Premonição Chronicles 2 escrita por PW, VinnieCamargo, MV, Felipe Chemim, Jamie PineTree


Capítulo 14
Capítulo 13: Poeiras Ao Vento


Notas iniciais do capítulo

Escrito por Márcio Vinicius.



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Um dia antes.

Andreia abriu lentamente os olhos, piscando eles algumas vezes. Não conseguia reconhecer o local onde estava nem como fora parar ali. As paredes brancas denunciaram para a garota que estava em um hospital.

Uma figura apareceu ao seu lado, e segurou sua mão. Ela olhou para cima, ainda com cara de morta e com os olhos quase fechados e viu uma pessoa olhando para ela.

– Como você tá, gatinha?

– Que merda... Danilo? - Andreia perguntou, vendo o cabelo loiro do agora ex-namorado.

– Eu vim ver como você...

– Pera... Que aconteceu? Eu...

– Teve uma overdose Andreia. Misturou tudo o que devia e o que não devia e deu nisso.

– Ah, isso explica muita coisa e... O que você tá fazendo aqui, Danilo? Você nunca foi o tipo de homem que fica se preocupando com os outros.

– Não posso me preocupar com minha namora...

– Ex, seu cafajeste. E você tava pouco se fudendo comigo antes!

– Todo mundo muda algum dia.

– Aham, sei Danilo. Sei como você mudou... Sei sim... - Andreia bateu levemente em Danilo, que se aproximava, tentando lhe dar um beijo. - Vaza daqui. Sou sua ex agora.

– Não precisa lembrar isso, Andreia. Realmente não precisava.

– Acho que tá precisando sim...

...

As árvores balançavam ao ritmo da ventania, enquanto o céu ficava cada vez mais cinza, com as grandes nuvens de chuva se aproximando, junto da noite.

It’s been seven whole days
Without your embrace
I wanna see your face
I've got some things to say

T'was just a week ago
You said "I love you, girl"
I said "I love you more"

Os cabelos pretos de Mônica também balançavam conforme o vento. Ela tirou uma mecha que insistia em cair sobre seu rosto e prosseguiu observando, meio distante dos outros, o que acontecia. Lágrimas saltavam dos seus olhos, ela estava inconsolável. Já havia se passado mais de uma semana desde que o novo ano começara, mas ela ainda não tinha superado a tragédia que a acometera naquela terrível noite. A morte de Eduardo. O corpo dele demorou muito para ser liberado, visto que alguns procedimentos legais presaram serem tomados antes de um funeral digno. Ela tentou ser forte, mas não conseguia, sabendo que sua outra metade nunca voltaria.

E agora ela tinha certeza disso.

Ela viu o caixão sendo carregado, e uma horda de pessoas atrás dele, inclusive seus pais. Um padre qualquer fez uma homenagem ao jovem, seguido de um companheiro da equipe de surfe.


And I can’t get away from the burning pain
And I lie awake
And the fallen hero haunts my thoughts
How could you leave me this way?

Mônica então se aproximou vagarosamente da multidão, enquanto todos olhavam para ela e alguns ainda comentavam sobre a garota. Parou em frente ao caixão, que estava sobre a grama e olhou ao redor. Conseguiu identificar Heloísa, atrás de muitas pessoas, com um lenço branco enxugando seus olhos. Parecia que todos esperavam um discurso da companheira inseparável de Eduardo. Mas ela não fez isso.

Apenas tirou uma coisa que carregava em uma pequena bolsa, se ajoelhou e colocou sobre o caixão, onde ela presumiu estar o pescoço de Eduardo. Era o seu colar, o seu amuleto, que havia ficado com Mônica desde o dia da competição de surfe. Olhou para o deus representado, Kanaloa, e depois passou a mão sobre o caixão, enquanto as lágrimas caiam sem parar. Por fim, se levantou e afastou-se na direção dos seus pais, que o abraçaram, todos em lágrimas.

O caixão desceu pela sua cova, onde o surfista repousaria para sempre.

It’s been seven whole days
Without your embrace
I wanna see your face
I've got some things to say
T'was just a week ago
You said "I love you, girl"
I said "I love you more"

...

Mônica estava deitada olhando as pás do ventilador do quarto girarem sem parar, sobre a garota. Um vento frio era lançado sobre ela, que era protegida por um cobertor, enquanto uma chuva caía torrencialmente naquela madrugada.

Ainda estava na casa dos pais naqueles dias, onde fora anteriormente o seu tão amado quarto, e agora estava de volta em uma situação tão diferente. Mesmo no escuro veio a lembrança de um fatídico dia que já tinha se passado fazia anos.

Ela tinha apenas 14 anos.

– O que foi, Dudu? - Ela perguntou. - Pode falar o que quiser comigo, tô aqui.

Eduardo, com apenas 16 anos, levou as mãos à cabeça, e disse:

– Eu não sei como te falar, Mô. Eu... Fiz uma enorme cagada. Tô com um grande problema. Mas olha, os pais não podem de jeito nenhum saber disso, tá?

– Tudo bem, pode falar. - Ela disse, se aproximando.

– Mônica... - Eduardo olhou para a garota. - Eu... Vou, quer dizer... ia ser pai.

– Como? - Mônica arregalou os olhos, não conseguindo esconder sua surpresa e espanto. - Não me diz que...

– Isso mesmo que está pensando e não quer dizer. Eu engravidei minha namorada. Mas eu não podia, eu não conseguia criar uma criança. Não tô realmente pronto pra isso.

– Aham, tô entendendo. Não consigo te imaginar agora como pai...

– E até cheguei em pensar em aborto mas não queria fazer isso, mas daí percebi que era a única solução. A minha namorada, a Bia, quer dizer, ex... - Eduardo parou um instante. Mônica entendeu. Aquilo deveria estar mexendo muito com o emocional do irmão.

– Calma, só continua. - Ela falou.

