Hitsugaya ainda conseguia sentir o cheiro da flor de laranjeira de Karin em si.

Após uma longa busca fracassada pela Kurosaki, ele retornara ao campo onde a mesma desaparecera. Ficara uns segundos naquele local, pensando. Seus sentimentos estavam confusos. Porém, naquele instante… Ele tinha a certeza de que a queria ao seu lado, em segurança.

Toushirou ia reunir-se com Ichigo e Urahara, contudo um objecto vermelho atraiu sua atenção. Agachando-se, notou que era a fita que prendia os cabelos da morena. Seu peito acelerou quando detetou, como um mero fragmento, uma outra reaitsu. Ele a reconhecia!

“Protege-a bem. Nunca se sabe quando pode aparecer um ladrão pela calada da noite.”

Só naquele instante, o albino ligou os dois acontecimentos. O aviso do desconhecido e daquele individuo estranho, chamado Hakai. Na primeira ocasião, ele disfarçara o rosto e por isso não o reconhecera de imediato no segundo encontro. Todavia… Como não o reconheceu somente pela sua presença!? Talvez fosse aquele desconforto quando este se aproximara tão amigavelmente de Karin?

Aquilo parecia tudo uma encenação. Hakai o tinha desafiado?

— Desgraçado. Ninguém brinca com a vida dela. Vou matá-lo!

O gelo que permanecera no local convertera-se em belas flores, mais propriamente rosas. Porém o encanto, foi temporário. Vários picos se realçavam e tornavam-se perigosos, só de olhar, de tão pontiagudos que eram.

A fúria do capitão refletira-se sob si, alastrando-se pelo imenso céu. Tornando aquela noite a mais fria que houvera na cidade de Karakura.

xXx

P.O.V Karin On

Onde estava? Ah, verdade. O desgraçado do Hakai me raptou quando estava com o Toushirou. Vagas lembranças fizeram meu cérebro latejar de dor. Droga.

Meu corpo tremia ao tentar mexer. Quando abri os olhos parecia que tudo andava à roda. Fui drogada? Não me lembrava de ter batido com a cabeça, portanto essa era a única explicação para todas aquelas sensações esquisitas.

— Maldito sujeito ruivo, quando eu pegar aquele idiota…

Engasguei-me com a minha própria saliva aterrorizada, não consegui sequer acabar minha fala. Não acreditava no que estava à minha frente… Shinigamis. Vários corpos ensanguentados e pálidos, pendurados na parede. Nem perguntei como conseguira prender os shinigamis como se fossem cadáveres, sendo eles almas.

Como não senti logo este cheiro podre?

Tentei desviar o olhar daquilo, mas o olfato me lembrava daquelas presenças. Mas não eram só eles que estavam comigo. Ao desviar o meu olhar noutra direção estranhei algo mexer-se dentro das sombras.

Foquei mais naquele ponto e ele revelou sua presença. Um hollow!? Hakai era um hollow também então!? Mas… Porque ele não me devorou logo sendo assim? Mais estranho que isso, era aquele monstro não se aproximar de mim.

Tentei soltar-me, mas ao não obter êxito encarei os meus pulsos e tornozelos. Ri sarcástica.

— Correntes. Óbvio.

Afinal, ele não me deixaria andar por aí livremente. Tinha que me manter quieta naquele lugar. Era uma prisioneira, afinal. Olhei fixamente a máscara alva, nada acontecia. O que estava acontecendo? Algo não está certo… Ele deveria me atacar, sou presa fácil.

— Karin-chan! Finalmente acordou!

Odiava ele tratar-me daquela forma. Mesmo a situação actual ser nítida, Hakai parecia me querer convencer que somos amigos! Isso me estava irritando… Pensando bem, poderia ser esse seu objectivo.

— O que quer? -respondi seca e áspera, não me importando com os bons modos.

— Que mau humor! Eu trouxe algo para você comer, vê? – ele estendeu uma bandeja com muita comida. Mas não fiquei interessada em ver o que era propriamente. Não ia comer algo vindo dele.

— Não se preocupe. Não está envenenada.

— Espera que confie em ti? -ele riu, sem me responder. Escondi meu olhar sob a franja. Não queria mostrar minha fraqueza. Não podia… Ele era um inimigo.

Aquela tortura psicológica estava começando a fazer efeito em mim. É mais fácil quando sabemos claramente quem é o monstro. Mas ele me tratava com tanta alegria que parecia… me querer confundir. Era esse o motivo pela má sensação que tinha quando o conheci?

— O que tem Karin-chan?

Não respondi nada. Valeria o esforço? Só cairia na sua rede de manipulação. Preciso inverter o jogo, ver sua verdadeira essência. Hakai não era estúpido. Ele manteve-se desentendido, e observou o cemitério de shinigamis, sorrindo descontraído. Trinquei o lábio contendo minha vontade de dar uma potente voadora dele. Estava presa e só me iria machucar ao lutar contra aquele metal.

— Ah, eles? Você ficou traumatizada? Lamento muito.

— Maldito! Quem é…

— Já disse. Me chamo Hak…

— Eu sei seu nome! Quero saber que tipo de coisa você é! Um humano não pode ser!

Ele sorriu! Mas será que ele só sabe fazer isso!? Raiva, dor, qualquer coisa… Mas estava sempre com aquele maldito sorriso! Parecia uma máscara colada em seu rosto.

— Tem toda a razão.

Meu pedido pareceu ser atendido. Não sei se isso foi bom. Se seu sorriso é intimidante… seu olhar sombrio é de gelar a alma.

— Sou um pecador.

Encarei-o algum tempo. “Pecador”? O que era isso? Fiquei mais confusa do que estava antes.

