Call Again escrita por Clara Luar


Capítulo 2
Não derreta na chuva.


Notas iniciais do capítulo

Olá, Boa leitura!



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A tarde chegava ao fim, o céu estava escuro, porém, não havia se quer uma lâmpada acesa na casa de Isac. Apertei a campainha, o ding-dong vibrou agudo pela residência, que parecia oca. Ninguém veio atender. Fui à janela mais próxima, a da sala, esfreguei as mãos nuas no vidro gelado para limpá-lo e, assim, enxergar melhor. Nada. Nem uma viva alma.

Logo lembrei: hoje é sábado. E Amanhã, domingo; dia de Torta de Limão Suíço. Eles, o pai, a mãe e Zack, trabalhariam a tarde inteira atendendo os clientes, o sucesso fez do pequeno comércio familiar praticamente uma confeitaria, e à noite, preparariam massa e espremeriam limões. Porém, não demorariam tanto, certo?

Sentei nos degraus da porta e esperei.

O sol foi embora completamente, a lua estava no seu há horas, embora não desce para vê-la por causa das nuvens. Prometiam chuva e elas corresponderam às expectativas; o céu despejava enormes baldes de água. A entrada da casa tinha apenas uma fina cobertura de telha, de modo que eu não conseguia afastar de todas as gotas e fiquei completamente molhada em poucos minutos. Meu cabelo começou a ondular com o excesso de umidade, por tanto o cobri com o capuz da blusa. Ainda nos degraus, encolhi mais, juntando os joelhos e envolvendo-os com os braços. Pensei em ir para casa, voltar amanhã. Tinha a certeza, porém, de que um dia a mais ou a menos poderia fazer muita diferença. Quanto mais cedo resolvesse o nosso problema, melhor. Ele chegaria logo, conversaríamos, eu ia dizer que gostava dele e Zack me abraçaria, feliz, e estaria tudo bem entre nós, mais do que bem até. Com o pensamento positivo encarregando-se de aquecer o coração, mergulhei o rosto no vão dos braços e joelhos e tentei ao máximo manter o corpo aquecido, mas começava a tremer.

Em meio à raiva em forma de chuva surge a luz dos faróis e o carro da família Baker estaciona na garagem. Levanto pálida e desajeitada na porta da casa deles. Duas crianças, um menino e uma menina, pulam dos bancos de trás e correm, com as mãos unidas sobre a cabeça contra as gotículas, para a sacada onde eu estava. Berram para os pais que havia uma garota na porta de casa: eu. A senhora Baker procura-me por cima da armação dos seus óculos.

– Oh, Blair! Quanto tempo! – desce com sacolas de supermercados nas mãos, enquanto os demais iam buscar as outras no porta-malas.

É agarrada pelas crianças no meio do caminho, teve dificuldade em manter-se equilibrada e, para que não caísse nas poças, prontifico a ajuda-la. E só então ela nota o quanto estou encharcada.

– Não me diga que esperou todo esse tempo aqui, na chuva... – os olhos esverdeados se encheram de preocupação materna. – Vamos logo, entre! Entre!

Sem me deixar segurar suas sacolas, empurrou-me porta à dentro assim que pôs as chaves na fechadura. De relance, encontrei as íris castanhas, nada a ver com a da mãe, de Isac pregados em mim. Carregava uma caixa aparentemente pesada nas mãos, sua expressão indicava ameaçar larga-la para correr por mim, saber como eu estava, mas algo o deteve. Desviou o olhar para o chão. Tive, então, a certeza de que Zack ainda estava bravo.

A menininha, Anne, puxou-me pela mão, conduzindo-me até a poltrona na sala, enquanto a mãe foi aos fundos buscar uma toalha. O senhor Baker adentrou a casa com muitas sacolas enfileiradas no braço e sacos de arroz empilhados nas mãos. Encarregado de amassar e redobrar as massas, ele adquiriu o corpo robusto e muita força. Cumprimentou-me com um aceno de cabeça, que eu retribuo admirada com tudo o que estava carregando. Pigarreou ao notar que não passaria pela batente da cozinha. Informa à mulher que deixaria tudo na despensa, ouviu a resposta, um alto “A-ham”, e seguiu pelo corredor ao lado da escada. Por último, para fazer meu coração acelerar ansioso, entrou Isac, com a caixa de leite e uma pequena pilha de óleo de soja. Depois da capacidade do pai de carregar tantas coisas de uma vez, o filho deixou a desejar. Entretanto, não era isso o que me importava. Sai do sofá e fitei-o da maneira mais penetrante possível. Ele devolveu, da forma mais nebulosa possível. Vi mágoa, angústia, raiva, preocupação, medo. Uma mistura de emoções que poderia indicar que me perdoaria ou que me odiaria para sempre. O contato visual foi cortado pela sua mãe trazendo a toalha junto com uma muda de roupas que foram da irmã mais velha do meu amigo (será que ainda éramos?).

