Marinwaal: besties forever escrita por Miss Vanderwaal


Capítulo 4
Estrelas reluzem nos olhos dela




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Quarenta minutos dentro daquele carro passaram como que num piscar de olhos. E, francamente, eu não me lembrava de qual caminho tomei para chegar até lá.

Eu ainda não conseguia organizar meus pensamentos. Às vezes, era como se eu não estivesse em condições de pensar em nada e noutras, era como se os pensamentos fossem como um remoinho que minha mente não poderia comportar por muito mais tempo.

Desta vez, não precisei esperar, pois os pacientes almoçavam antes do meio-dia. Fiquei feliz ao saber disso.

Ao adentrar vagarosamente o quarto, em um primeiro momento apenas com a cabeça, notei que Mona não estava como da última vez, olhando hipnotizada para a janela, parecendo uma marionete esquecida em um porão, estava sentada rente à guarda superior da cama, com um travesseiro entre esta e suas costas. Tinha as pernas esticadas e cruzadas sobre o colchão e em mãos tinha uma pequena boneca, talvez não muito maior que a palma de sua mão.

Congelei por uma fração de segundo, não podendo deixar de lembrar da única mensagem de –A que havíamos recebido até o momento, logo após o acidente de Mona: “Mona brincava com bonecas, eu brinco com corpos”. Senti um arrepio percorrer-me a espinha e não consegui achar graça na ironia.

Pisquei, afastando por completo tal pensamento da cabeça, me deixando sorrir novamente ao ver a doçura com que Mona acariciava os cabelos da pequena boneca, como se estivesse a penteá-los. Ela levantou a cabeça ao ver que eu me aproximava. Seus lábios, como da última vez, pareciam querer se curvar para cima e eu senti uma onda de felicidade me dominar. Por um momento, pareceu-me que ela ia abrir de fato um sorriso e pronunciar meu nome, mas não o fez.

Sentei-me em sua cama, a uma certa distância dela.

– Oi, Mona – disse meio sem jeito, porém sorrindo, notando finalmente que seus cabelos estavam bem penteados e presos em duas tranças que escorriam por seus ombros, uma de cada lado da cabeça, exatamente como a versão “nerd” dela usava, no primeiro ano – Você não imagina o quanto eu fiquei feliz ao saber pelo seu enfermeiro que você estava melhorando.

Nenhuma resposta. Mona já havia baixado a cabeça novamente e estava outra vez a tocar os cabelos da boneca com delicadeza.

Chinelinhos felpudos cor-de-creme cobriam seus pés. Me aproximei mais dela, tirando-os e os colocando no chão, e, sem cerimônias, coloquei suas pernas sobre meu colo em seguida. Ela parecia estar indiferente a tal informalidade. Não sabia se isso era um bom sinal ou não.

– Posso ver? – perguntei em um tom claro e delicado, como se estivesse tentando puxar assunto com uma criança encabulada, apontando para a boneca que ainda repousava entre suas mãos.

Mona finalmente me fitou, com um olhar incerto, e entregou-me a pequena boneca, que era dona de duas tranças castanhas assim como as dela e vestia um conjuntinho com saia e blusa xadrez azuis. Até o figurino parecia com o que ela costumava usar no primeiro ano.

– É bonita – eu disse, ainda num tom infantilizado – E se parece com você – afirmei, embora a boneca tivesse pele branquinha e sardas nas maçãs do rosto. Aparentava ter sido comprada recentemente pois possuía aquele típico cheirinho sintético de talco de bebê – Seus pais que te deram?

Mona apenas roçava as unhas umas nas outras, delicadamente, ainda silenciosa. Suspirei, um tanto frustrada, me aproximando ainda mais dela, fazendo com que suas pernas se flexionassem sobre meu colo.

Seus grandes olhos castanho-claros me fitaram mais uma vez devido aquela proximidade repentina e eu exitei um pouco antes de tocar um lado de seu rosto com minha mão esquerda. Sua pele parecia estar menos danificada e eu sentia sua bochecha macia encaixando-se perfeitamente em minha palma. Meu polegar movimentava-se suavemente, acariciando-a.

– Não pensa mesmo em falar comigo, docinho? – fiquei surpresa devido a tamanha facilidade com que a palavra “docinho” escapara de meus lábios, porém me senti franca e extremamente satisfeita assim que me ouvi dizendo-a.

