Era Pra Dar Certo... escrita por Lola Baudelaire


Capítulo 9
Conspiração do Universo


Notas iniciais do capítulo

oi,
olha, vou ser breve
já está tarde e acabei de terminar de escrever esse capítulo.
Espero que gostem =)
e eu sei que vocês estão meio que achando essa fic meio fora do contexto de PJO prometo explicar o porque disso tudo.
Mas vou adiantar que vou explorar bastante essa parada de semideuses terem vida dupla.
enfim,
acho que vai ficar legal
tô com sono.



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— Ai que saco, April, por que não me deixa dirigir? — perguntou Emma ao meu lado, puxando boa parte do edredom para bem longe de mim. Não fiz questão de puxá-lo de volta. O dia estava um pouco quente demais para me importar com isso.

— Você não vai dirigir, primeiro você está sem carteira porque fez o favor de ser pega dirigindo bêbada e, segundo, não vou deixar você acabar com o meu carro do mesmo jeito que acabou com o seu.

As gêmeas não paravam de discutir desde o inicio da manhã e a vontade de expulsá-las do meu quarto crescia a cada comentário ofensivo. April não era como a garota calma que costumava ser. Estava tudo tão mudado entre nós três que chegava a ser assustador.

Eu me lembro do dia em que as conheci. No terceiro dia do jardim de infância, vi duas garotinhas iguais passarem pela porta do parquinho. Os cabelos castanhos e iguais eram presos em coques de bailarina perfeitos, as saias passadas e alinhadas um dedo acima do joelho, tudo era tão perfeito que me causava medo. Quando Emma disse “oi” fiquei com bastante medo de que me tornasse igual também. Na verdade, até oito anos de idade eu suspeitava de que elas fossem robôs disfarçados de criança.

Bem, as coisas mudaram drasticamente após a quinta série, April cortou seu logo cabelo brilhante pouco acima dos ombros e passou a usar roupas mais curtas e Emma abandonou completamente o visual passando a usar apenas cinza. Ninguém entendia o motivo, mas felizmente foi uma fase que durou pouco. Na verdade depois de um tempo Emma mostrou ser uma pessoa de fases, ou seja, vivia mudando, me deixando incapaz de saber ao certo o que ela era.

Aumentei o volume da televisão para ver se conseguia escutar o que Bonnie dizia a Clyde, seu parceiro no crime pelo qual tinha um amor que me causava inveja.

Houve alguns graciosos minutos de silêncio e April deixou o quarto resmungando. Era bem melhor assim.

— É a segunda vez que você assiste a esse filme hoje, Brookster — disse Emma, deitando com a cabeça perto dos meus pés. Seu cabelo totalmente descolorido se amontoou sobre o seu rosto como uma espécie de cortina ressecada, escondendo seus traços delicados. Ela estava acabada. Os olhos envoltos por olheiras escuras manchavam a imagem radiante que costumava ter. Lembrei-me da ligação de April no dia anterior. Ela tinha dito algo sobre Emma ter entrado em um coma alcoólico ou algo do tipo.

Balancei a cabeça quase como um ato de concordância. Eu só queria que ela parasse de falar e me deixasse terminar os últimos vinte minutos do filme.

— Todo mundo sabe que eles morrem no final. Não precisa nem assistir para saber.

Revirei os olhos bastante irritada. Todo mundo também sabia que eu queria ficar sozinha, mas mesmo assim fui obrigada a aturá-la.

— Eu sei — respondi, me afundando ainda mais no travesseiro e fechei os olhos, tentando me manter focada no que Clyde dizia.

“Prometi a você te fazer alguém, mas você me tornou alguém.”

— Ainda há mundo do outro lado da porta, sabia? — ela se levantou e foi andando até a saída. — Não vai poder se esconder aqui para sempre. Os filmes não vão te proteger das lembranças por muito tempo.

—É, eu sei — respondi, antes ouvir a porta bater.

Eu sabia que uma hora teria que enfrentar a realidade, mas não estava pronta e ainda tinha uma longa lista de filmes para assistir.

...

Eu realmente estava preparada e muito ansiosa para ver sangue espirrar, mas a televisão apagou segundos antes de Eden Sinclair decapitasse Viper, a louca de dreadlocks que estava pedindo para morrer. Revirei os olhos antes de encarar April parada ao lado da televisão com a maldita tomada em mãos.

