Sabe quando a gente coloca inseticida na barata e ela começa a correr sem saber o que fazer? Imagine um cidadão, acordando, se arrumando, tomando o café da manhã e tudo isso sem conseguir parar de sorrir e cantarolar feito um louco. Um louco apaixonado.

— Pedro meu filho desse jeito você vai engasgar com esse pão! — Disse Delma rindo da felicidade repentina do filho.

— É que eu tô feliz mãe! —Disse Pedro com um sorriso enorme no rosto.

— Hmm, posso saber o motivo? — Disse a mulher que soltou um olhar desconfiado sobre o rapaz.

— Shii! É segredo! Beijo, eu tô atrasadão! — Disse Pedro pegando a torrada e o violão enquanto destrancava a porta e saia rumo a Ribalta.

— Sei não viu... Tomtom! Sai já desse banheiro que você vai se atrasar! — Disse Delma e a garota saiu as pressas colocando o batom e pegando a mochila. Marcelo desceu as escadas e levou a filha para a escola enquanto a esposa abria o restaurante.

_*_

Karina acordou leve, se sentindo como uma casa que tinha sido abandonada e agora estava voltando a ser habitada, estava trocando as lâmpadas, fazendo a faxina... Aquele beijo tinha sido uma verdadeira reforma dentro dela. Ela tomou um rápido café com seu pai, sua irmã, sua “boadrasta” e seu meio-irmão, que estava cada vez mais bobo e apaixonado por Júlia.

— Bom dia galera! — Disse Karina ao chegar na academia, ela logo viu Zé conversando com alguns alunos. — Zé? — Disse a lutadora se aproximando.

— K? Meu Deus! Não acredito que é você mesma! Olha só pra você! — Disse Zé a envolvendo num abraço de urso, ela logo corou com a cara de bobo que ele fez, ainda mais na frente dos seus alunos. Pedro entrou na academia e logo viu Karina sendo “amassada” pelo lutador, seu bom humor foi pro espaço, mas ele não deixaria passar em branco a oportunidade de irrita-la.

— Bom dia esquentadinha! Acho que vou mudar seu apelido... Que tal “amassadinha”? É porque com esse lutador te espremendo você ficou toda amassada. — Disse Pedro se aproximando e se Karina antes estava levemente corada, agora ela estava um tomate.

— Que tal eu amassar a sua cara? Aí ficaremos os dois “amassadinhos”. — Disse Karina sendo segurada por Zé.

— Gostei dessa ideia, nos dois... Amassadinhos... — Disse Pedro e os cochichos dentro do local estavam cada vez menos sutis.

—PEDRO SE VOCÊ VEIO AQUI PRA ME TIRAR A PACIÊNCIA PODE FICAR SABENDO QUE VOCÊ JÁ CONSEGUIU! AGORA EU SÓ VOU TE DAR UM AVISO: EU ESTOU NO MEU LOCAL DE TRABALHO, MAS ISSO NÃO VAI ME IMPEDIR DE TE ARRASTAR LÁ PRA FORA E TE ENCHER DE PORRADA! Vaza. Agora. — Disse Karina vermelha de raiva e Pedro fez algo que ela não acreditou: Ele abriu um largo sorriso. Não fez cara de medo, não saiu correndo, não fugiu. Apenas sorriu.

— Parabéns pra mim então! É uma honra tirar a senhorita do sério, até porque, você fica uma gracinha irritada... Vou deixar os “velhos amigos” terem seu encontro em câmera lenta porque eu já tô atrasadão. Tchau esquentadinha! Tchau, sei lá quem. — Disse Pedro subindo as escadas para a ribalta arrancando olhares das meninas que estavam indo para a escola de artes e principalmente dos alunos de Karina que estavam com medo do que ela faria na aula.

— Shii! Não fala nada Zé, antes que eu desconte em você. — Disse Karina tapando a boca do lutador.

— Ok... Eu vou lá pra perto dos outros... — Disse Zé se camuflando em meio aos outros alunos.