Mona baixou os olhos novamente, como se estivesse envergonhada. Mas eu não ia desistir.

– Está certo – disse num súbito ânimo e coloquei suas pernas de volta no colchão, esticando-as e me levantando em seguida – Nós não precisamos falar nada. Mas... – apontei para a cadeira da escrivaninha de madeira que ficava ao lado da cama, fingindo autoridade – você vai sentar aqui.

Virei a cadeira de frente para Mona, mas ela não se moveu, ainda que me fitasse.

– Eu não quero saber de nada! – me divertia brincando ser de mandona – Você vai sentar aqui.

Mona não moveu um músculo sequer, mas ainda me fitava um tanto curiosa e eu tive vontade de rir, mas me contive.

– Quer que eu chame reforços? – coloquei uma mão na cintura.

Ela finalmente se arrastou para a cadeira e eu sentei na cama novamente, logo depois de ter puxado minha bolsa para perto, para ficarmos frente a frente.

– Ótimo, ótimo. Agora... – disse, e, depois de vasculhar a bolsa, tirei de dentro uma máscara de cílios e algumas palhetas compactas de sombra e afins – eu vou retribuir o favor.

Sorri, me referindo ao dia em que eu fora atropelada – pelo carro de... bem, alguém da Equipe –A que eu não me dava permissão de me atrever a pensar que fosse Mona – e ela fora me visitar no hospital com as mesmas coisas dentro da bolsa, a fim de me animar.

– Bom... – suspirei, depois de alguns minutos de trabalho, deixando que ela olhasse o próprio rosto em meu espelhinho de mão – estou começando a te reconhecer!

Mona permanecia ereta na cadeira, o olhar vazio. Toquei seus joelhos com as duas mãos e o olhar preocupado.

– Eu não entendo. Eddie me disse que minha visita no sábado havia dado resultados. Pois então me mostre esses resustados – toquei novamente um lado de seu rosto com minha mão esquerda – Olhe para mim.

Mona obedeceu e, por um momento, olhava-me como se não me conhecesse.

– Eu vim de novo aqui porque acredito que haja uma pessoa aí dentro – toquei o centro de seu peito com dois dedos - não importa o que os outros me digam. E eu vou continuar vindo até quando for necessário! Porque eu quero te ter de volta – falei firme, ainda que sentindo o choro preso em minha garganta – Agora, tem que haver algo que possamos fazer. Me diga o que quer. Quer descer? Que tal o jardim? Eddie me disse que você anda tomando sol lá.

Mona assentiu, fitando a parede oposta do quarto, evasiva.

– Bom – eu disse, apertando minhas mãos nas dela – Muito bom.

Ela levantou da cadeira cautelosamente, enganchando seus dois braços em meu direito, como se estivesse com frio, com dificuldade para caminhar ou até com medo e quisesse que eu a protegesse de algo. Tal gesto me lisonjeou e eu consegui apenas sorrir.

Caminhávamos lentamente para fora do quarto. Mona estava um tanto encolhida ao meu lado, tensa, como se fosse a primeira vez que estivesse efetivamente fazendo aquilo. Deixei certo instinto protetor/maternal me dominar, passando o braço direito por trás dela.

– Está tudo bem – sussurrei, beijando-a no topo da cabeça.

Assim que disse isso, pude sentir a musculatura de Mona relaxar significativamente e suas costas ficarem mais eretas.

Paramos em frente a recepção, pois a porta gradeada atrás de nós, que dava para o quarto de Mona, estava aberta. À minha esquerda estava a porta de entrada e, à nossa frente, no final de outro corredor, estava uma outra sala, talvez uma sala de jogos, eu não sabia dizer. E havia uma porta dupla em azulejos envidraçados atrás do balcão que tive certeza que dava para o jardim dos fundos. Mas antes que eu pudesse dar mais um passo, Mona se desprendeu de mim, caminhando em linha reta, para a tal sala de jogos.

– Ei – eu disse, apertando o passo para alcançá-la – , aonde vai?

