O nascer de nossas estrelas escrita por Miss Cherry


Capítulo 1
Capítulo único




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Três anos... Já haviam se passado três anos. Anos de amor, anos de glória, de luta, de afeição. Três anos que estávamos juntos. O casal perfeito. As árvores, as mesas, as paredes... Todas concordavam. Em todos os lugares havia o monótono "Lótus + Alex" envolto em um coração, da qual ninguém nunca se cansava.

—Hoje é o nosso dia - Ele dizia num sorriso único estampado no rosto.

Nunca me esquecerei das palavras ditas a exatos 1068 dias atrás, dentro da sala do cinema às 18h30min, assistindo a cena mais marcante de Romeu e Julieta com as mãos entrelaçadas. Ele repetia as frases de Romeu como se estivesse assistindo pela milésima vez.

—Mas qual luz abre a sombra deste balcão? Eis o oriente é Lótus, e o sol!... Oh, e a minha mulher e o meu amor.

Havia prestado atenção em cada palavra... Mas fiquei ainda mais atenta depois de ouvir meu nome. Percebi que ele estava corado, e até um pouco inquieto... Era uma declaração. Não pude evitar um sorriso, que ficou estampado no meu rosto até o final do filme.

Ele me deixou na porta de casa, recordo-me bem daquele momento. Foi ali, em frente ao portão branco, a lua iluminando nossos rostos e as flores do jardim exalando um doce perfume, que ele definiu nosso futuro pelos próximos anos.

Depois de ter aceitado o pedido, ele se despediu com um beijo envergonhado em minha bochecha e entrei em casa com um sorriso bobo, ignorei a bronca de minha mãe involuntariamente. Não conseguia tirar aquele momento da cabeça. Aquele havia sido o dia mais feliz de toda a minha vida até o momento.

Alex e eu havíamos combinado de sair pela noite, para comemorar nosso terceiro ano juntos. Um piquenique romântico sob a luz de algumas velas e o céu estrelado. Trocamos presentes, olhares apaixonados e nossos corações batiam na mesma sintonia.

Depois que tudo havia acabado, entramos no carro em direção a minha casa.

Na metade do caminho, quando passávamos por uma avenida não muito movimentada, a chuva batia forte no vidro e era cada vez mais difícil de se enxergar a rua. O frio tomava conta do interior do automóvel e eu me encolhia cada vez mais no banco. Era quase impossível de se ver as placas. Avistei uma ao longe, uma curva brusca para a direita, mas Alex não havia diminuído a velocidade.

—Alex...

Pousei uma das mãos em sua perna e ele deu um leve sorriso. Ainda não havia percebido, e estávamos na mesma velocidade, vi a placa se aproximar. Olhei para ele com preocupação e medo, percebi que ele estava assustado ao perceber a placa.

—Alex!

Consegui gritar antes de tudo acontecer.

Ele virou bruscamente para o lado mas foi em vão. O chão molhado pela chuva fez com que o carro deslizasse até o barranco, onde caiu. Meus cabelos vermelhos taparam minha visão enquanto o carro capotava violentamente. Desmaiei.

Consegui ter uma última visão: luzes de uma ambulância piscavam pelo local. Minha visão turva e minha condição física só me fizeram ver Alex sendo levado.

Acordei em um quarto branco. Várias pessoas estavam ao meu redor mas não conseguia identifica-los com minha vista embaçada.

—Ela acordou... Ela acordou!

Reconheci a voz, era minha mãe. Minha cabeça latejava e custei a me sentar na cama. Percebi vários hematomas pelo meu corpo e uma gaze estava ao redor da minha testa. Meu cabelo estava maior do que me lembrava.

—O-o que aconteceu? - gaguejei.

Um homem entrou sério no quarto e mandou que todos se retirassem.

Assim que a porta se fechou, ele se aproximou da cama.

—Lótus Capullo, certo?

Assenti com a cabeça.

—Se lembra de alguma coisa?

—Não muito...Só...Um acidente...

—Sabe o que aconteceu com... - franzindo a testa e levantando uma folha da ficha - O senhor Alexander Boudelair?

Meu coração disparou.

—O que aconteceu com ele? Ele está bem? Onde ele está?

—Se acalme... Eu sinto muito, mas... ele não resistiu.

Fiquei sem reação alguma.

—Tentamos ao máximo mas não conseguimos...Sinto muito!

Meu coração bateu devagar, conseguia ouvi- lo parar aos poucos enquanto respirava ofegante. Enfermeiros entraram apressados no quarto enquanto eu fechava os olhos lentamente.

As próximas semanas foram uma tortura. Informaram-me que fiquei em coma por quase um mês, portanto, havia perdido o enterro de meu amado.

Voltei para casa, mas minha alma estava no hospital, a minha mente nos céus, junto com Alex.

Desabei a chorar, me abraçando fortemente ao travesseiro. Queria ao menos ter dado um último abraço, um último beijo, ter dito um último "Eu te amo".

