Estações escrita por Emma


Capítulo 19
Folhas Secas


Notas iniciais do capítulo

Eu achei esse poema do início bem apropriado para a expressão do que a Sonia está sentindo, não sei a quem pertence, então não estou plagiando, se alguém souber de quem é darei os devidos créditos... No mais, espero que curtam, comentem e apreciem o drama que apenas começou, nos próximos capítulos mais coisas serão explicadas e algumas surpresas virão junto com alguns personagens novos (:



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“Achava que não podia ser magoada, achava que com certeza era imune ao sofrimento, imune as dores do espírito ou à agonia. Meu mundo tinha o calor do sol de abril, meus pensamentos, salpicados de verde e ouro. Minha alma em êxtase, ainda assim conheceu a dor suave e aguda que só o prazer pode conter.

Minha alma planava sobre gaivotas que, ofegantes, tão alto se lançando, lá no topo pareciam roçar suas asas farfalhantes no teto azul do céu.

Como é frágil o coração humano, um latejar, um frêmito. Um frágil, luzente instrumento de cristal que chora ou canta.

Então de súbito meu mundo escureceu e as trevas encobriram minha alegria. Restou uma ausência triste e doída, onde mãos sem cuidado tocaram e destruíram. Minha teia prateada de felicidade. As mãos estacaram, atônitas. Mãos que me amavam, choraram ao ver os destroços do meu firmamento.

Como é frágil o coração, espelhado poço de pensamentos. Tão profundo e trêmulo instrumento de vidro que canta ou chora.”

6 anos atrás...

Alexandre estava deitado com o peito para cima e os braços cruzados embaixo de sua cabeça, os olhos estavam fechados, mas ele não dormia, muito menos conseguia descansar...

– Eu posso ouvir você pensar daqui meu amor... – Sonia ergueu a face e encontrou os olhos castanhos do marido fitando-a.

– Você também não dormiu? – ele acariciou docemente suas bochechas.

– Você estava muito calado no jantar hoje e isso me preocupou, meu sono ficou leve desde que tivemos Cristal, mesmo ela já estando bem grandinha, eu ainda acordo pela madrugada e verifico-a... Mas eu estranhei o fato de que dessa vez quando eu acordei seus braços não estavam envoltos em mim... O que tem te perturbado dear?

O médico suspirou e se sentou, encostando-se a cabeceira da cama. Sonia levantou e se pôs sobre o colo dele, envolvendo seus braços ao redor do seu pescoço, enquanto o marido desenhava padrões invisíveis sobre suas costas.

– Alê, você sabe que pode me dizer qualquer coisa – terminou sua sentença com um selinho em sua mandíbula.

– Eu sei meu bem... É só que... O assunto é delicado baby... – ele suspirou cansado – Vila Real está sendo roubado – sua esposa o encarou atônita – os números não estão batendo, tem saído mais dinheiro que o necessário na compra de equipamentos, entre outros desvios que tem lesado outras áreas do hospital, como nosso trabalho filantrópico...

– Isso é terrível meu bem! – Sonia o encarava, os olhos azuis expressando tamanho choque e surpresa.

– Algumas das instituições que ajudamos até me contataram por email, estranhando o fato de não terem recebido o valor destinado há alguns meses... Querida – ela deslizava os polegares pelas laterais do rosto dele – você sabe que quem cuida da parte administrativa do hospital é o Dr. Vicente, ele distribui o dinheiro e organiza as transações, assina os cheques de pagamento... Além de mim, ele como proprietário dos 30% restantes é o único que tem acesso ilimitado as contas do hospital... Então, se não sou eu quem está causando os desfalques não pode ter sido outra pessoa... Preciso tomar uma providência, mas não sei qual! – ele bufou e abaixou a cabeça.

– Alexandre olhe para mim – o doutor levantou a cabeça e a encarou – você é a pessoa mais íntegra que conheço, posso ver o quanto isto tem te perturbado, porém meu amor, algo precisa ser feito, esta fraude vem prejudicando o Villa Real e as muitas pessoas que dependem dele, seja como funcionários ou como beneficiados...

– Então você acha que devo chamar a policia, um investigador ou algo semelhante?

– Eu acho que você deveria chamá-lo para conversar, confrontá-lo e depois deixar a justiça a cargo do que se fazer...

– Um escândalo desse não será bom para a imagem do hospital, tanto interna como externa... Eu estava pensando em fazer uma proposta a ele...