Vaca!

— Você definitivamente tirou o dia para implicar comigo, não é, April? — gritei, puxando o edredom sobre a cabeça — Você deveria procurar algo para fazer ao invés de ficar aqui fingindo ter controle de tudo.

Fechei os olhos com força, esperando que ela saísse do quarto, mas não. April puxou o edredom com força, me deixando desprotegida.

— E você deveria ter vergonha de si mesma por assistir essa porcaria — retrucou ela, como se ainda estivéssemos no jardim da infância. Nunca entendi direito a habilidade April mudar de uma pessoa calma e sociável para uma chata insuportavelmente mandona. — Já são onze da manhã e você ainda não dormiu e nem tentou tomar o remédio que a sua mãe deixou.

Resolvi levantar e encarar o problema. Cheguei tão perto dela que pude ver nitidamente suas olheiras escuras por baixo de um lindo par de olhos castanhos.

Pelo visto não fui a única que não conseguiu dormir direito.

— O que eu assisto ou deixo de assistir não te diz respeito — disse, antes de ir para o banheiro e bater a porta. — E não vou tomar a porcaria do remédio.

De costas para o espelho encostei a testa na porta de madeira.

Não. Isso não teria acontecido se eu tivesse ficado sozinha em casa.

— Quero saber até quando vai insistir com esse seu teatro, Brooks. Não consegue ver que está se destruindo com esse seu drama? — gritou do lado de fora.

Não respondi, apenas tentei me manter calma para não ir bater nela e voltar para a minha cama. Sentei encostada na porta e respirei fundo. Ela poderia calar a boca e tudo ficaria bem.

— Para de pensar que você foi a única prejudicada na história. Natie não era importante só para você. Então não faz sentido ficar aqui se martirizando trancada aqui no quarto com esses filmes cheios de morte.

Eu poderia encher a banheira e me esconder lá dentro. Ouvi baixinho o som que o mar costumava fazer ao chegar à praia. Não fiquei apavorada como no dia em que a tubulação da cozinha estourou. Era suave como um dia ensolarado em Malibu, tão natural quanto dobrar os dedos da mão.

Ouvi água cair em algum lugar. Dei uma espiada, levantando o pescoço e vi que a banheira se enchia sozinha. Prendi a respiração e pisquei com força. Não, não deveria estar acontecendo.

— E eu quero saber aonde você quer chegar depois de quarenta e oito horas acordada. Você não viu o estado da Emma? Quando eles ligaram na quarta feira, ela sumiu e nós só a encontramos dois dias depois em um hospital fora da cidade.

— April! — falei alerta, pois a banheira começara a transbordar.

— Você tem ideia do quanto é doloroso perder uma irmã? —continuou como se não tivesse me ouvido. — Você não é a única que sofre com isso tudo. Ele também era nosso amigo, porra. Crescemos junto com eles também, não se lembra?

— April! — gritei mais uma vez, já me levantando. A água inundara o banheiro e estava bem próxima do meu pé e por mais que eu tentasse a porta não abria.

— Então pare de se martirizar e tome a porcaria do remédio antes que nós tenhamos que enterrar mais um.

Foi como se a água entrasse em cada poro do meu pé fazendo a pele queimar. Eu me senti forte, mas depois tive a sensação de que iria cair. Olhei para trás e vi o banheiro em perfeito estado, como se nada tivesse acontecido. Concentrei a minha força em girar a maçaneta para tentar escapar.

— Tudo bem, April. Onde está a porcaria do remédio — eu disse ofegante, quando finalmente consegui sair.

Sim, eu realmente precisava dormir.

Ela simplesmente abriu um sorriso aliviado e me entregou um vidrinho laranja.

Peguei um único comprimido e o engoli a seco.

— Eu sabia que não ia desistir — ouvi-a dizer antes que saísse do quarto.

...

Estava tão escuro e quente. Minha boca estava seca e os meus olhos não queriam ficar abertos.

Fechei os olhos e sentei na cama. Alguém cantava algo sobre sermos crianças loucas.

Somos?

A porta do quarto abriu bruscamente e a luz do mundo exterior me cegou por um instante até que eu conseguisse ver duas pessoas se beijando.

