RedBlacks escrita por Freak Kyoko


Capítulo 1
O Que Tem aí Dentro?


Notas iniciais do capítulo

Não ia participar do desafio, mas estava dentro do carro, numa estrada cheia de caminhões, ouvindo uma boa música e não consegui não escrever. Espero que gostem!



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12 de junho de 2014. 18h05. 16ºC.

Segundo tempo, o Brasil lutava pela a virada de jogo contra a Croácia, que fizera um gol — contra — na primeira etapa da partida, no estádio conhecido como Itaquerão, na zona leste de São Paulo.

Enquanto a bola rolava sob tempo frio da capital, a Scania Highline rumava despercebida ao sul do estado, totalmente carregada daquele que era o princípio para a sobrevivência de qualquer cidadão — principalmente brasileiro. Digamos que não era a primeira vez em que o caminhão, mais do que caro, circulava por locais proibidos por lei. Mas não era exatamente disso que se tratava? Ser fora da lei, coisa e tal? Imagino que seja exatamente o que deveria acontecer.

Os cinco passageiros a bordo — o motorista incluso na contagem — estavam silenciosos. Nenhuma voz dentro da cabine, apenas o chacoalhar metálico da carga contra a parede do baú carga seca preto distinguia-se do barulho do vento gélido, que entrava pela fresta da janela direita. A mulher, que estava sentada entre o motorista — um sujeito careca e bigodudo que mordiscava um palito de dentes — e outro passageiro rechonchudo de rosto oleoso, explodiu enquanto passavam por um viaduto baixo.

— Porra, Maurício, você tentando arrancar o topete do meu bebê, ou o quê? — gesticulou para o motorista, que apenas empurrou o lábio inferior levemente para fora num beiço de desinteresse forçado. — Não finja que não está me ouvindo, ouviu? — insistiu a mulher mais velha, ainda gritando com o motorista.

Na cabine atrás do banco Tatiany levantou-se do colchão de solteiro surrado e arrumou os cabelos bagunçados.

— Sua frase foi tão redundante que eu tive que acordar — a menina ruiva zombou da mais velha.

— Isso vindo de alguém com Y no nome. Ia perguntar se sua mãe fumou maconha durante sua gravidez, mas sei que ela cheirava, então deixo o comentário no ar — retrucou e umedeceu os lábios, além de cruzar as pernas em um movimento não muito bem feito, por causa do espaço, e jogar grande parte de seu cabelo para o lado contrário ao que estava anteriormente.

Tatiany suspirou, e sabendo que não tinha o que discutir com a prima mais velha, mudou o rumo da conversa.

— Tiago, você pode fechar a janela, por favor? — dirigiu a pergunta para o moço rechonchudo que estava à janela. Ele olhou por cima do ombro para ela e sorriu, desculpando-se.

— Não consigo ficar em lugares totalmente fechados. Você sabe.

A mulher ao lado soltou uma risada em puro escárnio.

— O que você não consegue é emagrecer, nesse frio você está suando que nem um porco. Deus me livre — a mulher disse fazendo um sinal da cruz, gesto costumeiro de sua antiga vida, vida que ela havia deixado anos atrás.

— Engraçado é a Claudia dizer que é ateia e falar "Deus me livre" e depois fazer o sinal da cruz. Isso é: Brasil, o país da hipocrisia. — Imitou o slogan do Governo Federal em sua versão de paródia. Sentiu novamente o frio gelado contra seu rosto e teve que insistir novamente para que Tiago fechasse a janela. — Por favor, eu te empresto uma das revistas que trouxe.