Ela não me respondeu. Era de fato uma sala de jogos. Havia uma mesa de ping-pong ao fundo direito, e, ao esquerdo, senhoras folheavam revistas em sofás aparentemente confortáveis. Pequenas mesas estavam dispostas pela grande extensão onde alguns internos jogavam cartas, damas e afins. E alguns enfermeiros circulavam. Vendo aquela pacífica interação, eu percebi estar mudando minha visão sobre o Radley. O local não merecia o apelido de “mansão assombrada".

Olhando em volta, admirada, eu não havia percebido que Mona caminhava para um piano marrom à nossa frente, rente à parede. O instrumento parecia antigo e tinha o aspecto um tanto surrado, porém Mona olhava para ele como se tal fosse um brinquedo novo.

Deslizou para o lado esquerdo do comprido banco de madeira, dando a entender que me queria ao seu lado, e colocou, exitante, as duas mãos sobre as teclas, como se quisesse ter feito isso há bastante tempo. Ela tocou um sol com o mindinho da mão direita e, em seguida, o resto da escala em reverso até chegar ao , tocando a nota com o polegar. Ocupei o lugar ao lado dela, atenta a seus movimentos.

Ela repetiu o processo anterior com a mão esquerda e, começou, lentamente, a tocar a melodia simples de We Wish You a Merry Christmas. A harmonia das notas graves com as agudas instantaneamente me fez pensar em coisas natalinas, embora ainda estivéssemos no meio de outubro. Ia abrir a boca para dizer, em tom divertido, que ainda não era natal, mas me detive, afinal quem se importava?

Mona recomeçava a tocar a doce melodia quando senti alguém tocar meu ombro.

– Vejo que você fez de novo – disse Eddie Lamb atrás de mim, em voz baixa – Ela está realmente progredindo.

– Eu não sei o que aconteceu – respondi no mesmo tom de voz, me virando para ele e dando de ombros - Eu ainda estou impressionada, para falar a verdade. Mona nunca me disse nada sobre saber tocar piano.

– Bem, é capaz de ela ter desencadeado uma memória da infância ou algo assim. É bem comum isso por aqui. E música é um grande estímulo. A maioria das coisas que vêm de fora são grandes estímulos, aliás.

Assenti, em compreensão. Mona não pareceu se abalar com a conversa, continuava a dedilhar o piano como se estivesse em um mundo à parte.

– Não está com fome? – Eddie me perguntou.

Olhei rapidamente para o relógio em meu pulso esquerdo. Uma da tarde em ponto. Eu ainda não havia almoçado e murmurei um “acho que sim” ainda que não estivesse com fome.

– Há uma cafeteria dobrando a esquina direita – ele informou – Você pode voltar assim que terminar, se quiser.

Concordei, sorrindo com tal possibilidade. Me virei novamente para Mona, que parou abruptamente de tocar, e Eddie se afastou.

– Eu já volto, está bem? – disse em voz baixa, fazendo questão que ela escutasse. Tinha minha mão esquerda em suas costas, acariciando-as delicadamente.

Mona assentiu, sem olhar para mim, ainda com as mãos sobre as teclas do piano. Ela parecia ter escutado que eu iria sair. Beijei-a demoradamente na bochecha, me afastando em seguida.

A cafeteria em estilo rústico não era apenas especialista em cafés. Demorei vinte minutos ali, dentre esperar e comer um cheeseburguer, ainda que um tanto sem vontade. Observava pela janela do local os carros indo em direção ao centro. Aquela segunda-feira estava ensolarada e não tão fria.

Chequei o celular enquanto comia. Haviam quatro chamadas perdidas de Emily e uma mensagem de Caleb, de mais ou menos dez minutos atrás: Hey. Emily me disse que tentou te ligar e você não atende. Ela achou que você estivesse comigo. Está tudo bem?

Caleb tinha dezenove anos (dois anos a mais que eu) e não estudava mais em Rosewood High – havia se formado no ano passado. Por isso, passou a ter as manhãs livres e trabalhava apenas à tarde com o pai, colocando um fim no desespero de pessoas que tiveram seus computadores invadidos por hackers e afins (o que era sua paixão desde que ele era um calouro). E às vezes eu ia até seu apartamento durante o intervalo para o almoço.

Senti meu coração se contorcer devido a culpa. Até por mensagem eu sabia que Caleb não perguntava aquilo num tom inquisitivo, mas sim unicamente preocupado. Ele não era ciumento, apenas protetor, e eu amava isso nele com todas as minhas forças. E omitir certas coisas dele simplesmente acabavam comigo.

