Contos de Halloween escrita por Mallagueta Pepper


Capítulo 5
O espelho - Primeira parte


Notas iniciais do capítulo

Não há nada a temer a não ser o próprio medo.



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Capitão Feio se debatia no chão gritando desesperadamente.

– Não, isso não! O horror! O horror! Limpo demais! Perfeito demais! Me tirem desse pesadelo!

Os jovens ao seu redor viam somente um homem rolando e gritando. Por que ele tinha ficado daquele jeito? O que tinha acontecido?

Tudo começou quando o museu da cidade recebeu um artefato muito antigo e valioso. Franja estava empolgado com o valor histórico que ele tinha. Tratava-se de um grande espelho feito de ouro e pedras preciosas. Mas não era um espelho qualquer. Pela datação do carbono, aquela relíquia devia ter pelo menos dez mil anos de idade, o que deixava todos intrigados, pois pelo que ele sabia, o espelho tinha sido inventado muito depois disso.

Qual povo ou civilização seria tão avançado a ponto de criar algo que estava milênios a frente do seu tempo? O que eles não esperavam era que o Capitão Feio também estivesse interessado naquele artefato e o roubou do museu, levando para seu esconderijo nos esgotos.

Cascão decidiu persegui-lo e os outros foram atrás para evitar que o amigo se machucasse. Até DC acabou indo porque se preocupava com a Mônica e não queria deixá-la sozinha com o Cebola. Encontrá-lo não foi difícil e sequer houve luta, porque quando chegaram, ele já estava rolando no chão e gritando como um louco.

– Eu heim, mó doideira! – Cascão falou coçando a cabeça quase sentindo pena do homem que gritava e se debatia.

– Será que esse espelho está amaldiçoado? – Mônica perguntou receosa.

– Eu não sei... não consigo sentir nenhum tipo de energia ruim nele. É tão estranho... – Magali respondeu.

Cebola pegou um grande pano velho e cobriu o espelho.

– Seja como for, é capaz de ele ter ficado assim porque olhou pra esse espelho.

– Como sabe disso? – DC perguntou com desdém.

– Porque é um espelho, seu Mané. As pessoas sempre olham em espelhos e ele deve ter se olhado também.

– Blé, sempre pensando no óbvio.

– Tá bom, gênio, qual é a sua teoria?

– A de que alienígenas minúsculos entraram no cérebro dele pra fazer uma aula de zumba enquanto tomam suco de caqui com mostarda e... – alguém o puxou pela orelha.

– Afe, ninguém merece! Sossega o facho, DC! - Mônica o repreendeu. Aquelas maluquices eram engraçadas de vez em quando, mas não naquela hora.

O rapaz sentiu-se frustrado. Cebola fez uma dedução que podia ser boa, então ele não podia ficar atrás daquele carequinha. Com a intenção de provar que ele estava errado, o contrariado correu para o espelho e tirou o pano. Mônica gritou.

– O que você tá fazendo?

– Vou provar que esse Zé ruela aí tá errado. Viu? Eu tô me olhando no espelho e não aconteceu nada! – o rapaz chegou bem perto, olhou seu reflexo e até dançou em frente ao espelho enquanto todos olhavam preocupados. Como não aconteceu nada, ele virou-se para o Cebola com um sorriso triunfante, feliz por provar que aquele careca bobalhão estava errado.

Cebola cerrou os punhos com raiva, se controlando para não dar um soco na cara daquele cretino.

– Beleza, gente, vamos vazar daqui. Esse lugar tá fedendo! – Ele falou para não demonstrar que ficou decepcionado por não ter acertado em sua teoria.

– Eu levo o espelho. – Mônica se ofereceu. – DC, me ajuda a tirar ele da base. DC? Acorda, criatura!

Ela o chamou algumas vezes, mas ele não respondeu. O contrariado parecia em uma espécie de transe, tinha os olhos arregalados e não esboçava nenhuma reação. Segundos depois, ele agachou no chão com a cabeça entre as mãos e falava sem parar.

– Eu não sou igual a todo mundo, não sou! Sou diferente! Sou original! Parem de me imitar! Eu sou diferente!