O homem sentiu-se verdadeiramente tentado a aceitar a troca. Tatiany estava passando por uma época da adolescência em que precisava sentir-se pertencente a algum lugar, nesse caso decidiu que seria uma ativista, feminista, esquerdista — ou nem tanto — e lésbica, sendo assim, trouxera consigo varias revista da marca Playboy com suas atrizes preferidas, além de três livros: Crepúsculo, A Culpa É Das Estrelas e Cinquenta Tons Mais Escuros (sequência do primeiro livro da trilogia). Como uma bela feminista, tinha que provar ao mundo que deveria ter direitos iguais ao dos homens, por isso a Playboy (que servia ao seu lado lésbico), mas não conseguia deixar de levar consigo seus livros preferidos, muitas vezes considerados como de menininha.

Tudo bem, talvez A Culpa É Das Estrelas não fosse seu preferido, mas o levara mesmo assim, alegando que precisava continuar a leitura atrasada (há mais de três meses).

Tiago pensou bem na oferta, já que trocaria de lugar com Tatiany quando parassem para abastecer o caminhão, e poderia se sentir meio solitário na cabine com Joaquim hibernando ao seu lado... Não. Não posso aceitar, pensou. Mesmo que decidisse bater uma com o amigo dormindo, logo após chegar a seu ápice ele precisaria se levantar para respirar e entraria em desespero caso o vidro estivesse fechado. Desde aquele episódio com fumaça... Chega. Não se lembre disso. Diga não e pronto.

E foi o que ele fez, educadamente recusou o pedido da menina ruiva descabelada. Tatiany fez bico, e percebendo que não conseguiria convencê-lo, sentou-se novamente no colchão fino ao lado de Joaquim, que dormia de barriga para baixo e babava por causa da boca levemente aberta.

Mesmo tendo certeza absoluta de que o companheiro não fecharia o vidro, decidiu executar aquilo em que era melhor: provocação. Catou sua mochila de couro sintético — hello-o, sou ativista — e de lá retirou uma Playboy de sua atriz loira preferida. Ela encostou-se contra o banco e passou a folhear a revista vagarosamente, dando um empurrão mais forte nos últimos centímetros antes do encontro da página segurada com a próxima, provocando aquele som característico de folhas sendo movimentadas. Pelo canto dos olhos viu que Tiago tentava olhar a revista disfarçadamente, então ela fez questão de levantar-se subitamente e passar os braços que seguravam a revista paralelamente pela cabeça de Claudia, que ficou cara a cara com o pôster da tal atriz de pernas bem abertas. Tiago não aguentou ver a revista tão perto de si é não poder apreciar a cena, então meteu o rosto entre os braços de Tatiany tendo um curto vislumbre das partes íntimas da atriz, antes da menina ruiva fechar a revista com tudo — quase metendo seus bíceps nas orelhas de Claudia.

— Você não quis fechar o vidro, então não merece ver minha revista — provocou infantilmente e mostrou a língua. Tiago revirou os olhos e fez um gesto com a mão que dizia claramente "deixa pra lá".

Tatiany ainda estava inclinada sobre o encosto do banco com os braços em volta do pescoço da prima quando, de supetão, o caminhão freou. Antes o Highline estava se movendo tão depressa que, no momento da brecada, Tatiany literalmente voou para frente. Suas mãos já estendidas impediram que a menina batesse de cara com o painel de plástico. Os corpos de todos os outros também foram impelidos para frente e na volta agressiva, Claudia chocou sua nuca na testa da prima.

Toda a cena não durou mais que 10 segundos: tempo suficiente para que o experiente motorista bigodudo, Maurício, sem perder tempo engatasse a marcha ré com um estalo de protesto do caminhão, botasse o braço direito por cima do encosto do banco — e sobre a bunda de Tatiany — e olhando atentamente pelo retrovisor, manobrou o grande caminhão, rapidamente deu meia volta numa estrada grande e guiou o veículo para a pista contrária.

Claudia bateu no painel do caminhão com a mão cheia de anéis.

— Mas que porra foi essa, Maurício? — O homem a olhou por um momento, sua expressão séria. Ele ponderou por um instante e então deu de ombros, rolando seu palito de dente para a outra extremidade da boca e o mordiscando repetidamente.