— Bom dia galera, vamos ao que interessa. Quero todo mundo alongando! Daqui a 10 minutos quero todos repetindo 7 vezes a sequência: Jab, cruzado, chute, soco de direita. Bora! Quer moleza? Vai testar colchão! — Disse Karina com a ficha de aulas na mão e o apito no pescoço. Os alunos alongaram e começaram a sequência.

_*_

Pedro foi para a sala de música e os alunos já estavam a sua espera. Ele deu bom dia a todos e iniciou a aula, logo Nando apareceu com Sol do lado. O músico não entendeu nada, mas Nando logo explicou que a cantora estava com dificuldade para arranjar emprego e Bete não estava dando conta dos débitos que ela tinha feito quando estava no “auge”, por isso Sol iria trabalhar lá de assistente, isso iria diminuir a carga horária do músico, ele então aceitou e disse o que ela teria que fazer, mesmo não estando mais tão próximo dela desde o “fim” da banda, ele ainda achava ela uma boa pessoa e tentou ser gentil com ela.

...

No horário de almoço Pedro foi para o perfeitão comer com a família e começou a contar para eles o que ele pretendia fazer agora que já tinha uma “vida profissional”.

— Mãe agora que eu já tenho emprego e- — Antes mesmo de completar o raciocínio Pedro foi interrompido pela mãe.

— Filho eu já sei onde você tá querendo chegar com esse papo e eu acho que você não vai saber se virar sozinho. — Disse Delma e Pedro arregalou os olhos.

— Que isso agora dona Delma? Tá com uma bola de cristal escondida? Virou vidente? Eu não sei como, mas você adivinhou e eu vou começar a procurar um apê pra mim hoje mesmo. Eu não sei me virar sozinho mas posso aprender. — Disse Pedro colocando uma colher cheia de comida na boca.

— Ai Pê eu não sei porque isso agora... Não quero que você vá embora! — Disse Tomtom fazendo uma expressão triste.

— Filho você sabe que pode ficar aqui o tempo que precisar, mas eu até acho bom você ter essa vontade de ser independente e já que você agora tem condições de se manter sozinho, acho bom você querer ter sua vida. É sinal de que você está amadurecendo. — Disse Marcelo e Delma o olhou confusa, achando que ele não iria querer ver o filho morando em outro lugar.

— Mãe relaxa, eu vou procurar um apê aqui no bairro mesmo ou nas proximidades... Não é como se eu tivesse indo pra China. — Disse Pedro voltando a comer.

— Pedro eu fico feliz que você esteja finalmente tomando um rumo na vida, mas não tô preparada para te ver longe de mim... — Disse Delma sendo abraçada por Marcelo.

— Eu também não quero te ver longe! — Disse Tomtom e o irmão a consolou.

— Calma pequena, eu venho ver vocês toda hora, não vão nem sentir minha falta. — Disse o músico colocando o prato na pia.

— Acho bom o senhor não esquecer que tem família! E vai ter que morar pertinho! — Disse Delma ganhando um abraço do filho. Ele ajudou a mãe a lavar os pratos e em seguida voltou para dar sua aula.

_*_

No horário do almoço Karina foi para casa comer com a família e assim que terminou foi pegar seu computador para pesquisar apartamentos pela vizinhança, ela queria morar em algum lugar perto da academia mas não estava nada fácil. Ela encontrou o site de uma imobiliária local e entrou em contato por meio de um email, disse suas preferências e foi para a academia, pois a resposta poderia demorar uns 5 dias.

Ao chegar na academia Karina viu Fabi, que tinha voltado para poder passar um tempo com a amiga e agora estava matriculada no horário da tarde.

— Fabi! — Disse Karina ao ver a amiga perto da escada.

— Oi K, eu tava conversando com a Pri, ela me disse que vai dar um jeitinho de voltar! Vai ser como antes K, não é ótimo? Nós 3 juntas de novo! E eu vou ver se arrasto a Juh, mas acho difícil dela aceitar... Bom pra ficar tudo como antes só falta você se resolver com o Pedrinho! — Disse Fabi e Karina ficou toda nervosa.