Não. Espera.

Minha mente começou a funcionar e me dei conta de que tinha duas pessoas desconhecidas se beijando no meu quarto. Levantei correndo da cama e empurrei a garota para o outro lado da porta.

— Cai fora do meu quarto — gritei, fazendo a outra pessoa sair também.

Dei uma espiada no corredor e vi que estava cheio de gente que eu tinha certeza que não deveria estar ali. O ar denso tinha o cheiro adocicado bastante familiar. Maconha. A música estava bem mais alta e reconheci a voz da Ke$ha que saía de uma das mini caixas de som espalhadas pela casa.

Bati a porta com tanta força que o quatro ao lado pareceu estremecer. Eu não conseguia acreditar que Emma e April tiveram a falta de bom senso de fazer uma festa na minha casa.

Como assim, pessoal? Uma festa? Não se pode fazer uma festa sem avisar a dona da casa. Principalmente quando a dona está dormindo no andar de cima.

Sim, eu iria resolver e tudo voltaria ao normal. Precisava de um banho primeiro, mas tudo seria resolvido.

Tomei um banho rápido e vesti o primeiro vestido a vista, um tubinho azul que não precisou de nenhum esforço para escorregar sobre o meu corpo. Prendi o cabelo com um dos elásticos presos na maçaneta da porta e ajeitei a franja. Esperava não estar tão muito horrível sem maquiagem.

Tranquei a porta do quarto por precaução. Não queria que ninguém tentasse mais uma vez transformar meu quarto em um motel.

Segui descalça pelo corredor desviando de jovens com suas melhores roupas e perfumes que se fundiam todos ao mesmo tempo com o leve odor de maconha.

Não ia ficar admirada se a casa explodisse do nada.

Na verdade, esse era o problema, se acontecesse alguma coisa a culpa seria minha. O que não era muito justo já que há alguns minutos eu estava dormindo tranquilamente sem sonho ou algo que pudesse tirar minha paz.

Parei na beirada da escada contemplando a situação da minha sala. Pessoas vagamente conhecidas dançavam — ou se sacudiam? — com copos vermelhos nas mãos. A televisão não estava onde deveria estar e o balcão onde minha mãe costumava expor nossas fotos havia desaparecido. As luzes adotaram uma intensidade um pouco menor que a de costume. Era uma festa que eu teria gostado se não fosse na minha casa.

Coloquei uma das mãos nos quadris, procurando alguma das gêmeas com o olhar. Claro que ficaria mais fácil se não houvesse tanta gente sobre o carpete caro da minha mãe. Não, ela não podia nem sonhar a situação que a casa ficaria. Senti vontade de gritar, mas logo percebi que seria inútil já que a música estava muito alta. Apertei a chave do meu quarto na mão como se fosse a salvação da minha alma.

Logo vi Emma na entrada da casa, ela sorria como se nada estivesse acontecendo e cumprimentava os novos convidados.

Só podia estar de brincadeira. Mais gente não, por favor.

Desci correndo as escadas e segui em sua direção, esbarrando em todo mundo sem pedir desculpas.

A casa é minha, queridos.

— Olha a Bela Adormecida vindo aproveitar a festa com a gente — disse, sorrindo antes de ser interrompida por uma garota alta usando um vestido rodado bastante curto. Emma deu uma olhada no tablet que segurava e sorriu para a garota que lhe entregou uma nota de cem dólares — Aproveite a festa.

— É, aproveite a festa já que não é sua casa que está sendo destruída — falei baixinho,fazendo Emma rir. Ela vestia uma calça de couro preta com uma camisa velha de uma banda indie. Presumi que calça provavelmente tinha bolso então entreguei a chave do quarto a ela que entendeu o recado e a guardou no bolso de trás.

— Não seja dramática, sua boba. Com o dinheiro das entradas amanhã a gente chama o serviço de limpeza e ninguém vai saber que aqui teve uma festa — Emma falava orgulhosa como se tivesse acabado de planejar uma tática de espionagem ultra importante.

Mais pessoas passaram por nós e eu ainda não conseguia entender o porquê daquela festa.

— Olha, Brookster, eu sei o que você está pensando, mas a ideia foi da April, eu só chamei as pessoas naquele grupo do Whatsapp...

