Muito Mais Que o Amor escrita por Jessi de Paula


Capítulo 5
Olha pra mim


Notas iniciais do capítulo

"olha pra mim
nao foi a toa que eu cheguei à ti
se a essas ruas sobrevivi
e nessas praias nao me afoguei
foi só porque
tinha algo a dizer pra você"



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– Tem certeza que ela não voltou, Kitty?

Estou atrás do balcão da recepção da pousada enquanto Jesse pergunta sobre meu paradeiro. Me admira ainda estar procurando-me depois do fiasco de ontem a tarde.

Depois do beijo eu simplesmente virei as costas e corri, sem dizer nada, sem nenhuma outra reação, apenas corri. Cheguei a esquecer que estava a caminho da casa de Quinn até chegar a pousada e, horas depois, receber um Kurt desesperado batendo à minha porta para saber sobre nossa conversa. Ele ficou furioso ao saber de tudo que acontecera.

– Olha só, para a Rachel chegar até o quarto precisa passar por aqui, se ela passasse por aqui eu veria. Ela não usa a própria cozinha porque morre de preguiça de fazer o próprio café. – dou-lhe um cutucão na perna e ela vacila por um segundo. – Portanto, se ela quiser tomar café na cozinha da pousada, precisa passar por aqui e eu veria. Então, não, Rachel não dormiu aqui, o quarto está intacto de acordo com a faxineira que foi lá essa manhã. – termina sorrindo desdenhosamente.

– Tudo bem, mas, se aparecer, avisa que estou procurando por ela. – Jesse pede desanimado.

– Não sou garota de recados. Aliás, não devia estar atrás da sua noiva? Ou ex, sei lá.

Jesse finalmente desiste, ouço-o saindo batendo os pés com força no assoalho.

Levanto-me devagar para ter certeza de que ele se foi e suspiro aliviada ao ver a recepção vazia de sua presença.

– Obrigada, Kitty.

– Por nada, ele é um babaca mesmo.

Dou um pulo assustada quando vejo alguém entrar novamente pela porta, mas é apenas Kurt com cara de reprovação.

– Então você não dormiu aqui essa noite, Rachel? – pergunta aproximando do balcão e apoiando-se nele. – De acordo com o Jesse você não estava aqui. Não pode se esconder para sempre.

– Quer apostar? – desafio dando meia volta em direção à porta dos fundos. – Fugi por sete anos. Já tomou café?

Seguimos até a cozinha que fica de frente para o quintal com uma grande piscina mais a frente. As paredes são todas de vidro para que os clientes possam tomar o café olhando a bela combinação do azul do mar e o verde do nosso quintal sempre bem cuidado. Por causa das preparações do casamento, há ainda cadeiras desmontadas entulhadas em um canto e tendas armadas próximas a um pequeno altar que fica na direção do mar.

Depois de preparar nossas bandejas, escolhemos uma mesa do lado de fora. Admiro a vista por um longo período enquanto tomo meu café. De repente, levo minha vista até os entulhos da preparação do casamento e volto a lembrar de toda a bagunça que está minha vida e das pessoas a minha volta.

– Rachel. – olhos novamente para Kurt. – Está mexida com o beijo de ontem?

– Não. – respondo rapidamente. – Estou preocupada com a Quinn e confusa com tudo isso que tem acontecido desde que voltei.

– Entendo. Não passou lá em casa desde que chegou. Carole e meu pai estão perguntando por você.

Abaixo a cabeça lembrando-me da última vez que entrei na casa de Kurt que, por acaso, também era a casa de Finn. Foi um dia antes do acidente, quando fui chamá-lo para irmos para a cidade vizinha onde teria a festa que aguardamos por um mês no mínimo. Kurt estava viajando com seu pai, Burt, por isso não foi junto e nem fazia questão. Disse desde o começo que não iria, pois não era de segurar vela. Ainda hoje é estranho ter meu melhor amigo como cunhado, principalmente depois que Finn se foi. Não tive mais coragem de entrar naquela casa.

Quando começo a sentir-me abalada pelas lembranças, Blaine surge dando-me bom dia. Percebo sua presença apenas ao vê-lo sentar em uma cadeira entre mim e Kurt.

– Ah, bom dia. – digo dando meu melhor sorriso e afastando as lembranças. – Como está sua estadia na pousada? Dormiu bem?

– Claro, com certeza. Acho que meus amigos ainda estão dormindo.