— E quem disse que eu quero voltar ao passado? Fabi eu me mudei pra fugir dele! D-do passado! Eu não quero voltar a ser a mesma adolescente boba que acredita em tudo, eu mudei, as coisas mudaram, as pessoas mudaram... Mas ter vocês aqui vai ser ótimo! — Disse Karina e Fabi fingiu que acreditou.

— Olha K, eu sei que você deve ter tido seus motivos mas ninguém entendeu porque você e o Pê não voltaram depois das suas “férias em SP”. Não quero parecer intrometida, mas eu sou sua amiga e quero entender o que aconteceu com você... — Disse Fabi que não tinha dito na hora, porque não achou que seria o melhor momento, mas não entendeu porque as “versões” deles não batiam.

— Você sabe muito bem o que aconteceu, eu voltei cheia de esperanças e o idiota do Pedro- — Disse Karina sendo interrompida pelo “idiota”.

— Posso saber o que estão falando de mim? — Disse Pedro se aproximando.

— Olha só Fabi, ele sabe que é um idiota. — Disse Karina se virando para Pedro.

— Eu reconheço que sou idiota se você admitir que é uma baita esquentadinha. — Disse o músico e Karina tentou parecer o mais furiosa possível, mas a saudade de ouvir o apelido era tamanha que não dava pra ficar com raiva.

— Não me chama assim! Caramba, você tem 20 anos na cara e ainda continua o mesmo moleque! Não cresce nunca! — Disse Karina e Fabi foi saindo de fininho, eles nem perceberam.

—Quem parece não ter crescido aqui é você. —Disse Pedro chegando perto da lutadora que nem chegava na altura dos ombros do rapaz.

— Pedro se você for começar a palhaçada novamente eu vou cumprir aquela promessa de hoje cedo, te arrasto lá pra fora e te encho de porrada! — Disse a lutadora de punhos fechados.

— Se você fosse me arrastar lá pra fora pra me encher de beijos eu até aceitava, mas não tô afim de apanhar hoje... Além do mais tô atrasado, tchau esquentadinha! — Disse Pedro dando um selinho na lutadora por impulso. — D-desculpa f-foi a força do hábito. — Disse Pedro andando rápido na direção da ribalta. Karina não estava acreditando no que ele tinha feito e pior, ela nem reagiu.

“Burro! Burro! Burro! Tá querendo apanhar Pedro? Meu Deus o que é que eu faço? Quando eu tô perto dela não consigo controlar... Pedro concentra! Foco!” Pensou o músico subindo os últimos degraus.

“Por que eu não fiz nada?? Eu devo ter parecido uma idiota ficando parada esperando ele continuar o beijo... Não dá pra acreditar... Como ele pode fazer eu me sentir assim ainda? Não acredito que fiquei tanto tempo sem ver aquele idiota e ele aparece de novo só pra me bagunçar! Pedro, Pedro, Pedro...” Pensou a lutadora indo dar inicio a aula.

_*_

Todos os dias novas piadinhas e provocações, aulas e compromissos, era assim que a vida de ambos estava seguindo, até que a mensagem de Karina foi respondida pela imobiliária e ela começou a visitar alguns apartamentos.

Pedro falou com o pai de Rico, que era dono de uma rede de imobiliárias que inclusive tinha uma filial no bairro, para conseguir um agendamento com algum corretor e ele conseguiu. Todos os finais de semana saia a procura do seu tão sonhado “apê”.

_*_

— Alô? — Disse Pedro ao atender o telefone.

— Olá, senhor...Pedro Ramos? — Disse a voz da estagiaria atendente da imobiliária.

— Sou eu, quem quer falar comigo? — Perguntou o músico.

— Eu represento a imobiliária “M.S. Imóveis” e quero informar ao senhor que achamos um apartamento recém desocupado disponível para aluguel no bairro das Laranjeiras, 2 quartos, 1 banheiro, 1 sala, 1 cozinha americana, 1 varanda, 1 área de serviço e com uma vaga disponível na garagem do prédio. O preço do aluguel vai ser combinado com o dono, que está disponível nesse sábado às 16:00 para combinar tudo se o senhor estiver interessado. — Disse a moça lendo as informações do computador.