– Alexandre! Esse homem cometeu um crime, precisa se acertar com a justiça!

– Sonia, eu sei, eu sei... – ele suspirou – Mas ele tem família, tem um filho que o admira tanto que está estudando para cursar medicina, não posso simplesmente acabar com a imagem dele – ela o olhou e sorriu, seu marido realmente tinha um coração de ouro – Por isso pensei em propor que para não mandá-lo para cadeia ele...

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Hospital Villa Real – Manhã seguinte...

Sentado em sua mesa, Alexandre ouve uma batida na porta. Suspirou, era o momento...

– Entre.

– Olá Alexandre – a figura de um homem grisalho, corpulento e um pouco desgastado pelos seus 50 anos se projetou parcialmente para dentro do ambiente – Pediu para me chamarem?

– Vicente, bom dia! Por favor sente-se – ele caminhou e obedeceu ao comando – Tenho algo sério para tratar com você! – No mesmo instante Alexandre percebeu a tensão se apoderar do médico mais velho.

– Qual assunto? – Vicente tentou disfarçar e se fez de desentendido.

– Você sabe muito bem do que se trata – Alexandre o olhou duramente – Não precisa de todo esse teatro, eu e você sabemos que tens roubado o hospital...

O cirurgião mais velho abaixou a cabeça.

– Como você descobriu?

– Posso até parecer ser ingênuo, mas não sou estúpido Vicente! Eu sempre verifiquei as finanças, mas ultimamente eu estive muito ocupado conciliando minhas cirurgias com a nova especialização que não pude manter a vistoria... Nunca imaginei que se aproveitaria disso, eu confiava em ti... Os últimos desfalques não foram nada sutis, desviou quantias altíssimas, deixou de repassar a quantia da caridade... Isso é inaceitável! Porque fez algo assim?

Vicente levantou a cabeça com o olhar de desdém, respondendo:

– Você quer a verdade?

– Claro!

– Fiz isso por sua culpa Alexandre! Estou cansado de viver as suas sombras... Você é o “melhor médico desse hospital”, aliás, “o melhor cirurgião plástico de toda América”, como se já não fosse o bastante resolveu agora que quer ser neuro... Foi o melhor da classe em Harvard, ganhou como melhor monografia, é casado com a modelo eleita 5 vezes seguidas a mais bonita do mundo, agora tens aquela garotinha adorável, todos nesse lugar te adoram, todos querem uma consulta com você, tudo é sobre você quando deveria ser sobre mim! – ele se levantou irritado e começou a caminhar de um lado para o outro em frente a mesa.

Chocado, Alexandre também se levanta e cruza os braços...

– Então a culpa de teres roubado o hospital é minha? Por que eu procurei sempre dar o meu melhor em tudo o que faço? Por ter encontrado minha mulher, me apaixonado e decidido formar uma família? Por ser gentil e educado com todos? Por querer mais para minha vida profissional e para o meu empreendimento? A culpa é minha e não o fato de você ter se acomodado com a posição que tinhas?

– Eu te ensinei tudo quando você chegou aqui, para no final me passares a perna! – ele o fitou rancoroso – Era para todo esse prestígio e reconhecimento ser meu!!

O doutor Del Rio bufou e respirou profundamente:

– Sou extremamente grato por tudo o que você me ensinou, por todo apoio quando vim para o México... Eu sempre busquei demonstrar minha gratidão, te incluindo em todas as pesquisas ou mesmo quando te emprestei o dinheiro para comprares o restante das ações, poderia ter comprado tudo, porém te ofereci sociedade e deixei os 30% para ti... Vicente, tudo o que eu fiz foi investir meu tempo, conhecimento e dinheiro nesse lugar... Se você tivesse feito o mesmo, também teria crescido...

– Era para eu estar sentado nessa mesa e não você!

– Realmente era, se tivesse trabalhado tão arduamente quanto eu trabalhei! A medicina se atualiza diariamente, nós precisamos acompanhar isso! Foi você quem decidiu cuidar da administração do hospital, deixando as pesquisas e cirurgias em segundo plano, eu não pedi nem lhe obriguei a nada! Pelo contrário, eu sempre te admirei, seu talento, mas você deixou isso de lado, deixou seu coração se encher de ganância e olha onde isso te levou...

– E o que você vai fazer agora – Vicente perguntou com ironia e ódio recheando sua voz e semblante – Chamar a polícia?

– Eu deveria... Mas não quero manchar a imagem que sua família tem de você...

