Maldição do Fogo escrita por Mary


Capítulo 6
Virginia - Tenho um pensamento estranho sobre o mar e o sol


Notas iniciais do capítulo

Música do capítulo: http://www.youtube.com/watch?v=eZxo9mrWgR8 (Clarity - Zedd feat. Foxes)



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Despertou com sua voz ecoar pelo aposento. Ouviu-se dizer a mesma palavra diversas vezes, até enfim cessar. E pôde ficar a sós com o silêncio do chalé. Mas ainda a ouvia em sua mente, e seu volume não diminuía.

“James!”

Foi um imenso alívio ver o escuro familiar do seu chalé novamente. Suava, o coração estava disparado. Sua mão sangrava por conta de enfiar as unhas na pele. Os olhos estavam arregalados, alertas. Uma fina linha de luz solar aparecia no chão, indicando que já estava na hora de se preparar. Levantou-se e ficou de frente com o espelho.

Sonhos de semideuses são ruins. Quando se tem esquizofrenia, são ainda piores.

Encarou seu reflexo sombrio, com as olheiras ainda mais profundas, a pele ainda mais pálida. Não notou estar tremendo até olhar para suas mãos cortadas, e, repentinamente, as imagens de seu sonho surgiram novamente.

Voltou a ver a outra sala escura, exceto por uma pequena chama em seu centro. Ela iluminava o rosto pálido de uma mulher, frio, mas ainda encoberto pelas sombras. A mulher estava com um sorriso grande e assustador. Quando falou, sua voz parecia rasgar a pele da semideusa.

– Você é a mais engraçada dentre os quatro. Já conhece sua maldição. Sabe o que lhe guardo. Sabe quem sou, e onde me encontro. E mesmo assim vem atrás de mim, só por causa de um garotinho. Ora, Virginia, é incrível ver que você é a líder dessa missão ainda.

Recuou até a parede, praticamente deitando-se nela. Seu coração parecia querer escapar para fora.

E o viu.

Olhou para o lado e viu sua sombra. E outra chama se acendeu, sobre a cabeça dele. Viu seus cabelos castanhos, e os olhos fechados. A sua face também pálida, mas de uma maneira que o fazia ainda mais fofo do que deveria. O rosto estava mais magro do que o normal, como se estivesse à beira de sua vida, cortes por toda a extensão dos braços.

A única coisa que pensou em fazer foi gritar.

Acordou de novo de seu pequeno transe, e viu o seu chalé exatamente da forma como ele era. Estava sentada no chão, com a cabeça caindo sobre a parede. Já não bastava ter aquele sonho – tinha que revivê-lo contra a sua vontade. E isso nunca tinha acontecido antes.

Ainda tonta, levantou-se e foi para o banheiro. Tomou um banho gelado, e colocou a blusa laranja do acampamento junto com seus jeans. Fez a habitual trança no cabelo e pegou um casaco preto para esconder as cicatrizes.

De frente para a porta, teve falta de ar e caiu outra vez. Viu as imagens do seu sonho na janela, e entrou em pânico.

Vamos, filha de Hades, falou a mulher na sua cabeça. É suicídio tentar me matar. Eu não vou morrer, ainda mais na mão de três semideuses idiotas. Junte-se a mim, e eu retiro a maldição imposta a você em seu nascimento. Quando os derrotarmos, tesouros lhes serão dados. Infelizmente, o sangue de James deve ser derramado, mas posso poupar-lhe Matt.

Com a cabeça girando, Virginia entrou nas sombras e as deixou lhe envolver. Estava tão acostumada a se locomover assim que nem sentiu nada até abrir os olhos e estar do lado de fora do seu chalé.

Por algum motivo, gostou de ver o sol. Talvez porque lhe desse alguma confiança, não sabia. Respirou fundo e se levantou.