– DC, o que houve? Fala comigo! – Mônica o sacudia várias vezes e ele não ouvia e nem respondia.

– Há! Não falei que esse espelho tava zicado? Olha aí! – Cebola bradou triunfante e logo fechou a boca com o olhar assassino que ela tinha lançado para ele. – Cof cof... quer dizer, nossa, que coisa horrível! Precisamos descobrir o que aconteceu!

Cascão pegou o pano e cobriu o espelho novamente.

– Ninguém olha pra essa coisa!

(Magali) – Gente, onde será que encontraram esse espelho? De onde ele veio?

Cebola o examinou com cuidado para não olhar seu reflexo e encontrou algo escrito atrás dele num idioma antigo e desconhecido.

– Pindarolas, aposto que isso aqui é a resposta, mas como vou ler esse treco?

Os outros foram olhar também e Magali tocou as inscrições com os dedos. Dava para sentir uma energia estranha ali, algo que ela não sabia definir.

– Tá acontecendo alguma coisa, Magá? – Cascão perguntou ao ver que ela tinha ficado quieta de repente.

A moça abaixou a cabeça por alguns segundos e logo os encarou de novo com os olhos brilhando intensamente e falou com a voz alterada.

– O espelho do medo! Que o encarar, terá que enfrentar seus piores medos, saídos do fundo do seu subconsciente!

Os jovens afastaram um pouco, sentindo receio. Quem era a entidade falando através da Magali?

– Como a gente faz pra parar isso? – Mônica perguntou após tomar coragem.

– O espelho deve ser quebrado.

– Ah, só isso? Então afastem-se! – ela tirou o sansão sabe-se lá de onde e o sacudiu no ar pronta para golpear o espelho. Cebola a parou segurando seu braço.

– Peraí, não deve ser assim tão simples! Senão qualquer um teria feito!

(Cascão) – E como a gente quebra esse espelho?

A entidade não respondeu mais nada. Magali fechou os olhos e teria desfalecido se Cascão não a tivesse segurado.

– Gente, que loucura! Eu falava e não conseguia segurar! O que vamos fazer agora? – Mônica respondeu.

– Não é óbvio? Alguém tem que quebrar esse espelho, senão o DC nunca mais vai voltar ao normal! – ela tirou o pano do espelho para quebrá-lo e Cebola se colocou na sua frente.

– Nem pensar, você não vai arriscar ficar doida por causa desse manezão! Ele olhou no espelho porque foi lesado!

– Você quer que eu deixe o DC assim pra sempre? De jeito nenhum! Eu vou tomar cuidado pra não olhar o espelho, só vou quebrar ele!

Cebola engoliu em seco, sentindo o coração apertar por vê-la correndo aquele risco pelo DC. Era duro não saber se ela fazia aquilo por sua natureza altruísta ou se era porque o amava. De qualquer forma, ele sabia que não tinha como detê-la.

Mônica preparou-se para dar o golpe e fechou os olhos por precaução. O problema é que ela abriu apenas um deles rapidamente só para poder fazer mira e sem poder se controlar, acabou abrindo os olhos totalmente, olhando seu reflexo no espelho. Que droga!

À primeira vista, parecia um espelho normal. Por que as pessoas ficavam daquele jeito quando olhavam para ele? Ela piscou algumas vezes, examinou seu rosto e viu que tinha algumas espinhas na sua testa. Será que ela tinha vencido o espelho?

– Vencer o espelho? Uma imprestável como você? Não me faça rir! – Seu reflexo falou com deboche, fazendo-a pular de susto.

– Queeeeee? Você tá falando comigo?

– Com quem mais, idiota? Claro que é com você, mas preferia estar falando com uma minhoca, que tem muito mais força e coragem do que você!

– Olha lá como fala, sua coisa! Você é só minha imagem refletida no espelho!

– A imagem de uma fraca, isso sim! Uma tola que não é capaz de fazer nada para salvar seus amigos!

– Eu posso sim, ouviu? Posso salvá-los!

– Ah, sim! A grande heroína! Que piada... olhe para trás então!

