A Garota Problema escrita por Brê Milk


Capítulo 39
My Blood


Notas iniciais do capítulo

Oi pessoas! Então, como quero encurtar essas notas quero só agradecer todos vocês por tudo e dizer que líbero mais spoilers semana que vem no grupo ok?

BOA LEITURA



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O som das notas de guitarra zumbiam em meu ouvido enquanto escutava Simple Plan nos fones de ouvido. THE Rest of Us realmente era uma boa música, inclusive foi ela quem me acompanhou esses três anos enquanto tentava me sentir mais aceita no mundo. Abro um sorriso com os olhos fechados e continuo cantarolando a letra bem baixinho, revivendo tudo que já presenciei. Parece que a nostalgia bateu não? Solto um suspiro e assim que ouço a última palavra cantada abro os olhos fitando o teto.
Como previsto, já havíamos voltado da fazenda desde ontem a noite. As coisas estavam estranhas e boas ao mesmo tempo.
Eu sei, confuso mas deixem - me explicar o por que: a) Desde do ocorrido lá na fazenda com Melissa as coisas melhoraram em relação a ela e a mim, podemos até dizer que nunca fomos inimigas.
B) Por isso mesmo, por ter me tornado amiga dela Bler e Laura parecem estar cada vez mais enciumadas e com um pé atrás quanto isso.

– Ela é a Melissa. MELISSA, Juli, não vai me dizer que acredita no que ela te falou né? - foram as palavras de Laura. Me custou muito fazer ela e Bler mudarem de opinião, mas consegui. Não totalmente, mas já é um começo.

C) Marcelo tem andado muito estranho. Tem estado distante cada vez mais, quase não o encontro mais aqui no internato. Tanto ele como Vicente estão me deixando louca com isso, parece que os dois deram para se afastarem e isso me faz cada vez ficar mais mal.

Respiro fundo levantando e calço meus tênis ao lado da cama. Amarro os cadarços e me levanto em direção a porta pegando meu celular. Quando giro a maçaneta e abro a porta, dou de cara com Francisco com a mão levantada pronto para tocar na porta. Solto uma risada e me escoro no batente, cruzando os braços e esperando o que o pirralho tem a dizer.

– O que foi?

– Mandaram eu vim te avisar que tem alguém esperando por você na sala de aula do quinto ano - encolhe os ombros e sai correndo sem deixar eu falar nada.

– Obrigada pirralho, e vê se vai estudar - grito na direção para onde ele foi e abano a cabeça.

Quem será que está me esperando? Acho que ninguém viria me visitar, e olha que as possibilidades são poucas mesmo. Coloco a mão na testa com preguiça de ter que subir as escadas até a sala da pirralhada e minha barriga dá sinal de vida.
Ótimo, agora vou ter que adiar meu lanchinho... Caminho em direção aonde Francisco me disse para ir e depois de subir as malditas escadas chego no corredor da sala e vejo que está vazia, exceto pela silhueta de alguém ali dentro. Franzo a testa e decido abrir a porta.
Me surpreendo quando a mulher se vira e eu vejo Fátima ali. Seu rosto estava mais pálido, ela estava mais magra e abaixo de seus olhos existiam bolsas roxas, olheiras. Seu cabelo estava preso em um rabo de cavalo frouxo e ela usava uma calça jeans com um grande casaco, nunca havia visto Fátima vestida desse jeito e ao mesmo que ela me parecia mais jovial parecia cansada também.

– Juli - diz abrindo os braços e vem em minha direção, me envolvendo em um abraço apertado.

– Fátima - balbucio de repente entorpecida por pensar o que a levou vim até aqui. - Por que está aqui? Meu pai, meu pai está bem?

Sinto um grande bolo se formar em minha garganta e luto contra as lágrimas. Meu coração acelera com a possibilidade de uma piora no estado clínico do meu pai. Ele tem que estar bem, ele tem que estar bem.