Tatiany escorregou de volta para seu esconderijo e trouxe os joelhos até o peito, agarrando suas pernas dobradas e apoiando o queixo bem ali. Ficou encarando Joaquim, que dormia tranquilamente, só tinha virado a barriga para cima, mas poderia ter sido a força da freada, vai lá saber...

— Hein, Maurício? falando com você. — exigiu Claudia apontando para o motorista com as unhas pintadas de preto. O homem, que sabia que não seria deixado em paz, suspirou.

— Passei direto pelo retorno, o próximo seria muito longe daí virei aqui mesmo — respondeu de má vontade, tinha um sotaque mineiro carregadíssimo. Claudia, Tiago e até mesmo Tatiany olharam para Maurício, boquiabertos. Como diacho ele não vira o maldito retorno? Até Claudia, que não era muito ligada nesse tipo de coisa, percebera as placas indicando o retorno para a Rodovia Régis Bittencourt. Por causa dele, Claudia atrasaria seu compromisso, mas preferiu não dizer isso em voz alta.

— Não sei por que deixamos você dirigir logo agora — reclamou.

— Bem, porque Joaquim prefere dirigir à noite, então não tinha outra pessoa que pudesse fazer o serviço... — explicou Tiago inocentemente. Claudia revirou os olhos e bateu a palma da mão no meio de sua testa. O rapaz poderia ser um gênio em esquematizar os planos da gangue, mas era lerdo que só na vida.

Pelo rádio, o locutor anunciava, empolgado, a vitória brasileira na estreia da copa: Brasil 3 x 1 Croácia. Tatiany bufou e retirou uma nota de vinte reais de seu bolso traseiro, deixou o dinheiro sobre a mão aberta de Maurício, que ostentava um pequeno sorriso amarelado pelo fumo. Claudia reclamou e colocou duas notas de dez na mão do motorista.

— Come quieto da porra, se o maldito James não tivesse feito aquele gol, eu faturaria meus oitenta paus fácil, fácil — reclamou Claudia cutucando Tiago com o cotovelo. — E você, Nhonho? Não vai pagar, não?

Tiago franziu o cenho para a mulher e pendeu a cabeça de lado naquela expressão característica dele de "fala sério".

— Só tenho uma de cem, no posto eu troco.

— Ouviu isso, Maurício? O bonitão aqui vai te passar a perna. — Claudia ria batendo palmas.

— Ninguém me passa perna não, senhora — retrucou calmamente com o maldito sotaque mineiro, comendo palavras, enrolando o R mais que o necessário. Claudia pareceu não ouvir a resposta.

— Do jeito que ocê é lerdo, acho possível sim, senhor — imitou o sotaque dele, ainda rindo.

Assim que entraram na pequena cidade de São Lourenço da Serra, a gangue abasteceu o grande Highline e seguiu para a pousada que sempre ficava quando passava por aquelas bandas. Pousada São Lourenço. Supercriativo.

Maurício deu um jeito de estacionar o caminhão do outro lado da rua, ocupando pelo menos um quarto de sua largura, pois o enorme caminhão não cabia no estacionamento da pousada.

Os quatro se estabeleceram em seus devidos quartos enquanto Joaquim permanecia no caminhão. O homem dormia que só a gota e todos sabiam que ele preferiria ficar e cuidar do bebê preto e vermelho da patroa, palavras dele. Sendo assim, Tiago foi até a área destinada à alimentação da pousada procurando o que jantar, Maurício foi tomar uma ducha e Tatiany disse que leria A Culpa É Das Estrelas, mas era mentira. Ela iria ler Cinquenta Tons Mais Escuros pela quarta vez e logo em seguida iria dormir para retomar suas forças e capacidade de raciocino crítico. Já Claudia passou um batom vermelho vivo nos lábios, penteou os longos cabelos pretos, passou lápis de olhos novamente e desapareceu. Picou a mula. Escafedeu-se. Sabe-se lá aonde a perua tinha ido.