— Ótimo! Eu vou sim, pode marcar a minha visita! — Disse Pedro que achou estranho receber um telefonema assim, mas ficou feliz por ter finalmente encontrado um imóvel que tivesse dentro das especificações dele. Ele estava torcendo para ser um bom apartamento e, principalmente, para ter um bom preço.

...

Karina tinha marcado com o corretor de fazer algumas visitas, dentro do mapa de imóveis disponíveis, no sábado. Ela queria resolver logo isso e se mudar o quanto antes. Bianca e Duca estavam super felizes, morando juntos, com uma filha linda e Karina queria ter a sensação de ter um “cantinho” só dela, que a irmã agora tinha. Ela tinha marcado em alguns bairros próximos e ficou bastante interessada em um imóvel recém desocupado nas Laranjeiras, queria ir lá o quanto antes.

_*_
No sábado Karina saiu cedo de casa para visitar os apartamentos, almoçou num restaurante no centro e depois voltou a visitar os imóveis. Quando eles foram para o último apartamento Karina ficou maravilhada, ele não era grande, mas tinha uma vista boa, era ventilado e pelo número de cômodos não devia ser muito caro, além de ser nas Laranjeiras, um bairro vizinho ao Catete. Do apartamento para a academia deveriam ser uns 15 minutinhos a pé e uns 7 de carro. Ela estava animada e logo ouviu a porta abrir, era o dono.

— Ah você deve ter vindo para a visita, chegou cedo! Meu nome é Carlos. Prazer! — Disse o homem de meia idade, apertando a mão de Karina.

— Eu vim sim, o prazer é meu, gostei bastante do apartamento. — Disse Karina e logo a porta se abriu novamente mas dessa vez ela se espantou ao ver quem era.

— Karina?? O que você tá fazendo aqui?? — Disse Pedro que reparou na jovem assim que a viu.

— Eu que pergunto! — Disse ela surpresa.

— Mas ninguém me disse que eram 2 pessoas interessadas. — Disse Carlos, o dono.

— É porque ela tá aí de intrusa, fui eu que marquei a visita! — Disse Pedro provocando a lutadora.

— Intrusa? Eu estou com o corretor, e se você “marcou” a visita ou não, pouco importa, eu cheguei primeiro e já tô até fechando negócio! — Disse Karina no impulso.

— Ah mais não tá mesmo! Eu quero muito esse apartamento e dessa vez não vou ceder. —Disse Pedro chegando perto da lutadora e do dono do imóvel, enquanto os corretores que eram colegas de trabalho ligavam revoltados para a empresa, aquela confusão não podia ter acontecido.

— Olhem só vocês dois, o preço é R$ 500,00 por mês, eu não quero me meter no meio dessa briga, mas vocês tem que decidir até as 17:00 porque se não tiver acordo até lá, eu vou receber outro interessado. Me deem licença. — Disse Carlos saindo do apartamento para atender um telefonema.

— Pedro eu não vou deixar você estragar meus planos de sair de casa! Eu quero muito esse apartamento e não vou desistir dele! — Disse Karina furiosa.

— Eu muito menos! Ou você acha que é só você que quer ter liberdade? Pelo amor de Deus, né Karina?! Eu não vou ceder dessa vez. Desiste logo antes que o outro “interessado” chegue e eu fique sem meu “apê dos sonhos”. — Disse Pedro sem querer dar o braço a torcer.

— Eu não vou desistir Pedro. Esse apartamento vai ser MEU. — Disse a lutadora sem paciência nenhuma.

— Eu também não quero desistir mas, a não ser que a gente divida, nenhum dos dois vai ter ele. — Disse Pedro sem acreditar na ideia maluca que tinha tido.

— Eu dividir um apartamento com você seu animal? Claro que não! Eu não quero nem respirar o mesmo ar que você! — Disse Karina rindo da cara de “EUREKA” que ele estava fazendo.