– Calma querida, seu pai está bem - suspiro aliviada e sinto ela acariciar meua cabelos ainda abraçada a mim - Só vim porque tenho que conversar com você querida.

– Tudo bem. - nos soltamos e ela me leva para sentar em uma cadeira a frente da dela.

– Esses últimos dias têm sido difíceis, eu sei. Mas vim aqui para lhe dizer que o estado de seu pai melhorou, ele não corre mais risco Juli - vejo as lágrimas de felicidade transbordarem dos olhos de Fátima e um sorriso estonteante toma conta de mim. Ele estava bem, meu pai iria voltar para mim.

– Oh meu deus, eu não acredito! Isso é... Isso é demais Fátima, eu - seu dedo indicador levantado me fez parar de falar e olhar para ela com o sorriso desmanchando.

– Ele está bem Juli, mas... - sua perna balançando sem parar e sua mão passando pelos cabelos insistentemente me mostrou que algo estava errado - Mas seu pai precisa de cuidados especificados por conta de batida muito forte que levou, o que recorre a uma cirurgia querida. Mas como infelizmente aqui no Brasil não tem os devidos médicos, Santiago será levado para o Canadá e eu irei junto.

Meu coração se aperta e eu assinto limpando o rosto pelas lágrimas que nem tinha visto que caíram. Eu entendia o que Fátima estava querendo dizer, tinha entendido o recado. Eu precisava decidir, e essa decisão já tinha tomado a algum tempo atrás. Era a saúde e a vida da última pessoa que me resta em jogo, eu não poderia intervir por querer que meu pai ficasse comigo. Ele precisava ir... De novo.

– Entendo - abro um mínimo sorriso e Fátima respira aliviada. - Mas posso lhe pedir algo Fátima?

– Diga - seu tom receoso me fez perceber que talvez a secretária do meu pai já soubesse o que eu tinha em mente.

É Juli, ora de crescer e deixar o coração de lado.

(...)

( Leiam ouvindo My BLOOD - Ellie Goulding )

Não entendia nada do que o professor de física explicava lá na frente da sala. Meus pensamentos sempre voltavam para a séria conversa que tive com Fátima hoje de manhã. Eu já havia tomado a minha decisão, e por mais que me arrependa dela é a certa. Aliás, Fátima já havia voltado para o hospital e parece que amanha ela voltaria para o Canadá para acompanha meu pai. Ele iria ser transferido para lá, só espero que ocorra tudo bem. E também eu não insisti em ir vê - lo antes da transferência de país, eu sabia que brevemente iria revê - lo, eu só... Estou meio perturbada com o rumo que a minha vida está seguindo.

De repente uma sombra se projeta a frente da minha cadeira e se abaixa. Olho para a pessoa e sinto meu coração se despedaçar em milhares de pedaços quando os meus olhos alcançam a figura de Vicente, me lembro de hoje de manhã. Molho os lábios com a língua e assim que percebo que sua caneta havia caído ao meu lado e que eu estava com o pé em cima trato de levantar o pé. Ele estica a mão e pega a caneta, se levantando e antes de se virar e voltar para sua carreira, me olha sem demonstrar nenhuma expressão. Desvio os olhos e encaro nervosa o quadro repleto de exercícios a minha frente.
Droga, Vicente! Porque fui me apaixonar por você?
Vasculho a sala com os olhos e fito Marcelo. Quando seus olhos azuis param em mim abro um sorriso, mas o desmancho assim que vejo a mesma expressão fria no rosto do meu amigo.
Sinto um aperto, não uma dor no coração e respiro fundo em busca do ar. Minhas mãos começam a suar e me deixo levar em um devaneio. Vicente, Marcelo e Isabela. Vicente, Marcelo e eu.
Um eu amo como o amor da minha vida, outro como o meu melhor amigo, mas ambos agora me desprezam. O que foi que eu fiz?