– Então... Ela não queria fazer isso, era arriscado demais pra ela e disse que daria tudo certo. Mas eu disse que não daria... Nunca ia dar. Mas então aconteceu tudo e de um jeito ou de outro ela abortou.

– Eu sei... Eu não sabia disso, Edu. Não sabia que ela esperava um bebê.

– O pior é que quando aconteceu aquele acidente de carro... Eu corri, corri o máximo possível pro hospital. Mas não deu, a Bia já estava morta. E me chamaram naquele instante. Sabiam que eu era o pai daquela criança. E então aqueles médicos me mostraram a crueldade que eu ia... - Eduardo parou de falar e agora somente chorava. Mônica ofereceu o abraço dela, e o irmão aceitou, chorando copiosamente enquanto a irmã o consolava.

Naquele instante, Mônica também chorava copiosamente, mas ninguém estava lá para consolar a garota. Porque a pessoa que estaria ali para consolá-la era o motivo de seu choro.

...

Atual.

Gabriel sentou-se na cadeira ao lado de Bella, enquanto olhava a garota respirar tranquilamente, mas não disfarçava o medo que sentiam. Não era apenas medo, era pena, era saudade, era uma mistura de sensações que sentiam mas que não sabiam explicar. Ele se sentia extremamente triste com a situação em que estavam. A morte havia encurralado eles, e os mesmo, nada podiam fazer. A sensação de estar perto de Bella era incrível, era uma sensação muito boa, suave, linda... Mas ele sabia que tudo aquilo não duraria muito. A morte já tinha tentado levar Bella, mas por causa de Thomas, isso não aconteceu. Como ele poderia agradecer àquele moço pelo que fez? A voz de Bella afastou os pensamentos momentaneamente.

– Ontem, ontem mesmo de manhã... Por que isso foi acontecer com ele? Não faz sentido. - Bella falou. - E daquela forma que foi...

– Nem tudo é do jeito que nós queremos. Se existisse um jeito eu voltaria no tempo pra tirar o Maurício do carro comigo. Mas não adiantaria, ele seria pego de qualquer jeito...

– Do que está falando, Gabriel?

– O quê? Não, não é nada...

Gabriel sabia que tudo aquilo que ocorrera com Bella era parte daquilo que falara com Maurício. Ela estava destinada a morrer naquela ilha, mas sobreviveu graças a Anna, que acabou por enganar o destino. E o destino estava vindo e pegando de volta cada pessoa que ousou desafiá-lo. Lis Araújo, Wendel Mateus, Eduardo Torres e Maurício Malinowsky, e a tendência era que isso aumentasse. E o nome de Gabriel seria mais um a ser riscado do mapa. Mas Bella também seria parte integrante dessa lista, mas conseguiu escapar desse destino inevitável mais uma vez. Será que ela estava salva agora? Ninguém consegue driblar isso duas vezes... Ou será que consegue?

– Pode falar, Gabriel. Eu não me importo se tem a ver com a morte do Maurício... Isso pode até me ajudar a aceitar o que aconteceu.

A salvação de Gabriel veio pelo anúncio que o horário de visitas terminara. Mas antes que ele saísse do quarto, Bella disse:

– Me conte tudo amanhã Gabriel. Não esqueça!

Mal sabia ela que era impossível esquecer-se de tudo o que viria a acontecer. Gabriel sentiu o peso do mundo quando percebeu que deveria ser o único dos sobreviventes, a saber, do que viria pela frente. Precisava descobrir alguma maneira de achar a responsável por tudo. Anna Clara. Esse era seu nome, e tudo o que sabia dela. Então se lembrou de algo que Maurício lhe dera antes de vê-lo pela última vez.

...

Andreia saiu do hospital acompanhada de Danilo, mas se negava a olhar pra ele. Tentando chamar a atenção da ex, abriu a porta do carro surrado dele, e Andreia apenas levantou uma sobrancelha antes de entrar.

– Por que você tá sendo tão difícil?

– Eu estou normal, você que tá parecendo um bobo com tudo isso.

– Tô só tentando fazer você ficar bem.

– Entendi Danilo, entendi. Obrigado por tudo, mas... Não dá certo.

– O que? Nós dois não damos certo?

– Não. Você não dá certo. Qual é, Danilo, quando você vai colocar na sua cabeça que ficar vendo desses golpes aí não vai dar futuro nenhum? Você só vai se fuder, assim como eu sempre me ferro.

– Mas não foi você que me incentivou...

– Antes de quase virar churrasco de Andreia né? Quando ficamos diante da morte, nossa consciência surra a maioria de nossas atitudes. Isso resulta na culpa.

– Virou filósofa agora?

– Eu não faço Filosofia, faço Psicologia. Aliás, eu vou dar o fora, não aguento mais...

– Vai viver de golpes então. Você vai fazer o que?

– Danilo, você não me tire do sério! Saiba que... - O carro encostou-se à guia. - Danilo, que merda...

Ela foi interrompida por um beijo que o loiro deu, e ela deixou ser levada por aquele encontro. Ela amava Danilo de verdade, mesmo que ele fosse do jeito dele. Mas então interrompeu o beijo, surpreendendo o homem.

– Tá bom, você venceu. Só jura uma coisa: se me quiser de volta tem que parar com esses golpes e começar a trabalhar decentemente.

– Eu faço, quer dizer, eu vou tentar. - Ele sorriu. - Tudo pra ter minha Deia de volta.

– Vamos com calma né?

...

Anna estava sentada no sofá, olhando para a marca na mão, que se assemelhava a um pentagrama. A mulher estranhava completamente aquele sinal ter aparecido da noite para o dia, mas tinha certeza que havia uma relação com o que Maurício falara na carta.