Mais tarde naquela noite Tiago decidiu ir dar uma checada no caminhão, além de levar um lanche, para o caso de Joaquim sentir fome. Juntou todas as coisas numa sacola de mercado, entregue pela dona da pousada, Dona Rita ou Vita, algo assim. Deixou as coisas ao lado do colchão onde Joaquim continuava apagado e sentou-se no banco novamente.

Olhou ao seu redor para conferir se não havia ninguém olhando, mas a rua estava vazia. As luzes nas casas começaram a acender-se, um poste em frente à porta da pousada lançava luz diretamente sobre a cabine do caminhão. De debaixo do banco Tiago retirou nada mais, nada menos que uma carabina. Mas não qualquer carabina, apenas sua AR-15.

Era sua arma de estimação. Ele passou a mão sobre o cano de metal escuro, quase numa carícia. Tamanha era sua distração que ele não percebeu que um menino o estava encarando numa bicicleta com a insígnia amarela do morcego preto estampada na cestinha. Assim que o menino percebeu que Tiago o vira, não perdeu tempo e pedalou para longe do caminhão, virando a rua depressa.

Tiago respirou fundo e fechou os olhos, sentindo seu coração acelerado. Era provável que o menino não tenha visto nada, afinal ele estava numa bicicleta do Batman, deveria ter no máximo sete anos. Não querendo correr mais nenhum risco, Tiago colocou a arma no esconderijo novamente e desceu às pressas do caminhão, quase caindo do pequeno espaço entre a cabine e o chão.

Silenciosamente rezou a Deus e a todos os seus santos, a Satanás e a todos os seus demônios para que o menino não comentasse nada com ninguém e prometeu a si mesmo que ficaria no quarto o restante da noite. Mas quando subia as escadas do estabelecimento, sentiu um cheiro de frango assado. Pelo amor de Cristo, nada era melhor que frango, pensou antes de ir novamente para a área de alimentação.

Pelo menos uma hora mais tarde, Claudia voltou para a pousada trazendo consigo um rapaz de aparentemente 25 anos — muito mais novo que ela — e de muito boa aparência. Estatura média, ombros largos, pele morena pelo sol e cabelos curtíssimos, recém-cortados na máquina (número dois). Os dois entraram no estabelecimento aos amassos. Claudia praticamente engolia o rapaz, que estava ocupado tentando retirar as curtas roupas da mulher. Eles mal conseguiam se desgrudar, mas fizeram o caminho até o quarto de Claudia, onde a prima dela dormia tranquilamente com o livro aberto sobre a barriga. O jovem parou um momento e perguntou se não havia problema em usar o quarto com Tatiany lá dentro.

— Ela não tem o que reclamar porque provavelmente você será o único homem pelado que ela vai ver nos próximos dias. Agora vem cá — disse Claudia deitando-se na cama e puxando o desconhecido por cima de seu corpo.

Exatamente uma hora e vinte e cinco minutos depois, aproximadamente as 21h37, a porta do quarto foi chutada com força e chocou-se na parede, acordando as duas primas e o jovem, assustados. Dois policiais entraram empunhando suas pistolas .38 apontadas para as duas camas de solteiro.

— Vocês devem ser Claudia e Tatiany Bernardes — deduziu um dos policiais, o mais bonito dos dois. Tatiany, percebendo os homens, jogou seu livro preferido no chão.

— Tecnicamente eu sou Machado e ela é Bernardes, porque o sobrenome vem da minha família por parte de mã... — A menina foi interrompida por Claudia antes de finalizar a frase.

— O que os senhores desejam? — perguntou casualmente, mas estava nua para quem quisesse ver. Os homens trocaram um olhar e reviraram os olhos.

— Se vista, senhora, acho melhor nos acompanhar — o segundo policial disse. Claudia levantou a contragosto da cama, recolheu suas roupas espalhadas pelo quarto e vestiu-se vagarosamente, gesto que fez com que os policiais a apressassem pelo menos quatro vezes.

