Estações escrita por Emma


Capítulo 22
Medos e Angústias - Parte 1


Notas iniciais do capítulo

Dois meses né?! Mil perdões, pensei que as férias seriam mais amenas, mas com tcc se aproximando foi complicado, precisei dividir esse capítulo em duas partes pois estava gigante, mais de 12 mil palavras... Mico Leão, amor meu, esse eu dedico à vc, que sempre me incentiva e me impulsiona a continuar ♥



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/558080/chapter/22

“O outono é conhecida como uma estação de mudanças, de extrema beleza, mas também de melancolia, os ventos sopram mais forte, as árvores perdem suas folhagens, secas e espalhadas pelo chão, vemos folhas que antes costumavam balançar verdes nos galhos... As noites se tornam mais longas, portanto, os dias mais curtos, diminuindo a incidência de luz...”. Emma

“- Estou grávida Helena!”

— Você o que? – ela deu um passo para trás – Quer dizer, tens certeza? – Sonia estendeu mais duas hastes marcando positivo para ela – Você estava suspeitando e não me falou por quê? – a amiga se sentiu um pouco traída.

— Não – rapidamente ela acenou com a cabeça – de forma alguma! Eu parei na farmácia, pois Cristal precisou de um curativo, estava colocando mais alguns produtos na cesta até que eu passei pela sessão onde tinha uns absorventes expostos, me lembrei que eu não usava um desde quando cheguei a sua casa, então um grande alerta vermelho acendeu diante dos meus olhos, os sintomas se fazendo presente, comprei esses testes e todos deram positivo... Mas não era para ser, eu estava tomando regularmente minhas injeções de anticoncepcionais, eu havia tomado no mês em que eu e Alexandre tivemos relações pela última vez...

Dio mio! – a boca de Helena abriu formando um pequeno O e depois se transformou em um sorriso – Isso realmente me deixou sem palavras... Que surpresa!

— Imagina para mim! Eu realmente não posso estar grávida Helena, não quando estou me separando dele! Oh meu Deus – ela passou as duas mãos pela testa e depois deslizou pelos cabelos, colocando-os atrás da orelha – Isso não pode estar acontecendo – elas se encararam e a amazona viu os olhos da amiga se encherem de lágrimas.

— Sonia meu bem, por favor, não chore, venha aqui – ela abriu os braços e sua amiga se aconchegou neles.

— Eu estou uma bagunça Helena – a ex-modelo soluçou no pescoço dela – só sei chorar, não faço outra coisa além de ser um peso para você e molhar seus travesseiros com lágrimas... Oh Deus... Eu... Eu não posso ter outro filho, minha vida está uma complicação gigantesca! Nem uma casa eu tenho mais...

A amazona a afastou gentilmente do abraço, pegou nas mãos de Sonia e a levou para dentro do quarto e ambas sentaram-se na cama, uma de frente para a outra, o sétimo mês estava sendo o mais severo de todos até agora. Helena se sentia mais cansada do que em qualquer outra gravidez, com mais sono e dores nas costas. Ela enxugou algumas lágrimas que desceram pela face de sua amiga e sorriu, suspirando a esposa de Alexandre a olhou aflita:

— Não diga isso outra vez minha amiga, eu sei o quanto é ruim desejar uma criança e não poder tê-la, o quanto é frustrante esperar por duas marquinhas rosas em cada uma dessas hastes e só ver uma – a arquiteta lhe deu um sorriso aguado, enquanto a ex-modelo abaixou a cabeça envergonhada. 

Nos dois meses que tinha passado ali, Sonia esteve com ela todo o tempo, mas Helena sabia que o peso dos acontecimentos estava destruindo-a aos poucos, estava mais magra que o normal, seus sorriso era despertado apenas pelas crianças da casa, seu ânimo tinha sumido e por mais que tentasse ocultar, a amazona sabia que ela passava horas no quarto chorando...

— Acalme-se e pare de dizer essas coisas, seu filho pode sentir tudo que sentes, lembra?! Não foi o momento, mas agora existe uma vida sendo gerada dentro de ti e ela precisa de você minha querida – Helena levantou o queixo da amiga e sorriu para ela, colocando uma mão em sua barriga, por cima da de Sonia – Eu sei que você se lembra da sensação de ter um bebê ai, os gêmeos não completaram nem três anos ainda, por mais contraditório que seja, isso é maravilhoso – a ex-modelo suspirou fechando os olhos. Ela não queria, não era o momento certo, todavia Helena estava completamente certa. Ela estava tendo um filho...

— Você tem razão... Mas e agora? Eu não sei o que fazer!

— Agora nós vamos precisar ir ao hospital ver como seu bebê está se desenvolvendo e se tudo vai bem... Com quantas semanas você acha que está?

— Bem – ela colocou uma mecha solta atrás da orelha enquanto pensava e fazia seus cálculos – Eu menstruei no mês que Alexandre viajou, a nossa última vez juntos tinha sido no fim de semana em que fui a abertura da conferência com ele – ela suspirou novamente engolindo o nó formado na garganta – depois disso não ficamos mais juntos até a noite em que fui buscá-lo no aeroporto... O que me intriga é que eu estava tomando o anticoncepcional.

— Você sabe que eu engravidei de Henrique tomando remédio não?!

— Sim Helena, eu lembro, mas você mesma disse que seus hormônios sempre foram instáveis, o que facilitou sua gravidez... Entretanto eu sempre fui muito estável, engravidei de Cristal a primeira vez porque tomava comprimidos e esqueci uns dias enquanto estávamos em nossa... – ela engoliu outro nó – nossa lua de mel – “Deus essas lembranças machucam tanto...” – Quando decidimos ter outro bebê eu parei de tomar e em seguida engravidei dos gêmeos... Nunca falhou em 5 anos e depois em quase 3, com exceção de agora...

— A questão é que não há mais volta meu bem e precisamos nos organizar para receber o novo membro da nossa família – Helena sorriu apertando sua mão – Queres que eu ligue para o hospital e agende uma consulta com a ginecologista?

— Não! Não posso fazer minha consulta no Del Rio...

— Por que Sonia?

— Porque se eu der entrada com qualquer tipo de exame ali Alexandre vai saber na hora e eu não quero isso...

— Eu entendo que não queira contar agora, mas não achas que quanto antes melhor?!

— Você não me entendeu Helena – as duas se encararam – eu não vou contar... Nem agora, nem depois!

— Sonia você não pode fazer isso! – Helena falou firme – Não é a hora de tomar uma decisão assim, seu emocional está abalado, pense melhor...

— Não Helena, eu não preciso repensar minha escolha, já está decidido, vou ter essa criança, mas Alexandre não vai saber desse bebê, não como filho dele pelo menos...

— Eu realmente sei o quanto estás decepcionada com ele, eu também, mas isso é loucura Sonia! Simplesmente não dá para esconder uma gravidez com ele morando uma rua acima! – a amazona a olhou séria, um vinco se formando entre as sobrancelhas – Como você pensa em manter isso de Alexandre? Porque algum momento vai ficar muito evidente...