Mesmo desconfiada ela olhou e deu um grito ao ver seus amigos acorrentados, ensangüentados e aparentemente mortos. Cebola, DC, Cascão, Magali e todo o resto da turma. Ela também viu seus pais e familiares. Todos mortos.

– Mãe! Pai! Magali! Gente! O que aconteceu? – ela gritou apavorada correndo de um para outro tentando socorrê-los. Ninguém se mexia.

– Eles foram mortos enquanto você perdia tempo olhando seu reflexo. Viu como você não é de nada? Tudo isso aconteceu bem debaixo do seu nariz e você nem percebeu! Você não pode proteger seus amigos, não pode proteger ninguém! É uma fraca, tola e inútil!

Ainda aterrorizada com aquela visão tenebrosa, Mônica tentou libertá-los das correntes e viu que sua força tinha acabado. Ela estava fraca como um ratinho. Chamá-los e sacudi-los também não dava resultado nenhum. Eles não tinham pulsação nem batimentos cardíacos. Todos mortos. Diante dela, estava Cebola com o rosto ensangüentado e um grande ferimento no coração. DC também estava na mesma situação, assim como o restante dos seus amigos e sua família.

– Não, por favor, isso não! Eu faço qualquer coisa, mas salva eles! Me leva no lugar deles!

O reflexo deu uma grande risada.

– Oh, que lindo! A grande mártir quer se sacrificar pelo bem de todos! Coisa mais patética! Querida, pela sua vida eu não daria nem mesmo um punhado de terra, quando mais a vida de tantas pessoas! Você não vale nada, não serve para nada!

– Pára, eu vou te quebrar agora mesmo!

– Então vem me quebrar! Estou morrendo de medo!

Ela socou o espelho várias vezes, chutou e até tentou atirar pedras. Nada aconteceu. O reflexo apenas ria e se divertia às custas do seu sofrimento.

– Mônica! Ei! Me escuta! – Cebola chamava várias vezes sacudindo-a com força. Foi em vão. Ela não ouvia, apenas gritava e chorava falando palavras sem sentido.

(Magali) – Não! O espelho a pegou! Isso é horrível!

(Cebola) – Droga, ela se sacrificou por esse idiota e agora tá presa! Eu tenho que fazer alguma coisa!

Antes que Cebola pudesse olhar no espelho, Cascão o parou segurando seu braço.

– Peraí, careca, vai devagar! Essa coisa é mó sinistra!

– Cascão tá certo, a gente tem que pensar em alguma coisa.

– Pensar no que? Magali, você não consegue falar com aquela entidade? Tem que ter uma solução, qualquer coisa! Tenta falar com ela!

Embora não gostasse da idéia, Magali foi para trás do espelho e tocou as inscrições como tinha feito antes na esperança de que aquele fenômeno se repetisse. Enquanto isso, Cebola tentava cuidar da Mônica e Cascão segurava DC que parecia histérico. Certamente o pior medo dele deve ter se concretizado: perder sua originalidade e ser igual a todo mundo.

Magali continuou alisando as inscrições com os dedos quando sentiu um choque desagradável, fazendo-a afastar a mão rapidamente e dar um gritinho.

– O que foi? – Cascão perguntou virando-se rapidamente e sem querer deu de cara com o espelho. Cebola tentou tirá-lo de lá, mas era tarde demais. Seu amigo foi pego.

Cascão olhava a si mesmo com o olhar vidrado, sentindo-se muito tenso e nervoso. Pouco a pouco, o rapaz relaxou ao ver que nada tinha acontecido.

– Não é tão ruim assim. – ele murmurou. – Pessoal, acho que é seguro agora. Galera? Cadê todo mundo?

Ele olhou para os lados e não viu ninguém. Será que eles tinham ido embora deixando-o para trás? Que bando de traíras!

– Ninguém merece! Agora vou ter que carregar essa porcaria sozinho! – Ele foi pegar o espelho para levá-lo embora e sentiu algo molhado caindo em seus pés. – Que é isso? Eu heim!

Com nojo, ele examinou cuidadosamente e viu que era só água. De onde tinha vindo? Uma poça se formou no chão e então ele viu que aquela água estava saindo do espelho.


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