Ele riu friamente para Alexandre:

– Ohh... Não se dê o trabalho, Miranda já deu entrada nos papéis do divórcio, não importa o quanto eu tenha tentado agradá-la, boa parte do dinheiro roubado gastei presenteando-a...

– Eu disse a você que ter um caso com sua secretária ia prejudicar seu casamento!

Vicente se aproximou de Alexandre, apenas a mesa entre eles, apontando o indicador na sua face acusadoramente.

– Claro! Foi você quem contou a ela não foi?!

Alexandre negou veemente.

– Eu não! Não é do meu feitio me intrometer na vida de ninguém, como tratas sua família não é problema meu, apenas lhe adverti pelo fato de tê-lo pego em uma situação muito constrangedora aqui no hospital, mesmo que tenha sido na sua sala... Mulher nenhuma gosta de ser engana e acredite, elas sabem quando são!

– Miranda já me odeia – sua expressão de desdém deu lugar ao temor – agora a única pessoa que ainda me admira e se importa comigo também me odiará... – ele encarou Alexandre, seus olhos vermelhos, algumas lágrimas presas – Lucas é tudo para mim, você sabia que ele está em uma turma de pré-vestibular específica para medicina? – Alê acenou com a cabeça, se compadecendo do homem a sua frente, que agora havia sentado na cadeira novamente – a única coisa boa que me resta, ou melhor restava... – abaixou a cabeça derrotado.

– Eu não vou denunciá-lo Vicente – ele falou calmamente também se sentando, o médico mais velho o encarou surpreso.

– Por que você faria isso?

– Porque eu também tenho uma família, Sonia me admira tanto quanto me ama, Cristal só tem 2 anos e acha que eu sou o super herói dela, o mais forte e invencível de todos – Alexandre abriu um sorriso discreto com a lembrança de sua menina encantadora – eu odiaria que um dia alguém destruísse a imagem que elas tem de mim... Não vou arrancar de Lucas o ideal que ele criou de você, espero que também faça o mesmo mais na frente com suas atitudes!

Vicente suavizou sua expressão, olhou alguns centímetros à esquerda fixando sua atenção em uma foto de Alexandre, Sonia e Cristal, a Torre Eiffel ao fundo, o doutor Del Rio seguiu seu olhar, esperando a pergunta que ele sabia que viria...

– E quanto isso vai me custar? Qual o preço do seu mais novo “ato de bondade”?! – novamente se encararam.

– Eu não quero dinheiro algum ou favor, na verdade eu tenho uma condição...

– Qual seria?

– Não vou denunciá-lo, mas infelizmente não posso aceitar que continues aqui no Villa real, principalmente como sócio proprietário – a respiração de Vicente começou a ficar mais rasa, suas mãos sobre a mesa se fechando – Quero que passes para o meu nome sua parte nas ações do hospital e que por favor se demita!

– Não! Seu cretino! – Vicente gritou irado e socou a mesa com força – Então esse era seu “ato de bondade”?! Você não pode me obrigar! Tenho direitos também!

– Vicente me escute! – Alexandre elevou a voz acima de dele e o homem se calou – Eu não havia terminado! – respirando para se acalmar continuou – Como eu mesmo paguei por elas, vamos somar o quanto elas valorizaram e vou lhe dar a diferença, também vou lhe pagar todos os benefícios que tens direito. Só não posso mais tê-lo trabalhando aqui, desculpe, mas minha boa opinião uma vez perdida, perdida para sempre...

– Era tudo o que você queria não?! Se livrar de mim e ter o Villa Real finalmente para você?! Seu infeliz! – ele se levantou indignado e socando a mesa mais uma vez – Eu trabalho nesse hospital desde quando ele ainda era apenas um projeto no papel e você quer me tirar daqui!

– Eu nunca quis que as coisas fossem assim! Você foi corrupto, cometeu um crime e trilhou sua sentença! Estou querendo lhe dar uma alternativa de não ir para cadeia, além de estar sendo generoso com a quantia que receberás... Eu podia muito bem não lhe pagar nada, justamente para cobrir os desfalques que cometestes... Veja – ele estendeu os documentos a sua frente – leia as cláusulas e assine se achar que deve!

