Até a Lua escrita por A Garota Dos Livros


Capítulo 6
Honestamente, é o meu trabalho




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Acho que dormi, não sei, não tenho certeza. Fiquei lá fitando a escrivaninha por um tempo até alguém bater na porta.

– Pode entrar - resmunguei.

Não movi um músculo durante horas, por isso meu ombro esquerdo doía e meus braços estavam dormentes.

Não sei quem eu esperava passar por aquela porta, mas com toda certeza não era Brad, o médico que disse que cuidou de mim. Reparo nele novamente, seus olhos, ao contrário dos olhos de Caleb, são azuis meio acinzentados, sua pele é pálida e sob seus olhos há algumas manchas escuras de cansaço, seu corpo não é musculoso como dos outros caras por aqui, ele é meio magro, mas mesmo assim ele não sei deixa de ser bonito. Seu cabelo escuro está curto e ele não usa o mesmo uniforme preto.

– Oi - ele sorri ao entrar.

– Oi - resmungo.

Brad mantém a porta aberta, e se senta da cadeira da escrivaninha, percebo que ele não anda normalmente, ele manca um pouco do lado direito, quase não dá pra ver, mas ele manca.

– Como você está ?

Perdida, com medo, com raiva, querendo muito arrancar a cabeça de alguém e chorar compulsivamente depois.

– Estou bem.

– Você mente mal - ele sorri docemente.

– Acho que sim - fecho os olhos.

– Você é forte, Ana, não pode desistir agora.

Abro os olhos e seus olhos grandes e azuis prendem os meus.

– Não sei se consigo... - digo baixo.

– Consegue, sim.

Não digo nada, um silêncio se forma.

– Não veio aqui pra dizer isso, veio ?

– Não, não vim - ele sorri - pensei que talvez estivesse cansada de ficar aqui dentro, já que está enfornada aqui a horas. Uma caminhada? - ele sugere se levantando.

Em resposta eu me levanto também, saímos do quarto direto para os corredores brancos. Não fazia ideia de onde estava, os corredores pareciam todos iguais a não ser a diferença de que alguns tinham mais portas do que outros. As luzes brancas no teto davam a impressão que tudo que não fosse branco estava fora do lugar, inclusive nós.

– É estranho, não é !? - ele pergunta.

– Muito.

Sua resposta é uma risada breve, depois voltamos a andar em silêncio. Brad me mostrou uma série de corredores que levavam ao refeitório, parecido com o refeitório de uma escola, só que sempre tem comida aqui, segundo Brad; a sala de treinamento, onde provavelmente eu nunca ia entrar; a sala de controle, onde eu também, provavelmente, não ia entrar; a ala hospitalar, onde ele trabalha e a vários outros lugares. Nós passamos por uma sala que ele disse ser a sala de reuniões, onde os ''manda-chuvas'', como ele mesmo disse, se juntam pra conversar sobre coisas importantes, exatamente como estava acontecendo agora, por isso as portas estavam fechadas. Brad me conduziu de volta ao refeitório. Não notei que estava com tanta fome, queria muito comer um super prato de toda comida que eu não comi em dois meses, mas fui advertida a comer apenas coisas leves, por isso acabei com um sanduíche natural de peito de peru e salada e uma garrafa de água, que não vai matar nem 1/10 da minha fome.

Eu continuava encarando a perna de Brad, tentando entender porque ele mancava. Normalmente, eu não me preocupo com essas coisas, mas eu não tinha nada melhor pra fazer, então quando nos sentamos a mesa, eu apenas fiquei comendo em silencio.

– Está se perguntando porque eu manco, não é ? - ele me surpreende.

Diante do seu corpo há uma badeja com a mesma comida que a minha. Assinto. Brad estica a perna direita e levanta a calça jeans revelando uma prótese no lugar da perna. Paro de mastigar o sanduíche e o encaro. Ele ri.

– Tudo bem - ele diz.

– Como ... ?

– Afeganistão, sete anos atrás. Eu estava na base, ajudando os soldados que voltavam, em sua maioria, faltando partes quando uma bomba explodiu onde nós estávamos, por sorte eu só perdi a perna...

– Ah - é só o que eu consigo falar.

Acabo de comer meu lanche em silêncio.

– Por que está sendo tão legal comigo ? - pergunto, depois de tomar um longo gole de água.

– Honestamente, me mandaram vir ver como você estava, mas eu também tenho ética médica e você é minha paciente, então... - ele sorri - É o meu trabalho, ver se você está bem - ele dá de ombros.

Pela primeira vez, eu acho, sorrio de verdade. Gosto da maneira como Brad tem sido sincero comigo, isso se tornou algo muito importante nos últimos tempos.

– Que tal uma sobremesa ? - ele pergunta.

– Seria ótimo.

Brad se levanta, depois volta com dois pequenos potes de gelatina de uva.

– Obrigada - digo quando ele coloca a gelatina na minha frente.

Novamente nós comemos em silencio. Um pouco antes de acabarmos, várias vozes apareceram no corredor, em seguida vários homens de terno entraram no refeitório, com alguns dos agentes atrás. Caleb estava entre eles, mas não fazia como todos, o outros agentes tentavam agradar os homens de terno, Caleb apenas andava despreocupado atrás deles.

Abaixei a cabeça porque não queria ser vista, mas não adiantou nada, um dos homens de terno olhou direto para mim e disse alto o bastante para que pudesse ouvir.

– É a garota dos Mayfleet ?

Encaro o homem. Como ele sabe meu nome ?

Caleb fica rígido no mesmo momento, sua postura muda e ele se torna protetor, exatamente como o tinha visto fazer no hotel quando fomos atacados.

– Sim, é ela.

Caleb se coloca na frente do homem que perguntou, me tirando do seu campo de visão. O homem olha para Caleb, depois desvia sua atenção para o cardápio. Caleb se volta para nós e anda a passos largos até onde nós estamos.

– O que estava pensando, Brad ? - ele diz baixo, mas bravo.

– Eu não sabia que eles iriam vir aqui - Brad diz com o maxilar rígido.

– Por que tirou ela de dentro do quarto ?

– Ela estava a cinco horas lá dentro!

– Sabe que é perigoso ficar andando por esses corredores, principalmente alguém como ela, ainda sozinha...

– Ela não estava sozinha.

– Parem de falar de mim como se eu não estivesse aqui - interrompo.

Os dois olham para mim como se lembrassem que eu estava ali.

– Leve-a de volta ao quarto - Caleb diz autoritário, então sai.

– Odeio esse cara - Brad resmunga - vamos ?

Assinto e nós saímos do refeitório depois de deixar as bandejas sujas no lugar corretos. Voltamos pelos corredores andando bem devagar.

– Por que Caleb disse que esses corredores são perigosos ?

– Porque - ele faz uma pausa - a maioria dos agentes que temos aqui já foram ou são as pessoas mais perigosas do país, algumas do mundo.

– Ah.

Brad me deixa na porta do quarto e se despede.


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