— Karina admita... EU SOU UM GÊNIO! Olha só, esse apê tem 2 quartos, cada um com o seu, eu trabalho o dia todo e você também, então nem vamos notar a presença um do outro E o aluguel ainda vai baixar pra R$250,00 pra cada um! É perfeito! — Disse Pedro se sentindo o Arquimedes.

— Pedro você fumou? Eu-eu... Isso não me parece uma boa ideia. Eu sinto que você vai acabar debaixo de 7 palmos de terra e eu atrás das grades. — Disse Karina pensativa. Logo entrou Carlos e um casal de jovens, a garota, que pensava que só seriam eles na visita, ao ver Karina e Pedro fechou a cara.

— E aí, vocês já se decidiram? Porque eu tenho gente interessada aqui. — Disse Carlos que já deveria estar impaciente por causa das discussões de Pedro e Karina.

— Já, nós vamos dividir o apê. Estamos prontos para fechar negócio! — Disse Karina num impulso para provocar a garota que a olhava feio. Pedro ficou saltitante com a possibilidade de “morar” com Karina e ficou surpreso por ela ter se decidido tão rápido.

— AH não! Nós já chegamos aqui, não decidiram antes porque não quiseram! Agora o apê é nosso! — Disse a garota e logo Carlos interveio.

— Olha só pessoal, me desculpem o transtorno, mas os dois chegaram antes e como eles já decidiram, tem prioridade... — Disse Carlos se despedindo do casal que chegou depois. — Bom, eu vou entrar em contato com vocês amanhã às 9:00 pra assinarmos os papéis e na segunda feira mesmo vocês já podem começar a trazer as coisas pra cá. — Disse o proprietário do apartamento. Karina saiu de lá acompanhada de Pedro, os corretores foram para a empresa resolver os problemas com relação ao horário das visitas que coincidiu.

...

— Eu não sei onde eu estava com a cabeça quando aceitei isso. — Disse a lutadora andando na direção de casa ao lado do músico.

— Eu ainda não acredito que você topou. — Disse Pedro com uma leve expressão de espanto.

— Enfim, a merda já tá feita. Topamos e amanhã vê se não se atrasa para assinarmos os papeis. — Disse Karina andando a rapidamente.

— Olha só, o apê tá mobiliado então segunda mesmo a gente traz as coisas. — Disse Pedro tentando caminhar na mesma velocidade que Karina.

— Tá eu vou conversar com o seu Gael e segunda a gente começa a trazer tudo. — Disse a lutadora e eles logo chegaram a praça em frente a academia. — Pedro eu já vou tenho muita coisa pra resolver até amanhã... — Disse Karina já prevendo tudo o que teria que escutar de seu pai.

— Eu também... Você não imagina o show que a dona Delma vai dar quando eu contar que vou me mudar na segunda... — Disse Pedro coçando a nuca.

— Então tchau. — Disse Karina dando as costas para o músico que num impulso segurou seu pulso.

— Espera! — Disse o músico a olhando nos olhos.

— Esperar o que? Olha só Pedro eu tenho muita coisa pra fazer não posso ficar aqui a noite toda! — Disse Karina tentando não fazer a mesma cara de boba.

— Não vai me dar nem um “boa noite”? — Disse o rapaz ainda segurando o braço dela.

— Boa noite! — Disse a lutadora fazendo deboche do pedido dele.

— Você sabia fazer melhor do que esse “boa noite” sem graça. — Disse o músico num tom provocativo.

— Sabia é? Não me lembro... — Disse Karina com uma das sobrancelhas arqueadas entrando no “jogo” dele, o deixando surpreso.

— Então deixa eu refrescar sua memória... — Disse Pedro se aproximando e quando eles estavam a centímetros, Karina se afastou bruscamente dele.

— Boa noite moleque. — Disse Karina saindo e entrando em casa. “Eu ainda não acredito que ela fez isso. A gente ia se beijar! E eu... O que é que eu tava pensando? ‘Ah eu vou chegar, agarrar ela e ela não vai fazer nada’ Burro! Burro! Burro!” pensou o músico tentando reorganizar suas ideias.

_*_

Karina chegou em casa e estavam todos na sala, Dandara estava preparando o jantar.