– Melhor tomar um banho, pode pegar um resfriado. – aconselha afetuosa – Vou preparar chocolate quente para todos nós. – pisca para o filho mais velho antes de esconder-se na cozinha.

Adoraria tomar banho, beber o chocolate quente da Bibian e aconchegar-me no calor da casa dos Baker, no entanto sabia o quão precioso era cada um dos minutos nesse momento. Dirijo-me à Zack, cautelosa. Estou a sua frente, mas todas as palavras de repente sumiram.

– Oi.

Não tinha algo menos estúpida para dizer, Blair? – reclamo em pensamento.

– Oi. Blair. – sua voz não vibra, como fazia quando dizia meu nome. Não pensei que algo tão simples pudesse provocar uma pontada dolorosa no peito.

– Preciso falar com você. – esfrego a manga no braço, pouco a pouco envergonhada com a situação em que me encontrava: encharcada, muda e com muitos olhos à volta.

– Tome um banho primeiro.

– Eu preciso falar, agora. – repito. Talvez assim meu cérebro volte a trabalhar no discurso de desculpas.

Ah. Eu não fiz um discurso...

Fico apavorada. Mentalmente me bato, descabelo, tenho vontade de gritar por não ter pensado mais do que sair correndo. Por fora, estou paralisada, os olhos pregados no chão. E espirro.

– Vai tomar um banho, Blair... – tenta ser duro, mas suas palavras carregam tamanha preocupação, que penso que, se fosse sincera, ele aceitaria minhas desculpas. – Faça isso enquanto guardo as compras.

Recompõe-se e passa por mim. Sinto a atmosfera a sua volta; não é leve, está denso, pesado pelo conflito de ideias em sua cabeça. Era como se tentasse ser o que ele não é, apenas para me afastar. E isso me irrita. Seguro seu braço, também firme como do padeiro, embora não pareça.

– É importante. Por favor... – minhas palavras saem sussurradas.

A reação dele é fechar os olhos. O meu toque queimava nele. Sabia. Essa brigava torturava a mim e a ele.

– Por favor digo eu! – exclama arrebatado.

Larga o leite no balcão. Os litros de óleo rolam e Bibian tem que correr para salvá-las antes de estourarem no chão. As duas crianças saltam nas almofadas da poltrona, curiosas. Isac vira-se completamente para mim, com olhos vidrados que não consigo ler. Quando ergue seu braço direito, fecho as pálpebras assustada. Sinto minha testa ser pressionada pela sua palma e entreabro-os olhos.

– Como pensei. Está queimando, Blair. – diz, dessa vez sem esconder a inquietude.

– Eu estou bem...

Mal tento contestá-lo vejo meus pés saindo do chão. Zack me ergueu e coloca-me sobre o seu ombro e leva em direção à escadaria.

– Banho. Agora!

Eu poderia ser espremida ali, e sairia o extrato de tomate, de tão vermelha que estava, de febre e vergonha. Ele só poderia estar muito bravo comigo. Carregava-me como a um bebê prestes a arrotar. Podia ver o riso quase pintando na face da mãe dele. Isac está com muita raiva, apenas isso justificaria tal ato. Ou queria divertir-se me humilhando, como um castigo. Debato-me mesmo sabendo que não tenho chance.

– Não! Me larga!

– É só um banho, menina. – o senhor Baker, voltando da despensa com os braços livres, observa casualmente, como se eu estar sendo arrastada pelo seu filho não fosse nada demais.

– Eu também não quero banho! – Igor ergue a mão, solicitando a liberação do banho diário, que a mãe nega imediatamente.

Essa família está vendo o que acontecerá comigo? São todos malucos? Ele vai mesmo me forçar a tomar banho?!

Paro de tentar desvencilhar-me somente ao perceber onde Zack me trouxera: no quarto dele.


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Notas finais do capítulo

Comentários?
Obrigada por ler, até a próxima :)



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