O jovem que a acompanhava vestiu sua calça jeans e seguiu, calado, as mulheres. Assim que os três chegaram à rua, avistaram, lado a lado, Tiago e Maurício em frente ao caminhão.

Os policiais fizeram com que todos ficassem em fileira gesticulando com suas armas. Claudia ergueu uma sobrancelha, encarando Tiago. Com certeza fora ele quem entregara toda a gangue para a polícia.

— Ora, ora, o que temos aqui? — ironizou um terceiro policial, que até então não fora notado. Ele era pequeno, barrigudo e usava óculos de grau. — Nada mais e nada menos que os Redblacks — disse prolongando a pronúncia do S.

— Quem? — perguntou o acompanhante de Claudia. O tal policial o olhou de cima a baixo com o nariz enrugado.

— Você não assiste o Jornal Nacional, jovem? Todo mundo está doido, procurando esses malditos ladrões — explicou enojado. O jovem deu de ombros, bem aquele estilo de garoto que só serve para ser bonito mesmo.

— Não roubamos nada, tiramos o que nem deveria existir— corrigiu Tatiany, o que fez com que os policias rissem.

— Ladrões?! Você me disse que era empresária! — brandiu o rapaz para Claudia.

— Sou empresária, mas não no ramo que disse para você... — disse calmamente sem olhar para o rapaz. Ele cruzou os braços com ódio e deixou o peso do corpo sobre apenas uma das pernas, numa pose não muito máscula.

— Você mentiu para mim?!

— Seja razoável... — pediu Claudia.

— Você queria o que, meu bem? Olha para onde ela te trouxe. Você acha mesmo que ela tem grana para ser uma empresária? — Tatiany se intrometeu.

— Ei! Eu tenho grana sim, quem teve a ideia de parar aqui foi o gordinho, quer dizer, Tiago — defendeu-se.

— Tive a ideia porque você disse que queria parar exatamente em São Lourenço da Serra e a comida daqui é boa — esclareceu Tiago. Claudia riu em escárnio.

— Faça-me o favor, você só pensa em comer.

— E você só pensa em sair com meninos 20 anos mais novos — retrucou Tiago. A mulher abriu a boca em choque e tentou atacá-lo com as unhas, mas o policial bonito a segurou. Uma discussão intensa iniciou-se entre o grupo, até mesmo Tatiany e Maurício trocavam ofensas e toda aquela barulheira dificultava o trabalho da polícia. Sendo assim, o policial de óculos sacou sua arma e atirou para cima, fazendo todos se calarem imediatamente.

— Não entendo como vocês conseguiram durar tanto tempo, não conseguem nem se dar bem um com o outro. — Gesticulou com sua arma horizontalmente apontada para eles. — Eu costumava admirar vocês, seu trabalho, seus ideais... Vermelho de sangue e preto de morte — citou rancorosamente a frase que a gangue tomara como slogan. — Mas agora percebo que vocês não passam de uma grande farsa. — Concluiu, escarrou e cuspiu no chão. Tatiany se segurou para não fazer nenhum comentário.

— Vocês todos estão presos. Mãos para o alto, palmas viradas para mim. — Indicou o policial bonito, com a voz firme. — Agora se deitem no chão. Devagar — disse sílaba por sílaba da ultima palavra.

— Os malditos usaram a abertura da Copa para andarem livremente pela cidade — comentou o homem de óculos enquanto os parceiros algemavam os integrantes da gangue. — Impostores, desviaram do caminho. — Concluiu com ódio.