— Oi gente. Eu tava pensando em como contar, mas... Enfim... — Disse a lutadora sendo interrompida por Gael.

— Desembucha logo Karina. — Disse o lutador já sem paciência.

— Eu vou me mudar na segunda. — Disse a lutadora e João acabou derrubando o controle do vídeo game no chão.

— COMO ASSIM K?? VAI ME ABANDONAR É?? — Disse João indo para perto dela.

— COMO ASSIM DIGO EU! Pra onde a senhorita pensa que vai?? Eu sabia que você ia se mudar, mas achei que fosse ser daqui a alguns anos, não depois de amanhã! — Disse Gael tentando colocar na cabeça que suas filhas haviam crescido.

— Mas você não quer pensar direito minha linda? Sabe, mudança não é fácil... Ainda mais a primeira! E morar sozinha... — Disse Dandara entrando no meio da confusão.

— Aí é que tá. Eu não vou morar sozinha. — Disse Karina e Gael ficou com uma expressão de dar medo até no demônio.

— COM QUEM VOCÊ VAI MORAR DONA KARINA???? EU AINDA SOU SEU PAI VIU! NÃO QUERO FILHA MINHA SE ENGRAÇANDO COM NENHUM ESPERTINHO! — Disse Gael totalmente alterado.

— Calma Gael! Karina, explica isso direito, com quem você vai morar? — Disse Dandara tentando controlar a “fera”.

— É... Eu... Eu vou morar com o Pedro. — Disse Karina e Gael soltou um grito.

— AQUELE MENESTREL DO CAPIROTO! EU-Eu-eu tô calmo... Eu tô muito calmo! Dandara diz pra Karina que eu não gostei nenhum pouco dessa ideia estúpida. — Disse Gael e João de indignado passou a feliz, pelo menos agora eles iam se acertar de uma vez...

— Dandara diz ao pai que ele não tem que gostar, quem tem que gostar sou eu! — Disse Karina já sem paciência.

— Dandara diz pra Karina que- — Disse Gael sendo interrompido por um grito de Dandara.

— CHEGA! Gael a Karina tá bem grandinha então para de show e deixa ela viver! E Karina, você sabe que seu pai é turrão, então se controla e conta direito todos os detalhes... Começando por: Aonde você vai morar? — Disse Dandara e Gael ficou calado enquanto Karina disse cada detalhe sobre tudo o que aconteceu até a decisão, deixando de fora o “quase beijo”.

_*_

Pedro chegou em casa e foi procurar os pais, mas como era sábado, dia intenso no restaurante, ele resolveu tomar um bom banho e esperar o fim do expediente. Quando ele chegou na sala viu Tomtom sentada no sofá assistindo televisão.

— Oi Tomtom, eu ia deixar pra te contar depois, mas vi você aí então vou falar logo... — Disse Pedro sentando ao lado da irmã.

— Pode falar Pê. — Disse a garota desligando a TV.

— Eu fui atrás de um apê hoje, e achei um ótimo, mas a Karina também quis ficar nele e pra ninguém sair perdendo, vamos dividir. — Disse o músico e a irmã o abraçou toda feliz.

— Eu vou sentir muito a sua falta, mas tô muito feliz que vocês estão se acertando! Você sabe que eu adoro a K, ela é um amor e te faz sorrir de um jeito que nem eu faço. — Disse Tomtom com os olhos brilhando.

— É, ela me faz sentir coisas que eu nunca senti antes por ninguém, mas não estamos juntos. Só vamos dividir o apê. — Disse Pedro desanimado.

— Pedro olha bem para a minha cara. Vocês “só” vão dividir o apê? Só? Pedro vocês vão morar juntos! Vão se ver o tempo todo, você já foi bem galinha sim que eu me lembro, agora é a hora de você usar seu charme pra conquistar a K. Se você não conseguir voltar com ela é porque você é um baita de um incompetente. — Disse Tomtom séria.

— E como a gênia aí espera que eu conquiste a minha bela donzela? — Disse Pedro fazendo mais uma de suas piadinhas.