Ligou a televisão, e viu que uma ruiva falava ao microfone sobre uma morte bizarra. Confirmando suas suspeitas, viu a imagem de Maurício Malinowsky aparecer. Seus pais eram alguns dos mais ricos da cidade e até do país, e aquilo abalara fortemente aquela fortuna. Anna não precisou forçar muito a mente para se lembrar do sonho e que ele também tinha sobrevivido em função da mulher, já que se lembrava do rosto dele naquela terrível visão que tivera.

– Chega. - Anna Clara disse para si mesma, desligando a televisão. Queria se livrar de toda aquela sensação estranha que a circundava desde o acidente e ficar alimentando a sensação ruim com esses acontecimentos e pensamentos era simplesmente algo abominável. Mas seu desejo não seria atendido tão facilmente. Não depois de todas as informações que recebera de Maurício. Ela não queria acreditar que aquele rastro de morte poderia lhe alcançar, já que o mesmo aconteceu com a cantora teen Lis e agora com Maurício. A morte era algo natural, não uma entidade sobrenatural. Bom, era isso o que pensava.

Até aquela noite fatídica.

Anna se dirigiu até o seu computador, e então procurou pelos nomes que Maurício citara. Não se lembrava de todos.

Lis Araújo foi facilmente achada, a cantora teen estava em todos os noticiários. Logo depois, Maurício Malinowsky também apareceu. Faltavam dois. O nome de um veio à cabeça, Eduardo, o surfista.

Pesquisou um pouco mais até achar uma notícia sobre a morte do surfista. Devorado por piranhas. Naquele instante, lembrou-se do peixinho morto de Anna Bella na noite de ano-novo, na mesma noite em que o surfista morreu. Ela se lembrou do rapaz, era aquele rapaz estiloso e super carismático... Que foi atingido pela prancha na visão. Assim como Lis e Maurício que não mereciam perecer tão cedo. Eram jovens cheios de sonhos que foram destronados pelo destino, ou como Maurício dissera, pela terrível Lady Death, ou simplesmente Morte.

Faltava apenas um, o jovem Wendel. Wendel o que? Pesquisou apenas Wendel na barra de notícias do Google, mas não esperava que aparecesse uma notícia sobre ele. O nome Wendel Mateus aparecia numa reportagem de Serena Rabelo, a mesma repórter ruiva da televisão. Quando observou a reportagem que tinha feito, percebeu que falava exatamente das estranhas mortes que aconteceram com algumas pessoas que escaparam da Ilha Vermelha.

Após ver a foto do garoto, lembrou-se de quando ele foi atropelado por um carro brutalmente na visão. Em seguida, anotou o nome de Serena. A mulher parecia saber muito mais coisa sobre o que a afligia. Enquanto anotava veio à mente o nome de uma pessoa, que Maurício citava na carta escrita por ele, e que foi entregue à Anna misteriosamente. Era um alguém, chamado Gabriel, e Maurício dizia à Anna que ela precisava cuidar dele. Mas como, se ela não fazia a menor ideia de quem era esse tal de Gabriel?

...

Valentina finalmente chegara na cidade, e dali não voltaria sem finalmente achar o que tanto procurou. Deixou sua casa na Ilha Vermelha aos cuidados de Eva que entendera a vontade súbita da garota procurar a irmã desaparecida. Afinal, a fundadora da filial brasileira da Animal Rescue, Eva Mendel, possuía um duplex muito bonito ao lado de sua casa. Valentina tinha poucas pistas, mas sabia que conseguiria achar a pessoa que procurava. E também acharia Maurício. Era isso que esperava, até passar na primeira banca que viu. Um jornal logo na sua capa, mesmo que não sendo a noticia principal, falava sobre as mortes recentes dos músicos.

Logo o violão que ele deixara para Val veio na sua cabeça. Ela não pode evitar algumas lágrimas descerem por seu rosto. Não se sentia amada daquele modo desde a morte do seu querido pai. Isso lembrou Valentina de sua missão principal e agora única. Tinha de encontrar a sua irmã perdida.

Mas não deixou de perceber os estranhos e anormais acontecimentos. A cantora Lis fora a primeira. Nada fora do normal, mortes ocorrem todos os dias. Tempo depois, Wendel morreu. Outra fatalidade, mas pura coincidência ocorrer dias depois da morte de Lis. Então ocorreu a morte de Eduardo, e já era o terceiro. Aquilo já passara da coincidência para algo mais anormal. E pra fechar, Maurício morrera. Quatro pessoas que estiveram naquele barco na fuga do vulcão tinham morrido.

Já havia se transformado em um padrão.

...

Greg entrou em sua conta no YouTube para verificar algumas coisas aleatórias, quando teve chance. Lana e Nina tinham saído para se encontrar com Vanessa, as duas últimas tentando superar perdas recentes e Lana dando o apoio total para elas. Greg passou a compará-las às Três Espiãs Demais ou às Panteras, para quem era mais hard. Desde os últimos acontecimentos, as três não se desgrudaram em nenhum momento.

Ao entrar na conta, foi surpreendido por algo incrível. Ele não podia acreditar. O vídeo que gravara já era o mais visto de todos os tempos do canal. Um sorriso passou por seu rosto até ver os comentários.

Embora o vídeo que Greg gravara sobre o acidente, depois de obviamente editá-lo tirando as piores partes que vira ao vivo, fosse o mais visto da sua conta no YouTube, alcançando esse posto em poucos dias, era também o mais negativado do seu canal. Ele colocou uma mão na frente do seu rosto enquanto olhava os comentários. Coisas que nunca passaram pela sua mente estavam escritas naquela área dedicada aos que viam seus vídeos. Uma pessoa aleatória, que Greg percebera que nunca comentou nos seus vídeos, então provavelmente não o seguia, escreveu um texto quilométrico que ele leu com enorme desinteresse, mas que por fim despertou sua atenção.