Afundada em minhas lágrimas, me olhei no espelho por trás da porta fechada. Meus olhos cinzentos estavam vermelhos, meu rosto inchado, meus cílios molhados, meus braços e pernas cheios de hematomas, e o que parecia um corte pouco profundo na testa. Eu já não me reconhecia mais.

Eu estava sempre sorrindo, o rosto e meu corpo sempre bem cuidados, os cabelos sempre bem aparados. Então é isso que acontece quando perdemos alguém importante.

De repente, olhando para o espelho, minha imagem melhorou, e a de Alex apareceu ao meu lado.

—Eu te amo! - ele disse.

Balancei a cabeça, aquilo não poderia ser real. A imagem continuou ali, chorando, repetindo a mesma coisa. Olhei para o meu lado e não vi nada, mas a imagem estava no espelho.

—Saia! Saia!

Gritei alto o suficiente para toda a casa ouvir. Peguei meu abajur e a lancei contra o espelho para quebra-lo.

Quando minha mãe entrou no quarto, caí de joelhos no chão com as duas mãos entre a franja, chorando.

—Lótus! O que aconteceu aqui?

—Alex! Ele apareceu aqui, ele...

—Ele morreu! E você quase foi junto com ele! Esqueça- o Lótus, você merece algo melhor.

Ela fechou a porta com força, fazendo o resto que sobrara do espelho se espatifar no chão. Na manhã seguinte, ela insistiu em me levar ao médico. Disse a ela milhares de vezes que eu estava bem, que tudo que havia acontecido na noite anterior fora um distúrbio momentâneo, e que não aconteceria novamente. Ela simplesmente me ignorou e me obrigou a entrar no carro.

Deitei-me no banco de trás e coloquei os fones no ouvido. Todas as músicas me faziam pensar nele, me faziam chorar por ele, o que deixou minha mãe com ainda mais raiva. Ela acelerou o carro e fez uma curva. O carro parecia tombar novamente. Comecei a gritar desesperadamente até que senti uma freada brusca.

—O que foi Lótus?

Percebi que estávamos em uma rua constantemente reta.

—O carro, nós quase tombamos e...

—Não faço uma curva a mais de dez minutos... Você está ficando louca, minha filha!

Não poderia ser possível... Parecia tão real. Olhei para a tela do celular e a imagem de Alex apareceu novamente. Ouvi um "Estarei sempre com você" pelos fones e joguei o celular pela janela aberta. Mamãe ficou furiosa ao ter visto a cena e não demorou para que chegássemos no grande prédio espelhado.

Desci do carro e, assim que fechei a porta, minha mãe saiu em disparada em direção ao estacionamento. Entrei no lugar e uma atendente me deixou na porta do consultório.

Olhei para a placa dourada em minha frente e ignorei o nome, mas encarei fixamente o "Psiquiatra". Não queria entrar ali por mais que soubesse que era preciso. Pensei em fugir, me atirar pela janela, ameaçar o doutor Boudelair de morte para nunca mais ter que voltar ali...

Boudelair... Alexander Boudelair... Eu não iria falar apenas com um médico, mas com o pai da pessoa que mais amei na vida.

Entrei no lugar, porta-retratos com fotos de Alex estavam espalhados por todo o consultório. Assim que entrei, ele fitou os olhos em mim e fechou a cara.

Ele sempre havia gostado de mim, pela minha inteligência, caráter e dedicação em tudo que fazia. Pelo jeito que ele me observava, parecia que toda a opinião sobre mim, havia se transformado em algo ruim.

—Sente- se

Ele disse num tom frio, na qual nunca havia escutado antes.

—Senhor Boudelair eu...

Ele me interrompeu, levantando a palma da mão

—Estou aqui como profissional, e não como o pai de Alex.

Ele tirou os óculos e me observou com seus olhos azuis. Me fez lembrar mais uma vez de Alex, seus olhos sempre observadores, focando dentro dos meus. Aquilo me fez soltar um leve sorriso e uma lágrima percorreu meu rosto. Ele deve ter percebido que estava pensando em Alex, ele se levantou e veio até mim.

—Desculpe Lótus, mas não poderei te ajudar... Não com isso.

Percebi uma lágrima se criando em seus olhos e me levantei, abraçando- o com força.

—Desculpe...

Foi tudo que consegui dizer. Minha garganta não deixou mais palavra alguma passar. Me afastei e abri a porta para sair.

—Lótus...

Olhei para ele, já com a mão na maçaneta.

—Passe na recepção, há uma carta de Alex para você...

Engoli minhas mágoas e saí. Como ele havia dito, havia uma carta para mim. Um envelope branco, escrito "Para Lótus" em lavanda, minha cor favorita. Agradeci a recepcionista e entrei no carro, que estava logo na saída.

