What changed your mind escrita por raquelthehobbit


Capítulo 4
Left


Notas iniciais do capítulo

Cada vez mais perto do encontro, gente! Vão se preparando.



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– Bom dia – disse Beth ao entrar no quarto escuro em que uma velha senhora repousava. Trazia em uma bandeja um prato de sopa enlatada, a última da despensa do hospital em que passara as últimas semanas.

Seu novo lar era, sim, um hospital, mas não funcionava inteiramente como um. Servia, na verdade, como o abrigo para uma comunidade de aproximadamente 40 pessoas; aquele local havia sido escolhido pelos líderes do grupo, no começo de tudo, por possuir muito do que era necessário, como um grande estoque e variedade de medicamentos. Beth soubera que conseguiram racionar bem a comida no princípio, porém, após tanto tempo, já era necessário procurar alimentos nos arredores do local.

Os quartos do hospital eram muitos; a maioria servia de dormitórios e apenas alguns recebiam, de fato, os doentes. Estes não eram muitos. A maior parte deles apresentavam doenças comuns, como resfriados e enjoos, enquanto outros voltavam de expedições com arranhões, concussões e, vez ou outra, membros fraturados.

A comunidade tinha um verdadeiro esquema, até mesmo considerado hierárquico. Havia um Conselho vigente, do qual cinco autoridades faziam parte: dois policiais, dois médicos e um professor – cargos que exerciam antes do apocalipse. Eles decidiam a respeito das medidas a serem tomas em todos os aspectos ali dentro. Os demais tinham outras funções, como sair em expedições, preparar refeições, organizar os quartos, vigiar os portões do hospital e cuidar dos doentes.

Beth cuidava dos doentes. Logo que foi recrutada pelos dois homens e pela mulher que haviam saído em uma expedição, ofereceu-se para ser enfermeira; havia aprendido algumas coisas com seu pai, embora ele tivesse sido um veterinário.

Aquele era o primeiro dia em que atenderia a Sra. Dylan, uma idosa forte e obesa, conhecida por reclamar de tudo e de todos. Estava com sérias enxaquecas há dias e exigiu o melhor quarto do hospital.

– Onde está a doutora Kim? – perguntou a senhora, deitada na cama, sem retribuir a cordialidade da garota. – Ela disse que viria me ver hoje. Onde está ela?

Beth, com um sorriso doce, a respondeu:

– Sinto muito, sra. Dylan, mas ela foi encarregada de separar analgésicos de antibióticos hoje. Você nem sabe como o estoque estava bagunçado...

– Não sei e definitivamente não quero saber. Não quero que você me atenda. Você tem, o que, quinze anos?! Não sabe fazer nada. Chame-a.

Beth suspirou. Então os boatos eram verdadeiros...

– Na verdade, tenho dezenove.

Ela assistiu ao rosto da mulher ficar mais relaxado. Tentou ser gentil, iniciando uma conversa.

– É uma história bem engraçada, na verdade. – Ela sorriu, desconsiderado o cenho franzido da sra. Dylan. – Por um bom tempo, eu não fazia ideia do dia em que estava. Até escrevia aleatoriamente no meu diário! Quando cheguei aqui, soube que vocês contam os dias desde o começo de tudo e, impressionantemente, meu aniversário fora duas semanas antes...

– Não precisa continuar, garota – a mulher interrompeu, fazendo um enorme esforço para ficar sentada na beirada da cama. – Apenas me passe esses analgésicos e essa sopa fedida. E saia.

O sorriso que preenchera o rosto de Beth por alguns segundos não estava mais lá. Depositou a bandeja em cima da cama e se retirou do quarto, cabisbaixa.

O corredor estava praticamente vazio, então sentou-se encostada em uma parede, ouvindo os resmungos da sra. Dylan sobre o gosto repugnante da sopa. Tentou ignorá-la e, para se distrair, começou a fazer pequenas tranças no próprio cabelo.

Estava ali há três semanas. Havia sido tratada raramente com gentileza, quase sempre com indiferença e hostilidade, mas todos se tratavam assim. Ali, entre 40 pessoas, só havia se aproximado de uma, podendo considerá-lo como amigo. Seu nome era Vincent, tinha 22 anos e estava no meio de uma aula de Filosofia na universidade quando “uma daquelas coisas” entrou na sala e atacou sua namorada.

