Holy Sins escrita por itsinthewaterb, posledozhdya


Capítulo 2
I




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            A lua estava cheia no céu, ao longe só o silêncio bradava em seus ouvidos, bradava uma sentença, uma condenação: Fraca. Seus lábios sentiam as lágrimas amargas, lágrimas de um misto de ódio e decepção consigo mesma. Era o segundo serviço que ela não havia feito, mais um para ela carregar pelo resto da vida em suas costas.

 

            Já estava perto de casa, suas pernas estavam cansadas, e ela resolveu levantar voo, chegaria mais rápido, e despercebida. Ela fitou por alguns instantes a paisagem negra, árvores retorcidas em meio à pequenas montanhas e depressões, arbustos solitários e amedrontadores, e sombras ameaçadoras; e ao longe, um enorme casarão. Um cenário com o qual ela estava acostumada a lidar. Retirou o casaco, o amarrando na cintura, enxugou algumas lágrimas e pulou do pequeno penhasco que estava à sua frente. Logo se transformou em uma das figuras amedrontadoras, duas asas enormes e negras abriram dois buracos nas costas de sua blusa, o barulho do tecido rasgando e daquelas asas enormes batendo a lembrou do aviso de seu pai “Jamais se transformar de novo”, que ela ignorava completamente agora. O sentimento de pertencer à noite se misturava com o horror que ela tinha de si mesma. Por que as coisas não poderiam ser mais simples?

 

 

***

 

            Desceu na parte dos fundos da enorme casa, escondendo suas asas, e vestiu o casaco por cima, a fim de tampar o estrago que havia feito na blusa. As lágrimas não escorriam mais, mas a dor continuava ali, continuava corroendo, pulsando a cada vez que o coração bombeava sangue. Entrou pela porta dos fundos, e despercebida, subiu as escadas. As sombras dominavam a casa, como sempre à essa hora da noite. Pensou estar sozinha, pensamento que logo foi afastado por uma silhueta negra, perto da janela de seu quarto.

 

            - Adele? – ela se espantou, sentindo os músculos pararem de responder.

            - Chegou cedo, Anita. – era uma pergunta, ela sabia disso, Adele queria satisfações, algo que Anita realmente odiava ter que fornecer. Adele continuou olhando pela janela, sem nem olhar para a irmã.

            - Eu não consegui ... – resmungou, tirando o casaco e o pendurando no cabideiro. Adele se virou, conseguindo ver o estrago na roupa da irmã, com um sorriso de aprovação, caminhou até a cama encostada na parede da esquerda do quarto e sentou ali, observando-a. – De novo, eu falhei outra vez. Eu não consigo mais fazer isso, Adele, não posso, é cruel, e ... é horrível! – um desabafo que pulava do fundo da sua alma para a ponta de sua língua, algo que lhe entalava a garganta há tempos, algo que ela temia dizer. Mas que sua irmã sentia orgulho de ouvir.

            - Você sabe que vai levar uma bronca amanhã, quando tiver que dar o relatório ao pai, não sabe? – Adele perguntou, séria. Mas o sorriso ainda pairava naqueles lábios, com um misto de apreensão pela irmã e melhor amiga.

            - Sei, mas cansei de ser um fantoche ... Eu, eu sou como eles, Adele, como todos os que eu tenho que dar fim. Me sinto mais horrível do que eles, mais horrível que o pai, eu me sinto um demônio completo ... – ela se jogou na cama, fechando os olhos e tentando lutar contra aquela droga de pensamento que martelava em sua cabeça. Tentando esquecer os olhos do rapaz.

            - Vai dormir, Anita, eu farei o que puder pra te ajudar. Acredite. – Adele se levantou e caminhou até a cama da irmã, lhe dando um beijo estalado na testa, a cobriu e voltou à sua cama. Anita se sentia culpada por não contar tudo, se sentia um pouco só por esconder o principal: o motivo de não ter matado aquele rapaz. Mas logo adormeceu, e mesmo lutando contra as lembranças, elas não foram embora.

