Ciclo Vicioso escrita por Lady


Capítulo 2
Peças.


Notas iniciais do capítulo

Olá para todos.
Então... Eu demorei, eu sei, mas tenho algo a dizer a vocês.
Esta fanfic será mensal, ou pelo menos tentarei postar um capitulo por mês, mas pode sair mais de um capítulo também, estou apenas garantindo que sairá um por mês o/.
Enfim, quero avisar, também, que prestem bastante atenção nas datas de cada quebra tempo, elas são importantes para que nao se percam u.u.
Boa leitura.



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/523841/chapter/2

Ato I

Peças.

~~

Quarta-feira, 15 de julho de 2024, 02:55 PM

Localização: Roma, Itália – Mansão Vongola.

Nota: Ninguém sabe. Ninguém entende. E, ás vezes, é melhor assim.

Piscou, desviando o olhar da folha a sua frente para o pulso onde a manga de seu terno escorria deixando a miséria de seu passado a sua vista, mesmo que esta ainda fosse escondida por ataduras. Restringiu a vontade de acariciar os pulsos enquanto puxava, levemente, a manga do terno para encobrir qualquer coisa que pudesse ser vista.

Ergueu o olhar novamente, isso enquanto baixava a folha e fixava o olhar naqueles que estavam consigo na reunião. Fixou seus enigmáticos olhos dourados no homem sentado a cadeira na ponta oposta da longa mesa, e quase sorriu quando pode identificar uma quantidade absurda de nervosismo escondida por trás de uma face lívida.

– Uma proposta bem interessante, Senhor Raphael. – informou ganhando alguns olhares. – Mas, diga-me, com que convicção pode afirmar que a sua Famiglia merece mais território?

O homem engoliu em seco, piscando confuso. Vongola Décimo era jovem, mas – como fora informado – não era idiota. E quando abriu a boca para se pronunciar a voz do jovem Don o cortou.

– Chegou a meu conhecimento que sua Famiglia estava envolvida em tráfico de mulheres com Americanos. – anunciou largando algumas fotos sobre a mesa deixando-as, assim, a vista de todos os outros chefes ali presentes. – E, é claro, não vamos esquecer-nos do comercio ilegal de obras de arte e medicamentos.

– Que escória. – resmungou Dantes, dono cabelos negros e olhos obsidianos; uma pele creme clara e uma aparência jovial, tal como Tsunayoshi, e vestindo-se formalmente num terno de grife Italiana. Mas mesmo a bela aparência do homem poderia cobrir a horrível personalidade que o mesmo possuía. – Nem terei pena quando Vindice vier os degolar. – e seu sorriso fora tão largo e cruel quanto à voz aterradora de um verdadeiro Vindice.

– Por mais que me doa afirmar isso... – o sussurro jovial fez-se presente num tom feminino, e facilmente todos os olhares decaíram sobre a figura esbelta da bela adolescente de cabelos longos azulados trajando-se num vestido branco de seda e usando um chapéu volumoso; esta, apesar de ser tão jovem, era chefe da Famiglia Giglio Nero, Uni. – Senhor Dantes tem sua razão e diante de tudo o que posso ver... – informou largando umas das fotos que fora tirada em período noturno, mas que ainda sim permitia-se identificar o tremulo homem ao fim da mesa cercado por mulheres acorrentadas e drogadas, enquanto passava ordens para algum subordinado de confiança. - Para tal escória meu voto é um sublime e firme: Não. – e por fim a garota jogou uma madeixa azulada de seu cabelo sobre os ombros antes de cruzar os braços e ignorar completamente o olhar de todos sobre si, ainda mais o olhar raivoso de Raphael.

Num piscar de olhos todos os outros líderes presentes foram se pronunciando, sem nenhum conflito, ou debate, a respeito do que se era visto. Nenhuma defesa para o aturdido Raphael, cuja raiva – ainda sim embebida em temor – o consumia enquanto fitava o castanho e jurava vingança, silenciosamente, contra o mesmo e a Vongola.