Me sinto tonta e minha cabeça trabalha a mil por horas. Eu havia MD tornado uma Isabela na vida deles, como Melissa me dissera. As lágrimas queimam em meus olhos e consigo ouvir meu coração martelando em meus ouvidos. Parece que tudo passa rápido por mim, as vozes, as pessoas ao meu redor, o som do relógio de ponteiros em cima da parede... Uma infinidade se tempo e lembranças que me atormentam.

– NÃO! - grito ofegante olhando para o chão a baixo e sinto minha respiração ofegante. Percebo que o professor parou de falar e que todos me olham.

– Está bem Juli? - ouço o professor e alguns cochichos. Respiro fundo e levanto a cabeça, ainda tonta.

– Sim... - pauso e respiro mais uma vez. Sinto o olhar de preocupações dos meus amigos cravados em mim - Posso ir lavar o rosto?

– Claro. - o professor assente e eu seguro na mesa, me levantando e tentando não cair.

Me apresso em sair da sala e já no corredor vazio me apoio em uma parede tentando não perder o equilíbrio do corpo e cair no chão de tão tonta. O que aconteceu comigo? De repente todas as acusações da minha vida, todos os erros, todas as lembranças, todos os sorriso, todas as lágrimas me atingiram e agora me sinto perdida. Vazia, incompleta e sem sentido.
Mas há algo mais, algo que eu já não sentia faz tempo. Aquela velha sensação de ódio por mim mesma, de raiva por ser quem sou. Me arrasto até o dormitório e entro no quarto. As lágrimas já transbordavam dos meus olhos e de repente eu já estava em frente ao grande espelho, vendo meu rosto manchado não só pelas famosas lágrimas mas também pelo rímel e lápis de olho borrado.
"Olhe só para você Júlia, uma derrotada fracassada. Uma nova apaixonada e renegada por todas. Até seus amigos lhe abandonaram. Você não merece ser feliz, você matou sua mãe, fez seu pai ser infeliz por todos estes anos e agora se transformou no fantasma do passado se Marcelo e Vicente. Você é desprezível garota".

Esses pensamentos não cessavam bem por um instante em minha cabeça. Eu já nem sabia se estava em sã consciência. Só sei que quando me dei conta já estava tirando o cabelo do pescoço e vendo pelo espelho a enorme cicatriz em meu pescoço. E isso só me fez ter mais vontade de me machucar.
Então foi o que fiz, procurei pelo armário do banheiro alguma coisa que pudesse me ferir e rapidamente encontrei uma gilete. A peguei com as mãos trêmulas e com uma voz baixinha ao fundo da minha cabeça me pedindo para não fazer isso. Mas não importava, eu tinha que aliviar essa dor que rasgava meu peito de alguma forma, aliás eu já estava acostumada a fazer aquilo não? Não fui eu que passei quinze anos me mutilando escondida?
Levei a gilete ao meu pulso e passei o objeto cortante pela minha pele. Rapidamente os raios de sangue foram esvaindo e rapidamente eu já me cortava por todo canto do braço. As lembranças dos anos anteriores eram nítidas, as coisas que tive que fazer, os meus sentimentos confusos em relação a tudo, minha mania de ser um empecilho, a maldição de sempre estar feliz e logo após voltar as lágrimas novamente...
Sentia a dor latejante em mim, sentia meu rosto transbordando em lágrimas e até mesmo podia ver as gotas de sangue pingando no piso branco junto com as lágrimas transparentes. De uma hora para outra eu tinha perdido pessoas, sonhos, amores, amor... Eu era e sou uma garota vazia.
Ao levantar os olhos para o espelho vejo o trapo que estava e a cena em que me encontrava. Me machucando fisicamente, me destruindo e me esvaindo em sangue. Mas foi naquele momento, em que já estava perdendo os sentidos que desejei que as escolhas que havia tomado tivessem sido diferentes, que alguém pudesse me salvar do que eu estava sendo.
Antes de soltar a gilete olhei uma última vez para o espelho e vi o que estava a minha frente, enxerguei a verdade. Eu era pior do que pensava.
E depois, tudo se apagou e Fechei meus olhos caindo em um sono profundo, no qual nunca mais queria acordar...