 

 

[Memories]

 

 

            - Eu confio esse trabalho à você, Anita, não me decepcione. – o homem disse, Anita sentia tudo aquilo como uma ameaça “Ou você acerta, ou acabará como sua irmã, uma vergonha.”  Não que ela não gostava de sua irmã, mas Adele era uma filha real de seu pai, e era ‘pura’ como ele mesmo dizia, ou seja, era humana. E Anita, ela era um monstro, e precisava provar ao pai, precisava provar a si mesma que podia ser alguém diferente.

            - É minha primeira missão sozinha, pai, não vou cometer erros! – sorriu, como uma criança quando sabe que vai conseguir algo. Pena que nem sempre elas estão certas.

 

            A garota levantou voo, abrindo aquelas enormes asas negras, e pulou pela janela da casa, em direção à cabana, onde vivia uma família de anjos. “Jamais se transforme de novo, Anita.” Foi a última coisa que ouviu, e ignorou.

 

 

***

 

            Ela estava começando a se cansar, estava a pouco mais de dez minutos sobrevoando a cidade com a criança nos braços e sem ter nenhuma idéia do que fazer com ela. Não pôde deixar de reparar como seus olhos eram belíssimos, brancos, completamente brancos, e brilhantes, radiantes. Não, ela não poderia largar a criança no meio da rua, tinha que encontrar algum lugar para ela, senão de que havia adiantado deixá-lo vivo? Havia feito um bom trabalho queimando o corpo da mãe junto com a cabana onde eles estavam, não haveria provas de que o garoto não havia morrido, ela havia sentido um imenso gosto pelo trabalho, menos pela parte de ter que eliminar aquele ... Pequeno anjo, que ironia! Podia jurar que havia se apaixonado por aqueles olhos... Mas tinha que escondê-lo. Aqueles olhos não a ajudavam a pensar. Lixo? Jamais, ele era uma vida, não algo descartável. Casa de algum mortal? Jamais! Poderiam não querê-lo... Foi quando um barulho chamou sua atenção: o sino da igreja. Ela Desceu de seu vôo enquanto embalava a criança nos braços... por que raios ela havia se apegado tanto? Escondeu as asas e, analisando bem a igreja, viu ao lado algumas luzes em uma casa enorme: o orfanato. Ela colocou-o deitado no degrau mais alto em frente à porta, enrolado em vários panos, e fez o que Adele sempre fazia com ela, deixou um beijo em sua testa, tocou a campainha e abriu as asas, hesitou em voar, algo dentro dela estava diferente, doía pensar que não ia vê-lo nunca mais. E, por quê?

 

 

***

 

            Ele era só um rapaz, um rapaz comum, se não fosse um anjo. Ela odiava missões com anjos, eles a lembravam do pequeno bebê que ela havia salvado, seu primeiro trabalho, seu primeiro fracasso.

 

            Ela o observou por horas, do lado de fora de sua casa, os olhos brancos ficavam à mostra raramente, quando ele queria, e as enormes asas brancas eram belíssimas, reluzentes exatamente como os olhos, como o bebê. Anita se prometeu durante um dia inteiro criar coragem de ir lá destruí-lo “Monstros, Anita!” Seu pai afirmava a todo instante, mas ele não parecia ser um monstro, ele parecia ser como ela.

 

            E depois de um dia inteiro, ela desistiu, caminhou por horas pela cidade, sua casa era longe, longe o suficiente para ela se esconder depois de fazer alguma missão, mas hoje, hoje ela precisava se esconder do seu próprio esconderijo, hoje ela era uma traidora.

 

 

[/Memories]

 

 

            As lembranças do rapaz, do bebê, aquelas asas, os gritos de horror da mulher, preocupada por seu filho, a dor... Tão real, misturada à culpa, tudo havia virado um emaranhado de lembranças, sentimentos e desespero...