– Está decidido então. – cortou Tsunayoshi, e todos os diálogos que ocorriam morreram no mesmo segundo. As orbes castanhas banharam-se num dourado-ouro impecável e assustador, e todos ali presentes podiam sentir a aura que envolvia o jovem Don. – Seu pedido; tanto será negado, como seu território será transferido para uma Famiglia mais promissora e competente. – anunciou numa imponência sublime. – A Famiglia Scuro deve retirar-se da Itália o mais breve possível, caso insistam em sua permanência tal ato será aceito como atentado de Guerra e a Famiglia deverá ser erradicada, isto dentro das leis de Vindice. – ouviu-se o farfalhar de papeis junto ao barulho estrondoso de uma cadeira chocando-se violentamente contra o chão.

– Você não tem esse direito seu moleque miserável! – berrou o Raphael, provável, chefe da Scuro Famiglia. – Acha que só porque lidera a Vongola tem o direito de mandar e desmandar onde e em quem quiser? Pois fique sabendo que nunca sairei daqui! Nasci e cresci na Itália, assim como minha Famiglia... – e antes que pudesse dar continuidade a suas palavras, uma aura escura sem um pingo de benevolência afundou a sala num frio invernal.

– Calado herbívoro estúpido! – rosnou o imponente Guardião da Nuvem Vongola, este que se encontrava escorado na parede ao lado da única porta que havia no cômodo de fechadas janelas vítreas. E diante daquelas palavras até mesmo os acompanhantes do restante dos chefes presentes tremeram. Odiavam admitir, mas Hibari Kyoya era uma figura surpreendentemente admirável e perigosa.

Tsunayoshi pigarreou antes de terminar suas falas.

– Gênova, e todos os territórios que antes pertenciam a Scuro, estarão agora sob jurisdição da Famiglia Trad 6. – e pesadamente as orbes de ouro decaíram sobre um surpreso Dantes. – Sabe as regras, então não me decepcione Senhor Dantes. – sussurrou ao homem, cujas mãos apertavam-se firmemente em punhos a fim de bloquear o nervosismo diante da confiança depositada sobre seus ombros. Nunca decepcionaria o jovem Vongola, morreria antes de cometer tamanho infortúnio.

– Não pretendo, Décimo. – respondeu, firme.

– A reunião está encerrada. – afirmou o jovem Vongola erguendo-se, ato que foi seguido por todos os outros chefes que, junto a seus acompanhantes, fizeram uma leve mensura em respeito à Sawada Tsunayoshi, antes de seguirem seu caminho para uma área mais confortável onde pudessem conversar despreocupados e apreciar um bom lanche, como se a ameaça e a reunião conturbada jamais houvesse ocorrido.

– Você vai cair em breve Sawada Tsunayoshi, e com você irá a Vongola e todos esses tolos que o seguem! – rosnou o chefe da Scuro Famiglia, Raphael Belicardo. – Terei o maior prazer em torcer seu pescoço com minhas mãos...

– Você pode tentar. – alegou o castanho erguendo o olhar para o homem de meia idade e a intensidade com que as orbes douradas brilharam faria a própria Vindice tremer, se é que já não haviam feito um dia.

Sabiamente Belicardo recuou um passo, postando-se mais próximo de seu acompanhante. E da mesma forma com que pode notar que o moreno perdera o interesse em si, Raphael também notou a aura escura que tomou as redondezas da sádica e viciosa Nuvem cruel.

Engoliu em seco, o medo correndo rápido em suas veias.

– Hibari-san, poderia escoltá-los para fora da mansão, por favor? – pediu o Don, num japonês que utilizava apenas para conversar com seu Guardião da Nuvem. – Quando retornar estarei com seu chá já pronto. – e com o perfeito e branco sorriso que fora oferecido ao moreno, Kyoya não teve como negar aquilo; na verdade, seria um prazer para si escoltar tal escória, e, também, garantir que a mesma jamais pensasse em sequer pisar nas propriedades de seu chefe novamente.

Quando viu-se sozinho fora quase por reflexo que checara se não havia ninguém no corredor antes de fechar a porta do cômodo. Desabotoou o terno com uma facilidade adquirida com os anos e logo o depositou sobre a cadeira que a pouco encontrava-se sentado. Abriu os dois únicos botões nas mangas de sua camisa social alaranjada e puxou-as até os cotovelos.