Ele era o único que realmente respeitava Beth entre tantas pessoas. Por isso, Beth resolveu vê-lo como alguém de confiança e pediu para que saísse com ela à procura de seu antigo grupo, quando ele pudesse. Ela pedia constantemente ao Conselho para sair em busca deles acompanhada de apenas duas ou três pessoas, mas a permissão era sempre adiada. Vincent foi o único que não hesitou; aceitou ajudá-la, prometendo tentar fazer com que ela fosse inclusa numa expedição, juntamente a ele.

Mas, naquele dia em particular, enquanto a sra. Dylan xingava no quarto, Beth sentia-se sozinha. Vincent havia saído em expedição, em busca de água e alimentos, e ela havia ficado ali, ignorada pelos que passavam no corredor, como um cão sem dono.

– Beth – escutou seu nome sendo chamado numa porta à sua direita.

Era Collins, a policial que pertencia ao Conselho. Beth fora tratada bem por ela algumas vezes, mas, em geral, ela havia sido bastante exigente.

– Olá. – Beth se levantou, andando em direção à mulher.

– Eu gostaria de ter uma conversa com você. Pode ser agora?

Beth deu um sorriso e confirmou com a cabeça. Collins convidou a menina para entrar em sua sala, a qual, antes do apocalipse, servia de escritório para um cardiologista. A policial sentou-se em sua cadeira e Beth, à sua frente, do lado oposto da mesa.

– Soube que você marcou outra reunião com o Conselho – ela disse, não parecendo muito satisfeita.

– Sim, eu fiz isso – Beth confirmou. – Eu tenho uma proposta para vocês e acho que pode ser bom...

A mulher a encarou, tentando adotar uma expressão mais simpática.

– Querida, veja, estamos muito ocupados esta semana. Já mandamos três expedições, estamos com uma maior quantidade de doentes...

– Estão? – Beth desconfiou.

Collins retomou a severidade no rosto.

– Sim. Então, se quiser propor algo, proponha a mim. Os outros não estão disponíveis.

Beth hesitou. Nenhuma decisão era tomada sem que todos os membros do Conselho estivessem presentes, porém, não achava que houvesse outro modo de propor suas ideias.

– Tudo bem. Eu estava pensando que nós deveríamos recrutar mais pessoas. Eu sei que vocês são bastante seletivos, e agradeço por terem me aceitado, mas em breve será preciso baixar um pouco a guarda e receber mais pessoas. A alimentação está ficando escassa, então mais pessoas terão de sair em expedições. E, além do mais, você disse que há mais pessoas doentes. – Beth usou o discurso da policial para dar mais razão à sua proposta. – Precisaremos de mais auxiliares.

Por todo o tempo que Beth falava, Collins não tirou a expressão fria do rosto. Pareceu digerir por alguns segundos o que a menina havia dito, analisando, mas pareceu inflexível logo que começou a responder:

– Beth. Estamos bem do jeito que estamos. Você realmente quer pôr em risco nossa integridade e tudo que já construímos até agora? Seja um pouco agradecida, querida. Nós a aceitamos. Seria uma pena ter de mandar você embora por coisas bobas, não é mesmo?

Beth sentiu-se desconfortável. Aquela mulher tinha um olhar duro, quase que ameaçador; nunca a havia visto dessa forma. Mas não queria desistir.

– Mas policial Collins, você percebe que faz sentido? Eu acho que...

– Não! – a mulher exclamou, surpreendendo Beth. – Não vai acontecer. Agora, se me der licença... Tenho coisas a fazer. Não precisa falar mais.

A mulher apontou para a porta da sala. Beth, um pouco chocada, levantou-se da cadeira e dirigiu-se à saída.

– Obrigada pelo seu tempo – disse.

Collins não respondeu.

Beth esperava ter passado uma impressão de fraqueza, desistência. Mas não desistiria. Faria o possível para ser responsável por alguma coisa boa, seja ela qual fosse. Estava farta de ser ignorada, reprimida, mal tratada. As suas últimas experiências antes de ir parar naquele lugar foram o bastante para torná-la mais forte e destemida. E assim ela seria.


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Notas finais do capítulo

Beth revolucionária aiaieahaeaeuahe. Se gostarem, comentem, por favor! Um estímulo é muito legal! Beijosss