— Não acho que eu esteja com cabeça pra festas. Vocês não deveriam ter feito isso tudo. Os vizinhos vão acabar chamando a polícia — interrompi um pouco magoada.

— Ah, qual é, Brooks? Os Bennet ainda não chegaram daquela excursão a Israel e Jasper está aqui. Quem mais chamaria a polícia? É uma festa exclusiva e secreta acho pouco provável que algum adulto vai aparecer por aqui antes das três da manhã.

Cruzei os braços e me encostei-me à parede ao seu lado. Talvez ela estivesse certa. Em Beverly Hills não se perdia uma oportunidade dessas. Quanto mais exclusivo e mais arriscado, mais interessante e cobiçado.

Reconheci alguns rostos que costumava ver no colégio. Natasha Beorlegui com suas amigas chatas, Matt Lauren flertando com algumas garotas de escolas diferentes. Todo mundo que eu não queria ver.

— Vieram quantas pessoas? — perguntei meio triste. A fome começara a bater e eu tinha o medo de que toda comida tivesse acabado até eu conseguir chegar à cozinha.

— Umas cento e vinte — respondeu meio distraída, enquanto dava o troco a um rapaz de cabelo verde.

Era mais gente do que eu esperava.

— Cadê sua irmã? — perguntei já sem paciência. Eu iria resolver logo com a cabeça do problema.

April levantou a cabeça procurando na multidão e apontou para a porta na sala onde minha mãe guardava a sua coleção de filmes.

— Lá! — apontou apara uma garota de cabelos longos que dançava só de sutiã junto com alguns rapazes.

— Tem certeza que é ela? — Apertei as pálpebras para ver se conseguia enxergar melhor e enfim acreditar que aquela era mesmo April.

— Pode crer. É o efeito da maconha — justificou, se divertindo.

Não, não era só maconha. Não podia ser só maconha. Uma April chapada nunca tiraria a roupa em uma festa. A analisei pelo canto do olho e percebi que todo o sinal de cansaço aparente pela manhã fora corrigido por maquiagem. Seus olhos castanhos foram envolvidos por maquiagem escura a deixando com uma feição desafiadora.

— Tá bom, não precisa me olhar assim é só maconha embalsamada. Brenda trouxe PCP de San Francisco.

Uma coisa era ficar chapada rindo de tudo e de todos, outra coisa era ter alucinações com anestésicos veterinários.

— Olha, ninguém a obrigou usar nada. Fica calma que amanhã a April chata está de volta.

Encarei Emma incrédula, me irritava a sua mania de achar quase tudo normal.

— E, se você quer saber — continuou —, eu estou limpa. Obrigada por perguntar.

Revirei os olhos e adentrei na multidão. Às vezes ficar longe das gêmeas era o mais sensato a se fazer. Então eu tinha que correr antes que eu começasse a sentir saudades, afinal, é meio difícil se manter longe de quem viveu grudada a vida toda.

April e Emma tinham sido minhas irmãs desde que as conheci. Moravam a menos de três minutos da minha casa e sempre estiveram presentes.

Fui andando até o jardim dos fundos, que, por algum milagre, estava praticamente vazio. Sentei no chão e olhei para o céu. Era bonito. O que me fez pensar na imensidão do universo e no que ele era capaz de guardar dentro. Minha mãe havia dito algo sobre eu ser filha de um deus grego. No começo eu achei um pouco engraçado, mas depois fui começando a acreditar. Centenas de dúvidas surgiram na minha cabeça e a cada dia minha ansiedade foi aumentando em relação ao meu post naquele site esquisito. Por mais que parecesse improvável eu tinha esperança de procurar respostas.

Um rosto tapou minha visão do céu azul e interrompeu minha infinidade de duvidas de serem discutidas. Meu coração acelerou por alguns segundos, mas não tive coragem de correr. Apenas continuei deitada e encarei o garoto de olhos negros envoltos por olheiras quase tão escuras que me encarava de volta.

— Quem é você? — perguntei, quebrando o maldito silêncio que estava me causando arrepios.

— Eu sou Nico di Angelo e eu estive procurando por você.





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Notas finais do capítulo

Vocês ainda me amam, não é?
às vezes eu fico com medo de vocês me esquecerem.