Sentia os pulsos coçarem em um desejo puramente masoquista, mas o Don sabia que não podia sucumbir a aquela vontade, não ali, não agora. Não quando podiam ir atrás de si e descobrirem seu pior lado. Sua fraqueza mais escondida. E também na podia assim o fazer, pois tinha de se controlar, tinha de conter-se.

Abriu e fechou as mãos algumas poucas vezes, exercendo uma força desproporcional diante de cada movimento. Caminhou de um lado para outro, buscando desviar a mente do desejo insaciável que sentia. Esfregou os pulsos fazendo as ataduras criar um leve atrito que, por mais breve que pudesse ser, acalentava a indomável vontade.

Rangeu os dentes enquanto sua face formava uma careta bestial. Tinha de suportar. E com isso em mente o moreno arrumou-se novamente, vestindo mais uma vez o terno - ao fim era como se sequer houvesse mexido em alguma parte de sua vestimenta -; e logo tratou de seguir para a cozinha – com um sorriso tão falsete quanto o de qualquer ator famoso -, prometera a Kyoya um chá e assim o faria, tal como um leve lanche para os chefes que conversavam, provavelmente, no jardim que a aquele horário ficava sempre tão belo.

Nada poderia dar errado e nada daria errado. Ele estava sendo perfeito como sempre fora e como sempre deveria ser.

Sua fachada era impecável.

E, para sua infelicidade, ninguém nunca veria através dela.

(...)

Sexta-feira, 18 de julho de 2014, 06:37 PM

Localização: Roma, Itália.

Nota: O céu é muito vasto para se viver na solidão.

Os passos pequenos, mas ainda sim rápidos, do bebê sequer fazia barulho contra o chão coberto por uma saliente camada de tecido vermelho. Parou frente a grandes portas duplas cujas maçanetas de prata e ouro devolviam o reflexo de seu camaleão verde-neon que instalara-se num sono impecável sobre a fedora que encobria seus obsidianos e enigmáticos olhos.

Ergueu a cabeça num ato milimetricamente calculado antes de as portas se abrirem para si com um gemido ensurdecedor e irritante. Fitou a escuridão parcial que se espalhava pelo cômodo, o fez por mínimos segundos antes de adentrar no recinto mal iluminado.

As portas fecharam-se atrás de si e rapidamente diversas luzes se acenderam. Viu um velho sentado ao trono mais a frente, alguns degraus mais alto; ao seu lado vinham alguns homens de terno – seus Guardiões – todos quietos e nenhum levava alguma expressão de solidariedade, exceto pelo velho – é claro – que podia ser identificado como Timoteo, ou Vongola Nono.

– Reborn. – sorriu o velho acenando casualmente para o bebê se aproximar enquanto o idoso erguia-se de seu lugar ao trono. – Já faz algum tempo que não nos encontramos... Por que não tomamos algo enquanto conversamos? – continuou-o, num polido e profundo italiano.

O assassino não recuou, mas fora cauteloso em suas ações e respostas; mesmo que conhecesse Timoteo há um tempo deveras extenso – e também por ter dedicado-se a Vongola mais do que a qualquer outra Famiglia –, Reborn não levava a fama de maior assassino do mundo para nada, ele era cauteloso, mesmo perto de conhecidos e amigos; só havia uma pessoa no mundo que conseguia fazê-lo relaxar em sua presença, mas tal pessoa jamais descobriria ou ficaria sabendo sobre tal informação.

Já acomodados ao sol frágil do fim de tarde, apreciando um forte café com alguns petiscos, o idoso se pronunciou, curioso e cauteloso sobre tudo o que poderia ser dito.