— Eu não sei ainda, porém, ele não vai saber sobre meu bebê!

— Ok! – Helena se levantou e mostrou a palma das mãos em sinal de rendição – Eu vou te dar espaço, você está precisando pensar um pouco... Acho que o impacto dessa notícia ainda não foi processado direito pelo seu cérebro, porque geralmente eu sou a imprudente e você a sensata – Sonia quis falar, entretanto sua amiga continuou – Vou colocar as crianças para dentro e aprontá-las para o jantar, se você não descer eu entendo e não se preocupe porque eu vou pedir para as babás me ajudarem...

Ela se virou e caminhou em direção a porta do quarto calada, deixando uma Sonia pensativa, olhando fixamente para o chão diante da cama na qual estava sentada com os pés para fora. Encostando os cotovelos no joelho, ela enfiou as mãos pelos cabelos, os massageando, crendo que seus movimentos fosse gerar algum tipo de pensamento lógico que lhe tirasse da confusão em que se encontrava.

Logo ela se inclinou para trás e se pôs de costas para o edredom macio da cama, seus olhos azuis agora pareciam se concentrar no lustre fino do quarto, mas ela sabia que sua mente na verdade estava muito além daquelas quatro paredes...

 “- Então? – Helena indagou ansiosa quando a viu saindo pela porta do consultório.

O sorriso gigante no rosto da modelo lhe deu a resposta que a arquiteta esperava, ainda assim Sonia falou:

— Positivo! – ela estendeu o papel na direção dela – Estou grávida de novo! – com um modesto grito eufórico escapando delas, as duas mulheres se abraçaram sorridentes.

— Parabéns! Alexandre vai ficar tão feliz...

— Obrigada! – Sonia não conseguia esconder o sorriso – Sim, ele vai... Nós estávamos planejando, só não imaginei que viria tão rápido...

— Como você vai contar para ele?

— Da forma mais especial que eu conseguir...

—________________________________________

O telefone da linha interna do escritório tocou e Alexandre apertou o botão de viva voz:

— Sim Clarissa.

— Dr. Del Rio, chegou a minha mesa o exame de um paciente seu, vou levá-lo até o senhor ou estás ocupado?

— Não, no momento estou fazendo umas pesquisas, nada demais... Que paciente? Melissa não me passou nenhum nome que precisasse ser reverificado ou que necessitasse de novos exames...

— Doutor eu não sei, o envelope está lacrado e não tem o nome do paciente, apenas o seu como destinatário.

— Ok Clarissa, traga até minha sala, por favor.

 - Sim senhor – a mulher mais velha desligou o telefone.

Sonia olhou para ela com um sorriso doce nos lábios.

— Obrigada querida!

— Sempre que precisar senhora.

—_______________________________________

— Aqui doutor.

Clarissa deu-lhe o envelope e rapidamente se virou saindo da sala. Intrigado ele analisou o incomum envelope rosa, seu nome escrito nele, ele reconheceu a caligrafia, podia jurar que era a de sua esposa, mas ela e Cristal estavam em NY e só chegariam amanhã...

Rasgando o lacre ele realmente viu o papel timbrado com marca d’água e logotipo de seu hospital, abrindo a pasta ele notou um exame de sangue e um... cartão?! ao lado.

Demorou mais alguns segundos até ele notar o nome da paciente e logo associar que aquele não era um exame de sangue qualquer ou de um paciente aleatório, e sim um que marcava o hormônio BHCG positivo. Um sorriso imenso surgiu em seu belo rosto, bom Deus, ele seria pai de novo! Abrindo o cartão ainda sorrindo e já discando o número do celular de Sonia, ele leu o que havia escrito:

‘Parece que Cristal finalmente conseguiu o irmãozinho que ela tanto nos pediu...

Parabéns para o melhor pai de todos, não podia estar mais feliz em viver isso com você outra vez.

Xoxo, Sua.’

Quando Alexandre terminou de ler, o aparelho em seu ouvido tentando conectar-se ao dela, a porta foi aberta lentamente, ele nem percebeu, ainda encantado com o papel em suas mãos...

— Eu me perguntei quanto tempo você ia demorar para... – o doutor olhou para cima assim que detectou a voz suave e reconfortante de sua esposa espalhar-se pela sala – perceber o que estava diante de suas mãos – Alexandre se levantou e correu até ela, a encontrando no meio do caminho entre a porta e a mesa dele, puxando-a para si e selando seus lábios.

— Meu amor, que saudades! Eu não poderia estar mais feliz em averiguar um exame... – ele desceu uma das mãos que estavam em sua cintura e colocou na altura do ventre dela, deslizando o polegar carinhosamente – Eu não esperava que conseguiríamos tão rápido, já que você tomava anticoncepcionais até poucos meses...

— Nem eu, mas mês passado, quando estive na França, eu fiquei tão enjoada, quase a semana inteira sem comer direito, passei muito mal, tanto que não pude desfilar todos os dias, logo eu imaginei que podia estar grávida, mesmo achando tão rápido, só tinha dois meses que nós estávamos tentando e depois de ver Helena tentando há anos, enfim, eu esperei e logo vi os outros sintomas aparecerem, este desfile de NY foi o último da temporada, por isso fiz o exame de sangue só agora, porque eu queria te contar e poder ficar um tempo aqui com você para desfrutar – ela se inclinou colocando os braços ao redor do pescoço dele e puxando-o para outro beijo que terminou com respirações ofegantes misturando-se, pois nenhum deles queria se separar – Eu estava com tanta saudades suas dear...

— Sweetheart eu também, tanta – sua mão direita subiu até o rosto dela e o polegar deslizou suave pela bochecha – Achava que vocês só chegariam amanhã... Onde Cristal está?

— Eu precisei mentir sobre isso para não estragar a surpresa... Está com Helena e Henrique na recepção, morrendo de saudades do seu papaizinho – Sonia sorriu feliz, ainda envolvida nos braços do marido.

— Vamos até ela, também estou com muitas saudades da minha menina – tirando o jaleco, ele colocou sobre o cabideiro próximo a porta e pegando na mão dela foram em direção a filha.

Sonia enxugou uma lágrima que desceu pelo seu rosto, suspirando, ela desceu as duas mãos e posou-as em sua barriga, fazendo leves movimentos de vai e vem... De repente, o peso que a descoberta da gravidez trouxe começou a se esvair, respirando profundamente mais uma vez e ainda com os olhos fechados, seus lábios desenharam um sorriso doce, ela percebeu como já começara a amar aquele pequeno ser que crescia dentro de si tanto quanto amava seus filhos que estavam há poucos cômodos de distância.

Sorrindo ela abriu os olhos, sentou-se e fitou a barriga plana.