– Blaine, quero pedir desculpas por toda a bagunça. – Kurt fala curvando o corpo na direção dele. – Sinto muito por ter perdido a viagem agora que aparentemente não terá mais casamento. Mas será pago o combinado pela quebra de contrato.

– Tudo bem, acho que precisamos mesmo de um descanso num lugar como esse.

– Que bom que gostou daqui. – digo aproximando-me enquanto Kurt lança-me um olhar de repreensão. – Pode ficar quanto tempo quiser. Kitty disse que toca piano?!

– Sim, ele toca. – Kurt interrompe-me e sorri para Blaine. – Ouvi seu trabalho antes de contratá-lo, obviamente. Toca muito bem.

Lanço para Kurt meu melhor olhar assassino e puxo minha cadeira para mais perto.

– Temos um piano aqui na pousada. – toco seu braço delicadamente e Kurt repete meu gesto. – Pode nos dar o prazer de ouvi-lo qualquer dia.

– Claro. – diz parecendo desconfortável com a situação. – Podemos falar disso em outro momento? Só quero tomar meu café e aproveitar a vista.

Eu e Kurt trocamos olhares de reprovação e voltamos às nossas posições iniciais.

Cerca de vinte minutos depois, em total silêncio, ganhamos mais uma companhia à mesa. Puck parece estar furioso quando senta-se ao meu lado.

– Passou a noite com a Quinn? – pergunta Kurt irritado.

– Quinn não é a noiva? – questiona Blaine ao que todos apenas confirmamos com a cabeça.

– Bom dia pra você também, purpurina. E não, para sua felicidade. Ela nem quis falar comigo, passei horas na frente da sua casa e nada.

Largo minha xícara novamente no pires e volto minha atenção para Puck.

– Como assim? Pensei que ela tivesse terminado com o Jesse porque te queria de volta.

– Eu também, mas a Quinn nunca foi assim tão simples não é?

Levanto-me rapidamente e saio em disparada, dessa vez decidida a saber o que está acontecendo. Puck tem razão, Quinn nunca foi simples, mas isso já está no cúmulo da bagunça.

Kurt pergunta aos berros o que vou fazer, mas não respondo, apenas corro em direção à saída, pego meu carro e sigo até a casa da Quinn.

Chamo por algum tempo até sua mãe aparecer, mas ela garante que a filha não está. Imploro que chame-a, que preciso conversar com ela urgentemente, que me preocupo com sua situação, mas sua mãe garante que ela realmente não está, até que desisto de ficar esperando.

A caminho da pousada, paro em frente à casa do Finn. Parece não ter ninguém então estaciono para observá-la. Passei dias bons aqui, quase todos os sábados vinha almoçar com a família de Kurt e Finn e me sentia feliz em imaginar que um dia faria parte disso como uma integrante, coisa de adolescente apaixonada que não tem tempo para pensar nos acasos da vida.

– Rachel?! – assusto-me ao ver Carole surgir repentinamente na janela do carro. – Desculpe assustá-la.

– Não foi nada. – respondo descendo para cumprimentá-la. – Só estava perdida em pensamentos.

– Imagino. – ela abraça-me com força e, por um momento, penso ver seus olhos brilharem por uma lágrima talvez. – Veio fazer uma visita? Faz tanto tempo.

Sinto-me envergonhada, pois só parei porque pensei não ter ninguém em casa, talvez não fizesse o mesmo se soubesse que ela apareceria.

– Só passei para dar um oi, nada demais.

– Quer entrar? Talvez tomar um café?

Olho novamente para a casa e congelo. Nunca mais entrei ali desde que ele se fora e mesmo agora não tenho coragem.

– Não. – respondo vacilante. – Estou procurando pela Quinn, temos coisas importantes para conversar, então...

– Entendo. – ela interrompe provavelmente percebendo meu desconforto. – Sabe, a casa não está muito diferente do que lembra. Pensei em me mudar, mas foi aqui que ele cresceu, que passou toda a infância e decidi não me afastar do lugar que tem tanto do meu filho. Não é tão doloroso estar ali dentro quanto pode estar parecendo para você.

Abaixo a cabeça sem coragem de encará-la. Carole simplesmente sabe e sempre soube que não voltei por fraqueza, sequer tive alguma consideração pela família e agora estou aqui novamente tentando fugir.

– A propósito. – volta a falar. – Vi a Quinn na praia, próximo à antiga escola de vocês. Está com Beth.

– Minha irmã? – pergunto estranhando.

– Sim. Bom, vou entrar, tenho muito que fazer.