– Deve estar interessado sobre o porquê lhe chamei aqui, estou certo? – obviamente era uma pergunta que não necessitava de resposta, mas, ainda sim, o Arcobaleno do Sol acenou uma solene confirmação. Em silêncio o velho desviou o olhar do pequeno assassino trajando um terno, onde o único destaque era a chupeta dourada pendurada sob seu pescoço, para a xícara em mãos onde o liquido negro era mexido com lentidão. Bebericou o café antes de tornar a continuar. – Estou interessado em saber sobre o desenvolvimento do meu neto... – e então o assassino piscou, não compreendendo exatamente o significado por trás daquilo, ou compreendendo até demais para seu prazer. – Algum tempo atrás recebi memórias, durante meu sono, cogitei que fosse apenas um sonho; mas algo me dizia que não eram, que eram do futuro. – afirmou, voltando as orbes cansadas para o sol poente ao longe.

O silêncio fez-se presente por alguns segundos enquanto o bebê assassino absorvia o que fora dito, e debatia internamente o que levaria Nono a lhe dizer aquilo. Fitou o velho por alguns segundos, talvez ele estivesse cogitando já a possibilidade de passar a Vongola para Tsunayoshi? Talvez, mas, ainda sim, aquilo poderia ser perigoso, afinal, por mais que odiasse admitir, o adolescente não estava preparado. Era forte, isso era obvio, era dedicado, e tinha um talento incrível para se tornar um dos maiores chefes que a Vongola já teve – talvez até maior que o próprio fundador -, mas Reborn sabia que não era o momento, não agora. O jovem Sawada ainda era uma pedra bruta que aos poucos era lapidada e, talvez, ainda fosse necessário um ano para que o rapaz adquirisse toda a forma física e psicológica para poder lidar e controlar a máfia.

Rapidamente o Arcobaleno desviou o olhar, seguindo o percurso para onde o velho Vongola encontrava-se tão absorto. Um espetáculo de fim de tarde fora o que o recebeu. O sol em seus últimos raios espalhando-se pelo céu entre laranja, azul-claro, azul-escuro, amarelado e um toque especial de fios esverdeados – como videiras a subir pelo céu, indo além das nuvens em busca do paraíso prometido. Mas, por mais difícil que fosse de admitir, aquela cena lhe lembrava da batalha do futuro; não que fosse catastrófica – como a luta final havia sido –, mas sim por que aqueles tons, aquele ouro, dourado, mesmo o azul celeste, lhe lembravam da fúria avassaladora que seu aluno descarregara - como suas chamas - em Byakuran, extinguindo a vida do mesmo ali, o levando ao pó – ou a menos que isso. E quando o sol pusera-se, veio à noite calma se espalhando pelo céu tão acolhedor. Um céu que abraçava a tudo e a todos; que perdoava; que compreendia; e que lutava por seus elementos, para que eles pudessem dançar livres e demonstrar tudo de si.

– Meu aluno está crescendo. – afirmou o Arcobaleno dando um último gole em seu café. – Admito que está forte, que têm potencial para ser muita coisa, assim com têm potencial para colocar a Vongola no caminho que deveria ter percorrido desde sempre; mas... – e rapidamente as orbes negras do assassino fixaram-se nos cansados olhos do idoso. Ele sabia o que Timoteo planejava, era tão obvio de se ver, ainda mais após ver o velho apreciar com tanto carinho um céu que era a descrição perfeita de Tsunayoshi. – Não é o momento Nono, Tsuna ainda não está pronto e empurrá-lo cedo demais para o comando pode acabar destruindo-o. – e com uma delicadeza surpreendente Reborn depositou a xícara e o pires dobre a mesa posta para si e para o velho Vongola. Empurrou levemente a fedora em sua cabeça e centrou seus infantis e sérios olhos, não no idoso, ou em Timoteo, mas no seu chefe, no homem que o contratou para treinar o herdeiro do maior império do sub-mundo da máfia. – Tsuna vai herdar a Vongola, eu sei disso. Mas o momento não é esse. Nossa ida ao futuro o pressionou demais e também mostrou, não apenas a mim, mas a todos os Guardiões, que Sawada Tsunayoshi possui tantos segredos quanto deixou visível. – e assim as pequenas mãos do bebê fecharam-se em punhos enquanto Leon tremia sob a fedora, angustiado pelos sentimentos diversos que cruzavam a face de vidro de seu mestre. – Ele esta escondendo alguma coisa e eu preciso descobrir o que é.