Vicente leu o contrato onde ele passava o título de suas ações para o Alexandre, as cláusulas eram justas e o valor final que receberia era no mínimo satisfatório, mas nada disso o impediu de odiar ainda mais seu sócio. Após assinar os papéis o homem se levantou e apontou o dedo indicador ameaçadoramente para o Dr. Del Rio:

– Isso não termina aqui Alexandre! Você vai me pagar por tudo o que me fizeste, eu vou me vingar de ti aonde mais vai te doer – ele olhou na direção do porta retrato mais uma vez e Alexandre sentiu um frio na espinha – Vou destruir você e a imagem que construiu! Nem que seja a ultima coisa que eu faça!

Alexandre também se levantou, impondo-se:

– Eu fiz tudo o que fiz para poupar sua família de um constrangimento enorme por sua causa, mas se você chega perto da minha família, eu juro que te ponho atrás das grades! – agora o doutor assumiu uma posição intimidadora e um olhar frio – Ouse ameaçar minhas meninas de novo e vais estar dentro de uma cela em um piscar de olhos, tenho provas guardadas contra você! Agora por favor, se retire da minha sala, nossos negócios estão encerrados!

O homem mais velho lhe lançou um último olhar de ódio e saiu da sala jurando que aquela não seria a última vez que eles se veriam, e na próxima, Alexandre se arrependeria...

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CAPITAL MEXICANA – DIAS ATUAIS...

– O QUE? – ele bradou indignado – Não! Não vou dar divórcio nenhum! Se acalme Sonia – ela respirou profundamente mais uma vez e se virou de costas para ele – Não podemos simplesmente acabar com tudo assim... Pense na nossa história, nossa família...

– Assim como você pensou quando resolveu ter um caso com sua pupila?! – ela continuava de costas com os braços cruzados abaixo do peito, se protegendo e forçando respirações longas para que mais lágrimas não descessem por seus olhos...

– Por favor Sonia, vamos conversar... – Alexandre suplicou mais uma vez.

– Eu não tenho condições nenhuma de conversar contigo hoje, olhar para você está me destruindo Alexandre – ela falava sobre os ombros – preciso do máximo de distância possível de ti... Eu estou indo para casa de Helena, minha cabeça está estourando de dor, preciso ver como ela e as crianças estão...

– Eu queria vê-los...

– NÃO! – ela se virou de uma vez – Não entendeu que eu preciso ficar LON-GE de você?! Não quero que fique perto de nenhum de nós por enquanto...

– Mas Sonia, eu senti falta deles...

– Não! Não vou mudar minha opinião sobre isso!

– Então quando? Porque nós precisamos de uma conversa civilizada, você precisa me ouvir e ver que isso não é verd...

– JÁ CHEGA! – ela bradou e um silêncio mortal que durou alguns rápidos segundos pairou sobre eles – Estou cansada de te ouvir falar isso Alexandre! – Sua voz agora era estranhamente calma, quase um sussurro cansado – Se você realmente tem alguma consideração por mim e por seus filhos como dizia, não nos procure por enquanto, me dê um tempo, ok?!

Ela se virou e sua expressão quase o derrubou, agravando a sua própria de derrota. Sonia passou por ele, ambos com suas cabeças baixas e lágrimas prontas para serem derramadas horas a fio. Alexandre seguiu o rastro dos pés de sua esposa e viu quando eles a levaram para longe dele, sentindo-se um inútil por não poder fazer nada para trazê-la de volta para si, sentou-se na cama arrasado, tentando ele próprio entender o que estava acontecendo, com um suspiro triste e desesperançoso ele sentiu em sua pele o caminho quente e molhado que as lágrimas desenhavam pelo seu rosto...

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Sonia abriu a porta principal da casa de sua amiga, olhando ao redor percebeu Helena saindo do corredor da cozinha com o resto de uma maçã na mão esquerda e acabava de abaixar o celular da orelha com a outra. Quando a amazona a notou sorriu e disse:

– Era meu pai, ele me liga milhares de vezes por dia, tenho certeza que além da preocupação padrão do Sr. Inácio, tem dedo de Heitor nisso – ela sorriu ainda mexendo no telefone e foi se aproximando de onde Sonia estava parada de cabeça baixa desde o momento em que entrara – Pensei que você viria só mais tarde... Onde está Alê? – A mais jovem da senhora soluçou suavemente levando Helena a desfocar a atenção do objeto em suas mãos, colocando ambos sobre a mesa redonda do hall de entrada e enfim se dando conta do estado da amiga - Sonia? – ela quebrou a distância entre elas e levantou o rosto delicado da ex-modelo – Oh minha nossa! O que aconteceu? Por que você está chorando assim querida?