— Oi, eu sou sua mãe... Você já deve saber disso não é?! Sei que você é esperto, portanto deve ter escutado as besteiras que falei... Desculpas tá?! É que... Bem bebê, você foi uma surpresa para a qual eu não estava preparada – ela sorriu – e eu fiquei bastante assustada, mas não se preocupe, já passou... Obrigada por me escolher para ser sua mamãe, prometo daqui para frente te mostrar o quanto você é especial para mim e o quanto será amado... Começarei a provar isso parando de chorar pelos cantos e voltando a viver, você e seus irmãos são as coisas mais preciosas do mundo para mim, portanto, se os tiver, eu serei feliz. O que você acha de uma mudança?

—__________________________________________

Sonia desceu para o jantar com uma expressão alegre que há tempos Helena não via. O que a deixou mais aliviada. As crianças estavam cheias de energia, enquanto os gêmeos dentro dela já tinham sugado sua cota diária. Notando o quão exausta sua amiga aparentava, a ex-modelo mandou a amazona subir as escadas e descansar, ela se responsabilizaria por cuidar dos pequenos pelo resto da noite.

A sra. Herrera encheu a banheira com água morna, colocou alguns sais e sabonetes líquidos e relaxou, sentiu os músculos responderem ao calor da temperatura da água, suavizando um pouco a dor que ela sentia... Helena amava seus bebês mais que ela própria, porém, eles estavam acabando com suas costas e ela não via a hora deles nascerem...

— Eu juro que o pai de vocês vai me pagar por não estar aqui agora, me fazendo uma massagem relaxante que mesmo a melhor esteticista não faz igual – ela sorriu desenhando padrões aleatórios em sua enorme barriga – Sonia precisa me dizer como ela conseguiu carregar duas crianças tão bem...

—___________________________________________

Helena não sabia dizer quanto tempo havia passado no banho, talvez tivesse até dormido, estava no closet se trocando quando ouviu Sonia a chamar.

—Helena?

— No closet amore.

— Pensei que a essa altura você já até estivesse dormindo... – Sonia sentou-se em uma poltrona enquanto sua amiga procurava uma camisola confortável.

— Não tenho mais nada que dê em mim, minha barriga está imensa – ela andou até o lado onde as roupas de Heitor estavam guardadas e começou a procurar uma camisa – me diga como você conseguiu lidar com uma gravidez de gêmeos tão bem? Eu juro que não aguento mais dois meses...

— Lê eu sei que o drama sobre não ter nada para vestir é só porque eu entrei aqui e você ficou com vergonha de admitir que está com tanta saudade de Heitor que quer se enfiar dentro das roupas dele – Helena mostrou a língua para ela e revirou os olhos, terminando com um sorriso, afinal ela tinha sido pega, pois era a verdade, estava com saudades de seu marido – E quanto a gravidez de Char e César, foi cansativa para mim também, mas eu obedecia mais as ordens médicas que você então...

— Ok, eu já entendi. Deixa os sermões para quando Heitor me ligar mais tarde... Eu realmente estou com saudades daquele irresponsável, principalmente das massagens que ele me fazia quando eu estava tão dolorida uma altura dessas da gravidez...

— Se você quiser eu posso tentar fazer uma massagem...

— Querida, eu vou a estética praticamente todos os dias, faço hidromassagem e todas essas coisas que Bárbara me recomendou ultimamente, não se incomode, meu corpo só está sentindo falta do toque do meu marido – ela a encarou sorrindo, enquanto vestia um pijama composto por blusa e shorts de algodão escolhido entre as coisas de Heitor – Agora vamos lá para o quarto, quero meus biscoitos de nata e eu também sei que você veio conversar, lá será mais cômodo.

—__________________________________________

— Você tinha razão – Helena colocou outro pedaço do biscoito caseiro na boca, ouvindo Sonia e se sentindo até mais aliviada por ela ter mudado de ideia sobre omitir o bebê de Alexandre – não dá para manter isso dele se eu estiver morando aqui – a amazona balançou a cabeça concordando enquanto saboreava a guloseima em sua boca – portanto, eu pensei e decidi que vou passar um tempo longe – seus olhos se arregalaram e logo ela a encarou surpresa – vou para minha casa em NY, ficar algum tempo com minha família e quando a gravidez já estiver visível eu ficarei alguns meses em Paris, até meu bebê nascer talvez, então volto para os EUA.

A carranca apareceu outra vez na face agora arredondada de Helena, mas ela continuou ouvindo-a. Sua amiga costumava ser doce como uma tâmara, mas também sabia ser tão teimosa quanto uma mula. Com tantos hormônios correndo pelo corpo e sem nenhum homem por perto, Helena pensou, era melhor que duas grávidas não permanecessem sozinhas juntamente com 5 crianças numa casa, seria uma loucura, graças a Deus Heitor estava chegando...

— Eu acho que você não vai mudar de opinião por enquanto, então não vou me exceder tentando te fazer ver as coisas pela lógica, prometi aos meus filhos – ela voltou os olhos para a barriga e a acariciou, continuando, pegou o olhar de sua amiga novamente – quando chegar o momento você vai perceber que cometeu um erro. A gravidez é sua assim como o bebê, só não esqueça que você não o fez sozinha e quando Alexandre descobrir sobre a criança, ele pode tomar alguma medida jurídica em relação a tutela, então teríamos uma confusão de verdade... Pense sobre isso...

— Helena eu entendo tudo o que estás expondo, porém eu preciso recomeçar minha vida, preciso viver outra vez, enquanto eu estiver tão perto de Alexandre eu não vou conseguir, prometi ao meu filho agora pouco que eu iria seguir em frente por ele, Cristal, César e Charlotte, se eu contar para ele agora, sei que não me deixará em paz...

Helena suspirou, ela conhecia sua amiga o suficiente para saber que essa decisão tinha sido difícil, voltar para os EUA era ter que ouvir as críticas de Viviene, sobre a decisão que Sonia tomara há alguns anos sobre abdicar sua carreira para dedicar tempo ao marido e os filhos pequenos, principalmente o fato de que ela ainda amava muito Alexandre, a proximidade machucava, mas a distância talvez doesse muito mais.

— Lê... eu sei que você só quer o meu bem, muito obrigada por cada conselho, eu só estou estressada, parece que descobrir a gravidez hoje despertou todos os hormônios que estavam dormindo enquanto eu não sabia, estou sensível e ao mesmo tempo tão chateada, confusa também, como eu já lhe disse minha vida está uma bagunça, não sei direito por onde começar a arrumar, ainda me sinto perdida e talvez só o tempo possa consertar meu coração... A única coisa da qual tenho certeza é que preciso ir para um novo lugar tentar recomeçar...