Enquanto Carole direciona-se até o portão, volto para o carro, mas, antes que eu dê a partida, ela chama novamente.

– Ainda espero sua visita qualquer dia desses.

Dirijo até o colégio deixando meu carro perto da entrada. Tiro os sapatos para pisar na areia enquanto procuro pela Quinn, mas Beth me encontra antes.

– Oi, Rachel, veio brincar com a gente? – pergunta pulando sem parar.

– Olá, Beth. Claro que podemos brincar, mas antes, pode me dizer onde está a Quinn?

– O que quer, Rachel? – Quinn pergunta seca surgindo por trás de minha irmã.

– Só conversar.

Quinn me observa com cara de poucos amigos e finalmente cede:

– Beth, minha pequena. – dirige-se a ela docemente. – Não quer procurar conchas para mim e... Sua irmã, Rachel.

– Meus pais sempre falam isso quando querem ter conversas de adultos. – reclama Beth revirando os olhos e batendo os pés até a beira do mar.

– Não sabia que tinha alguma relação com ela. – comento olhando a garotinha se afastar.

– Cuido dela quando seus pais estão ocupados. Mas então, o que quer conversar?

– Sobre o casamento.

– Não terá mais casamento.

– Mas como não, Quinn? Até ontem parecia tão certo.

– Mas não está. – exalta-se. - Eu não posso fazer isso, não mais. Já cometi muitos erros na minha vida, mas esse não será mais um.

– Que erros? – questiono também me exaltando. – Você sempre foi a melhor em tudo, sempre teve tudo o que quis e eu sempre tive inveja disso. Quando conheci o Finn ele ainda era louco por você e eu tinha tanta raiva porque pra você era tão fácil com esse rosto perfeito, com uma personalidade forte e decidida, sem medo. Você sempre teve tanta certeza de tudo e agora, a três dias do casamento, está cancelando tudo. Foi um relacionamento de anos pelo que todos me falaram. Qual o problema agora, Quinn?

Quinn tenta segurar o choro, mas parece quase impossível. Ela olha para o horizonte evitando-me. Olho na mesma direção e vejo Beth correndo alegremente atrás de conchas e molhando os pés nas ondas fracas que batem na areia. Não está um tempo muito quente, portanto ela está de short e camiseta e não com roupas de banho, mesmo assim começa a entrar mais para dentro do mar.

– Não vá muito longe, Beth. – Quinn grita firmemente.

Quando algo muito estranho com relação a esse momento começa a martelar na minha cabeça, Quinn retorna nosso diálogo.

– Não vou voltar atrás. Está na hora de fazer alguma coisa certa na minha vida. Desde o acidente, caso não tenha percebido, aquela Quinn tão decidida deixou de existir. Tudo que restou na minha vida foram incertezas e medos. – explica com a voz trêmula. – Não tenho nem certeza de quem eu sou, de quem me tornei, entende?

Para minha desgraça, sim, eu entendo porque também me sinto assim nesses sete anos que se passaram. Talvez por motivos diferentes, mas essas questões todas também têm me perseguido.

– Tem a ver com o Puck? Com tê-lo encontrado na pousada comigo? – pergunto sentindo-me novamente culpada.

– De certa forma, sim. – ela afasta-se em direção à Beth. – Está na hora de ir para casa, prometi aos seus pais que te levaria para o almoço e ainda tem que tomar banho.

Ao longe vejo as duas conversando. Beth não parece muito feliz por ter que ir, mas se dá por vencida. Ofereço carona e, por conta do horário, Quinn aceita.

Chegamos em frente à casa de Quinn e encontramos um antigo amigo do colégio, também ex-namorado dela, Sam. Na verdade o namoro dos dois foi tão rápido que Quinn nunca considerou como algo sério, mas, para Sam, foi importante.

Quinn desce suspirando como se já esperasse por mais uma conversa desagradável nesta manhã. Ela parece ocupar bastante tempo ajudando Beth a descer do carro e pegando suas coisas até não poder mais adiar.

– Sam, por favor. – pede aproximando-se dele. – Já conversamos tudo o que tinha para conversar.

– Eu não desisti. – diz olhando-a e ignorando minha presença. – Não desisti quando marcou o casamento e muito menos agora que cancelou.

– O cancelamento não tem nada a ver com você.

– Olá, Sam. – chamo sua atenção tentando desviar o assunto.

– Rachel, ouvi falar que voltou. – cumprimenta-me – Vai ficar?

– Por um tempo, peguei férias do trabalho pra aproveitar um pouco com minha família e os antigos amigos.