Sonia apenas se lançou nos braços de Helena a apertando com força e chorando com rosto em seu pescoço. A mulher de Heitor devolveu o abraço com todo carinho que possuía, tentando acalentar sua amiga, assustada e compadecida pelo estado da pessoa tão preciosa em seus braços, que rompia em lágrimas diante dela.

– Querida, você quer me dizer o que aconteceu? – ela acariciava seus cabelos e a balançava como se fosse uma criança. Sonia acenou com a cabeça positivamente – Foi algo com Alexandre? – automaticamente o corpo de Sonia endureceu e as fungadas aumentaram, molhando a pele e a gola da roupa de Helena, que logo imaginou o pior – Ele está bem? – a Sra. Del Rio se acalmou um pouco, puxando uma respiração profunda e afastando o rosto do pescoço da amiga para poder encará-la.

Em todos os anos em que conviveram juntas e compartilharam suas vidas, Helena nunca tinha visto tanta tristeza nos lindos e meigos olhos azuis de Sonia. Aquilo partira seu coração. Ela apertou carinhosamente os braços da amiga e sorriu lhe dando apoio. Mais uma respiração profunda e Sonia finalmente conseguiu falar.

– As crianças... – sua voz era poucos decibéis acima do considerado um sussurro – já estão dormindo?

– Os gêmeos conseguiram fazer Gabriela dormir junto com eles, aliás, eu acho que você poderia trazê-los aqui mais noites porque essa menina está impossível – Helena tentou quebrar a tensão do momento, Sonia riu, uma faísca de sorriso que logo sumiu – Cristal e Henrique ainda estavam acordados quando desci, estavam assistindo um filme...

– Helena... – ela suspirou cansada, lágrimas embaçando seus olhos novamente - Você se lembra quando um dia me disse que se eu precisasse, seria aquele ombro amigo no qual eu poderia chorar?! – a amazona concordou com um movimento de cabeça – Hoje eu preciso dele mais que nunca! – ela então desabou, qualquer barreira que ela tinha conseguido manter, qualquer que fosse o apoio que a matinha em pé rompeu e Sonia cedeu, lágrimas e mais lágrimas tristes e desoladas fluíam dela, a cabeça baixa e os braços envoltos em torno de si. Helena conhecia esse sentimento, reconhecia essa dor, o coração de sua irmã estava quebrado.

– Oh minha querida – ela abriu os braços e Sonia novamente apoiou a bochecha no ombro da amazona – Chore o quanto quiser – envolvendo a figura magra da amiga em um abraço, beijou sua cabeça – Vamos lá pra cima...

Ainda abraçada a Helena, agora de lado, o rosto descansando no ombro e lágrimas vazando com uma represa que rompeu e sem previsão de reforma, ela foi guiada pela amiga escada acima até entrarem no mais amplo quarto da casa e Helena sentar na cama, acomodando Sonia, até que esta estivesse com a cabeça deitada em seu colo.

Depois do que pareceram horas de choro fino e ininterrupto, soluços suaves e extremamente dolorosos, as mãos macias de Helena continuavam alisando docemente os cabelos castanhos claros e lisos. Com um último suspiro sofrido Sonia finalmente começou a falar:

– Eu não sei nem por onde começar... Estou tão perdida com o que acabou de acontecer...

Sonia puxou outra respiração profunda, seus olhos encontraram um ponto na parede do quarto de Helena e lá estava seu foco. Helena mesmo com a barriga saliente conseguia olhar na direção dela, enquanto afagava seus cabelos e desenhava padrões suaves em seus braços. Ela nada falou, deixou Sonia seguir seu discurso, apenas se mantinha acariciando-a, para saber que estava ali e que poderia contar com ela.

– Alexandre me traiu...

– O que? – o susto de Helena foi tão grande que ela falou sem notar que havia se expressado.

– Você tinha razão com relação a Melissa... Ela e Alexandre tinham um caso há não sei quanto tempo...

– Oh meu Deus! Sonia quando eu lhe advertia sobre aquela mulher era por não confiar nela, mas nunca duvidei do Alê, como eu poderia?! Você tem certeza disso?

Sonia concordou com a cabeça, apertando os olhos e mais lágrimas escorriam por sua face, Helena se inclinou e conseguiu pegar na gaveta do criado uma caixinha de lenços e deu a amiga, retornando os carinhos gentis.