Helena continuou encarando, dessa vez com um sorriso compreensivo, quando ela continuou:

— Alexandre não merece meu filho, ele e Melissa estão planejando o deles, quem sabe isso se consume logo e então ele esqueça as crianças... Eu poderia viver em paz com meus filhos e ele nem nos faria falta – ela tentou ser indiferente, mas a Sra. Herrera viu as lágrimas que ela estava lutando para segurar, inclinando-se na direção dela, a abraçou dizendo:

— Isso não podia ser menos verdade, você sabe, tanto quanto eu, que além de ser louco por essas crianças, Alexandre jamais deixaria de se importar com os filhos... Toda tarde desde que vocês se mudaram pra cá, ele vem e passa horas com eles...

Sonia enxugou uma lágrima solitária e continuou ouvindo sua amiga.

— Eu estou do seu lado, só queria que você chegasse a uma conclusão lógica, entretanto se sua vontade é que Alexandre não saiba sobre o bebê eu vou respeitar e apoiá-la no que decidir.

— Mesmo que eu tenha que ir embora e quebrar nosso acordo de ficar contigo até os gêmeos nascerem?

— Mesmo assim – ela sorriu solidária – Heitor chega em breve, logo você estará livre do fardo de me aturar cheia de hormônios...

— Oh Lê, não diga isso! É um prazer estar aqui contigo sua boba – Sonia a abraçou apertado – Você é minha irmã e eu te amo, só tenho a te agradecer por tudo o que fez por mim... Eu prometo que estarei aqui quando meus sobrinhos nascerem, vou a NY organizar meu apartamento, uma pena minha arquiteta preferida estar de licença maternidade, pois vou precisar de umas reformas com certeza... Também vou procurar um advogado para tratar dos trâmites do divórcio... Eu ficarei mais descansada quando Heitor chegar, só irei à Paris depois que eu tiver a oportunidade de conhecer seus bebês, vou ficar até o final do mês se estiver tudo bem para você...

— Claro que sim amore, fique quanto tempo precisar e saiba que seu segredo está guardado. Eu te amo e juro que quando meus filhos nascerem darei uma surra naquela cadela sonsa da Melissa – Sonia revirou os olhos e não resistiu sorrir – Não sei se posso me acostumar com a ideia de vocês morando longe de mim – um biquinho triste apareceu nos lábios da amazona.

— Nem eu baby! Por favor esqueça Melissa e Alexandre, independente da distância você sempre vai ser minha irmã – elas se abraçaram mais uma vez.

— Sim, sempre!

—_______________________________________

  Nos dois meses que se passaram, Alexandre sentia como se sua vida, sua essência lhe tivesse sido arrancada do corpo, perder Sonia e as crianças era a pior experiência pela qual passara, sua casa já não tinha o calor do amor, era fria e grande demais, as fotografias se tornaram fantasmas que pareciam o perseguir lembrando-o constantemente do que perdera, o silêncio era quase enlouquecedor, já não tinha mais o som suave e ainda amador do violino de Cristal, o sorriso doce e tão encantador de Charlotte ou o barulho dos pezinhos de César correndo pela casa e arrastando seus carrinhos pelas paredes.

Antes, voltar do trabalho era um bálsamo para seu coração, agora era como se auto-flagelar, ele as vezes não podia acreditar que toda aquela tempestade tinha lhe sobrevindo, hora ou outra sua mente brincava com ele, lhe dizendo que tudo era um pesadelo horrível, porém, dia após dia, a realidade tratava de se fazer evidente, sua família já não era mais sua e nem estava ali, o pior de tudo era que ele não sabia que medidas tomar para reavê-los.

Todas as tardes, de segunda a segunda, ele esgueirava-se pela casa de Helena para vê-los, desfrutar da companhia deles por poucas horas que fossem e no final de semana que Sonia permitiu que os levasse, tinham sido os dois dias mais felizes desde que os perdera.

Falando sobre ela... Ele sentia tanta saudade, desde aquela fatídica tarde em seu escritório nunca mais a viu, um reflexo talvez, uma sombra observando-o de longe enquanto estava no jardim dos Herrera com seus filhos, entretanto nunca mais pode contemplá-la em toda sua formosura, olhar nos azuis doces e cativantes de seus olhos e se perder, Deus, como ele sentia falta...

Além da dor que o acompanhava aonde quer que fosse, ter que olhar todos os dias a causadora disso e não fazer nada era aterrorizante, Melissa ainda andava por seu hospital, agora tendo parte dele, as vezes era obrigado a engolir Vicente por ali também. Seja qual forem os pecados que ele cometera ao longo dos anos, certamente estava os pagando agora. Ele não era religioso, mas acreditava que existia um Deus, um Deus que era justo e íntegro, assim como procurou ser durante sua vida inteira, ele se viu constantemente e mesmo sem notar, enviando orações silenciosas aos céus pedindo sua família de volta.

Elijah, seu cunhado, marido de Sophie há pouco menos de um ano, vinha de uma família judia dona de uma conhecida rede joalheira europeia, se conheceram quando a moça havia feito um intercâmbio durante o segundo ano da faculdade de jornalismo, na Bélgica, se apaixonaram e um ano e meio depois, ela voltou para NY com um anel de noivado de fazer inveja em qualquer mulher. O jovem era um rapaz de bom caráter e coração puro, tal qual sua irmã, era improvável não darem certo, tinham uma afinidade especial, tanto que não demorou para Soph se envolver com os costumes judaicos e se encantar com a rica cultura daquele povo.

 Alexandre se lembra de conversar com o jovem sobre sua fé e das histórias bíblicas que ele recitava ou sua preferida, a história dele. Sua mãe era estéreo e depois de orar a Adonai Olan, o Deus de Israel, foi agraciada com ele e ainda mais 3 filhos. Era nesse mesmo Deus abençoador que Alexandre cria. Estaria ele errado?! Nesse momento ele só podia ter algo que não imaginava possuir: fé. Fé que os teria de volta.

“- Alexandre, nas crônicas do povo de Israel, existe uma história, sobre um jovem que decidiu desafiar um gigante, mesmo contra todas as probabilidades, ele saiu vencedor, por causa da fé que possuía em seu coração... Tenha fé que você pode derrubar esse gigante e ter sua família de volta, estarei orando por você!”

O grande problema era não deixar seu coração ser inundado pelo ódio, por ver a injustiça todos os dias passando diante de seus olhos e não ter armas para se defender. Sua alma sempre inclinou-se para a bondade, entretanto, por mais que tentasse sufocá-lo, ele sentia esses sentimentos obscuros tentando vazar por qualquer brecha que ele desse...

—_______________________________________

Era tarde, depois das 21h, quando retornou do hospital, a cirurgia tinha tido complicações e ele não conseguiu sair cedo para ver seus filhos, estava jantando quando em seu telefone apareceu a foto de Heitor.

— Oi irmão...

— Heitor, quanto tempo... Como estão as coisas por ai?

— Desculpe ter falado pouco contigo ultimamente, as coisas aqui estão uma loucura, tem muito trabalho a ser feito e essa obra de restauração em especial exige da equipe o melhor de suas habilidades, estamos mexendo com um dos maiores patrimônios da humanidade... Enfim, você deve imaginar. Viu as últimas matérias e críticas sobre a Herrera Construções? – perguntou em êxtase – Mas deixa isso para depois... Estou bem, com muita saudade de todos e eu te liguei porque quero saber como você está e para falar sobre Helena...