Essa pessoa dizia que ele estava se aproveitando do sofrimento alheio, e também de tudo o que acontecera para alcançar mais inscritos no seu canal, e claro, fazer ele ficar mais famosinho com tudo isso. Várias respostas a esse comentário estavam embaixo, alguns apoiando Greg, outros dando mais valor à pessoa aleatória.

– Fala sério. – Greg falou, balançando a cabeça, meio indignado, meio frustrado. Não tinha conseguido alcançar o que desejava com aquele vídeo, que não tinha como intenção conseguir mais inscritos no canal. Nem muito menos se divulgar ou aparecer. Não tinha nada a ver com isso.

Ele pensava que já estava acostumado com ação desses haters, que fazem de tudo para estragar a vida dos youtubers. Mas nunca pensara que chegaria ao ponto de ser considerado um indivíduo tão insensível, que usava o sofrimento das pessoas para se promover cada vez mais.

O pior é que não só Greg estava sendo linchado, quando percebeu que o nome de Lana também estava no meio. Naquele momento, pode ser dizer que Greg ficou realmente puto com tudo isso. Repentinamente, tirando

Greg de seus devaneios, Sidney apareceu na sua frente, comendo um pequeno pedaço de legume e ficou olhando para ele.

...

Heloísa andava placidamente pela grama de outro cemitério, só que dessa vez em uma área totalmente diferente da cidade. Ela mantinha o mesmo look do dia que fora ao enterro de Eduardo, e agora ia ao enterro de outro surfista, Murilo.

Perder dois de seus maiores surfistas foi um verdadeiro baque para a equipe, que agora estava praticamente destruída depois da trágica ida de seus dois pilares. Eduardo perdera a vida num acidente que a senhora preferia nem lembrar, tamanho o horror que sentira diante de tanta brutalidade. Não, ele nunca mereceu tal destino, mesmo sendo do jeito que ele era.

E poucos dias depois, Heloísa foi surpreendida pela morte de Murilo. Originalmente, foi informada pelo pai do rapaz, um grande investidor, que tinha sido um terrível suicídio, mas suspeitou desde o princípio. Murilo não tinha razões para se suicidar, inclusive agora com a morte do seu maior rival, Eduardo. Então, por que ele se suicidaria? Heloísa tinha suas fontes secretas e descobriu que o rapaz esteve envolvido nas mortes do patriarca e da matriarca da riquíssima família Valadares Brandão, cujo assassinato foi encoberto, por causa do incêndio. Mas ela descobrira que Murilo ajudara no assassinato. Mas como? Murilo poderia ser o cafajeste que era, mas não mataria ninguém.

Heloísa sentia que aquilo fazia parte de uma teia gigantesca de estranhos acontecimentos com ricas famílias da região. No total, já aconteceram cinco ocorridos suspeitos: a morte do Sr. e Sra. Brandão, do patriarca dos Magalhães, a morte do filho dos Malinowsky, a morte de Murilo e ainda o incidente com uma garota chamada Isabella, filha de uma outra família rica. Heloísa não acreditava que todos os acidentes estavam conectados, mas que era esquisito era.

A cerimônia ocorreu rapidamente, e Heloísa não queria ficar muito naquele ambiente fúnebre. Percebeu que a mãe de Murilo chorava copiosamente sobre o caixão, mas que o pai dele estava à certa distância, observando de cara fechada e óculos escuros. Derramava algumas lágrimas, mas não o bastante para a morte do filho. Ela sabia que ele e Murilo tinham vários problemas de convivência, e que ele sabia que alguns segredos do filho, que nem mesmo a senhora deveria saber. Mas aquele sentimento do pai a deixou assustada, e ao mesmo tempo desconfiada de que a morte de Murilo tivesse mais coisa a ser desenterrada.

...

Sentada naquele mesmo local de sempre, olhando para o computador, estava Serena. Sua casa era uma herança de família, e estava muito bem cuidada. Um cheiro de chá de hortelã pairava no ar. Seu rosto não negava que ela estava horas sem dormir, as olheiras estavam horríveis em seu belo rosto. Na tela no computador estava a foto de Maurício, que havia morrido no dia anterior.

Lis Araújo, Wendel Mateus, Eduardo Torres. Agora mais uma pessoa entrava na lista. Maurício Malinowsky, a pessoa que tanto Serena procurara agora finalmente aparecera para ela. Mesmo que não fosse numa condição considerada ideal. Ela descobrira um fato importante: Maurício morrera no mesmo Spa que ela saíra momentos antes. Para piorar, foi na mesma sala. Se ele tivesse me escutado, o ruivo estaria aqui ainda e poderia me conceder essa entrevista. Esta ironia insuportável das pessoas morrerem nas piores horas.

O que Serena descobria naqueles dias transcendia todas as entrevistas e reportagens que fazia para Kátia ou para o canal. Clarisse, sua assistente de reportagem a ajudava, ainda meio desconfiada com tudo. Ela acrescentava cada vez mais dados em sua reportagem.

Segundo as informações que Serena obtivera, as quatro mortes estavam totalmente ligadas entre si. Assim como as três primeiras, a de Maurício só serviu para aumentar ainda mais suas suspeitas. Muitos se perguntavam: como você sabia que todos estavam na ilha? Simplesmente porque estava com essas mesmas lá na Ilha, inclusive pegando o mesmo barco delas. Serena se lembrava de todas as faces, e continuaria a sua louca pesquisa, colocando mais dados na sua reportagem com um pequeno toque de sensacionalismo. Então a frase final da sua reportagem inicial veio à mente:

“Santa Muerte tem seus mistérios do passado que se escondem em um armário sob a escada, mas eles sempre se revelam no nosso presente e com certeza surgirão mais no futuro. Como será o final desse conto de terror? Só o tempo dirá.”

O tempo já está dizendo que esse conto de terror continua. E tudo indica que irá continuar... Com quem saiu da ilha.