Parte de mim queria que Caleb estivesse comigo. Queria ouvir a voz dele e contar-lhe o quanto Mona estava progredindo (e o quanto eu estava aliviada e feliz com isso), mas sabia que ele teria nos olhos a mesma preocupação que as garotas tinham. Eles temiam por mim, eu sabia, mas não entendiam a necessidade que eu sentia de estar com Mona e protegê-la. Na verdade, nem eu entendia.

As pontas de meus dedos suavam e meu estômago se contorcia ao estar de volta ao hospital. A possibilidade de Mona ter tido uma crise súbita ou algo assim me causava apreensividade.

Passei pela recepção e lentamente girei os tornozelos para começar a caminhar para a direita, como quem recebe uma prova corrigida das mãos do professor que se mais odeia, com medo de ver um grande “reprovado” escrito em caneta vermelha traçando uma linha em diagonal no papel. Mas lá estava ela, ainda ao piano. E tudo que eu consegui fazer foi soltar o ar que estivera prendendo desde que saíra da cafeteria e sorrir.

Caminhei lentamente até ela. Pude distinguir a melodia de Yankee Doodle que Mona tocava, agora com certa agilidade nos dedos da mão direita. Ela estava não muito ereta mas também não muito curvada, e agora uma malha de lã da cor de seus chinelos cobria-lhe as costas.

Ela parou de tocar assim que me viu sentar ao lado dela.

– Uau, você é persistente – eu disse, tocando seu ombro.

Mona permaneceu de cabeça baixa por alguns segundos, como se estivesse pensando no significado da palavra “persistente”. E então ela me fitou e seus lábios curvaram-se genuinamente para cima. Ainda que ela não mostrasse os dentes, aquilo era um autêntico sorriso, algo que achava que não a veria fazer por muito tempo.

Tive trabalho, porém, para ler aquela expressão. Era um sorriso doce, de fato, mas era como se ela ainda estivesse tentando descobrir quem eu era ou porque me conhecia. Era quase como se ela dissesse “não sei quem você é, mas agradeço por estar aqui”. Novamente não pude fazer nada além de sorrir de volta.

Não tentei puxar assunto por algum tempo. Porém, como quem não quer nada, comecei a dedilhar, exitante, as primeiras notas de Für Elise, de Beethoven.

Eu havia, por dois meses, no sétimo ano, tido aulas de piano. Tudo porque Kate, minha perfeita e irritante meia-irmã, sabia tocar tal instrumento e eu queria provar para meu pai que poderia fazer tudo que Kate fazia, exceto ser magra e atraente. Acabei desistindo e mandando Kate mentalmente para ser queimada pelas labaredas do Inferno.

Ali, sendo atingida por uma nostalgia momentânea, acabou me ocorrendo que a única pessoa que sabia que eu havia tido aulas de piano era Alison.

Sentia os olhos de Mona seguindo os movimentos de meus dedos. Parei de tocar ao sentir uma mão em meu ombro.

– Você tem unhas bonitas – disse-me uma senhora que poderia ter entre setenta e oitenta anos de idade e tinha o braço direito de uma jovem enfermeira sobre seus ombros, que sorria simpaticamente ao vê-la falar. Mona se virou para olhá-la assim como eu.

Olhei para minhas unhas um tanto compridas que estavam pintadas de azul-marinho. Apenas os dedos anelares possuíam o desenho de uma florzinha branca.

– Muito obrigada – respondi pausadamente, me sentindo corar por um momento.

– Eu gosto de azul – ela informou, como se quisesse continuar a conversa.

Sorri, apreciando a maneira doce com que a senhora falava comigo.

– Bem... – comecei, depois de lembrar que tinha o mesmo esmalte na bolsa – eu posso fazer as suas, se a senhora quiser. E é claro – olhei para a moça que estava junto dela – se disserem que está tudo bem.

A jovem tinha um olhar divertido no rosto. Tocou seu rabo-de-cavalo castanho, fingindo estar pensativa.

– Se prometer não vir reclamar para mim depois, então tudo bem.

– Eu nunca reclamo de nada! – disse a senhora, em protesto, envolvendo minha mão direita em sua esquerda. Não pude evitar achar graça.