***

Ao abrir os olhos sinto algo apertar meu pulso e um cheiro de detergente invadir minhas narinas. Ao piscar e recobrar os sentidos, percebo que estou na enfermaria do internato, com uma faixa em torno do meu pulso ferido e com dois travesseiros me incomodando drasticamente. Respiro fundo e tento entender quem poderia ter me trago para cá, eu havia trancado a porta, não havia?

– Vejo que acordou Julia - uma mulher com roupa de enfermeira entra na sala com um grande sorriso. Assinto com a cabeça.

Ela caminha até a mim, olha para o aparelho ao lado e retira o soro que eu tomava. Quando acaba pousa as mãos sobre a cama e continua me encarando com aquele sorriso acolhedor.

– Pode me dizer quem me trouxe? - pergunto com a voz diferente, rouca e falha.

– Um rapaz daqui do colégio te trouxe nos braços desesperado. Ele parecia preocupado, mas não quis me dizer quem era e infelizmente eu não me lembro quem ele é - a enfermeira responde e eu assinto em silêncio.

– Já posso ir?

– Sim, sim querida. Venha - ela me ajuda a levantar tomando cuidado com meu braço e logo me leva até a porta. - Só não... O faça mais querida - aperta minha mão e eu lhe dou um sorriso agradecido.

Saio da enfermaria e caminho devagar entre os corredores. Olho para meu pulso enfaixado e faço careta, certamente se chegar assim no quarto as meninas e Pablo notarão algo errado. Certo, abaixo a manga da blusa e agradeço por ter optado por uma blusa de frio. Pronto, agora ninguém irá perceber.
Passo pelos alunos e sigo direto para os dormitórios, mas ao chegar nas escadas que levam até lá vejo o pessoal descendo as escadas conversando.

– Ei Juli - ouço Gustavo e paro de andar, me encostando ao corrimão da escada - Vem com a gente?

– Para onde? - arqueio as sobrancelhas e sinto a droga do pulso latejar.

– Para o Daris Parq. - Laura responde cantarolando de mãos dadas com Tomás e eu olho os dois com a boca aberta. Eles riem.

– Depois vamos conversar sobre isso - estreito os olhos na direção do casal - E vocês podem me dizer que diabos é isso?

– É um parque de diversões - responde Bler e eu assinto.

– Vem com a gente? - André pergunta.
Certo, eles estavam querendo que eu fosse com eles me divertir quando a horas atrás eu estava me mutilando dentro de um banheiro parecendo uma depressiva pronta para morrer.

– Eu não sei... - olho disfarçadamente para meu braço e ouço alguém bufando. Levanto os olhos e vejo que foi Vicente.

– Só se vocês não vomitarem na montanha russa e me fazerem passar vergonha - abri um sorriso debochado e todos riem.

– Ahah vamos ver quem vai vomitar - diz Gustavo com um ar de soberania. Reviro os olhos e todos riem.

– Ok, mas antes tenho que ir me trocar rapidinho - e tirar o cheiro da enfermaria também.

– Ta. Mas vai rápido se não a gente te deixa - faço careta ao ouvir o comentário de Bler.

Subo as escadas correndo passando por eles que riem e vou em direção ao quarto. Depois quando chego abro a porta e vou em direção ao closet. Pego uma calça preta de couro, uma blusa de mangas curtas com uma caveira fumando na frente, opto também por uma jaqueta de couro preta pois pode fazer frio e arrasto meus converses de baixo da cama. Pego uma toalha e vou em direção ao banheiro, me enfiando de baixo da água morna. Lavo o cabelo e depois de estar sem aquele cheiro de detergente e ter relaxado um pouco, termino o banho com muito cuidado para não molhar a faixa no meu braço.
Saio e me enxugo, começando a vestir as roupas. Depois quando acabo saio e volto para o quarto, parando diante do grande espelho de corpo todo. Passo a toalha no cabelo o secando e encaro minha imagem. Tinha escolhido uma bela combinação.
Pego a escova na mesinha ao lado e começo a desembaraçar meu cabelo. Depois dele estar penteado o bagunço e pego a maleta de maquiagem. Passo rímel, muito lápis de olho, sombra cinza e um batom nude. Depois volto a me encarar no espelho e percebo que nem pareço a Garota de umas horas atrás.
Solto um longo suspiro e guardo tudo em seu devido canto. Calço os tênis e agarro na jaqueta, a levando em minha mão. Abro a porta do quarto e a fecho, ao me virar dou de cara com Melissa saindo do quarto dela ao lado. Será qua alguém a tinha convidado.