Então Serena se assustou repentinamente. Se todos que saíram daquela ilha, naquele barco, naquele dia morriam um por um... Isso poderia indicar que ela também estava no meio desses eventos trágicos. Se estivesse marcada para morrer por alguma suposta maldição, tinha de estar pronta. Ela realmente estava intrigada com tudo que estava acontecendo, tantas mortes... A maldição seria mesmo verdadeira? Ela sentiu um arrepio desconhecido. Até que ponto a morte poderia ser tão cruel? Na verdade, desde sempre ela é cruel.

Serena desligou-se dos pensamentos e levantou-se, dirigindo-se até a cozinha para fazer um novo chá. Colocou a água no fogo, e se abaixou para pegar um pacotinho de chá no armário, quando levantou a cabeça a bateu na panela de água que estava sobre o fogo. Ela foi rápida, e a agarrou rapidamente. "Ufa" ela pensou. Pegou uma xícara e preparou o chá. A noite ia ser muito longa.

...

Algumas velas iluminavam o quarto de Andreia, que estava sentada sobre a sua cama junto de outra pessoa, Clarisse. A mesma assistente de reportagem de Serena, que por um acaso do destino, era amiga da jovem de cabelos curtos.

– Eu ainda não acredito que voltou pro Danilo. – Clarisse suspirou.

– Nem eu. Mas fazer o quê, né? Ele disse que vai mudar.

– Como você está sendo boba, Deia. Ele não vai mudar. Você mesma disse pra mim isso.

– É, mas... – Andreia deu de ombros.

– Mas se a Deusa e o Deus querem assim, que podemos fazer? Não podemos desejar nenhum mal para os outros, mesmo se for pro Danilo. Isso não é bom...

– É. Realmente...

– Você ao menos entendeu o que eu disse, Andreia? – Clarisse perguntou. – Eu sei que você acredita no que acredito, mas às vezes acho que você não está ligada como estou...

– Eu até acredito sim, a religião Wicca é algo maravilhoso, mas... Ah sei lá...

– Você não tem um Coven, por isso. – Clarisse sorriu. – E deve ser por isso que você é louca por LSD, imagino. O LSD deve te permitir ver esses seres místicos, como duendes, elfos, fadas, gnomos... Mas eles não são verdadeiros. A partir de um Coven, um grupo de bruxas Wicca, você conseguiria realmente ter contato não só com esses seres, mas como toda a nossa cultura, a nossa tradição.

– Hum... A oferta parece tentadora. Mas eu não sei sabe Clarisse...

– Sim... Bom, não posso ter forçar a fazer nada. Não vou controlar sua vida, nem te proibir de fazer suas rezas, usar seus amuletos, e tudo... Não concordo com a ideia do LSD, mas já que você insiste...

– Obrigado Clarisse. Você deve ser uma das únicas que me entende de verdade. E como vai a Serena?

– Mais louca do que nunca. Ela cismou com a Ilha Vermelha e sua civilização antiga. Que todos os sobreviventes da erupção estão marcados por algum tipo de maldição e...

– Que maldição, Clarisse? Que porra é essa?

– É que aconteceram umas mortes depois que aconteceu o incidente na Ilha Vermelha. Se não me engano, a cantora Lis era uma dessas vítimas.

– Ah sei... Eu gostava de uma ou duas músicas dela... Eu lembro que ela se apresentou no...

– Você estava lá na ilha, Andreia?

Andreia confirmou com a cabeça.

– E não tem medo de acontecer de verdade? Depois, mais duas pessoas morreram. Um deles era o Eduardo Torres, já ouviu falar dele? Certo surfista?

– O nome não me é estranho. – Andreia então formou o rosto de Eduardo na mente. – Pera... Eu sei quem era... Era aquele surfista que me viu, e eu o vi e... Tive a impressão que já tinha visto ele em algum lugar...

– Talvez você realmente conhecesse o Eduardo.

– Pode ser. Mas agora ele também morreu, né? Supostamente por causa dessa maldição...

– Vou repetir a pergunta, Deia. Não tem medo de acontecer de verdade e... Com você e com o Danilo?

– Sinceramente, eu já vi a morte de muito perto naquela ilha. Acho que a Dona Morte vai querer me deixar quieta um pouco antes de vir me pegar. Já viu que da primeira vez foi difícil, né? – Andreia abriu um sorriso amarelo.

– Não sei... Pelo que a Serena anda supondo, eu teria medo. – Clarisse olhou para o relógio. – Bem, já está na hora de ir. Aliás, já passa da meia-noite.

Alguns minutos depois, Andreia voltava ao seu quarto. Ela estava sentindo falta de alguma coisa... E não era de Danilo, que deveria estar bem longe agora.

...

Mônica se viu em um lugar totalmente branco, olhou para o chão, e viu que ele se assemelhava a nuvens, não era algo rígido. Mesmo assim, ela conseguia ficar sobre ele em pé.

Ela piscou os olhos algumas vezes, e sabia que aquilo era um sonho. Estava dormindo, não era? À sua frente, bem ao fundo, uma luz brilhante reluzia.

Sentiu um arrepio e se virou. Um grupo de pessoas a via, mas ela não conseguia identificar por quem era formado. Uma delas saiu andando na direção dela, e as outras desapareceram como névoa. A figura também parecia névoa, mas a cada passo foi tomando uma forma cada vez mais sólida, abandonando a névoa. Quando chegou perto da garota, essa pessoa sorriu.

– Dudu? - Mônica falou relativamente alto.

– Oi Mônica.

No momento seguinte, ela estava abraçada ao jovem, enquanto lágrimas desciam pelos olhos claros dela.

– Como... ?

– Isso não importa agora, Mô.

– Mas... Mas... - Mônica estava extasiada. - Você morreu e... Foi no pior momento possível.

– Eu sei... Mas não podemos controlar o destino. Ele chega e simplesmente nos pega, e nos leva pra outro mundo.

– Mas por que ser tão cruel com você, Edu? Por quê?

