Um Outro Lado da Meia-Noite escrita por Gato Cinza


Capítulo 12
Nada é tão ruim que não possa piorar




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Fui despertada por um tremor inesperado, se sentei confusa, visualizei duas luzes brilhantes um de tom azul-gelo e outro de tom vermelho fogo. Fiquei em pé. O cajado de Verbena estava trabalhando em força total, corri e peguei um espelho, não era normal Verbena usar tanta magia para fazer seu cajado ficar daquele modo.

Espelho, espelho meu – murmurei esperando a face do espelho se tornar liquida mostrando meu rosto encoberto por uma nevoa densa – Verbena.

Não sei o que era aquilo, apenas vi neve muita neve. Larguei o espelho, não poderia abrir um portal por um espelho tão pequeno e ir até meu quarto seria um pouco difícil, eu estava em forma humana então podia supor que eram mais que duas da manhã e tecnicamente eu estava á quatorze quilômetros de distancia dormindo. Tive que cantar para que um armário se abria quando gostava da musica que ouvia – um feitiço errado, eu queria uma tranca que só eu pudesse abrir e acabei criando uma tranca que se abria á próprio gosto.

Peguei a vassoura mágica que eu não usava desde... eu usava a vassoura para varrer então posso dizer que nunca usei como deveria.

Leve-me, rápida como o vento – mal terminei de falar e já estava á metros do chão. Me concentrei na casa de Verbena e quanto mais rápido queria chegar, mais rápido o vento frio da madrugada castigava meu rosto. Planei sobre o telhado da casa de minha irmã. Estava tudo muito silencioso. Entrei por uma janela e fui até o quarto dela.

Verbena estava sentada em um baú enrolada em um grosso cobertor de lã com o olhar vazio e os lábios azulados. Toquei nela para chamar sua atenção, mas sua pele estava frio como a neve. Ela me olhou por um bom tempo até que abriu a boca, mas não disse nada. A segurei pela mão e a deitei na cama.

– Não se preocupe Verby, vai passar – disse trancando a porta e voltando para junto dela.

Incendiei a cama dela enquanto ela se mantinha ali imóvel me olhando como se não me reconhecesse. As chamas vermelhas ficaram azuis e o calor ali dentro se tornou tão insuportável que precisei de muito esforço para manter o fogo apenas em volta do corpo de Verbena, aos poucos o azul-chamas foi ficando claro até chegar ao branco-puro e se esfriando.

– Agradeço – disse Verbena saindo do meio das chamas

– O... que... a-con-te-ceu? – perguntei ofegante olhando para ela.

– Oods – respondeu indo até a janela – Dois deles vieram á pouco. Os mandei direto para a Rússia, mas um deles revidou, sensação de ser tocada por eles é horrível.

Verbena parou dobrando o punho de sua chemise, haviam marcas vermelhas no pulso dela, como... mordidas de cobra. Nós duas olhamos curiosas para aquelas marquinhas enfileirada como de tivessem sido feitas manualmente por agulhas.

– Ele te mordeu? – perguntei

– Não, ele apenas me segurou quando os enfeiticei, era apenas um frio para atrasa-los enquanto eu abria o portal para a Rússia, mas ele me agarrou pelo pulso quando me virei e tive que manda-los embora por transporte dimensional. Acho que isso que me deixou tão fraca, tentei me recuperar sozinha, mas... sei lá, você apareceu e me impediu de virar um picolé.

– Os mandou para a Rússia? Por que não os matou?

Verbena me olhou vagamente, como se a ideia lhe passasse só agora pela cabeça e sorriu envergonhada.

– Eu teria que congelar a cidade para causar a morte deles.

– Você disse que eram dois, será que são os mesmos que vimos Meg e eu, semana passada?

– Não sei, mas se for ou não eu sei que eles vão voltar. Eu vi...

Verbena se calou olhando para o pulso novamente

– O que você viu?

– O futuro é algo incerto, não se pode confiar em visões. Muito menos nas realizadas quando se está com medo – disse ela com voz tremula – Mas estamos bem, logo vai amanhecer, dorme aqui?

Assenti. Verbena não me disse o que ela viu e nem vou insistir. Sempre que ela vê algo ruim ela guarda para si. Mas isso não significa que não vou ficar de olhos abertos em relação aqueles Oods. Por hora esses dois se unem á minha lista de por que exterminar fadas.