– Melissa - a morena se vira e por sua roupa casual vejo que não. Hoje era fim de semana, ela não iria sair?

– Oi Juli - ela sorri e para na minha frente me olhando da cabeça aos pés - Uau, ta linda.

– Obrigada - forço um sorriso - Quer vim comigo e com o pessoal para um parque de diversões?

– Ahh, acho que ninguém vai me querer lá.

– Deixa disso, eles uma hora vão ver que você não é o que eles pensam - Melissa sorrir e segura em minhas mãos.

– Tudo bem. Mas eu não quero ir mesmo, não estou me sentindo bem - ela responde e eu franzo a testa.

– Tá passando mal? Quer que eu te leve a enfermaria...

– Não precisa, só uma dor de cabeça - sorri - Mas pode ir, lá se divirta por mim... Que isso no seu braço? - sigo seu olhar e vejo a faixa. Droga, eu tinha esquecido.

– É só... Só uma dorzinha, aí resolvi enfaixar - abro um sorriso amarelo e Melissa me olha desconfiada.

– Ta bom - solta minhas mãos e beija minha bochecha - Agora vai lá e se divirta.

– Pode deixar. - ela acena e sai andando em direção oposta.

Suspiro, essa foi por pouco. Tanto Melissa tanto os outros iriam ficar decepcionados se soubessem que me mutilo. Chega de decepcionar as pessoas Juli. Visto a jaqueta e pronto, agora a faixa não está visível. Respiro fundo jogando o cabelo para trás e caminho em direção as escadas rapidamente. Ao chegar no topo das escadas vejo todos lá embaixo me esperando e assim que o som dos meus passos ecoam todos se viram me encarando e rapidamente sorrisos surgem.

– Uau, caprichou Hein - ouço Tomás falando e logo Laura cruza os braços, o que me faz rir. - Mas claro, minha Laura é a mais linda.

Todos rimos.

– Caraca Juli, ficou gata Hein amorzão - diz Gustavo assobiando e passando seu braço por cima dos meus ombros assim que término de descer as escadas.

– Da para a gente ir logo? - olho para Vicente que tinha uma carranca formada no rosto e reviro os olhos.

O povo concorda e lá fomos nós saindo do internato e indo em direção ao tal Parque. Fomos no carro de Vicente ( como sempre ) e no caminho todo tentei me alegrar e rir sempre que Gustavo falava alguma asneira, ou quando Tomás e Laura ficavam de melação, mas sem sucesso. Minha mente voltava sempre para hoje de manhã, para o que fiz e para o que vai acontecer nos próximos dias... Parecia que a qualquer minuto uma bomba iria explodir dentro da minha cabeça e eu iria cair morta no chão de tanta preocupação e incertezas.

...