– Você diz que foi cruel... Eu senti a dor de verdade, até aquele momento que engoli a água, sabe? A partir daquele momento, parecia que as dores foram diminuindo, mesmo com as piranhas me atacando e de repente, não senti mais nada. Falam que quando a gente morre, nossa alma se desprende do corpo. Mas eu não vi isso, só senti... O nada.

Mônica baixou a cabeça.

– Ei, por que você tá assim?

– Como que eu vou continuar, Edu? Vai ter sempre algo faltando na minha vida...

– Mas você tem que continuar, e vai. Sei que esquecer isso vai ser impossível, mas você pode fazer a escolha de superar, dar a volta por cima. Você é forte, e todos nós sabemos disso. Até mais do que eu, diga-se de passagem.

– Eu...

– Você vai conseguir, Mônica. Eu sempre vou torcer por você, maninha.

– E sobre aquilo que sentíamos...

– Aquele sentimento vai ser superado, eu acho. Mas se você me permite...

Eduardo abaixou um pouco até ficar na altura de Mônica. Ela avançou junto com o jovem e suas bocas se encontraram num beijo gelado. Ela fechou os olhos, aproveitando o momento. Quando abriu novamente, Eduardo sumira. Olhou na direção contrária, da luz brilhante, e ele continuava a sorrir.

– Dudu, isso é real ou um sonho? - Ela perguntou.

– Você decide no que acreditar, Mô. - Ao seu lado, três figuras apareceram. Lis, Wendel e Maurício. Os quatro se viraram, e seguiram andando, até a luz brilhar tanto, que sumiram.

...

Já era 03:00 da madrugada, e Serena ainda estava pesquisando sobre o acidente. Será que aquilo era um jogo? Será que eles não deviam ter sobrevivido? Será que a morte não aceita ser desafiada? Como ela queria obter respostas para todas essas perguntas, até mesmo as que ela não sabia...

Um vento assolou o local, mas as janelas estavam fechadas. Serena decidiu não se importar com isso, o sono e o cansaço já estavam lhe consumindo. Decidiu desligar o computador e ir para a cama. Levou a xícara até a pia, tomando cuidado para não tropeçar em seus próprios pés.

Quando estava passando pelo escritório, em direção as escadas, Serena viu uma luz, era do computador, que ela jurava ter desligado. Ela se aproximou do aparelho e viu a página que dizia "Santa Muerte, o lugar sem volta". Rapidamente ela desligou-o e se afastou dali, subiu as escadas correndo, e acabou tropeçando em um dos degraus, machucou a perna e gritou.

Conseguiu levantar-se com muito esforço e se dirigiu a cama, antes de cair em um sono profundo ela jurou ter ouvido uma mulher gritar por socorro.

...

Andreia acordou estirada no chão do seu quarto, ainda meio estranha. A última coisa que lembrava foi de despedir-se de Clarisse. Olhou ao redor e viu um pouco de cera derretida no chão, provavelmente proveniente de alguma vela. Olhou para o jardim a partir da janela do seu quarto e viu um gnomo acenando para ela. Sorriu de volta, e se virou para ir ao banheiro, quando estranhou tudo aquilo.

Virou-se novamente para o jardim e não havia mais nada. Não era nenhuma criatura mitológica ou algo dos Wiccas. Era só uma boa dose de LSD mesmo.

Ao chegar ao banheiro, lavou seu rosto repetidas vezes enquanto olhava para a sua face repleta de olheiras no espelho. Seu cabelo curto estava totalmente bagunçado e ela arrumou o mesmo rapidamente.

Oh girl, this boat is sinking,
There's no sea left for me,
And how the sky gets heavy
When you are underneath it
Oh I want to sail away from here
And God
He came down down down down down down down down
And said (down down down down down down down down)
Nothing (down down down down down down down down)

Andreia correu até o seu celular, que tocava uma música qualquer, mas não chegou a tempo de atendê-lo. Quando viu, percebeu que existiam 13 ligações de Danilo.

Esse aí não me deixa em paz mesmo viu?

Ainda se sentindo meio esquisita pela ação do LSD, tentou ligar para o namorado. A chamada começou, mas foi interrompida de repente, existindo somente um barulho irritante ao fundo. Por fim, o barulho parou e o celular ficou mudo.

– Mas que merda! – Andreia gritou, jogando o celular do outro lado do quarto, chocando-se contra a beirada da cama. O celular caiu contra o chão, espalhando a capa, a bateria e ainda rachando a tela. Andreia gritou um sonoro palavrão, e começou a recolher os pedaços separados do mesmo. Então sentiu um arrepio gelado vindo da janela. Levantou-se e viu que algumas árvores balançavam pela ação de um vento que atingiu Andreia em seguida.

...

O portão azul de ferro abriu com um barulho irritante. Valentina entrou no mesmo e subiu as escadas de uma grande casa branca e azul. Algumas crianças brincavam próximas dela. Ao entrar na recepção olhou ao redor para tentar achar alguma pessoa que a atendesse. Sem sucesso, Val sentou-se em uma cadeira na sala. Logo foi atendida por uma senhora, que surgiu de uma porta lateral.

– Olá jovem. - A senhora, que aparentava ter por volta de 70 anos se apresentou. - Meu nome é Glória.

– Prazer, Valentina. - Ela deu um aperto de mão na senhora que retribuiu calorosamente.

– O que a traz aqui, Valentina?

– Eu preciso de uma informação e... Acredito que posso encontrar a resposta.

– Sim, sim. Acompanhe-me.

Valentina acompanhou Glória até uma sala arejada, com um estante de madeira repleta de livros na parede ao lado da porta. Uma janela coberta por uma persiana deixava parte do sol entrar. Ela se sentou uma das cadeiras da escrivaninha, enquanto Glória sentava na sua cadeira.

– Então Valentina, conte o que a traz aqui. Que informação necessita?