– Eu também não imaginava, nem por um minuto se quer eu suspeitei de nada, Alexandre soube me enganar muito bem – ela engoliu o nó que se formou em sua garganta – Ou talvez eu tenha estado tão apaixonada por todos esses anos que não consegui ver o que estava acontecendo diante dos meus olhos...

– Meu bem como você descobriu isso? Pegou eles em fragrante, por que essa será a única forma em que eu acreditarei que Alexandre estava tendo um caso... Isso é inconcebível para mim! Foi ela quem lhe disse isso não foi? Não acredite! Ela só está querendo roubar seu mar...

– Helena! – Sonia ergueu-se, encarando sua amiga e falou mais alto do que o padrão com que falava toda noite desde que entrara no quarto – Eu mais do que qualquer um sei que é difícil de acreditar – ela suspirou – mas tenho provas e se eu juntar as pequenas evidências fica claro... – Sonia balançava a cabeça negativamente enquanto deu um riso amargo – Todas as viagens, noites no hospital ou mesmo na minha casa, horas a fio trancados juntos, em tudo o que Alexandre ia fazer Melissa tinha que estar junto... Ele passou um mês na companhia dela na Suíça! Você pode cogitar o quão doloroso é imaginar que depois de passar o fim de semana comigo naqueles chalés, ele a levou lá com o mesmo propósito?! Eu não quis ficar na minha própria casa Helena porque a ideia dele e dela juntos na minha cama me faz estremecer...

– Não diga isso! Alexandre não seria capaz... – Sonia virou a cabeça 90° graus encarando sua amiga.

– Não? Eu já não sei, nem mesmo acredito se o Alexandre que conheci existe ou é alguém que eu construí na minha imaginação...

Sonia deu uma fungada e secou as lágrimas com outro lenço, deitando-se novamente, seus olhos voltaram no mesmo ponto aleatório do início da conversa, encolhida e com a cabeça descansando sob um travesseiro no colo da amiga.

– Me conte o que aconteceu para eu entender então... Na última mensagem que me mandou, vocês tinham chegado em casa bem...

Um silêncio se estabeleceu de novo, Helena esperou pacientemente, permanecendo com os toques suaves em sua amiga, aproveitando para acomodando-se melhor a cabeceira estofada de sua cama, encaixando os travesseiros da melhor forma possível para seu conforto, realmente estar grávida de gêmeos era bem mais cansativo, as dores apareciam mais cedo que o normal, logo ela foi tirada de seus pensamentos pela voz de Sonia:

– Eu fui buscá-lo no aeroporto, seguimos para casa normalmente e depois fomos para o quarto na intenção de desfrutar do jantar que havia preparado pra ele. Dei-lhe o presente e então eu insisti para que pulássemos o jantar e assim fomos parar na cama. Depois de um tempo levantamos para comer, Alexandre foi na frente tomar um banho, eu prometi que logo o seguiria, mas primeiro iria lhe enviar uma mensagem para saber das crianças, foi quando vi a notificação de mensagem de um número desconhecido... Ao abri-la, me deparei com várias fotos de Alexandre e Melissa nus numa cama, em um dos chalés na Suíça.

– Você tem certeza que era Alexandre mesmo? Pode ser alguma montagem, isso é tão frequente na internet... Talvez tenha sido alguma brincadeira de mal gosto de alguém! Tinha algo escrito?

– Helena... Eu sei reconhecer uma imagem adulterada, Pietro adora fotografar e fazia vários trabalhos como tal, inclusive fotos minhas, aprendi como esses softwares funcionam. Por mais que eu queira acreditar que não, a verdade é que realmente era ele, eu sei reconhecê-lo, ele é meu marido... – Sonia engoliu outro nó em sua garganta – Em uma das fotos eu... Eu vi um sinal de nascença que ele tem na parte externa da coxa esquerda, César herdou um igual... O texto era pequeno, dizia que já estava na hora deu conhecer a verdade sobre Alexandre Del Rio... Eu nem quis ouvi-lo, ele negou, será que eu pareço mesmo uma garotinha burra Helena?! – ela se virou e a amazona acenou negativamente com a cabeça – Não tinha condições de escutar nada, muito menos permanecer no mesmo lugar que ele, então eu disse que queria o divórcio, ele disse que não me daria de maneira nenhuma, pedi um tempo, distância, qualquer coisa que o mantivesse afastado e sai...