O Daris Parq parecia ser muito legal mesmo. O parque é super colorido e está lotado hoje, com tanta gente passando de um lado para o outro. Meus amigos estavam animados, rindo e soltando piadinhas entre si. Eu forçava um sorriso a todo momento, até agora só tinha comido uma pipoca e dispensando o convite das meninas para a montanha russa. No momento observava todos irem na roda gigante enquanto eu estou aqui ao lado do carrinho de pipoca de pé, com os braços cruzados.
Olho ao redor e ver tanta pessoa passando por mim me deixa sufocada. Resolvo ir caminhar um pouco pelo parque, ajeito minha jaqueta em meu corpo e passo por um grupinho de garotos idiotas que ficam jogando cantadas. Passo reto e sigo caminhando para trás de uma grande tenda, sigo por onde não tem rodas aquelas luzes coloridas e ofuscantes e chego em uma parte abandonada do parque. Olho para trás mordendo os lábios, não tinha ninguém aqui mesmo.
Suspiro e esfregou uma mão na outra ao sentir o vento batendo contra meu rosto. Continuo a caminhar e mais a frente vejo muitos brinquedos do parque jogados no chão, inclusive um que chamou minha atenção: A Barca grande.
Caminho rápido até lá e ao parar de frente a grande brinquedo parado ali, desligado e inclinado sobre grandes estacas resolvo subir. Estendo as mãos para o alto e coloco o pé na beira, começando a escalar a barca. Ela estava diagonal, inclinada e acho eu segura. Coloco força nos braços me impulsicionando a continuar e antes de conseguir chegar ao topo ouço uma voz lá embaixo:

– Sabia que a barca não está funcionando? - olho para baixo e vejo Vicente com os braços cruzados.

– Sabia. - respondo o olhando e depois continuando a subir - E você sabia que não gosto que me sigam?.

Ele não responde, mas escuto sua risada e logo em seguida o som de seus sapatos escalando a barca.

– Sabe, para uma garota até que você tem coragem - ouvir seu tom brincalhão faz meu coração acelerar e um sorriso tentar escapolir.

– Não sei se agradeço ou se me sinto ofendida por isso.

Ele solta mais uma risada e continuamos subindo. Conseguia sentir Vicente subindo atrás de mim, ele era rápido. E a barca parecia ser realmente grande, pois já estávamos a uma altura relativamente perigosa só chão e ainda não conseguia ver o topo. Ergo a mão subindo mais um pouco e agarrando nos fios que tinham sobre a barca e ouço os murmúrios de Vicente atrás de mim.

– Acho que já está bom Juli - viro a cabeça para trás olhando para baixo e vejo seu rosto vermelho.

– Tem medo de altura Vicente? - o encaro com a sobrancelha levantada e ele bufa.

– Acho que está óbvio. - responde respirando fundo. - Mas na verdade todos temos medo de algo, não é mesmo?

Sorrio balançando a cabeça e volto a subir mais rápido.

– Juli... - rio ao ouvir sua reclamação.

Enfim depois de agarrar mais um fio consigo chegar no topo da barca, e passo uma perna sobre a lateral, me sentando em um lado dela, tendo o cuidado para não acabar deslizando ou desequilibrando o brinquedo com meu peso. Solto um suspiro e esfrego as mãos uma na outra por conta do frio aqui de cima. Logo escuto Vicente chegando ao meu lado tentando controlar a respiração.
Olho para frente e logo para baixo, tendo uma bela vista do parque lá embaixo com todas as suas luzes coloridas e brinquedos girando junto com as pessoas que pareciam pequenas Formiguinhas olhando daqui de cima.

– Lindo não? - faço a pergunta para Vicente e vejo ele arriscando a olhar para baixo e logo voltando a posição anterior rapidamente.

– É... Verdadeiramente lindo. - rio de seu sarcasmo.

Ficamos em silêncio, cada um apreciando as coisas ao seu redor o que não eram muitas, pois só tinha os prédios ao longe, o vento ao redor e o parque lá embaixo. Logo meu olhar vagou para o rosto de Vicente.

– Qual o motivo de ter vindo até aqui hoje?.

– Queria pensar um pouco - respondo tirando os fios de cabelo do rosto.

– Entendo. - ele diz e em um ato abrupto puxa meu braço - Pensar se acaba com sua vida se jogando daqui de cima ou se cortando como fez hoje mais cedo? - Vicente arregaça a manga da jaqueta e toca na faixa ao redor só meu pulso.