Assim que terminaram de algemá-los, os três policiais posicionaram-se lado a lado e observaram com júbilo a gangue deitada ao chão. Estavam sorrindo, provavelmente receberiam uma promoção por prenderem um dos grupos mais procurados do Brasil. A gangue já havia feito vítimas em Minas Gerais, Rio de Janeiro, Goiás, algumas partes de São Paulo e provavelmente seguiam para o Paraná agora. Eles levavam aquilo de mais sagrado para a sociedade, tudo o que eles necessitavam para ter uma vida completa e feliz no contexto em que viviam, Destruíam amizades, namoros e famílias, em poucos meses eles conseguiram arrancar de casas e mais casas a pouca paz que seus habitantes tinham. Tudo isso utilizando um programa muito simples apelidado de “cair a ficha”. O programa era instalado, efetivamente, à base da força bruta. Era colocado sobre a cabeça da pessoa, como um capacete, e literalmente assaltava tudo que a mantinha na famosa vidinha conformista.

O vidro do caminhão lentamente foi se abaixando, fazendo um som engraçado no atrito com a borracha que o firma na porta. Os policiais olharam assustados para a cena e ficaram boquiabertos quando um homem se posicionou com um dos pés na janela, apontando a queridíssima AR-15 diretamente para os oficiais.

— Não somos impostores. Somos os únicos que tentam mudar as coisas por essas bandas. E não, não somos ladrões — explicou Joaquim calmamente, antes de engatilhar a arma e atirar no pescoço, ombro e cabeça de cada policial. Os três caíram no chão e de seus membros vazava sangue suficiente para sujar o asfalto escuro.

Joaquim não perdeu tempo e da mão de um dos policiais retirou a chave das algemas. Em seguida, libertou seus companheiros, assim como o acompanhante de Claudia. Os cinco riram da situação até que Claudia fez um de seus típicos comentários.

— Isso é hora de você acordar, Joaquim? Achei que ia pra cadeia e que você já tinha fugido.

— Que nada, Dona Clau, acordei foi com o tiro do policial — confessou Joaquim coçando os cabelos castanhos e cacheados. Tinha no mínimo 1,80cm de altura e era bem gostoso, nos quesitos de Claudia. Mas como ela mesma dizia: Redblacks era uma família e tem um único propósito. Pegar os integrantes não era um deles.

O jovem que estava com Claudia decidiu interromper seus pensamentos.

— Se vocês não são ladrões, que merda tem dentro do caminhão? — perguntou. Os companheiros olharam uns para os outros, não sabendo se poderiam dizer a verdade a ele. Por fim, todos encararam a líder do grupo, que suspirou.

— Podem contar, Guilherme não vai abrir o bico sobre nada — assegurou.

Ah, então esse era o nome do rapaz.

Enquanto Joaquim e Maurício empilhavam os corpos dos policiais na calçada, Tiago procurava a chave do cadeado que trancava o baú caixa seca. Percebendo que ele não iria encontrar a chave tão cedo, Tatiany revirou a caixa de ferramentas e encontrou uma chave de roda, que considerou pesada, e caminhou até a traseira do caminhão. Depois de vários golpes com a ferramenta, finalmente o grande cadeado cedeu e ela abriu a porta do caminhão.

Guilherme olhou para o conteúdo em seu interior de boca aberta e olhos brilhando, fez até menção em tocar, mas não se atreveu.

— Agora entendi o que vocês roubam. Eles não deveriam perseguir vocês, eles deveriam dar suporte à causa! — disse Guilherme animadamente. Seu comentário fez com que todos rissem.

Ninguém poderia culpá-lo por sua opinião idealista, até mesmo utópica. Ele simplesmente não entendia que não havia policial, juiz ou político no Brasil que permitisse que eles a roubassem da população.

— E eu achava que eu era a idealista — brincou Tatiany antes de fechar a porta. —Precisamos de um novo cadeado, vai que toda essa hipocrisia vaze de volta para seus donos.


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Notas finais do capítulo

Gostaria de agradecer imensamente à minha Betareader que, em momento algum, xingou-me por esquecer de usar artigos e por ter me dado aquele toque sobre vários detalhes. Muito obrigada pela leitura, pessoal!

~~Não esqueçam de marcar a história como lida, é muito importante.