 

            - ANITA! Acorda, Anita! – ela acordou com Adele segurando seus braços, ela estava se debatendo na cama, sentia um nó na garganta e um aperto no coração. – Você enlouqueceu? Gritar por anjos aqui em casa?! – Anita se sentiu confusa.

            - Eu o que? – colocou uma das mãos na cabeça: enxaqueca.

           - Você estava sonhando, Anita... – Adele afirmou, balançando a cabeça negativamente, e se levantou da cama, caminhando até o guarda-roupa.

            - Acho que não foi bem um sonho... – comentou, suspirando cansada. Droga de anjos!

 

            Vestiu uma roupa qualquer, como sempre se vestia, jeans e camiseta, e desceu as escadas, não ia esperar Adele, ela não precisava ouvir os palavrões e agüentar a fúria do pai pela irmã.

 

            - Precisamos conversar, Anita. – o pai disse, com a voz firme de sempre, era um homem bastante perceptivo, ela nem havia chegado na cozinha, onde ele estava, mas assim que chegou viu a figura de seu pai, sentada na cadeira principal da mesa, os cabelos estavam começando a ficar grisalhos, e os olhos eram vazios, como um enorme abismo sem fim. Algo que metia medo em qualquer um. E Anita estava com medo, conversas começadas com “Precisamos conversar” são sempre péssimas.

            - Sobre o que, exatamente, Pai? – o tom de voz era trêmulo, ela tirava forças de onde não tinha para domar a fera que gritava dentro dela, pedindo por liberdade, implorando por perdão.

            - Sobre o trabalho que você não fez ontem à noite. – ele contorceu os lábios num sorriso, irônico. – Você não conseguiu matar uma droga de um anjo, Anita. Você não é capaz de fazer o seu trabalho. – ele levou a xícara de café até os lábios, com a mesma expressão de sempre, Anita fervia por dentro, toda a tranquilidade que Adele havia passado à ela havia ido embora. Seus lábios tremiam sem saber o que dizer, odiava a maneira como o pai a tratava, odiava esse pouco caso; e principalmente, o ódio de si mesma havia voltado, estava borbulhando em seu sangue.

            - C-como você soube? – gaguejou, lutando contra si mesma, uma parte dela queria desistir, largar tudo aquilo que ela era obrigada a enfrentar todos os dias. Mas a outra parte insistia, queria mostrar ao pai que ela podia ser mais do que uma meio-demônio nojenta. Podia sentir o gosto do suor em sua boca, o sabor do medo.

            - Por favor, Anita. Você vive aqui desde que nasceu e não sabe dos meus contatos? Não sabe do que eu sou capaz? – “Ah, sei sim, infelizmente eu sei.” Ela pensava, preferiu não dizer. – Você é fraca. – essas palavras soaram como um grito ensurdecedor, bateram no fundo de sua alma e ecoaram para o resto do seu ser ... “Fraca... Fraca”.

            - Eu não sou fraca! – afirmou, batendo os punhos contra a mesa, o pai aumentou o sorriso. – Eu consigo, eu mesma mato essa droga de anjo, arranco aquelas asas malditas e jogo fora o resto! – a fúria deixou seu rosto rubro, seus lábios tremiam e as lágrimas queriam cair, ansiavam por liberdade, mas ela ia deixá-las presas, bem guardadas. Ele não merecia suas lágrimas, ninguém merecia.

            - Você tem dois meses para fazer isso, Anita. Ou eu vou bani-la do grupo de caçadores. – “Eu vou te tratar como o que você realmente é: um demônio.” Foi o que ela ouviu. Balançou a cabeça negativamente e saiu dali, deixando aquele homem de cabelos grisalhos e sorriso insuportável tomando o seu café.

 


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Notas finais do capítulo

Letty: Então, né? Não quisemos deixar muito espaço entre o prólogo e o primeiro capitulo, então... é... tá, sem enrolar nas notas x-x'

Bia: Primeiro capitulo postado, aeae *---*, esperamos que gostem, er '-' Reviews, my little monsters? :p



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