— Bom Heitor, o que eu posso te dizer?! Estou levando, vivendo da forma que dar, me controlando para não apertar o pescoço de Melissa quando ela está na minha frente ou socar a cara de Vicente quando ele me direciona um sorriso irônico. Tentando amenizar a dor que sinto por não ver Sonia há dois meses e ter que me conformar em passar apenas duas horas do dia com meus filhos...

— Sinto muito Alê, quando eu chegar nós vamos arrumar uma forma de reaver sua família e não faça nenhuma besteira enquanto isso, por favor, seja racional...

O doutor suspirou profundamente, estava cansado, tanto física como mentalmente, a cirurgia tinha tomado o resto de suas energias, ele só atendeu o telefone por que era Heitor...

— Eu sei, estou tentando... Agora fale sobre Helena, você me deixou um tanto preocupado...

— Bárbara me ligou falando que Helena tem... – ele olhou na tela do notebook a cópia dos exames que a médica lhe enviara por email – placenta prévia, o que explica os dois sangramentos que ela teve e quase me causaram um infarto aqui... Ela disse que a placenta está começando a se deslocar para a parte do colo do útero... Helena também me queixa de cansaço e muita dor nas costas, segundo as ultrassonografias os bebês estão se desenvolvendo bem, com peso e tamanho até além do esperado para essa fase, por serem dois, isso é ótimo! Entretanto estou preocupado com minha mulher... A doutora disse que se ela continuar se sentindo tão cansada e se os sangramentos persistirem o parto pode ser naturalmente induzido...

— Bom, tenho pouca experiência na área de obstetrícia, mas eu acho que esse sangramento precisa ser monitorado, Helena deveria descansar pelo resto da gravidez e semanalmente fazer ultrassons, para ver como está o movimento dessa placenta e o colo do útero, parto normal deve ser descartado e acima de tudo, ela precisa repousar... Heitor, Sonia está em sua casa com sua esposa, porém, você e Inácio são os únicos que conseguem por rédeas naquela amazona – eles sorriram – Quando você chega?

— Esse é o problema... – Heitor suspirou e passou a mão pelos cabelos loiros – enfrentamos contra tempos no processo de restauração e tivemos que estender o prazo de entrega da obra por pelo menos mais 6 meses...

— Heitor... Como assim? Helena está perto de dar a luz e você não vai estar aqui?! Enlouqueceu?!

— Não Alexandre, eu vou estar ai, consegui uma semana livre e vou para casa no próximo mês verificar tudo e volto para o parto, só não poderei ficar muitos dias... Eu estou arrasado com isso, não era meu plano inicial, mas infelizmente não foi como projetamos aqui.

— Heitor! – chamou sua atenção exasperando-se – Meu Deus... Tudo o que eu queria era poder estar perto de Sonia, dos meus filhos e você está desperdiçando sua família! Inacreditável! – ele bufou – Você acabou de me dizer que Helena está com problemas, então venha cuidar de sua mulher! Sabes melhor que eu o quanto ela está com saudades suas...

— Alexandre é do meu trabalho que estamos falando – Heitor começava a sentir uma pontada de irritação, será que seu amigo não entendia o que estava em jogo? – não posso abandonar a obra de qualquer jeito, é do meu nome e da imagem de minha empresa que está em jogo...

— Eu daria minha rede de hospitais inteira para que Sonia me olhasse outra vez como antes! Para ter a certeza de que quando chegasse em casa, teria um sorriso e braços calorosos que me envolveriam com amor e cuidado – bradou o doutor – Por que você acha que eles não me tiraram o hospital? Porque não me machucaria como perder minha família... Por favor, seja um homem sábio e não cause sua própria ruína, volte para casa, venha cuidar daqueles que você ama, se não, não serei o único que terá motivos para chorar pela perda que teve...

—________________________________________

1 mês depois...

Oh love! – Pietro disse quando abriu a porta, abraçando a irmã – Ei belezinha, venha com o titio – estendendo os braços, ele pegou uma meio adormecida Charlotte do colo de Sonia – Cacau – se esticou dando um beijo na cabeça da sobrinha mais velha e espalhou o cabelo de César – E você, como cresceu rápido rapazinho...

Sonia entrou pelo apartamento e avistou Guilhermino, que com os braços abertos e um sorriso, se apressando até ela, abraçando-a e beijando sua cabeça como quando ela era uma garotinha.

— Oh minha querida, como você está?

— Melhor tio – ela sorriu para ele, se afastando um pouco do abraço para olhá-lo nos olhos – Onde está minh...

— Vovó... – Cristal chamou feliz e correu até a avó, César seguia a irmã.

— Oi minha jóia – Viviene beijou a têmpora de Cristal e se inclinou pegando César no colo – e você meu garoto? Como está lindo sweetheart — ela deu um beijo de esquimó nele.

Sonia encarou Viviene nervosa, sabia que ouviria sermões mais tardes, entretanto, quando seu olhar encontrou o de sua mãe, ela só conseguia ver compaixão em seus olhos. A mulher mais velha colocou o menino no chão e foi até a filha, chegando a sua frente ela a abraçou tão apertado quanto pode, sussurrando em seu ouvido.

Oh baby, eu sinto tanto! – Viviene afagou as costas da filha enquanto a abraçava.

— Obrigada mother, eu sei...

Se afastando um pouco ela sorriu grata e a mãe lhe perguntou:

— Como você está se sentindo meu bem?

— Melhor do que dois meses atrás...

— Venha, vamos para a sala – ela olhou para Pietro e sorriu para a garotinha em seu colo – Venha cá Pi, me dê essa princesa linda que a vovó estava morrendo de saudades dela – tomando Char de seu filho, ela beijou o rosto da menina.

— Ah – Pietro enlaçou a cintura da irmã enquanto caminhavam – tem alguém ansioso para vê-la na sala – Sonia o olhou curiosa e ele apenas sorriu.

—______________________________________

Hey Céci... Quanto tempo – o homem sorriu, indo até ela e a abraçando.

— Vic, realmente quanto tempo! – ela sorriu se afastando e o examinando de cima a baixo – Você está muito bem, o que anda aprontando?

— E você linda como sempre! Respondendo sua pergunta, eu não apronto mais, deixei essa vida apenas para Pietro, agora eu trabalho no escritório do meu pai integralmente...

— Que bom, fico feliz que pelo menos um de vocês criou juízo e cresceu – sorrindo, ela levantou uma sobrancelha para o irmão, que em resposta mostrou a língua para ela – Está vendo o que eu digo – eles sorriram.

— Mamãe eu estou com fome e cansada...

— Querida, mamãe já vai providenciar algo para vocês comerem – Cristal olhou para o lado curiosa ao notar Victor – Diga Oi para o tio Victor, não te ensinei boas maneiras?