— Isso é… Uma espécie de hollow? – ele gargalhou alto, ligeiramente malévolo. Me arrepiei apesar de ter disfarçado. Tinha dito algum disparate assim tão grande?

— Algo do género… os pecadores são obrigados a viver no inferno eternamente, sempre em sofrimento. É o pagamento pelos seus pecados quando estavam vivos, que foram demasiado graves para serem perdoados.

Comecei a compreender melhor o que ele me tentava explicar. Porém, isso me preocupou. Isso significava que aquele sujeito irritante era pior que um arrancar!

— … As almas que se tornam hollows foi por algum motivo que ficaram presas no mundo real, se não fosse isso elas seriam salvas. – enquanto completei seu raciocínio, fui lembrando da avó Haru e da explicação que o Toushirou quando alertara do perigo das almas rondarem por ali. De se transformarem em monstros a qualquer segundo.

Meu rosto deveria revelar o quão atordoada fiquei, porque o riso de Hakai só aumentava.

— Exato!- observei Hakai e depois fugi meu olhar para o lado oposto, me recordando da terceira presença.

— Você está controlando ele e mais quantos hollows? Por isso os ataques aumentaram em Karakura… O Ichi-nii tem tido muitos problemas em fazer tudo sozinho. Uma forma de distrair meu irmão para me raptar. Maldito, você já tinha tudo planeado.

— Oh! Até isso percebeu Karin-chan! Que garota esperta!

Nunca quis tanto chutar a minha bola de futebol em alguém como nesse ruivo! De certeza, que só pelos olhos, eu devia estar mostrando todo o desprezo que nutria por ele. Ao olhar pelo ombro de Hakai notei um ferimento dos shinigamis que ainda sangrava… Não era possível! Ele devia estar morto! Minha raiva evaporou. Eu ia vomitar se continuasse ali.

— E eles?- Hakai seguiu meu olhar a não mostrou o mínimo interesse.

— Precisava de cobaias para as minhas experiências.

— Como assim? Do que está falando?

— Tinha de testar antes de a tornar minha zanpakutou Karin-chan, eu lhe disse isso.

Aquele sorriso de novo. Mas não me importei com isso. Por momentos, acho que perdi toda a pouca cor que ainda me restava no rosto. Não aguentai mais, começando a gritar, descontando minha raiva.

— Qual o seu interesse nisso!? E porquê logo eu!?

— Hm. -ele estava a fingir que pensava!?- Ichigo Kurosaki quase derrotou o inferno. Pensei que escolher sua irmã com reaitsu mais elevada seria uma boa aposta e estava certo -sorriu- Ao início, julguei em escolher seu irmão mas por ser um substituto de shinigami não era possível, por ele já ter uma zanpakutou.

— Precisava de um humano. Sem poderes.

— Hai! -respondeu empolgado, me irritando- Sabe… esse é o único jeito de me livrar das perseguições.

— Perseguições?

— Alguns pecadores conseguem fugir do inferno, e certos guardiões os perseguem para os levar de volta... aconteceu com todos. O único jeito é me ligando a alguém que seja puro, um ser vivo. Tendo com ele uma ligação do shinigami com a sua zanpakutou. Dessa forma nenhum guardião me poderá arrastar de volta para aquele mundo.

A sua gargalhada era oco em meus ouvidos. Se ele fizesse isso, eu… Estaria presa a ele para sempre! Mesmo morrendo, não tinha como me livrar dele! Comecei a soar frio, estava a ficar desesperada.

Aquele cara era um completo lunático!

— Apesar que…

Ele aproximou-se e tomou o meu queixo entre seus dedos, aproximando-se demasiado de meu rosto. Sentia seu hálito tórrido bater contra o meu rosto, com seu olhar penetrante em cada possível reação minha. Ele não podia estar fazendo o que eu estava pensando… 

Meus receios pioraram quando ele contornava meus lábios com seus dedos. Droga! Move-te Karin!

— …acabei por me interessar de verdade em você, Karin-chan. Será mais que minha zanpakutou. Será minha amante.

Sempre havia um jeito de piorar a situação.

— Prefiro morrer.

— Morte é o ultimo que pretendo... desse jeito não me seria útil e teria de caçar outra presa. Mas nenhuma seria melhor que você.

Nojo. A visão daquele imprestável lambendo os próprios lábios me observando com luxúria, era pior que todos aqueles shinigamis mortos! Eu queria que ele se afastasse, mas não o fez. Estava cada vez mais perto. Meus olhos ardiam. Droga. Estava a chorar… Até onde ele pretendia ir? Me aterrorizei quando ele fechou os olhos. Não!

Porque eu não me conseguia mexer!? Seria a sua reaitsu? Estava em pânico. Tentava sacudir meu corpo, quando ele começa a rir. Por fim, afastando-se. Suspirei de alivio com aquele espaço seguro entre nós.

— Não se preocupe, não vou beijá-la. Bom, não agora. – ele sussurrou, dirigindo-se à saída. Notei que já me mexia e que em algum momento ele soltou as correntes, talvez para me alimentar. Pelo canto do olho, espiei o hollow. Ele devia vigiar-me caso tentasse fugir ou não cumprisse as ordens de manter-me viva.- Seu hálito está gelado por culpa daquele seu “momento” com o capitão… Odeio tudo o que é frio.

Quando escutei o som de Hakai se afastando, quase gritei por ajuda. Na esperança ridícula de Toushirou me escutar a onde quer que estivesse… Mas não o fiz. Em vez disso, saiu algo completamente diferente por meus lábios.

— Arigato, Toushirou.

P.O.V Karin Off

Sem ele saber, acabara-a por proteger.