– Bem... Eu tenho uma irmã, só que ela não sabe que ela é minha irmã e eu mesmo não sei quem é. Meu pai me deixou a missão de descobrir quem era antes de falecer...

– Pode continuar, minha querida.

– Bom... Ele, com suas buscas, descobrira parte dos locais por onde ela passou. Até chegar nesse endereço... O abrigo. Mas ele nunca chegou a vir aqui. Eu tenho que completar essa missão, tenho que achar quem é essa minha irmã. – Então, ela passou por aqui, segundo o que descobriu, certo?

– Aham.

– Mas tem algum dado que possa ajudar a localizá-la?

– Eu tenho a data de nascimento aqui. - Valentina entregou para Glória um pequeno papel, contendo as informações que a senhora necessitava.

– Hummm... – Glória olhou o papel, e depois disse. - Três de dezembro de 1992. Bom, eu posso procurar aqui nos arquivos para ver esse acho alguma informação ou dado sobre alguém nascido nesse dia. Poderia esperar aqui, por gentileza? - A senhora sorriu e se dirigiu a uma porta atrás de sua cadeira, e entrou num cômodo.

Enquanto Glória procurava os dados, Valentina sabia que sua busca estava prestes a ter um fim com a resposta da senhora. Os arquivos estavam prestes a ser revelados.

E ela finalmente teria a resposta para o que sempre buscara. A sua irmã perdida estava a um passo de Val. Somente um passo.

...

Anna Clara preparava o almoço para ela e sua filha. Shinji havia saído a trabalho e também buscaria o carro da família em uma oficina qualquer. Então, a campainha tocou e ao atender, um jovem com feições juvenis surgiu diante de seus olhos.

– Anna Clara del Sol?

– Sim, sou eu mesma. Quem é você?

– Preciso conversar com a senhora, e desculpe, meu nome é Gabriel. Gabriel Luz.

Gabriel... Então a mente de Anna deu um salto até o dia em que tivera a visão. Vira vagamente no meio da multidão e depois no barco um jovem com um rosto de criança. A face dele combinava com a de Gabriel. Era ele. Repentinamente, a carta de Maurício reapareceu em seus pensamentos.

"Cuide do Gabriel por mim."

– Eu lembro de você... Mas como me encontrou?

– O Maurício, ele parecia ter planejado tudo para que eu te encontrasse... Talvez ele já soubesse o que ia acontecer.

Anna iria continuar a conversa, mesmo com um pé atrás quando sentiu uma forte dor na palma da mão. Olhou e viu que a estranha estrela estava vermelha. E começou a sangrar. Ela gritou de dor, Gabriel rapidamente entrou em ação, ver sangue já não o deixa enjoado. Colocou as mãos nas costas de Anna, e começou a caminhar com ela em direção à cozinha. O sangue respingava na cerâmica rosa bebê. Repentinamente o ventilador da sala começou a funcionar sobre eles, espalhando um vento frio que provocou um arrepio em ambos. As gotas de sangue continuavam a tocar o chão. Naquele mesmo instante, o aparelho de som começou a funcionar e tocou uma música no volume máximo. Anna Bella gritou de susto no mesmo momento. Gabriel sentiu um calafrio, e um medo do desconhecido. Ou melhor, da morte.

I close my eyes
Only for a moment
And the moment's gone
All my dreams
Pass before my eyes, in curiosity
Dust in the wind
All we are is dust in the wind

...

Naquele fim de manhã claro, o sol forte estava incomodando a todos. Andreia também sofria desse calor, presa dentro daquele inferno de oficina. Havia retornado com Danilo, e parecia que o sofrimento havia retornado também. Ela estava sentada num banquinho, próxima ao banheiro. Um ventilador girava sobre um pedestal de plástico, mas não esfriava o clima quente daquela verdadeira estufa.

Danilo estava entretido no conserto de um carro que estava sobre uma área de metal, que estava levantada. Pouco à frente, uma rampa descia até a parte de trás, onde o carro era manobrado para a saída da oficina. Ele saiu de baixo do carro e desceu a rampa.

– Falta muito ainda, Danilo?

– Não muito, só...

– Eu estou hiperventilando aqui nesse inferno Danilo!

– Calma gatinha, calma. Eu não trouxe você pra cá de propósito.

– Tá querendo transar comigo no meio da oficina Danilo? Poupe-me.

Vai se foder viu! Continua o mesmo cafajeste de sempre.

– Já falei pra se acalmar e... Olha, vou atender o japa ali e já volto.

– Tá bom, vai logo.

Onde eu tava com a cabeça, deuses?

Andreia se levantou, dirigindo-se novamente ao banheiro, e lavou o rosto repetidas vezes, tentando se livrar de todo aquele maldito suor que insistia em sair e cair sobre seus olhos. Olhou ao redor e viu que o local estava totalmente empoeirado. Suspirou, e saiu do banheiro. Danilo voltava, estampando um sorriso no rosto.

– O que...?

– Olha só. – Danilo estampou diante dela algumas notas de 50 e 100. – Consegui um dinheirinho, e dessa vez honesto.

– Já era hora né? – Andreia falou, sorrindo verdadeiramente depois de dias.

– Vou terminar umas coisas ali e já vamos tá? – Ele disse. Andreia se apoiou na mesa de trabalho, que ficava ao lado da área onde Danilo consertava o carro. Passou por cima do cabo do ventilador, conectado na tomada. Ele estava na parte de trás do automóvel, e ao se virar, Andreia acabou derrubando uma bola de titânio, que saiu rolando sem nenhum dos dois ver. Ela se dirigiu mais próximo do ventilador e aumentou sua potência ao máximo, já que o clima ficava cada vez mais quente.

Repentinamente, o seu celular começou a tocar a mesma música que tocara mais cedo.