Caminhou sozinha até o pinheiro, e lembrou-se de que não partiria solitária naquela missão. Parou ali, e sentou encostada no tronco da árvore. Acariciou a cabeça de Peleu, que dormia, e o dragão se remexeu um pouco. Normal, afinal animais não gostam dos filhos de Hades. Suspirou e olhou para o lado.

– Olá, Nia – disse uma voz.

Ela se assustou, e olhou para a figura sobre ela. Por mais que reconhecesse a voz, ainda estava com medo da tal mulher.

– Matt – ela falou – Não me assuste.

– Achei que tivesse me visto.

– Estou meio distraída.

O filho de Poseidon se ajoelhou na frente dela e segurou sua mão. Seus olhos verde-mar a penetravam, como se pudesse ler seus pensamentos. Nia tentou recuar, mas sabia que isso não seria possível. Temeu que seu rosto estivesse enrubescendo – não queria lhe dar esse gostinho. Quis puxar sua mão, mas ele a segurava tão firmemente que mal teve coragem para tal ato.

– Quer andar um pouco? – ele perguntou – Não pretendo ir muito longe.

Ela olhou para baixo e mordeu o lábio por estar sendo tão fraca. No entanto, era mais forte que ela. Concordou com a cabeça, e se deixou ser puxada por ele.

Não quis olhá-lo. E a isso conseguiu resistir. Seu olhar estava fixo na frente, mas permitiu que ele a guiasse para onde quer que fosse. Quando notou, estava pisando na areia da praia. Ele se sentou, e a puxou junto, convidando-a que ficasse com ele.

Mantinha seu olhar no horizonte, no reflexo do sol no mar. Um estranho pensamento passou pela sua cabeça, mas o afastou antes que fosse tarde demais.

Matt passou o braço pela cintura dela e a aproximou de seu corpo. Com toda a tontura que ainda sentia, deixou-se deitar ali. Suspirou e inalou o cheiro da água salgada. Estava sob pressão. Era de momentos como aquele que precisava, pelo menos naquela hora.

Fechou os olhos, e tentou tirar qualquer dor da sua cabeça. Tentou esquecer como era sofrer, e que estaria prestes a morrer. Tentou esquecer do Acampamento Meio-Sangue, e de que era uma semideusa. Tentou esquecer da sua esquizofrenia e da sua bipolaridade. De que seu irmão estava em perigo e seu braço, machucado. Só queria se lembrar de como era poder relaxar, e de ter Matt ao seu lado.

Estava tudo indo muito bem. Queria que aquela lembrança fosse a sua única, e assim se fez. Naquele instante, tudo o que existia era um sol, um mar e um Matt. Deveria precisar apenas disso para viver. Contudo, como tinha lido uma vez, o mundo não era uma fábrica de realização de desejos.

Quando abriu os olhos novamente, isso foi tudo o que conseguiu visualizar. Matt estava passando a mão pela sua trança, e simplesmente quis que aquilo nunca acabasse.

Foi obrigada a lembrar-se das coisas ao seu redor. Novamente, teve vontade de apertar seu rosto com força, abraçar suas pernas e gritar. Mas o carinho de Matt conseguiu tranquilizá-la ainda mais.

– Você tem que ir, Nia – ele sussurrou.

– Tenho sim.

– E sou obrigado a aceitar isso.

– Assim como eu.

Ele a abraçou com mais força, e ela deixou escapar um gemido.

– Nunca me imaginei dizendo isso para ninguém – ele continuou.

– Isso o quê?

Depois de respirar fundo, Nia percebeu que ele fazia um esforço grande para dizer o que tinha que dizer. Deveria ser importante.

– Eu...

Não terminou. Pareceu ter se arrependido de ter começado aquele assunto, e não terminou. Mas não precisava de palavras.

Puxou o rosto de Nia para perto do seu, e a garota novamente teve vontade de gritar. Já surtava por dentro, não precisava daquilo para enlouquecer ainda mais. Levantou-se, e correu de volta para o pinheiro.

Não antes de deixar ele beijá-la, claro.


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Notas finais do capítulo

Espero que tenham gostado :3



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