Ele se volta para Quinn com um olhar triste, mas ela já está entrando em casa com a pequena Beth em seu encalço. Antes de fechar a porta nos lança um último olhar e um vagaroso tchau com a mão.

Quando estou voltando para o carro, Sam pergunta se posso levá-lo até uma oficina mecânica próxima dali. Vejo a carona como uma oportunidade para saber um pouco mais sobre o que está acontecendo entre os dois.

Ele não parece muito a fim de conversa, mas, como não iremos longe, decido eu mesma começar o assunto.

– Então, não há muitas mulheres nessa cidade, não é?

– Como assim? – pergunta sem parecer me dar muita atenção.

– Sei lá, é só que, parece que todos os caras daqui estão em cima da Quinn. Meio que sempre estiveram, mas na adolescência é aquela coisa de todo mundo ficar com todo mundo, mas agora?! E a Mercedes? Quando fui embora não estava namorando com ela?

– Sim, por dois anos. – responde ainda indiferente. – Não deu muito certo. Nunca fui um dos mais espertos, nunca pensei em sair daqui. Comodismo, talvez. A Mercedes sempre foi muito mais independente então, quando viu que meu futuro se resumia a essa cidade, se mandou. Fez bem.

– E agora, com a Quinn? – pressiono.

– Ela é uma das poucas mulheres com quem realmente me senti bem e eu tinha certeza que íamos ficar juntos depois que você e o Puck se foram. Eu estava sempre com ela até quando precisou ficar fora, eu estava lá.

– Pra onde ela foi?

– Não importa. – ele desconversa. – O que importa é que eu estava lá para ajudá-la e quando voltamos o panaca do Jesse apareceu querendo dar uma de herói e a Quinn simplesmente esqueceu tudo o que fiz por ela.

Sinto-me tentada a perguntar o que tanto Sam afirma que fez pela Quinn, mas ele interrompe todo o assunto e diz:

– É aqui. Obrigado pela carona, Rachel, até mais. – e desce sem maiores explicações.

Chego à pousada já na hora do almoço e nem ao menos passo em meu quarto, vou direto para a cozinha. Lá fora, encontro Kurt sentado na mesma mesa que estávamos pela manhã. Ao seu lado também está Blaine e, ao sentar, surpreendo-me ao vê-los com as mãos quase que entrelaçadas. Mesmo que soltem rapidamente tentando disfarçar, tenho certeza do que vi. Olho para Kurt procurando uma resposta e ele apenas sorri com desdém.

– Como foi a conversa com nossa noiva instável? – pergunta ainda com o sorriso no rosto.

– Sem avanços. – respondo voltando às lembranças da manhã nada produtiva que tive.

– Que pena. – afirma sem parecer realmente pesaroso.

– E como está o Pcuk? – pergunto.

– Não se preocupe com ele. Está se contentando com a prima dela.

– O que tem nessa cidade? Parece que as pessoas entram em um estado de alvoroço sexual.

– Você que o diga.

Lanço-o um olhar de repreensão. A verdade é que tenho sido impulsiva e não sexualmente alvoroçada, são coisas diferentes.

– Já tive muitos problemas por conta de certos envolvimentos. - explico.

– Sexuais. – corta-me e diz deixando-me um pouco constrangida. Afinal, os estranhos não precisam saber sobre minha vida sexual.

– O que importa, Kurt, é que não quero mais saber de homem nenhum enquanto estiver nessa cidade. – afirmo decidida.

– Então precisa avisar para certo rapaz que veio te procurar.

– Kurt, já disse que não quero saber do Jesse.

– Não estou falando do Jesse. Me refiro àquele moreno lindo que está vindo em nossa direção.

Viro-me torcendo para que o tal moreno lindo não seja quem imagino, mas não teria como ser outro e tudo o que me pergunto é o que, por Deus, Brody está fazendo nesta pousada.


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Notas finais do capítulo

Nina Spim: Sim, a Rachel ta suuuuper confusa hahaha. A volta pra casa e todas as novidades deixaram ela perdidinha com relação aos homens e à sua amizade com a Quinn porque elas mudaram muito em sete anos. Claro que essa confusão dela vai deixar todo mundo tão confuso quanto.

dresilv: Calma que ainda tem muita coisa pra rolar e essas duas têm muito o que se resolver, não é?

Então aí está mais um capítulo e lá vou trabalhar para o próximo. Me deu uma "travada", mas estou conseguindo continuar aos poucos.



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