Observou a pequena figura por alguns instantes, nunca Timoteo vira o grande Reborn expressar tantos sentimentos de uma vez só; e se havia algo que o levava a aquele estado, certamente era algo que precisava ser analisado. E então ele sorriu antes de dizer:

– Alguns segredos devem permanecer escondidos, Reborn. – sussurrou-o, mesmo tendo certa curiosidade sobre como seu neto conseguira esconder algo do maior assassino do mundo, isso sem contar o fato de que Vongola Nono encontrava-se curioso sobre o tal segredo.

– E outros segredos matam pessoas. – devolveu a questão puxando a fedora para encobrir seu olhar. – Irei descobrir o que ele esconde. – dito isso acenou levemente antes de descer da cadeira e sair do aposento.

Quando viu-se sozinho o velho não deixou de suspirar, cansado. Dera um leve aceno, dispensando seus guardiões para suas funções, ou para o que quer que queiram fazer; logo deu as costas e retornou ao próprio escritório.

Largou o corpo sobre a poltrona antes de soltar um suspiro pesaroso. Seus olhos cansados dançaram entre os poucos papeis que ali se encontravam, mas logo pararam sobre as próprias mãos. Soltando mais um suspiro o velho girou a cadeira, fixando o olhar na grande janela que havia atrás de sua mesa esta cujas cortinas longas e vermelhas impediam qualquer visão do lado de fora. E com leveza levou a mão direita ao pulso esquerdo, puxando levemente a manga e deixando a mostra a pele fina, lisa, onde uma cicatriz em particular lhe chama a atenção, esta escorria pelo pulso em um ponto critico; fatal.

Uma lembrança de muito tempo atrás; era o que aquela cicatriz era. Uma lembrança.

Um pesadelo.

(...)

Sábado, 19 de julho de 2014, 07:37 AM

Localização: Namimori, Japão – Residência dos Sawada.

Nota: O fato de eu não saber o que fazer comigo mesmo me destrói. Tento me entender, juro, eu tento. Mas quanto mais eu penso, mais me confundo.

Lentamente seu olhos se abriram deparado-se com as cores claras da parede onde sua cama encostava-se. Podia sentir seu travesseiro meio úmido e amaldiçoou-se quando as cenas cruéis do pesadelo que tivera ainda se encontravam muito claras em sua mente. Maldições, fora isso que praguejara em silêncio enquanto agradecia mentalmente por Reborn encontrar-se na Itália – claro que isso era devido a um chamado de seu avô – e retornaria apenas dali a dois dias, apesar de que o retorno de seu tutor não trazia bons sentimentos para si. Sua intuição lhe alertava que algo estava para vir junto a seu tutor.

Virou-se sobre o leito cravando seus olhos castanhos vazios no teto de tom neutro. A claridade batia em sua visão através das fendas na cortina da janela e, mesmo que minimamente, isso o fazia sorrir. O dia prometia ser bem ensolarado e pacifico, na medida do possível.

Ficou em silêncio apenas apreciando os mínimos sons que se faziam presentes em toda residência. Provavelmente Lambo, I-Pin e Fuuta ainda estivessem dormindo, um sono dos anjos, enquanto Nana preparava calmamente o café da manhã para todos e cantarolava baixo uma musica qualquer de sua infância.

Com suavidade a cabeça do castanho pendeu para a lateral proporcionando ao mesmo uma visão ampla do aposento e uma vista perfeita da porta, esta que ele notou estar trancada como toda manhã sempre estava. Não tardou para que retornasse a posição anterior, mas, desta vez, erguendo as mãos para fitar os pulsos enfaixados – dormentes. Por baixo das camadas o sangue já encontrava-se coagulado contra as ataduras, e Tsunayoshi sorriu diante da sensação agradável que sentia, do formigamento, das picadas leves, onde os cortes haviam sido feitos.