— Desculpe mommy... Boa noite Tio Victor – ela terminou com um sorriso.

— Eu não acredito que aquela menininha já se tornou uma moça tão linda assim Sonia – o homem se ajoelhou e estendeu a mão para Cristal apertar, olhando para a mãe desconfiada e com um pedido de permissão nos olhos, ela apertou de volta quando Sonia concordou com um aceno de cabeça.

— Cacau amor, você não se lembra do Tio Victor? – ela acenou negativamente e Sonia arqueou uma sobrancelha inquisidoramente para o amigo – Isso é para você aprender a não sumir por tanto tempo... Bom, minha menina cresceu e ganhou mais dois irmãozinhos – ela chamou os gêmeos que já estavam no chão – Esses são Charlotte e César, sei que você não os conhece ainda...

— Olá – novamente ele estendeu a mão, cumprimentando as duas crianças e recebendo um sorriso de volta – Vocês são lindos e – ele olhou para Sonia – como forma de me desculpar por passar tanto tempo sem uma visita – voltou a olhar para os 3 filhos de sua amiga parados na frente dela – o que vocês acham de um passeio num playground super maneiro?

Os irmãos se olharam com um sorriso e balançaram a cabeça para Victor juntos, uma reação tão cronometrada que até pareceu ser ensaiada.

— Legal! – Cristal vibrou – Nós podemos ir mamãe?

— Sim meu bem, depois mamãe marca com tio Victor um dia, mas agora vamos tomar um banho enquanto eu peço para prepararem algo para vocês comerem...

Chéri— Viviene se manifestou – Eu já providenciei tudo, o jantar de vocês será servido assim que desejarem e quanto as crianças, tomei a liberdade de contratar duas babás em uma agência, minhas amigas que também são avós me recomendaram e elas te ajudarão no que precisar.

— Obrigada mamãe – Sonia se ergueu, arrumando a postura e tomando uma atitude defensiva continuou – mas não era preciso – ela tinha crescido, era uma boa mãe e sempre cuidara com zelo dos filhos, sua mãe precisava parar de vê-la como uma menina imatura – posso tomar conta dos meus filhos.

— Sonia, meu bem – Viviene apertou gentilmente os antebraços da filha, desarmando-a, não era de forma alguma sua intenção julgá-la – eu sei que sim, você tem feito um ótimo trabalho com eles – ela sorriu – tenho visto, entretanto também sei o quanto esse último mês não foi fácil – sua mãe deslizou carinhosamente as mãos, confortando-a com pequenos gestos e um olhar amoroso – além do mais a viagem também foi exaustiva, então deixe que Claire e Lucy cuidem dos gêmeos por essa noite, Cristal já sabe tomar de conta si por hora...

— Ok, obrigada, de verdade! – sorrindo, ela se inclinou e beijou a bochecha da mãe.

— Não foi nada, agora vamos acomodar vocês nos quartos e depois vá relaxar um pouco – ela concordou e seguiu rumo a ala dos quartos.

— Char, Cesinha, venham aqui com a vovó...

— Sim vovó – a menina respondeu primeiro.

— Essa aqui é a Claire, vai ajudar sua mamãe contigo minha princesa – a jovem senhora respondeu com um sorriso caloroso – e essa aqui é Lucy César, agora ela vai acompanhar vocês até o quarto e lhes dar um banho, tudo bem?

— Tudo – as crianças sorriram e logo as babás começaram interagir com eles, ganhando suas confianças.

— Cacau sweet, você pode tomar banho no quarto da vovó por enquanto se quiser, depois Mary vai servi-la...

— Mary está aqui vovó?

— Sim – ela sorriu piscando para a menina.

— Eu amo as comidas dela. Será que ela fez aquela torta de morango com calda de chocolate? – os olhinhos azuis da jovem brilharam.

— Hum... – Viviene fez suspense por alguns segundos, depois sorriu – Sim, ela fez, mas só após o jantar.

— Obrigada grandma— a garota saiu contente para o banheiro.

—_______________________________________

Na sala de estar estavam Guilhermino, Victor, Pietro e Viviene esperando por Sonia, as crianças já haviam comido e agora estavam sendo acomodadas em suas camas. Sonia estava com um robe de seda enquanto procurava uma roupa confortável na mala, quando ouviu uma batida e a voz de seu irmão soar logo em seguida.

— Posso entrar?

— Claro que sim – ela olhou rapidamente em direção a porta sorrindo e voltou a procurar uma roupa na mala.

Pietro se posicionou ao lado dela, Sonia conseguia sentir os olhos dele fitando-a, logo ela parou o que fazia e o encarou, seu irmão geralmente era um piadista, que sempre vivia com um sorriso e costumava não levar as coisas a sério, mas quando ela olhou em seus olhos, sua expressão era serena e compreensiva de uma maneira que ela nunca tinha visto. Ele a puxou para um abraço aconchegante e a apertou contra seu peito, logo sentiu-a suspirar e um soluço fino escapar.

— Oh minha querida, eu juro que te ver triste assim acaba comigo – ele enxugou algumas lágrimas que desciam pelo seu rosto com uma mão, o outro punho ele fechou e apertou tão forte que seus dedos ficaram brancos – Juro que estou me segurando para não ir até o México e socar Alexandre tão forte quanto eu conseguir que ele precisará de uma plástica naquela cara cínica dele... Ninguém magoa minha irmã assim, ele foi um cretino!

— Não Pi, não faça isso, não é necessário, ele irá pagar por isso por conta própria... Ele me magoou tanto, dói de uma forma que eu nunca imaginei que pudesse doer, é dilacerante... Mas eu estou bem, prometi que eu iria viver e procurar ser feliz pelos meus filhos.

— E quanto ao bebê?

— Você não falou nada com a mamãe não é?

— Não.

— Fui ao médico e estamos bem, mas Alexandre, nem as crianças sabem ainda... Você acha que a mamãe vai surtar quando eu contar? Estou esperando pelo sermão desde já...

— Calma love. Você é uma mulher adulta, independente, tem sua vida, seu dinheiro, nossa mãe não tem o direito de se intrometer nisso, apesar de você estar na casa dela, é temporário, logo seu apartamento fica pronto... Talvez ela se assuste um pouco com a notícia devido as circunstâncias, mas no fim vai acabar adorando ter outro netinho – ele sorriu a ela se aconchegou no peito dele, Pietro descansou o queixo na cabeça dela – Se você tivesse visto a empolgação dela arrumando tudo para a chegada das crianças, ela adora aqueles 3 pares de olhos azuis, por que não vai adorar mais um?!

— Porque o bebê pode acabar tendo os olhos do pai dele – ambos sorriram e se afastaram o suficiente para se encararem novamente.

— Acho que não, parece que nossa genética é mais forte – ele enxugou a lágrima solitária que ainda descia pelo rosto dela – Eu te amo minha Céci, conte comigo para qualquer coisa.