He never got up, he never got up

We live on the cusp of death thinkin' that it won't be us

It won't be us, it won't be us, it won't be us

Nah, it won't be us

– Deia, faz esse negócio parar de tocar, por favor! – Danilo gritou. Andreia andou na direção do mesmo, mas a sua tela não ligava.

Oh girl, this boat is sinking,
There's no sea left for me,
And how the sky gets heavy
When you are underneath it
Oh I want to sail away from here
And God
He came down down down down down down down down
And said (down down down down down down down down)
Nothing (down down down down down down down down)

A música parou num baque. E então outra tomou o seu lugar. A mulher de cabelos curtos sentiu um arrepio passar por todo o seu corpo ao ouvir a letra.

I close my eyes
Only for a moment
And the moment's gone
All my dreams
Pass before my eyes, in curiosity
Dust in the wind
All we are is dust in the wind

A bola de titânio continuava a rolar, até atingir a alavanca que levantava a área de metal onde o carro estava. O material já velho só ajudou a tudo acontecer. Antes que alguém pudesse ver qualquer coisa, o carro caiu numa velocidade impressionante e embalado pela velocidade desceu num ritmo fulminante por cima de Danilo, até chocar-se contra a parede. Danilo, que estava no caminho, foi brutalmente destroçado pela queda e descida do carro, e seus órgãos foram espalhados por todas as direções, enquanto o resto do seu corpo foi esmagado entre o fundo do carro e a parede. Com o choque uma grande massa de sangue espalhou-se pela parede.

Andreia gritou o máximo que pode, enquanto sentiu poeira cair sobre seus olhos, proveniente do choque. O choque foi tamanho que parte da estrutura acima dela ameaçava cair.

Desorientada, Andreia bateu na mesa de trabalho, enquanto alguns itens caíam sobre o chão, inclusive uma lata de óleo cheia. Ela esfregou os olhos, e então, Andreia gritou enquanto via um cenário de terror se desenrolar diante dos seus olhos. Repentinamente ela caiu no chão, ofegante.

Viu que o braço estava totalmente sujo de óleo, e então tentou levantar-se, segurando-se em uma mesa de trabalho, porém essa tinha rodas. Alguma poeira ainda caía do teto, e Andreia estava ainda sobre a poça de óleo. Suas roupas já estavam totalmente pretas por conta daquele líquido viscoso.

Ao tentar se segurar, a mesa deslizou, derrubando algumas ferramentas contra o rosto de Andreia, que colocou os braços na frente para proteger seu rosto. As ferramentas caíram todas sobre seus braços, machucando-os, fazendo muito sangue cair dos ferimentos. Ela tirou a mão da frente, e gritou de dor. Viu que a mesa ainda estava ali e tentou novamente, mas a mesa não ajudou. Ela deslizou mais um pouco para frente, até se chocar contra o pedestal de plástico onde o ventilador girava loucamente. Foi inevitável o que iria acontecer, mas foi tão rápido que Andreia não teve tempo de perceber.

O ventilador desabou ainda funcionando, sobre o rosto da garota e no choque, a proteção se quebrou sobre o rosto dela. Ainda na velocidade máxima, o velho ventilador continuou a girar com as suas lâminas. Andreia não conseguiu nem gritar direito, até ter sangue espalhada por toda a sua boca. O primeiro atingido foi o nariz, que logo se transformou em uma massa sangrenta e disforme. Logo o rosto inteiro da Andreia foi dilacerado pelas lâminas incansáveis do ventilador, misturando à pele, à cartilagem e a sua carne. Andreia sentiu uma dor terrível tomar conta de si e logo expirou enquanto o terror acontecia.

Pedaços de pele e carne voavam para todos os lados, como se fossem poeira retirada pelo ventilador que continuou a girar, até não existir mais nada para ser retirado daquele rosto. Apenas os ossos expostos, misturados com sangue e toda a carne, tornando aquilo irreconhecível.

A música ainda tocava.

Dust in the wind
All we are is dust in the wind

Repentinamente, algo que Andreia não tinha visto antes, desabou do teto em uma velocidade fulminante sobre o corpo da garota. Um grande ventilador de teto caiu e esmagou boa parte do corpo da jovem, tendo o centro do impacto no seu tórax. Como se fosse uma bolha de sangue, o líquido rubro voou para todas as direções possíveis, completando o cenário de desolação e horror que se desenvolvera naquela oficina.

...

Ela havia pensado muito a respeito do que faria, após aquele sonho na madrugada anterior. Ela queria ser uma mulher nova, abandonar aquele passado recente que a atingira em cheio, feito um trem em movimento.

Não seria fácil para Mônica vencer esse passado, mas ela estava pronta. Pronta para enfrentar o futuro, e o que ele reservava. Mas ela seria forte, e conseguiria. Aquele momento com Eduardo, mesmo que fosse apenas uma ilusão criada pela garota a deixou fortalecida.

Porque eu sei que é amor
Eu não peço nada em troca
Porque eu sei que é amor
Eu não peço nenhuma prova

Mesmo que você não esteja aqui
O amor está aqui agora
Mesmo que você tenha que partir
O amor não há de ir embora

Mônica se olhou no espelho do salão no fim do corte. Sorriu. Seus longos cabelos agora estavam bem mais reduzidos. Aqueles lindos fios, ela já decidira, doaria para pacientes com câncer.

Parecia extremamente clichê, mas era esse o modo que ela achara de superar totalmente aquele passado recente. Aquilo simbolizava um recomeço na sua vida, e também um amadurecimento daquela moça. O amor que nutrira por Eduardo nunca ia acabar, e ela sabia que em algum lugar, ele estaria olhando por ela, guiando sua irmã.

Eu sei que é pra sempre
Enquanto durar
Eu peço somente
O que eu puder dar

Eu sei que é pra sempre
Enquanto durar
Eu peço somente
O que eu puder dar


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Notas finais do capítulo

Espero que tenham gostado e comentem. As reviews são muito importantes para a continuidade do projeto.



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