...

Assim que tomei café da manhã resolvi fazer uma visita á um amigo á quem devo desculpas por ficar tanto tempo longe. Verbena resolveu me acompanhar para depois me arrastar até o club. Leonel morava em um dos três bairros vistas como “de pessoas descentes” em Ferrara. Algumas pessoas ali eram trabalhadoras que passavam metade do dia trabalhando e a outra metade também, as outras pessoas eram vadios. Os pais de Leonel mantinham um bar na entrada do bairro, as pessoas que frequentavam ali eram em bêbados, desocupados, trapaceiros, ladrões e encrenqueiros.

Entramos chamando atenção das poucas – oito – pessoas no local. Não era normal mulheres entrando em lugares como aquele, pelo menos não pela porta da frente. Um homem velho usando um avental sujo parou nos olhando com os olhos apertados e coçando a barba rala.

– Bom Dia, senhor Cellini?! – perguntei o encarando

– Sim, sou eu. Ah! menina Gardênia, á quanto tempo

Ele se aproximou tão rápido que eu não teria nem notado se já não o conhecesse. Apertou minha mão com força e depois – um lapso momentâneo de cavalheirismo – beijou o dorso de minha mão e fez o mesmo com a mão de Verbena.

– É sempre bom rever um rosto conhecido – falei dando um sorriso por incrível que pareça, sincero – Leonel está por aqui?

– Ah! É uma pena, realmente uma pena. Um caso comum de encontros e desencontros da juventude que nunca espera por nada e está sempre indo atrás do que procura...

Olhei para Verbena, tinha me esquecido do quão chato era falar com Giacomo Cellini, ele sempre enrolava uma eternidade antes de responder o que lhe era perguntado.

–... Se ao menos ele fosse menos impaciente e esperasse quando se mandam esperar, mas ele tinha que ir. Eu avisei. Fica aqui que quando ela estiver pronta para te ver ela mesma virá, mas o rapaz achou que a moça tinha se esquecido dele e esta manha saiu todo elegante para ir vê-la e nem mesmo tomou o desejum.

– Ele está onde agora? – perguntei impaciente, mas gentil

– À caminho de sua casa onde mais?

– Minha casa? Ele foi para minha casa?

– Acho que sim, isso se a senhorita se mantêm vivendo na casa que pertencera aos seus pais, na propriedade da Fazenda Floresça onde sua família reside desde muitos anos quando os donos daquela terra eram ainda a família Caravagio que venderam tudo o que tinham para a família Walker que sempre foram muitas boas pessoas, mas um tanto estranhos em minha opinião.

– Agradeço pela atenção e informação, senhor Cellini, tenha um bom dia.

Saímos sentindo um prazer impar ao respirarmos o ar fresco do lado de fora, era uma pena mesmo que Leo resolvera ir me ver logo agora que eu estava na cidade, embora que eu estivera tantas vezes na cidade desde que voltei, que era mais culpa minha que dele, nossos desencontros. Consegui me livrar de ir ao club com a desculpa de ir logo para casa. Verbena queria abrir um portal para me mandar direto para meu quarto, mas preferi ir de vassoura.

– Ficou louca Morticia? São nove da manhã, as pessoas vão vê-la.

– Quantos metros de desilusão mágica há em torno de sua casa? – perguntei mais direta.

– Um raio de cem metros, mas qualquer criatura mágica ou pessoa que já tenha tido contato direto com magia pode ver através da ilusão.

Ignorei a ultima parte, ninguém ia poder dizer que minha irmã era uma bruxa se ela estivesse no club rodeada de pessoas importantes e honestas no mesmo instante em que uma figura encapuzada saísse voando do telhado de sua casa. Nos separamos na metade do caminho, me deixei demorar até chegar á casa de Verbena e me dei ao prazer de incomodar os criados da casa de minha irmã ficando sentada na escada lendo um livro qualquer que eu encontrei sobre as viagens de um alguém chamado Marco Polo, depois do que julguei uma hora de longa espera – o que teria permitido Verbena ter sido vista por muitas pessoas no club – eu subi para o telhado e alcei voo.

