Eu queria ter um minuto em sem ser vigiada por Leo. Ele não acha que as pessoas que ele encara se sentem constrangidas? Acho que essa ideia não passa pela cabeça dele. Lúcia e eu temos dado duro esses dias para termos uma candidatura pelo menos adequada, porque comparada as outras chapas, nós somos uma bosta. Eu até estava mais animada indo para o colégio, menos por conta de Catarina, ela tem feito minha vida uma porcaria. Como? Essa semana, na aula de artes, ela derramou "sem querer" um pote de tinta lilás no meu cabelo. Ainda bem que era tinta guache.

Eu estava indo para casa, estava toda quebrada por conta dos 100 cartazes que fiz hoje com Lúcia. Do outro lado da rua, Leo, me seguindo sorrindo. Ele tem estado mais sorridente, o que me agradava. Não desisto de ver aquele brilho nos olhos novamente e o apelido "Lisa" saindo da boca dele. Sorri ao percebê-lo me seguindo. Olhei para os dois lados e pisei na calçada que ele estava. Os cabelos dele estavam bagunçados, e aqueles olhos azuis me encantavam cada vez mais que eu os via, sendo grosso, sendo gentil... Mas tem uma coisa que odeio nele, que estava fazendo frequentemente: me olhando sorrindo. Eu fico muito sem jeito!

—Err... Sabe esse seu colar que tem um cadarço?— perguntou ele

—O que tem ele?

—Eu tenho um igual, olha...

Ele me mostrou a "aliança" dele. Meu Deus! Eu fiquei com uma vontade tão grande de chorar, que tive que olhar pro céu para controlar os olhos marejados. Uma chuva ameaçava vir, e o clima combinou perfeitamente com o momento. Eu retirei o meu cordão de debaixo da blusa e mostrei para ele sorrindo. O sorriso de Leo desapareceu. Ele tirou o meu colar e colocou o laço no meu dedo. Senti meu rosto quente, logo Leo pegou a "aliança" dele pôs no próprio dedo. Nos olhamos por um tempo, e percebi que Leo estava muito vermelho. Ele pegou minha mão e entrelaçou o dedo dele com o meu, como fizemos à seis anos atrás.

—Li...

Ele foi cortado com a chuva, que caiu muito rápido e com muita força, até que percebemos que era granizo. Estávamos tão próximos um do outro que eu pensava que... Nada. Viagem da minha cabeça. Corremos para um lugar coberto. Rimos feito bobos e nos olhamos de novo. Ele ia mesmo falar Lisa? Ele... Está se "lembrando" de mim? Mas o que aconteceu com Leo afinal? Eu abaixei a cabeça e sorri. Ele colocou uma mecha do meu cabelo por traz da orelha, até apertar os olhos com força. Leo quase caia, quase não... Ele caiu. Bati no rosto dele, procurando uma resposta, mas o garoto estava desmaiado. Tirei o celular da mochila e liguei para o hospital.

—A-alô? Pode mandar uma ambulância aqui para a Rua 15? Sim é com urgência.

O que está acontecendo aqui afinal?!

Mexi na mochila dele e achei o número do pai dele. Liguei para ele, meio aflita. Lembro-me quando ele me apresentou os pais dele, Leo me disse que eles estavam em crise na época que o conheci, e que tinha medo de divórcios. Não tinha o número da mãe dele na agenda, então provavelmente se divorciaram, coitado do Leo. O celular do pai do garoto chamava...

—Alô? Aqui é a amiga do Leo... Ele desmaiou e eu o levei para o hospital... O senhor pode vir aqui vê-lo?— atendi

—Estou indo agora.

Eu estava preocupada... O que aconteceu com Leo depois que eu fui embora? Seus pais se divorciaram? Achei uma garrafa de Black e White dentro da mochila dele. Leo anda bebendo?! Empurrei a mochila dele para longe, não devia estar mexendo em algo que não é meu, mas mesmo assim... Leo está bebendo. Minha curiosidade foi maior e vi várias latinhas de cerveja. Achei uma fotografia dele, tinha os pais e ele no meio, bem pequeno, acho que na idade em que o conheci. Até que eu virei e vi o pai de Leo atrás de mim. Ele tinha um cabelo crespo, olhos castanhos sérios e tinha um paletó. Olhei para a foto e depois olhei para o pai de Leo.

—O que aconteceu com vocês...?— perguntei

—Eu me lembro de você. É aquela garotinha que Leo tanto falava quando tinha dez anos.

—Sim... Sou eu.— murmurei

—Depois que você foi embora, dois meses depois eu e a mãe de Leo nos separamos. Na época, eu estava muito... Desorientado, com raiva e louco, bati o carro com Leo dentro, fazendo-o bater a cabeça, perdendo suas memórias mais recentes, inclusive você.

Minha cabeça começou a doer. Era por isso que ele não se lembrava de mim, quando as lembranças ameaçavam a voltar, sua cabeça ficava doendo. Por isso... Tudo fazia sentido agora. Não queria pressioná-lo a saber quem eu sou, ou o que nós passamos... Para piorar meu humor, Catarina chega no hospital fazendo o maior chilique. Peguei um lápis e um papel e escrevi: "Leo, nos veremos em breve.". Não sabia mais o que botar, mas apenas quis avisar que estou aqui se ele precisar de mim. A enfermeira falou com Catarina dizendo:

—A senhorita é namorada de Leonardo Borges?

—Sou. Mas ele não sabe ainda.— respondeu entre piscadelas Catarina

—Me acompanhe por favor.

Eu as segui discretamente e espiei a enfermeira e Catarina entrando na sala por uma janela vidraça, a enfermeira deixou os dois "sozinhos" (eu estava lá), vi Catarina se jogando nos braços de Leo, que ainda estava na maca, frágil. Ela deu um beijo nele... Aquilo foi o suficiente para mim. Deixei o hospital, mas as ideias, as lembranças não deixavam minha mente.

Deitei na minha cama, ainda um pouco tonta por tanta informação assim na minha cabeça. Leo... Será que ainda vou tê-lo novamente? Minha "aliança" de cadarço pesava no meu peito, com as lembranças, no qual eu nunca vou esquecer. Meus pais chegaram pelas 19:00 e me encheram de perguntas como "Como foi seu dia?", ou "Assistiu o filme que passou hoje na TNT?". Não, eu apenas queria meu querido amigo, Aurélio, para me explicar o que era amor...