Telessequestro? Que Telessequestro? Com quem?

As dúvidas rodopiam em minha cabeça enquanto vejo Debra levantar-se rapidamente.

"Não é possível!" grita "Dei ordens específicas para..."

"Lamento, Senhora" interrompe o homem "Precisa me acompanhar, se quiser reverter a situação."

A presidente arruma os cabelos loiros e vira-se para mim com um sorriso de escárnio

"Que a sorte esteja a favor das torradas" diz.

Antes que eu responda ela sai com um leve farfalhar de seu vestido e deixa um cheiro de rosas no ar.

Me viro para Peeta e o encontro pálido e gelado. Ele agarra as costas de uma cadeira, esperando o flashback acabar. Fazia anos que ele não tinha um.

Não me preocupei em perguntar-lhe se estava bem. Sabia que ele não me ouviria. Estava lutando com velhos fantasmas.

Dou-lhe um abraço e deixo que uma lágrima escorra sob minha bochecha. Preciso lutar.

Me sento em frente ao computador e procuro nas câmeras por algum sinal dos meus filhos. Em um par de minutos eu encontro Lira procurando por algo comestível. Logo depois Klaus aparece em meu campo de visão. Gemendo e chorando de dor. Chega.

Vou até a mesa de comida e preparo três xícaras fortes de café. Não que eu goste da bebida, mas porque sei que o dia será longo e precisarei de forças extras.

Estou bebericando meu café quando Effie dá sinal de vida. Bem a tempo.

"Effie" digo, indo até ela e lhe entregando o café "Preciso marcar uma reunião com os Patrocinadores"

"Estou bem, Katniss, obrigada." diz Effie após tomar um pouco do café.

Por alguma razão estúpida eu coro.

"Mas vou marcar a reunião imediatamente!" continua ela, sorrindo, feliz por ser eficiente.

"Ótimo" digo com um meio sorriso "Obrigada."

"O que houve com Peeta?"

Tomo um gole de café , ganhando tempo para formular uma resposta. Decido pela verdade.

"Um flashback" respondo "Alguém foi telessequestrado e isso causou lembranças ruim no Peeta."

"Oh" é tudo que Effie consegue dizer.

Na altura em que termino minha xícara Peeta despertou. Lhe entrego seu café e digo que teremos que falar com os patrocinadores em dez minutos.

Antes que ele responda o som do canhão nos faz olhar para a tela instantaneamente. Posso ver a menina do Distrito 8 ser levada pelo aerobarco. E pela primeira vez as roupas dos Tributos são mostradas com clareza. Uma calça marrom, camiseta cinza e um casaco térmico preto. Os sapatos são emborrachados e parecem com uma bota de mineiro. Não há ferimentos no corpo desta tributo, o que me leva a perguntar como ela morreu. Lembro de Twill e Bonnie por alguma razão e sinto meus olhos marejarem.

Effie me tira dos devaneios.

"Se querem mandar seus presentes hoje é melhor irem logo." diz.

Peeta pega minha mão e seguimos para os elevadores com Effie. Ela aperta o botão de número cinco.

Em segundos paramos em uma sala enorme, também dividida por distritos, porém mais luxuosa que a dos mentores. As baias da sala dos Patrocinadores são tão grandes que minha casa na Vila dos Vitoriosos caberia duas vezes e ainda sobraria um bocado de espaço.

Ao entrar na baia do Doze percebo o porque. Quase perco o fôlego ao ver mais de cinquenta Patrocinadores generosos me aplaudindo. Estão torcendo não só pelos meus filhos, mas por mim e Peeta também. Então, como que para confirmar meu pensamento primeiro um, depois todos os homens e mulheres daquela sala assobiam as quatro notas de Rue, levam os três dedos do meio da mão esquerda aos lábios e os erguem no ar. Por mim. Por Peeta. Por Lira. Por Klaus. Por Panem. Meu joelhos fraquejam com o gesto. Sinto que sou o Mockingjay novamente.

Antes que Peeta possa me apoiar sinto outros braços o fazendo. Braços musculosos demais para alguém da Capital.

"Obrigada" digo.

"Por nada" diz o homem.

Ao notar certa familiaridade na voz dele ergo o olhar. Gale.

Fico confusa com a presença dele aqui, mas percebo. Claro. Ele tem algum emprego extravagante no Dois. Extravagante o suficiente para patrocinar os meus filhos. Como pude suspeitar que ele era o Gamemaker Chefe?

Ao notar a falta de reação de Peeta tomo a iniciativa e o levo até uma mesa enorme, perto da janela panorâmica que há na sala. Todos sentamos e a reunião inicia.

Não dura muito. Prontamente todos concordaram em enviar o que queríamos. O pedido já está a caminho da Arena.

Voltamos à sala dos mentores e ficamos felizes ao saber que não houve mais nenhuma morte enquanto estivemos fora. Como frango ao molho madeira enquanto checo Lira e Klaus. Eles continuam exatamente onde estavam e isso me dói enormemente.

Enquanto observo a tela vejo um paraquedas prateado chegar para Klaus. Ele abre um enorme sorriso ao ver o conteúdo. Um kit de escalada, instrumentos para imobilizar seu pulso. Remédio para dor e alguma comida.

"Tenho patrocinadores generosos" sussurra Klaus.

Sorrio.

Alguns minutos depois um paraquedas prateado chega, desta vez para Lira.

"Mãe!" ela grita ao ver os presentes se aproximando.

Por alguma razão isso faz meus olhos marejarem.

No pacote dela há um kit de primeiros socorros e muita comida. Não sei o que há na mochila que ela pegou na Cornucópia, então decidimos simplesmente mandar o que ela estava precisando.

O resto do dia é um marasmo. Nenhuma luta, nenhuma morte. A audiência deve estar reclamando que estes Games serão sonolentos. Me pergunto quando os Gamemakers irão intervir.

A noite cai, o hino toca e as fotos dos tributos mortos começam a aparecer. Nenhum carreirista. O menino do Três. O menino do Cinco. Ambos do Seis. A menina do Oito. O menino do Sete. Ambos do Nove e do Dez. O menino do Onze.

O hino toca alguns segundos a mais. O impensável acontece. Meus pulmões expurgam todo o ar existente. Effie dá um gritinho agudo e quebra uma taça. Joahnna grita obscenidades. Beetee grita algo que não entendo. Peeta trava e fica mudo. Mas é óbvio que todos estão reagindo a mesma coisa.

Reagindo ao Mockingjay que apareceu queimando no céu da Arena.