Vida sem Vida escrita por Bonnie Blow


Capítulo 1
Vergonha


Notas iniciais do capítulo

Olá querido leitor,
Fruto de divagações de uma madrugada do ano obscuro que foi 2014.
Realmente espero que não se identifique com o conteúdo "fictício" da minha falação.
Texto revisado em 2019.

Boa leitura.



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Primeiramente, devo dizer que esse não é um texto que lhe fara rir. Então caso procure por algo divertido ou empolgante, acho que talvez seja melhor repensar em prosseguir sua leitura.

Creio que toda a combinação de palavras a seguir pode ser modesta, mas é sincera. Ou pelo menos pretendo que seja. Realmente espero que não haja ser algum que se identifique com tudo isso. Mas se houver, você não está sozinho.

 

Às vezes eu sinto vergonha.

Não levo uma vida ruim, na verdade acredito que esta vida pode ser considerada muito boa quando comparada à de tantos desamparados. Sem teto, comida ou qualquer perspectiva de futuro. Eu tenho tudo isso, apenas vacilando na parte do futuro vez ou outra.

Tenho uma boa família, uma mãe que me ama e ajuda sempre que pode e quando não pode também. Um pai não muito presente, ou melhor, nada presente. Mas isso já não influência em tanta coisa como há dez anos atrás. Não posso me esquecer dos bons amigos, alguns de infância. E até mesmo um namorado, que, aliás, me trata muito bem.

O que mais uma pessoa como eu poderia querer?

É, eu também não sei. Aparentemente não falta coisa alguma para ser alguém feliz. E eu costumava ser, rir por toda coisa e adorar a companhia de pessoas divertidas. Acordar alegre, com planos bobos para o dia; como o que faria no jantar, ou se deveria lavar o cachorro naquele dia.

Mas em algum momento, numa semana qualquer, talvez enquanto eu tomava café ou virava qualquer esquina algo começou a mudar. Como se a bolsa de felicidade houvesse se rompido, e de lá tudo que me alegrava escorreu para um grande ralo da vida.

Gostaria bastante de me encontrar nesse tal dia, quem sabe pudesse avisar-me do que houvera; costurar o pequeno rompimento e seguir a diante com uma cicatriz quase invisível. Talvez num momento de reencontro cósmico e efeito borboleta isso até fosse possível.

Contudo o tal aviso nunca veio. E sem que eu pudesse perceber o lodo foi se formando ao redor de tudo. O pôr-do-sol da minha janela, antes tão amarelo e vermelho se tornara cinza. Pouco a pouco o buraco foi ficando maior, e mais fundo.

A vontade de sair e ver pessoas tão queridas acabou. Não é como se eu já não as amasse, pois tenho certeza que o faço; e é por isso que continuo por aqui.

Mas talvez por saber do estado não muito animador em que me encontro por dentro, tive medo de contamina-las. Trazer pessoas tão amadas comigo a esse estado quase enlouquecedor seria o mais puro egoísmo. Com todos os inúmeros erros que tenho não quero carregar mais esse.

A energia que antes me fazia levantar e resolver tudo que deveria ser resolvido não mais apareceu. Algumas coisas tão bobas de se fazer tornaram-se difíceis. E mesmo sabendo do lindo dia, das coisas deliciosas de se comer e de como eu poderia dançar o quanto quisesse; sair do quarto não parecia convidativo.

Não creio que as pessoas sejam totalmente falsas na internet. Porém raramente aparentam o que realmente são, ou o que sentem de verdade.

Alguns deprimidos na verdade são pessoas alegres em busca de atenção. E algumas pessoas muito alegres na realidade são tristes e quebradas. Posso afirmar que nesse universo paralelo chamado internet o buraco negro demorou a me alcançar.

 Talvez pela facilidade que se há em mover os dedos sobre as teclas sem sentir absolutamente nada.

Me arriscaria a dizer que todos vivem personagens por aqui, menos as tias de idade que insistem em usar o Facebook. Todavia, como um bom predador de alegria a coisa que vive ao meu lado logo se apossou do meu personagem online.

As redes sociais perderam a graça, e eu via como compartilhar algo sobre mim na verdade nada mais era que superficial e enganoso. Um teatro exaustivo e sem sentido. Isso em conjunto àquele velho pensamento de que quem realmente se importa irá lhe procurar pessoalmente. E essas pessoas o fizeram, mas de nada adiantou.

Um vazio de sentimentos, às vezes complementado por certa melancolia. Como ser um boneco sorridente, que no seu íntimo é apenas plástico oco. A vida sem vida, um descontentamento que não tem justificativa. A sensação de andar e andar por uma floresta fria, úmida e sem fim, por meses.

Eu teria rido de mim mesma há dois anos se soubesse como estaria agora. Rejeitando bolos de chocolate e andando pelas ruas sem procurar por flores no caminho, olhando para baixo.

Precisando de remédios que não parecem ajudar em absolutamente nada. Pensando em desistir de alguma forma, e olhando em volta como num beco sem saída. Jamais teria acreditado em tudo isso, por que não tem uma explicação. E meu único desejo é voltar a ser quem eu sempre fui, poder me reconhecer novamente.

Uma sensação única, que não se é possível descrever. Morrer todos os dias, se perguntando se há algo que possa ser feito. Qualquer jeito de reverter à situação. Conversas não ajudaram, talvez ninguém saiba o que me dizer. Ou eu quem jamais aprendeu a escutar o que é dito.

Sem saber por onde começar, ou se deveria terminar. O jeito é continuar seguindo, ou aparentando fazê-lo.

Rezar por um milagre, que tudo volte do jeito que se foi, tão fácil.

 

Por ser fraca.

Por isso eu sinto vergonha.


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Notas finais do capítulo

Se quiser me dar a graça de um comentário ficarei muito grata.
Abraços.



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