Olho para ele sem saber o que fazer e instintivamente puxo meu braço de sua mão, voltando a abaixar a manga da jaqueta. Como ele sabia?... Será que foi Vicente a pessoa que me levou para a enfermaria?

– Não sou burro Juli, eu sabia que estava acontecendo alguma coisa. E olha que surpresa eu tive quando arrombei a porta do banheiro e te encontrei inconsciente no chão com os pulsos sangrando? - ele rosna e chega seu rosto perto do meu - Você por acaso está tentando se matar?

– Não fale assim comigo. Você... VOCE não sabe nada sobre mim, ouviu? Acha que as pessoas não tem problemas, que a vida é um mar de rosas é? Pois eu digo que não Vicente, e por isso volto a repetir que você não me conhece, que não sabe nada sobre mi...-

– Então me diga Juli, me diga o por quê dos cortes, o por quê gosta de afastar as pessoas e o por quê dessa cicatriz em seu pescoço. - arregalo os olhos ao ouvir isso - Estou esperando.

Como Vicente ainda se lembrava da cicatriz? Será que eu deveria realmente dizer o que aconteceu, me abrir para ele... Tantas dúvidas.

– Eu vou contar. - digo suspirando - Mas amanha, na sua casa ok? Tenho tanta coisa para dizer que prefiro que todos estejam lá. - olho em seus olhos e vejo a confirmação.

– Tudo bem. - Vicente responde e noto um receio em seu tom... Medo?

Respiro fundo e olho para o lado encarando os prédios distantes enquanto Vicente encara as pessoas lá embaixo. Me perguntava se Vicente era tão mal - resolvido quanto eu sou. Se ele também tem suas incertezas quanto ao futuro e se em alguma hipótese lutaria por algo que acredita. Se ele acredita em mim talvez.

– Você se sentiu muito mal quando descobriu o lance entre a Isabela e o Marcelo? - o encaro e seus olhos grudam nos meus.

Vicente me encarou por um minuto e eu o encarei de volta. Já estava na hora de tirar essa história a limpo.

– Sim.

– E não vai me contar toda a história?

– Para quê se você já sabe?

– Só queria ouvir sua versão - ele abre um sorriso e eu franzo a testa.

– É igual a dos outros, mas o que muda é que eu me sinto pior do que eles. - responde e olho para baixo.

– Então você se sente um destruidor de vidas?

– Algo parecido com isso.

– Então bem vindo ao clube - sorrio de lado e Vicente solta uma risada curta.

– Tive uma ideia baixinha - reviro os olhos e Vicente segura minha mão - Vamos esquecer tudo por essa noite e... Aproveitar o momento enquanto dura.

Abro um sorriso e em seguida apoio a cabeça no ombro de Vicente, enquanto ele passa seu braço pelas minhas costas me trazendo para mais perto dele. E depois disso, ficamos apenas fazendo o que ele disse : aproveitando o momento com uma música de fundo que começou a tocar lá embaixo.
Talvez ser um destruidora de vidas não seja tão ruim assim, não quando tem a certeza que há mais um igual a você no mundo. E agora eu me encontrava na seguinte situação: Contar toda a verdade do meu passado e ir ou contar a verdade e ficar, permanecer ao lado das pessoas que me fizeram aceitar quem era eu de verdade.

Mas bem, foi fácil esquecer de tudo isso quando tinha Vicente aqui ao meu lado, cantarolando a canção de lá de baixo baixinho em meu ouvido enquanto estávamos no alto de uma barca quebrada. Acho que nossa história poderia virar um belo livro se acabasse aqui.


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Notas finais do capítulo

Gostaram? Para mim esse foi um dos melhores que já escrevi até agora...
Eita que é no próximo que vocês vão saber o que tem no passado obscuro da Juli hahhaha.
E desculpem os erros ortográficos mas é que estou pelo celular.
Bem, até o próximo e espero.comentários de vocês... Beijos!

PS: A cena do parque me inspirei em DIVERGENTE ok? Mas só foi o brinquedo de grande altura viu... ;)



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