Das sete mulheres que estavam na sala de jogos, sete fizeram fila para tirar vantagem do kit de manicure que eu sempre levava na bolsa. E, durante as três horas que se seguiram (tais que não vi direito passarem), fazendo as unhas de cada uma delas em uma das mesinhas dispostas pelo local, me senti como se estivesse ajudando a erradicar a fome do mundo.

Até a terceira ou a quarta “cliente”, tive Mona em uma cadeira ao meu lado e enfermeiros de olhos colados nela para evitar que ela ou qualquer uma das outras resolvesse brincar com o alicate de unha; porém somente ao terminar o “serviço comunitário” fui perceber que Mona estava sentada no sofá mais ao fundo, de pernas cruzadas, e a pequena boneca com tranças nos cabelos havia voltado para suas mãos. Em meu coração havia apenas lugar para compaixão

Mona parecia aquela criança com quem ninguém queria brincar na hora do recreio. E eu sabia porque já havia sido essa criança. Caminhei até ela, ajoelhando-me para tentar olhar em seus olhos.

– Ah, você está aí – disse, tirando delicadamente a boneca de suas mãos e envolvendo-as nas minhas – Posso fazer as honras?

Mona lançou-me novamente o sorriso de horas antes.

Acho eu que a primeira regra do Código Oficial das Manicures é “nunca tratar das mãos de um cliente com mais ou menos delicadeza que das de outro”. Mas para mim era inevitável não perceber o carinho exagerado com que cuidava das unhas de Mona, como se ela fosse, de algum jeito, mais frágil do que as outras mulheres que estiveram ali. Não é à toa que demorei por volta de quarenta e cinco minutos para finalmente terminar.

Eram quase cinco e meia quando chegamos ao quarto dela. Eu estava meio sem jeito, não sabia se devia ficar mais um pouco ou se devia ir embora, e, para falar a verdade, tinha até medo de checar outra vez o celular.

Mona estava em pé, olhando para fora pela pequena janela do quarto que dava para o jardim frontal do prédio.

Eu estava de costas para ela, ainda ponderando sobre se ia ou se ficava, quando a ouvi perguntar:

– Quer ir ver as estrelas comigo?

Ouvir a voz de Mona depois de tanto tempo foi como um choque que me fez congelar no mesmo lugar por longos segundos. Meu coração estava batendo tão descompensadamente que nem foquei na pergunta em si, que pareceu não ter muito sentido.

– O que foi que você disse? – perguntei, ainda de costas, a voz quase nula.

– As estrelas, Hanna. No jardim dos fundos. As mais bonitas aparecem ao entardecer.

Ouvi-la pronunciar meu nome me fez perder a força nas pernas por um momento. Segurei firme na guarda inferior da cama e girei o corpo, sentando na beirada do colchão. Apenas saber que ela era capaz de lembrar quem eu era me provocava uma inigualável mistura de alívio e felicidade, talvez a maior que já sentira na vida. Lágrimas começavam a escorrer por meus olhos.

– Você não quer ir comigo? – ela desgrudou-se da janela e veio até mim, parecendo inocentemente desapontada.

Meu coração enternecia cada vez mais. Mona deslizou as pontas dos dedos por meus olhos, parecendo não entender porque eu chorava.

– Quero, docinho. É claro que eu quero – confirmei, percebendo que tais palavras saíram de meus lábios ainda mais facilmente do que as ditas por mim horas antes. Puxei-a para um abraço.

Mona correspondeu, encaixando seu pequeno corpo entre meus joelhos. Ela estava quente, e pela primeira vez desde que fora internada, mostrava que ainda havia sangue correndo por suas veias.

Sentia que suas mãos deslizavam por minhas costas, tentando fazer com que eu me acalmasse. Mas eu ainda não estava pronta para me acalmar. Apenas apertava-a com força pela cintura e, por aquele breve momento, eu senti que nada mais existia.


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Notas finais do capítulo

Então, eu preciso dizer que esse foi o capítulo que eu mais gostei de escrever até agora. Foi puramente água-com-açúcar, eu sei, e me desculpem. Mas acho que especialmente esse capítulo (principalmente o final) descreve exatamente como eu vejo a relação delas: doçura, apenas! Enfim, eu as amo demais :D