— Olha só, você tem que mostrar pra ela o que ela tá perdendo! Pedro você é lindo, e não estou dizendo isso porque você é meu irmão, você faz sucesso com as garotas e tem que mostrar pra K o que você tem pra oferecer, mas nada de fazer ciúmes com outra garota porque isso não funciona com a K. — Disse Tomtom e Pedro ouviu atentamente cada palavra.

— E com “mostrar o que você tem pra oferecer” você quis dizer que eu tenho que exibir meu corpo escultural? — Disse Pedro segurando o riso.

— Isso mesmo. — Disse Tomtom com um sorrisinho de quem tava planejando alguma coisa.

— Eu tava brincando! — Disse Pedro gargalhando da ideia insana da irmã.

— Pedro não é pra você andar peladão pelo apê, eu estou sugerindo que você mostre pra ela seus atributos, não é atoa que você vai pra academia de vem em quando... Eu quero que mostre que você aprendeu a cozinhar algumas coisas, que você cante ou toque algumas das suas músicas, ou que você a elogie, a agrade... Faça alguma coisa que ela goste! — Disse Tomtom e Pedro ficou confuso.

— Como assim mostrar minhas músicas? Tomtom você leu meu caderno? Ah, agora tanto faz mesmo... Eu joguei ele no lixo. — Disse Pedro colocando a mão na cabeça.

— Jogou, mas eu tirei. Sabia que você ia se arrepender algum dia. — Disse Tomtom deixando Pedro de boca aberta com tamanha inteligência. — Tive uma ideia perfeita! Escreve alguma coisa pra ela! — Disse a garota com os olhos brilhando.

— Eu não sei... O Johny até disse que a música que eu escrevi tava legal, mas eu acho que foi só pra me tirar da fossa. — Disse Pedro olhando para o vazio.

— Pê eu sou sua irmã, você confia em mim? — Ele assentiu — Então tenta escrever alguma coisa pra ela... Eu amei seus poemas, suas poesias, suas músicas... Falando nelas eu quero ouvir você tocar cada uma delas.! Agora pensa nisso e fala com a mamãe e com o papai sobre a mudança enquanto eu pego o caderno. — Disse Tomtom saindo e deixando o irmão sozinho na sala até que os pais deles chegaram.

— Oi filho, chegou agora da visita ao apartamento? — Disse Delma tirando os sapatos.

— Não, eu tava conversando com a Tomtom... Mas quanto a questão do apartamento, eu fui lá e no fim das contas acabei adorando e amanhã mesmo vou assinar o aluguel. — Disse Pedro tentando terminar logo com aquele assunto e se concentrar no assunto “impressionar a esquentadinha”.

— Mas assim tão rápido?? Pedro você tem certeza?? E o que você estava querendo dizer com “no fim das contas”?? Aconteceu alguma coisa? — Perguntou Delma aflita sentando no sofá.

— Bom é que a imobiliária acabou marcando duas pessoas para o mesmo horário de visita e tanto eu quanto ela estávamos muito animados com o apartamento e decidimos dividir, vai ser até melhor de pagar... — disse Pedro e Delma ficou olhando com os olhos arregalados para o filho.

— PEDRO VOCÊ VAI MORAR COM UMA DESCONHECIDA PRA PAGAR MENOS NO FINAL DO MÊS??? Você enlouqueceu meu filho? — Perguntou Delma incrédula e Marcelo ao ouvir os gritos da esposa desceu a escada para ver o que estava acontecendo.

— Como assim morar com uma desconhecida?? Pedro eu apoiei a sua ideia de se mudar mas não estou gostando de você morando com uma garota que não conhecemos! — Disse Marcelo preocupado.

— Aí é que vocês se enganam. Eu não vou morar com uma desconhecida, eu vou morar com a esquentadinha! — Disse Pedro segurando o riso.

— O QUE? — Disseram os pais do rapaz em uníssono.

— É isso mesmo que vocês ouviram. — Disse Pedro que não conseguiu segurar e acabou por gargalhar da expressão no rosto do pai.