Desta vez não havia por que ter pressa, resolvi admirar Ferrara de cima. Se alguém me visse e sei que me veriam não havia menor chance de me reconhecer, eu seria apenas uma figura encapuzada voando á uns cem metros de altura em uma vassoura – quem ia notar isso em pleno século XIV? – estava pensando nas aventuras do Marco Polo, acho que ia ser legal conhecer o mundo como ele fez, nõ sei como nem por que meus pensamentos vagaram para os últimos acontecimentos em minha vida. O casamento de Meg que eu prometi ajuda-la em não o realizar, mas agora eu estava decidida que ela se casaria gostando ou não. Meu sobrinho descobrindo ser bruxo tendo uma mãe que tem pânico da magia. Os Oods vagando pela cidade e agora na Rússia depois de tentarem drenar minha irmã bruxa. O “bruxo sombrio” que tinha voltado depois de ter o matado mesmo que eu nunca o tenha matado de verdade. E meu item favorito, a maldição lançado pela minha irmã cabeça de vento que me transforma em gato metade do dia.

É minha vida estava bastante bagunçada e isso tudo por que eu resolvi ir participar do jantar, tenho certeza que se tivesse ficado quietinha no convento orando nada disso ia estar acontecendo, de repente me peguei lembrando da conversa entre Meg e Margarida. As palavras de minha irmã mais velha ainda soavam em minha lembrança como se eu estivesse repetindo tudo em tempo real:

Quando foi que aquela bruxa sem controle fez algo para ajudar alguém que não fosse por interesse próprio?” [...] “Quer desonrar nossa família também? Quer ficar falada pelo fato de fazer um escândalo antes do casamento, se enfiar em um convento e depois voltar para casa e sair por ai sozinha na cidade como uma meretriz?” [...] “Onde se encontra neste mundo uma mulher honrada que anda sozinha á está hora do dia?”

Será que sou assim tão errada? Por que elas me pintavam daquele modo? Nunca fui uma pessoa má, as vezes exagero um pouco e causo mais problemas que o necessário, mas sempre resolvo as coisas – tudo bem que na maioria das vezes eu faço merda e preciso de ajuda para concertar – mas dai á me comparar com uma meretriz apenas por não precisar de companhia para andar livremente e por fazer o que eu quero sem pedir permissão ou opinião alheia?

Eu nunca fui um exemplo de educação feminina, desde pequena preferia brincar na lama á ajudar na cozinha. Preferia pescar ou caçar com Narciso á ir á cidade nos fins de semana. Preferia ouvir contos de terror á escutar os finais felizes dos faz de conta. Preferia rir de piadas grosseiras á me reunir com outras meninas para falar sobre “como será minha casa, meu marido e meus filhos”. Preferia brigar com os garotos á aprender a bordar e costurar. Preferia a companhia dos adultos sujos que viviam á esmolar na porta da igreja que a companhia das beladonas do club. Preferia enfeitiçar as pessoas com magia é encanta-las com bons modos.

Estava tão perdida em meus pensamentos e lembranças que mal vi a bola de fogo passando ao lado de meu rosto, pisquei aturdida procurando a origem daquilo, então outra bola veio em minha direção, eu desviei á tempo de ser atingida. Olhei para cima, uma enorme ave escura sobrevoava acima de mim em círculos, inclinei a vassoura e me embrenhei a floresta. Aliás, agora que eu notava ter cruzado a cidade toda sem nem mesmo olhar a paisagem.

Desviei de algumas arvores com sucesso, até olhar para trás para ver se ainda estava sendo seguida e bater contra um galho. Me levantei massageando minha testa e pegando minha vassoura novamente, mas antes de montar o enorme pássaro negro – muito mais alto que eu – pousou na minha frente me encarando do alto com seu par assustador de olhos alaranjados.

– Ah! É você – disse me mantendo mais indiferente possível – O que quer agora? Se for me bater seja breve por que tenho mais o que fazer.

O olhei em silêncio aguardando que ele fizesse algo, eu estava pronta para assa-lo.

“Não está com medo” – disse ele de modo observador

Ele se curvou um pouco mantendo os olhos medonhos nos meus. Dei um passo involuntário para trás, mas não desviei meus olhos – estava apavorada demais para piscar. O ouvi fazendo um barulho estranho, como se farejasse algo.