Sentou-se sobre a cama desviando seus olhos castanhos das mãos pálidas para fitar as brechas dispostas pelas cortinas em sua janela. Tinha que levantar, afinal, prometera a seus amigos – principalmente a Hayato e Takeshi – que iriam fazer um piquenique aquela manhã. Com um suspiro abandonou o próprio leito aconchegante e quente, e seguiu caminho para o banheiro a fim de começar, realmente, o dia.

Não possuia nenhum desejo ou esperança para aquele dia em particular, apenas queria que ele passasse o mais rápido possível e, se tivesse sorte, que os valentões esquecessem-se de si e/ou não cruzassem caminho consigo.

(...)

Terça-feira, 21 de julho de 2024, 07:02 PM

Localização: Roma, Itália – Mansão Vongola.

Nota: As pessoas mudam. E muitas vezes tornam-se o que mais temiam.

Relaxou os ombros antes de um suspiro pesaroso escapar de seus lábios. Quanto tempo já fazia que estava ali apenas sentado em sua poltrona lendo e relendo relatórios, assinando aqueles que necessitavam de sua assinatura e comprovação, dispensando para subordinados – aqueles que, como Gokudera era no passado, o reverenciavam e seguiam fielmente como cães adestrados – cartas que deveriam seguir para os destinatários corretos.

Estar ali não era como havia imaginado. Aquele trabalho não era o que pretendia, nunca foi, nem o que imaginava. Quero dizer, quem levantaria a possibilidade de que chefes da máfia passavam grande parte do dia lendo relatórios de pesquisas, de empresas, de missões e tudo o que era preciso. Aquilo era um pesadelo para Tsunayoshi e uma tortura excruciante cada vez que seus pulsos cobertos – tanto pelas mangas longas quanto pelas ataduras – roçavam sobre a madeira rústica da mesa causando-lhe a enervada sensação de que precisava de um corte, apenas um.

Um que seria seguido por outro e outro, e outro, e outro... E quando saísse do torpor já seria tarde, e tantos ferimentos quanto o necessário espalhavam-se por si; e não adiantava tentar controlar-se, aquele vicio era maior e mais forte, só perdia para o estresse diário que acumulava-se até levá-lo a aquelas ações. Era um maldito ciclo vicioso de atos pecaminosos e masoquistas, e Tsunayoshi sabia disso muito bem – bem até demais talvez -, ele queria mudar isso, mas não conseguia, não mais...

– Se ao menos... - lamentou-se. - Se ao menos alguém houvesse notado... – sussurrou, cessando os movimentos com a caneta para poder fitar o pouco das ataduras que apareciam. E poucos segundos após, tornou a continuar a assinar o papel e ler o que faltava. O jantar já se aproximava, e ele ainda tinha de tomar banho para poder se juntar a alguns de seus Guardiões para a refeição noturna.

Mas mesmo com tudo aquilo, mesmo com todo o trabalho diário, com toda presença perto de si; o Don não conseguia deixar de questionar-se como poderia ser sua vida se houvessem o descoberto, se houvessem ajudado-o, impedindo-o de prosseguir com aquelas ações dia após dia.

Os minutos se arrastaram a seu ver, mas antes que se desse conta estava se erguendo de sua poltrona a fim de seguir para o quarto; o que claramente não se tornou possível após ouvir batidas ecoarem por todo o cômodo, estas que provinham de sua porta.

Suspirou, largando-se novamente sobre o assento extremamente macio.

– Entre. – informou, não tardando em deparar-se com um sorriso largo e branco do seu irmão mais velho, Dino Cavallone. – Dino-nii? Pensei que estivesse em Veneza com Uni e Layla checando com Dantes a deportação da Famiglia Scuro...

E assim o loiro riu, suave, enquanto coçava a nuca – arrepiando os cabelos agora curtos - de forma constrangida. Sabia que estava esquecendo algo, e esse ‘algo’ era de avisar para o irmão menor que o processo de deportação da “escória”, de acordo com os chefes da Giglio Nero e Trad 6, ocorrera mais cedo que o previsto e sem muitas complicações.