— Pedro você sabe muito bem quem é o pai da Karina, não sabe? Então eu sugiro que vocês não façam nada que a Tomtom não faria, ou ele vai te capar. — Disse Marcelo e Pedro olhou assustado para o pai.

— Pedro eu não quero netos agora, viu? Acho bom vocês dois controlarem os hormônios e se protegerem! — Disse Delma preocupada.

— Até parece que vocês não conhecem a Karina, vocês realmente acham que vai rolar alguma coisa? — Disse Pedro com plena noção de que ela não ia baixar a guarda facilmente muito menos transar com ele.

— Eu não acho, eu tenho certeza. — Disse o pai do músico.

— Eu concordo com seu pai, mas como eu sei que vocês já resolveram tudo e não há mais nada a fazer, trate de trabalhar pra conseguir pagar as contas, porque não é mole! Vá dormir e amanhã quando você voltar do tal encontro com o dono do apartamento a gente arruma suas coisas. — Disse Delma que já sabia qual era o apartamento e só não surtou porque de fato era perto.

— Boa noite filho, espero que vocês não ajam por impulso! — Disse Marcelo subindo a escada ao lado da esposa. Pedro foi ao quarto da irmã e a mesma já tinha achado o caderno, ela entregou o objeto para o irmão e ele foi para o seu quarto.

_*_

— Alô, Fabi? Eu preciso falar com você agora! É urgente! — Disse Karina e Pri, que também estava lá, começou a conversar com a lutadora pelo “viva-voz”. Karina contou tudo sobre o apê e quase ficou surda com tantos gritinhos, ainda bem que pelo celular não dava para elas verem o quão vermelha Karina estava por causa dos “hmmm” que as meninas soltavam em meio à narração da lutadora. Quando ela desligou o telefone já era quase uma hora da manhã, ela colocou o celular debaixo do travesseiro e foi dormir.

_*_

Pedro tentou a todo instante dormir, mas estava difícil... E reler suas composições só o fazia sentir mais saudade ainda do namoro dele com a lutadora. As músicas, poesias, poemas... Tudo refletia numa fase da vida dele com ela e as folhas em branco depois que ele jogou o caderno no lixo, podiam fazer quem estivesse lendo achar que ele a esqueceu. Ele bem que tentou, mas não deu e com tudo o que aconteceu nos últimos dias só ficava cada vez mais difícil de esquecê-la. Por mais que ele tivesse ficado destruído com o que ela disse na mensagem de voz, ele podia sentir que algo nela dizia o contrário, algo nela gritava por ele assim como ele também a queria por perto, pra sempre. Ele lembrou do reencontro deles na academia e sorriu feito bobo, até que como num passe de mágica, as palavras começaram a “cair no colo dele”, assim como faziam antes, ele então pegou seu caderninho azul decidido a escrever nas folhas em branco a nova fase do amor deles, um amor que na verdade só deu um rolé e resolveu dar as caras novamente e pelo visto, dessa vez, ele não iria embora por nada.

“Olha aí o tempo passando

E a gente se esbarrando outra vez

Olha ai, o meu coração

Indo contra a razão

Sentimento não se desfez

Recaí quando te vi

E a paixão veio a tona

Fui a nocaute, beijei a lona

O meu corpo tremeu

O tempo passou, a vida mudou

E ainda continuo seu

Ainda sou o mesmo

Louco apaixonado

Se eu estou errado

Não quero nem saber!

Eu só sei que a vida

É mais colorida com você, com você, com você!

E o tempo passando

E a gente se esbarrando outra vez

Olha ai, o meu coração

Indo contra a razão

Sentimento não se desfez

Recaí quando te vi

E a paixão veio a tona

Fui a nocaute, beijei a lona

O meu corpo tremeu

O tempo passou, a vida mudou

E ainda continuo seu

Ainda sou o mesmo

Louco apaixonado

Se eu estou errado

Não quero nem saber!

Eu só sei que a vida

É mais colorida com você

Ainda sou o mesmo

Louco apaixonado

Se eu estou errado

Não quero nem saber!

Eu só sei que a vida

É mais colorida com você, com você, com você!

Eu só sei que a vida

É mais colorida com você!”