— O que deu em vocês hoje para usarem meu apelido de infância? Obrigada por tudo Pi, love you too. Eu vou terminar de me trocar e logo vou até a sala, preciso conversar com mamãe e tio Dolce, contar para eles... Vic sabe?

— Sabe que você está se separando, mas não o motivo. Quis vim para vê-la, estava com saudades. Foi uma ideia ruim?

— Não, não, de forma alguma. Victor é uma amigo querido, foi muito bom vê-lo.

— Quer que eu peça para ele ir?

— Eu prefiro ter essa conversa com mamãe sem a presença dele, não sei como ela irá reagir e não quero que ele veja uma cena. Mas deixe que eu mesmo o dispenso, quero marcar para fazermos algo juntos depois.

— Seu desejo é uma ordem senhora.

—_________________________________________

Após Victor ter sido dispensado calorosamente por sua amiga, com um café da tarde seguido por um passeio com as crianças agendado para o dia seguinte, Viviene e Guilhermino esperavam sentados no sofá da sala elegante e cheia de requinte, o bom gosto dela e o quanto dinheiro tinha refletia em cada cômodo do apartamento com 5 suítes e vista para o Central Park, desde o hall de entrada com paredes brancas e pé direito alto, decorado com pinturas cubistas adquiridas em algum leilão de artes, de onde Sonia vinha após acompanhar o amigo até porta ao quarto de hospedes que agora pertencia aos netos, ela não poupara gastos para agradar os pequenos, modificando boa parte do espaço disponível para acomodá-los da melhor forma possível, se tratando de Viviene, ela não perderia a oportunidade de mimá-los, afinal, eram seus únicos netinhos.

A mulher de 60 anos expelia beleza, não é atoa que no passado, no auge de sua carreira nas passarelas, recebeu vezes seguidas o título de mulher mais bonita do mundo, assim como sua filha. As mulheres Colucci compartilhavam um traço em comum, os olhos azuis claros, Cristal e Charlotte também o carregavam como prova. Os cabelos loiros claros, estavam na altura do ombro e eram muito bem cuidados, o rosto era delicado e suave, poucas marcas de rugas, o sorriso era como ver o de Sonia refletido, mas também se limitava a poucos traços incomuns entre elas, Pietro tinha lhe puxado muito mais.

Sonia chegou na sala e suspirou buscando força e coragem, caminhou até onde estavam e Guilhermino abriu espaço, logo ela sentou-se entre os dois. Pietro entrara no ambiente quase junto com ela e tomou lugar numa poltrona próximo ao sofá. Um tanto desconcertada, a mulher mais jovem começou sua história.

— Eu nem sei por onde começar... – a mãe apertou suavemente sua coxa, a encorajando – Ao mesmo tempo em que me sinto envergonhada por ter sido tão cega e tola, sinto raiva por ter sido traída, enganada por anos – Ela abaixou a cabeça, mexendo nos dedos.

— Querida, se isso lhe maltrata tanto, não fale, apenas saiba que estamos aqui para lhe apoiar – Viviene falou pegando seu queixo entre o dedo maior e o indicador, olhando em seus olhos.

— Sim meu bem – o tio disse com a mesma simpatia de sempre.

— Não, tudo bem, dói, acho que vai doer para sempre, mas agora não é tão latente como quando eu descobri. Vocês precisam saber de algo que não contei antes...

Os dois irmãos olharam para ela, olhos azuis idênticos, encarando-a com um misto de apreensão e preocupação.

— Mês passado, soube de algo que foi o pivô na minha decisão de voltar para NY – ela respirou fundo, encarou Pietro que acenou com a cabeça e continuou – estou grávida de novo – fechou os olhos soltando a respiração.

Um silêncio pairou sobre a sala, quando abriu os olhos novamente, buscou primeiro os olhos de seu tio, que sorriu e afagou sua bochecha, se inclinando um pouco e beijando sua têmpora.

— Minha querida, eu só posso dizer que isso é uma benção, no meio de tanta dor, receber um presente desses.

— No começo eu não pensei assim, mas depois, foi a única conclusão a qual pude chegar.

Viviene ainda se mantinha calada, mesmo ainda não tendo virado o rosto para encará-la, Sonia podia sentir os olhos da mãe fitando-a por trás, sua aparente apatia estava deixando-a aflita, tudo que ela menos precisava agora era de um discurso sobre acertos e erros, nem tão pouco aceitaria sua mãe lhe dizer que seu filhinho por nascer era um erro. Ela começava a pensar que ter pedido para ficar ali até organizar seu apartamento fora uma péssima decisão...

— Você está de quantos meses?

Sonia engoliu o nó na garganta e se virou, a expressão de sua mãe ainda era indecifrável, ou seria o nervosismo dela que não a deixou discernir?!

— A senhora não ouviu o que falei mamãe?

Oui, certamente, mas também lhe fiz uma pergunta. Fique de pé.

Intrigada, ela foi se levantando, aproveitando para respondê-la.

— Por volta da 13ª semana, fiz 3 meses alguns dias atrás...

Examinando-a de cima a baixo, Viviene falou:

— Você está muito magra para uma mulher grávida, os ossos da sua clavículas estão bastante visíveis, está se alimentando direito? Já foi a um médico? Já viu se está tud – ela começou a formular pergunta atrás de pergunta, sua voz demonstrando um tom de preocupação que Sonia foi obrigada a interrompê-la.

— Mãe – falou gentilmente – estou bem, nós estamos. Fui a médica logo após descobrir, porém preferi começar o pré-natal aqui. Eu sei que estou horrível, a doutora reclamou de minha magreza também, mas depois de tudo meu apetite só está voltando agora, a senhora sabe como tenho facilidade em perder peso...

  - Ma fleur, você não está horrível, seu rosto adere um rosado especial quando estás grávida, eu deveria ter percebido. Outra coisa, seu tio tem razão, essa criança é um presente para nós...

Viviene colocou algumas mechas do cabelo da filha atrás da orelha e sentaram-se novamente.

— Como aconteceu? Vocês estavam planejando mais um bebê? – sua mãe perguntou.

— Não, foi um acidente, eu não sabia que quando se toma antibióticos o efeito do anticoncepcional é cortado. Peguei uma infecção no pulmão após voltar da Suíça, quando Alexandre chegou, nós ficamos juntos uma vez antes de tudo acontecer e foi o suficiente para eu acabar engravidando.

— Acho que essa é a hora em que nós homens deixamos as mulheres a sós, não é Pietro?!

— Sim, boa noite – ele foi até elas, dando um beijo na cabeça de cada uma.

— Por favor, antes de vocês se retirarem, Tio, tenho um pedido a fazer. Não comentem sobre a gravidez com ninguém, Alexandre não sabe e eu pretendo que assim seja.

— Farei conforme desejar docinho.

Após os homens saírem, Viviene questionou-a:

— Por que você não vai contar ao Alexandre?