– Desculpe, desculpe. – riu sem graça. – Eu me esqueci de avisar que ocorreu tudo antes do previsto. - E então o castanho piscou, desconcertado. – Mas não se preocupe otouto, não ocorreu nenhum problema inesperado. – e vendo o suspiro de alívio de seu irmão menor, Dino não pode deixar de sorrir, mas, claro, que tal sorriso diminuíra exponencialmente quando seu olhar deparara-se com algumas ataduras envolvendo o pulso fino do castanho que, sem perceber, a manga do terno havia escorrido revelando algo que não deveria. – Aconteceu alguma coisa com seu pulso? – questionou, preocupado.

Em segundo todo o corpo do castanho congelou, claro que o sorriso nos lábios do mesmo congelara de uma forma que chegava a ser indescritível já que o mesmo não deixava de transmitir uma aura positiva.

– Está tudo bem Dino. – sorriu, envergonhado. – Foi apenas uma torção leve que tive outro dia. – e nem com a desculpa completamente idiota, o loiro desconfiou, afinal, seu irmãozinho não tinha pelo que mentir para si e, também, ele estava sorrindo, não podia ser algo sério; era o Tsuna, afinal, seu doce e gentil irmãozinho que não seria capaz de mentir para si, ou para nenhum de seus Guardiões. – Por que não fica para jantar aqui? – questionou o castanho, ainda sorrindo, largando tudo sobre a mesa e erguendo-se, aproximou-se do loiro, ainda de pé frente a sua mesa, e passando o braço sobre os ombros do mesmo o guiou para fora do aposento.

– Está mesmo tudo bem com seu pulso Tsuna? – questionou, após alguns minutos, logo quando encontravam-se próximo a sala de jantar. E novamente o moreno o olhara nos olhos. O castanho tão suave e surpreendentemente profundo o engoliu numa certeza absoluta de que estava tudo perfeitamente bem.

– É claro que sim! – e o loiro nunca ouvira aquele tom de voz confiante vindo do menor, mas, obviamente, Tsunayoshi estava crescendo, se desenvolvendo, e mais do que nunca tinha de ter um tom de voz como aquele, com uma autoridade e uma certeza avassaladora. E toda aquela confiança e autoridade, todo o sentimentalismo que mostrava que o Sawada estava se transformando em alguém incrivelmente temido, poderoso e incrível; apenas fez com que o Don Cavallone sorrise num orgulho genuíno.

Mais uma vez ninguém notou. Foi uma atuação perfeita, esplendida, digna de filme; e Tsunayoshi queria mudar isso a todo custo. Mas o que o castanho não percebeu, ao menos não naquele momento, fora o leve brilho que piscara em seu anel Vongola, claro que, isso antes de voltar a apagar-se como se aquilo nunca houvesse acontecido, mas obviamente acontecera e, certamente, tornaria a acontecer novamente.

E outro fato que passou despercebido pelo menor fora o par de olhos obsidianos que o fitou, mudos; eles o analisavam diante de cada ação e movimento. E quando Tsunayoshi buscara a dureza de olhar que o analisava de forma meticulosa, pode deparar-se com Reborn, ou apenas uma parte do mesmo, já que o homem mesclava-se facilmente as sombras como o assassino profissional que era, digno do titulo de melhor do mundo.

Sorrira para ele, mas o silêncio e a frieza vieram imparciais, e apesar de o Sawada estar acostumado a tudo aquilo vindo de seu tutor – afinal este parecia ainda mais diferente a cada dia que passava – o castanho ainda sim não pode deixar de não se incomodar com aqueles olhos tão profundamente misteriosos.

Dizendo a Dino que fosse para a sala de jantar sem a si junto, o Don seguiu para o próprio quarto, alegando ter de precisar de um banho e de uma muda nova de roupas antes de jantar; obviamente o loiro compreendera e seguira seu rumo – com um silencioso Romário atrás de si, este que estivera sempre presente, apenas limitando-se a observar e ouvir -, tal como Tsunayoshi, entretanto este cessara seus passos logo quando vira-se no interior do próprio aposento.

Os pulsos e todas as cicatrizes coçavam, a alma pulsava, sua intuição – mais do que nunca – lhe avisava que algo aconteceria em breve, muito breve. Mas o pior de tudo, não era o fato de que seus olhos brincavam de um lado para outro, esperando, rezando para que o ex-Arcobaleno do Sol não o seguisse, apesar de que a batida suave da porta de seu aposento, seguida pelo som da tranca sendo fechada, destruiu todas as suas expectativas.