“Ora, sentes medo e ainda assim me confronta” – continuou pensativo – “Por que me desafiou a feri-la?”

Pelo sol que me ilumina, eu esperava qualquer coisa, menos uma pergunta, logo quando eu tinha um feitiço de incineração em mente. Mas não o queimei, preferi responder a pergunta dele.

– Não é isso o que planeja fazer comigo? Me ferir? É o que fez das duas vezes que cruzou meu caminho.

Para meu espanto ele diminuiu seu tamanho á minha altura, não estava mais que um passo de mim.

“O que te aconteceu minha flor? Tem raiva em suas palavras e temor em seus olhos”.

– Me persegue e quase me faz cair da vassoura, me fere e me ameaça, o que quer? Que eu lhe dê flores e sorrisos de alegria toda vez que aparecer para me infernizar? – gritei – Tenho direito se sentir raiva e medo de um louco que se esconde atrás de possessão de animais indefesos por ser um covarde incapaz de mostrar sua verdadeira face.

Respirei e aproveitei que ele apenas me observava para prosseguir enquanto me restava coragem.

– Mas pode ficar sossegado – disse em meu tom mais calmo – vou descobrir quem é você e vou tortura-lo tão lentamente que a morte vai lhe parecer uma agradável amiga, mas eu não lhe deixarei morrer, quando clamar pela morte ela vai lhe virar as costas e eu farei com que sua vida seja longa para que sofra por toda eternidade.

Ele não fez nada, apenas ficou me observando em silencio enquanto eu falava. Como ele se manteve imóvel eu montei em minha vassoura e abri a boca para guiar, mas ele segurou meu braço – com uma delicadeza inesperada confesso. Naquele momento pensei que tinha perdido meu tempo falando, se eu tivesse apenas saído dali em vez de ameaça-lo...

“Não sou a única coisa que te incomoda. O que te causa tanto tormento para deixa-la assim?”

– Me solta – pedi sentindo um nó na garganta

“Me diga o que aconteceu e eu te deixo ir sem perturba-la mais”

Ele segurava meu braço, o que significava que eu teria que falar com ele para ir embora, mas não nasci ontem e resolvi barganhar.

– Se eu dizer o que quer saber promete que nunca mais vai me perturbar? Vai me deixar em paz e não aparecer mais, nunca mais.

Ele riu, um barulho asqueroso e assustador que me fez encolher.

“Se não tivesse ameaçado me condenar a uma vida longa e dolorosa eu poderia até te deixar viver sem ter conhecimento de minha presença, mas gosto de desafios minha flor. E você é um desafio muito intrigante”

– Isso quer dizer que não vai me deixar em paz? – ele assentiu – Tudo bem, mas já que serei obrigada a conviver com sua presença ao menos me diga quem é.

“Me diga o que aconteceu e eu te deixo ir sem te perturbar mais. Por hoje”

Engoli em seco, ele era esperto. Pensei se ele saberia se eu mentisse e por alguns minutos foi o que fiz, para minha infelicidade ele percebeu. E agora estava quase quebrando os ossos do meu braço.

“Estou ficando sem paciência, minha flor, eu quero saber o que te aflige só isso”

– Já ouviu falar em Oods?

É claro que ele sabia, expliquei a ele sobre os Oods que estavam vagando por Ferrara e sobre o ataque que fizeram á Verbena. Para contribuição de minha raiva ele disse que os Oods em questão eram uma raridade, eram irmãos, e ele também sabia o nome deles. Uno e Duo. Disse também que Verbena teve muita sorte e que ela devia ser uma bruxa excepcional para se livrar dos dois e sair apenas com uma marca no braço. E para finalizar me deixou angustiada dizendo que eles voltariam e que provavelmente Verbena não teria a mesma sorte, pois eles não cometem erros e repeti-los é impossível.

– Obrigada! Agora tenho mais um motivo para me preocupar, minha irmã está em perigo... eu já lhe disse o que queria saber, posso ir embora?

“Não me disse tudo o que te incomoda, tem mais eu posso sentir” – falou ele me farejando

– Tem sim – repliquei mal humorada – Você fede, não tinha um animal mais agradável para usar não? Um coelhinho por exemplo.