Abri o envelope e li. Minhas lágrimas molhavam a margem ao redor da letra tão bonita de Alex.

"Querida Lótus, saiba que desde o momento em que meus olhos encontraram os seus pela primeira vez, me apaixonei por você. A combinação perfeita de beleza e inteligência em uma só pessoa. Se você se pergunta o porque dessa carta, deixe-me explicar. Antes de sair de casa, senti que algo ruim aconteceria. No caso do pior ter acontecido, me desculpe por não ter conseguido te proteger por muito mais tempo, mas mesmo morto, zelarei pela sua vida até que um dia ela venha a acabar e você possa ficar comigo novamente. Só quero que saiba que eu queria passar toda minha vida ao seu lado. Procure dentro do envelope, e mais uma vez, me desculpe por lhe fazer sofrer".

Procurei dentro do envelope. Meus dedos tocaram um objeto circular, com uma espécie de etiqueta presa ao mesmo. Puxei e não acreditei nos meus olhos quando vi o que era. Até mesmo minha mãe, que observara tudo pelo retrovisor, se surpreendeu.

Era um anel dourado, com uma pedra transparente e brilhante, a frase "minha flor" cravada no metal. Li a pequena etiqueta. "Será que a mais formosa dama, aceitaria passar a vida ao lado de um mero plebeu, que cometeu o pecado de amar?"

Desabei a chorar novamente, imaginando como seria nossa vida se ele ainda estivesse vivo. Seríamos felizes? Formaríamos uma família? Morreríamos lado-a-lado, velhinhos, com os cabelos grisalhos e a marca do tempo gravada em nossos rostos? Talvez sim, mas o destino ingrato não deixou que isso viesse a acontecer. Não deixou que uma família fosse feliz.

Chegamos em casa. Minha mãe, muda, abriu a porta principal. E eu ainda mais calada, não tinha mais nenhuma lágrima para chorar. Entrei em meu quarto e me joguei na cama, olhando para o teto.

Pedi a minha mãe quando era mais nova, para pintar o teto de forma que parecesse o céu à noite. De algum jeito, conseguia ver o rosto de Alex, no contorno das estrelas. Orei por ele assim como todos os dias e toquei meu colar. Um coração pela metade, assim como o meu estava naquele momento. Abri o fecho e peguei a aliança de dentro do envelope. Soltei um leve suspiro e coloquei o anel como um segundo pingente, que estaria sempre comigo.

Esperei o dia acabar ali, olhando fixamente para as estrelas do teto, observando-o ali, chorando por mim.

—Volte Lótus... Volte para mim.

Eu queria chorar, quebrar alguma coisa, gritar até que não tivesse mais voz... Mas isso não aconteceria, era idiotice fazer algo assim, nada o traria de volta... Só se eu me juntasse a ele. Talvez fosse obra do destino, que vivêssemos juntos pela eternidade.

Levantei-me rapidamente e escapei da casa pela janela do meu quarto.

Vaguei sozinha pelas ruas, tentando me aquecer de alguma forma. Passei um bom tempo andando, até chegar à curva. Lembranças do acidente vieram em minha mente, quando vi pequenas peças do carro que não foram levadas pelo tempo. Aquilo só havia me decidido ainda mais do que iria fazer em seguida. Não muito longe dali, havia um viaduto.

Fui caminhando com as mãos nos bolsos da calça, e esperei sentada na mureta o fim da tarde passar. Depois que a noite caiu, suspirei e subi na mureta. Os carros que passavam por ali buzinavam, os motoristas me olhavam com curiosidade, mas logo me ignoravam.

Fechei os olhos e abri os braços, metade dos pés na mureta e metade para trás, na queda livre para a rua de baixo. Ninguém parecia notar minha intenção, ou apenas não ligavam. Somente a ponta de meus pés tocavam o concreto. Inclinei-me para trás lentamente e deixei com que a gravidade fizesse seu trabalho. Caí com os olhos fechados até colidir com o chão, acabando com minha vida e meu sofrimento.

Abri os olhos. Alguém estava segurando minha mão.

—Lótus?

Reconheci a voz imediatamente, mas não conseguia vê-lo. Minha visão foi escurecendo aos poucos, o barulho contínuo dos meus batimentos cardíacos se extinguindo tomaram conta da sala.

—Não...Lótus! Não posso te perder de novo! Você não pode acordar para morrer logo em seguida! Eu te amo... Por favor fique comigo.

—Desculpe...Alex.

Meus olhos se fecharam por completo e dei meu último suspiro.

No final, não se passava de um sonho. Alex estava comigo o tempo todo, e só percebi isso quando foi tarde demais.

O destino não foi ingrato comigo, eu fui ingrata com ele. Não aproveitei a chance que ele me dera, de viver com a pessoa que amo. Era tudo um teste, e eu falhei miseravelmente.

No fim das contas, eu só precisava acordar.


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Notas finais do capítulo

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