– Isso não faz sentido algum... – Helena tentava assimilar tudo, mas faltava algo, era como um quebra-cabeça cujas peças não se encaixavam, nada parecia fazer sentido – Alexandre nunca agiu como um homem que trai a esposa... Seria muito mais fácil para mim aceitar que meu próprio marido tinha uma amante do que Alê, nunca foi do feitio dele...

– Ele pode ter se apaixonado por ela...

– E qual propósito de manter você então? De trata-la bem, de amá-la e ser tudo o que ele sempre foi?

– Eu não sei, não sei... Talvez as crianças ou sua carreira, o hospital... Não sei! Na verdade ele estava bem distante de uns tempos pra cá. Eu não falei nada porque pensei que tinha haver com a tese e com toda a responsabilidade que a rede Del Rio trás... Mas agora – ela esboçou um riso amargo – Eu realmente entendo o motivo... Eu quase tive de implorar para fazermos amor hoje... Oh meu Deus! Que vergonha! – ela cobriu o rosto com as mãos – Ele veio com a desculpa de que eu tinha ficado doente nas últimas semanas e que ele não queria me prejudicar... Mentiroso! Provavelmente já devia estar saciado do tempo gasto com aquela vadia! Estou com tanta raiva dos dois Helena! Por me enganarem e mentirem pra mim tão descaradamente... Porém ao mesmo tempo dói tanto, eu sinto como se meu coração fosse desintegrar de tanta dor... – novamente ela começou a chorar agarrando um dos travesseiros sobre a cama e com o rosto enterrado no colo da amiga, que não havia parado de acalentá-la até então.

– Sonia querida, chore, chore a vontade, eu conheço a sensação de ter um coração partido, dói muito, mas eu estou aqui por você... Ouça algo meu bem – ela virou para encarar Helena – Me prometa que vamos nos aprofundar acerca dessa história, por que isso está muito mal explicado, quero ouvir Alexandre depois e você também terá de fazer o mesmo...

– Não sei. Eu não quero vê-lo...

– Mas você precisa! – Helena beijou sua testa suavemente – Você não pode jogar sua família pelos ares até ter certeza de tudo o que aconteceu, ok?! – Sonia concordou relutante – Agora descanse e acalme-se querida.

– Obrigada! – ela deu um sorriso aguado e beijou docemente a barriga de Helena.

– Você não tem pelo que agradecer – depois de receber um sorriso de Helena, a ex-modelo fechou seus olhos, tentando conter as lágrimas que insistiam em jorrar. Sonia apertava a mão direita sobre seu peito tentando extinguir a dor, que parecia aumentar a cada minuto. Entre lágrimas e soluços silenciosos ela pensava: “Por que Alexandre? Por que? Nunca vou perdoá-lo... Deus, por que dói tanto?”

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– Alê – Heitor respondia abrindo a porta de seu apartamento – tudo bem? Você me ligando esse horário ai no México não pode ser coisa boa... Ah meu Deus... Aconteceu algo com Helena? – ele começou a ficar angustiado, deixando sua pasta cair.

– Calma Heitor – a voz rala do doutor chamou a atenção de seu amigo – Helena está bem... – o engenheiro suspirou aliviado e recolheu o objeto que caíra do chão – Aconteceu sim alguma coisa, estranha e terrível, porém comigo e Sonia, algo que nem sei como explicar...

– Como assim Alexandre? – indagou confuso recolhendo o objeto.

– Eu – ele suspirou cansado, ainda sentado no mesmo lugar, sua voz falha pelo choro de momentos atrás – cheguei de Genebra e ela foi me recepcionar no aeroporto, depois fomos para nossa casa, as crianças estavam com Helena, Sonia tinha preparado um jantar especial de boas vindas e então acabamos na cama. Estava tudo bem, como sempre, então entrei no chuveiro para tomar banho, esperando por ela que nunca chegou. Ao retornar para o quarto ela estava chorando e irada, acusando-me de traição e logo mostrou dezenas de fotos minha na cama com Melissa – Heitor arregalou os olhos tamanha sua surpresa ao ouvir sobre a suposta traição de Alexandre...

– Alê... Eu realmente não posso acreditar que estavas tendo um caso com Melissa – confessou chocado –... Meu Deus! Porque você não me contou isso antes? Não – ele balançou a cabeça – Tudo bem você me pegou, agora pode parar com a brincadeira – Heitor sorriu, mas do outro lado da linha, só um gemido triste e um suspiro de frustração.

– Heitor, tudo o que eu mais queria era estar brincando, mas é verdade... – ele foi interrompido pelo amigo.