“Coelhos não voam, mas se quiser pode escolher um animal para eu usar na próxima vez...”

– Não haverá uma próxima vez – o interrompi – E caso eu o encontrar novamente você será apenas um homem e eu o matarei.

“Mesmo que dormisse na mesma cama que eu não saberia quem sou, não se eu não quiser que saiba”

– Me deixe ir embora – falei mais irritada que nunca

“Não estou te segurando minha flor, poderia ter ido quando quisesse, mas preferiu ficar”

Abri a boca para retrucar, mas não disse nada. Montei a vassoura e dei o comando de voo. Como aquele monstro se atrevia? Poderia ter ido quando quisesse, ele tinha praticamente me ameaçado e fala como se eu tivesse escolhido falar para ele sobre minha vida. Mas agora sei mais algumas coisas sobre ele: É inteligente; Arrogante; Observador; Gosta de desafios; Conhece os Oods e o que mais me apavora não pretende me deixar em paz.

...

Não me demorei mais que alguns minutos para chegar em casa. De longe avistei o coche de Margarida o que me deixou mais irritada ainda, e vi também o cavalo malhado de branco e castanho de Leonel. Felizmente meu inconveniente encontro com o “fedorento” não me fez perder tempo demais para me desencontrar de meu amigo. Vislumbrei algo rosa correndo para dentro e logo um grupo pequeno saia para o quintal. Margarida, Magnolia, Andreas, Dayse – de vestido rosa-shocking – e Leonel. Aterrissei á um metro deles fazendo uma ligeira reverencia de agradecimento aos meus sobrinhos que aplaudiram.

– Não incentivem – ralhou Margarida batendo nas mãos dos filhos – Você perdeu o juízo de vez Morticia? Voando por ai nessa vassoura e nem cobriu o rosto.

Eu me esqueci de recolocar o capuz quando sai da floresta.

– Eu retirei o capuz quando sai da floresta, não há menor chance de alguém ter me visto – expliquei soltando a vassoura que voou direto para o porão – Leonel.

Meu amigo sorriu – um sorriso tímido sem mostrar os dentes e ainda assim muito meigo – e em um piscar de olhos ele estava na minha frente me abraçando com força. Depois me soltou e começou me analisar com ar preocupado.

– Andou brigando? – perguntou traçando uma linha que ia do meu queixo até meu pescoço.

Neguei com a cabeça e prometi que depois explicava. Naquele momento eu estava mais interessada em ouvi-lo falar. Tive que ouvir Margarida reclamando por alguns minutos e acabei arrastando Leonel até o poço para podermos conversar com mais privacidade. Ele me fez um rápido resumo do que tinha lhe acontecido nos últimos quatro anos.

Estudou Arquitetura em Milão. Passou seis meses trabalhando na Zona Cinza – região do não-mundo onde as pessoas ou criaturas mágicas podem conviver livremente – onde se envolveu com uma sereia que vendia órgãos humanos na Zona Negra, ele se livrou de ser um escravo por que uma bruxa resolveu lhe roubar os sonhos e sempre que estava com a sereia era a bruxa que ele via – tenho que fazê-lo me contar mais sobre isso e me apresentar a essa bruxa.

Me diverti o ouvindo contar sobre sua vida nos últimos quatro anos, eu não tinha nada a dizer, vivia presa no convento orando, escapava quando estava entediada demais e ia para as noites em Ravena caminhar sozinha enquanto colocava a mente em ordem. Ia contar a ele sobre o que tinha me acontecido desde que retornei, mas Dayse veio informar que o almoço estava servido.

Leonel havia mudado bastante desde a ultima vez que o vi. Seu cabelo escuro estava incrivelmente penteados – o que era uma coisa rara de se ver -, estava usando roupas limpas e alinhadas, os olhos azul-safira pareciam mais vivos que jamais os vi, o rosto estava mais amadurecido com traços mais belos do que sempre fora, e mantinha o mesmo sorriso tímido e infantil de quando éramos crianças ainda. Ele me olhou e piscou coçando o queixo, sei que ele estava curioso para saber o que tinha acontecido e eu ia explicar a ele tudo o que me aconteceu desde que coloquei os pés novamente em Ferrara.

Mas eu pensava em outra coisa. Logo seria duas da tarde e eu precisava evitar Margarida.


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