— Porque ele não merece saber sobre o bebê, enquanto eu puder manter isso escondido dele será assim, essa criança será apenas minha.

— Vou respeitar seu desejo, mas você sabe que está cometendo um erro...

— A senhora diz em relação a que precisamente? Ao meu casamento, ter abdicado das passarelas ou minha gravidez?

Viviene com muita classe suspirou e sorriu balançando a cabeça.

— A nenhuma das três coisas, você sabe a que me referi. Antes eu pensava assim, porém não mais hoje, você foi corajosa por lutar pela sua felicidade e pelo que realmente sonhava, mesmo eu tentando demovê-la dessa ideia.

— E no fim, você estava certa mãe, eu cometi um erro – Sonia colocou as duas mãos sobre o rosto pesarosa – Eu deveria ter lhe ouvido.

— Não! Não Sonia, VOCÊ estava certa meu amor! – Viviene pegou o rosto dela entre suas mãos e sorriu, os olhos brilhavam cheios de emoção – A culpa da infidelidade de Alexandre não é sua, fizestes tudo certo, lutou pelo amor e para formar uma família, muito linda por sinal, se tivesse desistido disso, eu jamais me perdoaria, pois nunca teria esse sentimento que me renovou, o amor pelos meus netos, por todos eles – uma das mãos desceu e descansou na altura do ventre da filha –  Essas crianças me ensinaram a ser alguém melhor, fecharam de vez a porta de um quarto escuro dentro de mim que ora ou outra eu costumava visitar.

Sonia se lançou nos braços da mãe a apertando forte, enquanto Viviene afagava suas costas.

— Eu não consigo entender mamãe, como Alexandre pode ser tão frio? Como ele pode fazer isso comigo? Com tudo que construímos? Ele parecia me amar tanto, era como se nada tivesse mudado desde quando nos conhecemos, apenas foi se tornando mais intenso com os anos... – sua voz falhou e as lágrimas guardadas começaram a escorrer por suas bochechas – Como eu não percebi isso antes? Como eu não vi os sinais?  E Deus... Por que dói tanto? É quase insuportável, é dilacerante, como se meu coração tivesse sido arrancado cruelmente do meu corpo e agora habita apenas um fantasma dentro do meu peito.

— Filha, eu sei o quanto dói perder alguém, mesmo que não tenha sido nas mesmas circunstâncias, mas meu coração ficou igualmente destruído, eu ergui muros ao redor dele, você bem sabe, entretanto, não me tome como exemplo, encontre a redenção que eu tardiamente encontrei nos seus filhos. Não se feche para o amor, pelo contrário, ame, ame o máximo que puder, tens amor de sobra em seu peito e lindas crianças para distribuí-lo... E eu estou aqui, seu tio, seu irmão, seus amigos, todos nós, prontos para ajudá-la com o que quiser.

Sonia suspirou sorrindo, agradecendo a mãe, que também chorava, Viviene enxugou as lágrimas da filha com as mãos e em seguida as suas próprias.

— Obrigada mãe, de verdade.

— Não precisa agradecer honey, errei muito contigo no passado, quero acertar agora – beijou sua testa e continuou – agora vá para seu quarto, descanse, estás precisando.

— Boa noite.

— Boa Céci.

—___________________________________

— Pode entrar Vivi – Guilhermino diz ao ouvir as batidas na porta do quarto que ele ocupava no apartamento da irmã, desde que fora morar com ela.

— Gui, você viu? O que eu mais temia aconteceu – ela foi caminhando até a cama onde o irmão estava deitado lendo um livro, ele afastou e bateu uma mão sobre o espaço ao seu lado, indicando que ela se sentasse.

— Querida, você se lembra da conversa que tivemos no casamento dela, enquanto dançávamos?! O que eu disse também aconteceu. Se um dia nossa menina tivesse o coração partido, nós estaríamos aqui para ela, mesmo que agora ela já não seja uma menina e sim uma mulher...

— Verdade – Viviene se acomodou melhor, apoiando as costas no encosto estofado de couro da cama – mas agora pouco quando ela chorou em meus braços eu me lembrei de quando ela apenas uma menininha e precisava de consolo, os olhos eram iguais, inocentes, sem entender porque coisas ruins acontecem e cheios de lágrimas.

— Vê-la assim me machuca tanto, Sonia não merecia isso. É difícil acreditar que Alexandre tenha feito uma coisa dessas...

— Eu senti como se fosse meu coração que estivesse despedaçado Guilhermino, na verdade até desejei absorver sua dor, nenhuma mãe suporta a dor de seu filho, é terrível... Esse doutor me parecia ser tão íntegro, realmente inacreditável, até cheguei a compará-lo com meu Arthur, porém, ele se mostrou muito diferente.

— Eu ainda desconfio de algo errado nessa história, sou homem Viviene, sei discernir um homem apaixonado quando vejo, isso porque é incomum, os olhos de um homem quando ele ama exalam um brilho especial dedicado apenas aquela que despertou sua afeição. Podia claramente ver isso no olhar de Alexandre, ele amava Sonia.

— Se amava, como pôde fazer isso? Ter um caso com a pupila? Uma traição era até fácil de entender, podia ser considerado um deslize, uma confusão dos sentimentos por passarem tanto tempo juntos, mas eles se envolveram por anos...

— Eu não sei como explicar, entretanto, sinto que algo não se encaixa...

— Irmão – ela pegou sua mão direita e apertou suavemente entre suas duas mãos – é difícil aceitar porque construímos uma imagem de Alexandre durante 9 anos, de repente, ele mostrou estar bem longe disso. Amor que é amor, jamais acaba ou se é trocado por mera luxúria, o verdadeiro amor dura por toda vida, acredite, sei do que falo. Meu coração pertenceu apenas a um homem até hoje.

Ok chéri, mas não se angustie, Sonia vai superar essa dor e nós estaremos aqui para ajuda-la. Veja a luz nisso tudo – ele sorriu para ela, animando-a – Vamos ter outro netinho para mimar.

— Sim – o rosto de sua irmã se iluminou – e agora estaremos mais perto de todos.

— Agora vá se deitar, você não parou hoje o dia inteiro, descanse, nossos netos precisarão de sua energia amanhã... Aliás, você precisará de energia para acompanhá-los.

Sorrindo, ela beijou sua bochecha e lhe agradeceu:

— Obrigada Gui, por ser meu companheiro sempre, olho para Sonia e Pietro e vejo o quanto são unidos, dou graças a Deus por meus filhos desfrutarem dessa relação tão maravilhosa entre irmãos, como nós. Ter um irmão que te entenda e apoie, é a melhor coisa do mundo.

— Você sabe o quanto te amo Vivi. Boa noite.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

e continua :)

Pietro: https://s-media-cache-ak0.pinimg.com/564x/19/6c/8e/196c8eabd7b4bdc478b568056d212a7c.jpg



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Estações" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.