Agora sou o senhor do Norte, o senhor de Winterfell. Muitos fidalgos consideram uma sorte e uma honra ser o primogênito, e desfrutar de todos os privilégios da sucessão. Hoje vejo meu pai partir pela Estrada do Rei na companhia da comitiva Robert Baratheon e nada sinto em mim, além de medo por me deixar no comando.

Estive com meu pai durante toda minha infância e boa parte da minha adolescência, o vi conversando e se impondo como um suserano justo, mas nem por isso menos inflexível. Agora percebo que tenho de deixar os treinamentos em espadas de madeira com Sor Rodrik e me tornar lorde. Impor-me como Lorde Eddard, deixar de ser um menino para ser um senhor Stark. Um senhor do Norte.

Theon aproximou-se de mim nas ameias e juntos observamos os estandartes da casa Baratheon perder-se na curva além das muralhas. Ele grasnou qualquer coisa sobre agora eu ter o poder dentro das cercanias de Winterfell, crocitou como um corvo feliz em regozijar-se sozinho de uma cabeça conservada em alcatrão. Theon era assim, sonhador, com ambições maiores do que a habilidade de suas ações. Não posso culpá-lo, nunca teve o peso de uma herança nas costas. As Ilhas de Ferro estão a muitas milhas de distância e aqui ele tem de ser somente um protegido.

Pedi licença a ele dizendo querer ficar sozinho. O castelo estava num clima mais sombrio do que de costume com Bran comatoso e minha mãe em choque. Miestre Luwin diz que definhará ao lado de meu irmão se não intervir em algum momento. Aí está mais uma responsabilidade para eu carregar. Em alguma hora terei de convencê-la a sair de seu torpor.

Neste dia, pelo menos neste dia, quero ficar sozinho. Atravessei o pátio e saí para as criptas. Empurrei a pesada porta de madeira, capturei um archote na entrada e desci para as paredes escuras e opressoras onde os Reis e Lordes do Norte descansavam. Vento Cinzento, minha cria de lobo gigante, seguia-me solenemente, certamente entendendo que lugar era aquele do qual adentrávamos. Vento Cinzento é um animal inteligente e galante, e mesmo não passando de um filhote, sinto que nos daremos muito bem daqui a diante.

Caminhei lentamente através das criptas, parando em frente à tumba de meu avô. Meus tios repousavam ao seu lado, frios e duros como as rochas que haviam se tornado. Antes de perecer um havia perdido a vida quando o Rei Louco escolhera o fogo como seu campeão. O outro se enforcou na agonia de ajudar o pai. Eram histórias e fins tristes as daqueles senhores Stark. Nem a Lyanna, sua bela tia, havia sido reservado um destino digno das canções glamourosas proclamadas pelos bardos de Westeros.

Robb sentiu o ar gelado penetrar pela sua cota malha e enregelar seus ossos.

O inverno está chegando.

Lembrou-se do lobo gigante apodrecido na mata, sucumbido pelo chifre de um veado. O Rei Baratheon vindo do sul. Bran numa queda suspeita das torres. O pai partindo para ser Mão, ao que muito lhe parecia, contra sua vontade.

O lobo e o veado. Caninos subjulgados por Chifres.

Eram sinais dos deuses antigos, as árvores-coração o segredariam se perguntasse e esperasse pacientemente o vento farfalhar suas folhas vermelhas trazendo respostas.

Robb temeu imaginar o que tantos presságios pudessem dizer, e temeu ainda mais estar no meio deles. Teria de ser forte, adulto e absurdamente maduro dali em diante. Era isso que os olhos duros e esculpidos dos outros Starks falavam para o Jovem Lobo.

Vento Cinzento deu um rosnado infantil para as tumbas e Robb passou a chama do archote para inspecionar os rostos na pedra. Eram duros e frios, como sempre. Como todo Stark.

Ele era um Stark, nascido no verão, mas moldado para frio. O inverno avançava prometendo ser mais impiedoso do que nunca, e o garoto percebeu que estava mais do que pronto para ele.