– Cara como deixou isso acontecer? Você sempre amou sua esposa, achei que estavam bem...

– Me ouça, por favor – o médico pediu cansado – esse é o grande ponto... Eu não traí minha mulher. Não tinha por que fazer isso, a amo e estou feliz com ela, não sei explicar como eu e Melissa fomos fotografados nus numa cama, eu nunca tomei liberdade alguma, muito menos a deixei ter esperanças sobre nós...

– Não existe de nenhuma forma, a possibilidade de você ter passado da conta nas bebidas e tê-la convidado para seu quarto de hotel?

– Por Deus Heitor! Eu não bebo mais que 3 drinks, ainda mais em um evento como o que eu estava, nunca fui fraco para bebidas, nem na universidade, quanto mais agora que sou um homem crescido e pai, você melhor que ninguém sabe disso... Além do mais, eu saberia se tivesse acordado com outra mulher que não a minha ao meu lado...

– Então de fato temos um problema – caminhou até uma mesa com bebidas e se serviu de um copo de Johnnie Walker – Você tentou dizer isso a Sonia?

– Sim...

– E claro, ela não acreditou...

– Não... Heitor, você não tem ideia do quão doloroso foi vê-la me olhando com tanto desprezo, pedindo para eu me afastar, dizendo que tinha nojo de mim... Cara, eu realmente fiquei arrasado. Não entendo porque ela não quis me ouvir, nunca dei motivos para ela duvidar do meu amor... Eu juro pelos meus filhos que não traí Sonia!

– Meu amigo, eu acredito em você! Conheço demais sua honra e integridade para duvidar da veracidade do seu caráter, mas sua mulher está chateada e confusa no momento... Me lembro quando Helena pensou que eu a traí com Bianca... Íamos ter nossa primeira noite juntos e o que era para ter terminado em amor, acabou com uma amazona muito irada e no mínimo me odiando... Você se lembra?

– Sim...

– Lembra-se do que me aconselhou também? Que eu deveria dar um tempo a ela, para ajustar suas emoções...

– A situação é diferente Heitor, Sonia me odeia tenho certeza, eu perdi minha mulher cara...

– Alexandre Del Rio, pare com isso e por favor me ouça! Ela realmente está magoada, viu algo que qualquer mulher que ama seu marido não suportaria ver, porém como eu disse, ela o ama, vocês tem uma família juntos... Quando estiverem mais calmos e conseguirem agir pela razão e não pelas emoções como agora, tudo ficará mais claro, Sonia vai repensar e ver que realmente és inocente, diferente da minha italiana sangue quente – Heitor riu com saudade de sua esposa – você tem uma mulher calma e doce, tenho certeza que ela irá ouvi-lo...

– Você realmente acha isso? Pela forma como Sonia me olhou eu receio acreditar...

– Então tenha fé meu amigo! – Alexandre conseguiu rir lembrando-se das palavras que ele próprio proferiu ao amigo anos atrás...

– Eu realmente preciso de fé agora...

– Amanhã você vai conversar com Melissa e ver o que ela sabe disso... Só por precaução, tome cuidado, Helena nunca gostou dessa moça e quando minha mulher não gosta de alguém dificilmente ela erra o julgamento...

– Eu acho que ela sabe tanto quanto eu Heitor, Melissa é inofensiva, se não teria comentado algo na nossa volta para cá...

– Meu amigo, você é muito bondoso, não vê maldade em ninguém... Fique de olhos abertos, a punhalada pelas costas vem de quem menos esperamos!

– Ok, eu ficarei, mas acredito que ela não tenha culpa...

– Se você diz... Então, primeiro nós precisamos descobrir quem foi o imbecil que fez isso contra você... Tens alguma pista de quem poderia querer destruir sua imagem dessa maneira?

Alexandre começa a pensar, não conseguindo conjurar quem poderia querer lhe atingir de forma tão baixa, sempre buscou não fazer inimigos, mas pelo visto havia falhado.

– Alexandre? – Heitor o trouxe de volta a conversa.

Como em um estalar de dedos, sua mente viajou a uma conversa anos antes, em sua sala no ainda Villa Real, onde um homem jurou destruí-lo e lhe arrancar o que tinha de mais precioso, sua família.

– Sim, eu sei quem foi.


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Notas finais do capítulo

Beijos! Até o próximo, farei o possível para não demorar tanto tempo novamente, porém minha vida é corrida huahaua



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