Engoliu em seco, virando-se para Reborn enquanto um sorriso de porcelana vinha a seus lábios mudos. Tinha medo de que o moreno descobrisse sobre seu pequeno pecado, era seu maior medo desde que era adolescente; mal conseguia compreender como estava conseguindo esconder aquilo até agora...

– Tsuna... – sussurrou o homem puxando sua fedora para esconder o brilho enigmático de seus olhos. Sob o ombro do moreno Leon tremeu, visivelmente assustado e abalado, com seus olhos grandes ainda mais abertos que o normal enquanto a cauda tremia junto às patas curtas e finas. Algo ruim estava para acontecer, da mesma forma como sua intuição lhe avisara.

– Reborn. – sussurrou-o, ainda sorrindo. – Precisa de algo? – a questão veio aos lábios do castanho antes mesmo de este conseguir se deter. Num piscar de olhos a figura imponente do maior assassino do mundo encontrava-se a sua frente o segurando pelos pulsos feridos. – Reborn...?

– Por quê? – questionou o assassino erguendo o olhar para as orbes castanho-douradas, estas que fitaram a imensidão negra abalada e surpresa, com uma pitada de choque. – Por que isso? – indagou mais uma vez, indicando os pulsos que, naquele momento, doíam como nunca, mas, ao ver do Sawada, estava sendo uma dor até mesmo prazerosa.

Tsunayoshi não negava que era masoquista, ao menos não para si mesmo quando estava sozinho no próprio aposento, um maldito masoquista que pensara em se matar varias vezes.

Inclinando levemente a cabeça, de forma que até o deixou com certa doçura na aparência, o Don retorquiu:

– Do que está falando Reborn?

Rangendo os dentes, sabendo que não obteria resposta alguma naquele momento, não sem provas verdadeiras, o homem de cabelos negros virou-se, destrancou a porta e saiu em passos duros pelo corredor da mansão.

Novamente sozinho, tudo o que o castanho conseguiu fazer foi seguir para a porta e fechá-la novamente, trancando-a, e logo em seguida apoiando suas costas na madeira que o separava do corredor enquanto o corpo escorria em direção ao chão. Engoliu em seco algumas vezes, os lábios ainda estampavam o sorriso de vidro que dera ao ex-Arcobaleno antes de o mesmo sair bruscamente, mas seus olhos arregalados apenas transmitiam todo o terror que o assombrava naquele momento.

Mas diante de tudo, apenas uma coisa rodava em sua mente, repassando todas as suas ações e palavras que havia dito naquele dia e em todos os outros que antecederam a ele. Mas nada, nada, que fizera publicamente – ou próximo dos amigos e/ou aliados – poderia dar alguma pista de todo o pecado que cometera por tantos e tantos anos.

E só quando o sorriso quebrara-se, quando seus olhos já não mais conseguiam se manter abertos e ocultaram o dourado que os havia tomado, quando as mãos tremulas agarraram-se firmemente ao tecido da calça; fora que Sawada Tsunayoshi sussurrara a única palavra que, certamente, lhe atormentaria por um longe período.

– Como...?

(...)

Terça-feira, 22 de julho de 2014, 12:59 PM

Localização: Namimori, Japão – Residência dos Sawada.

Nota: Dê valor às pessoas enquanto elas estão por perto, pois saudade não será motivo suficiente para que elas voltem.

Quieto o moreno abaixou o celular enquanto seus olhos, parcialmente arregalados, fixavam-se no chão. Apertou fortemente o aparelho telefônico nos dedos, mas, obviamente, não usando força o suficiente para quebrá-lo. Engoliu em seco antes de largar o corpo sobre a própria cama agradecendo aos céus por estar sozinho em seu quarto.

Itália.

Reborn e seu Avô queriam a si na Itália.

Eles não pediram sua presença, exigiram-na – ao menos o Arcobaleno o fizera -, mas ainda sim... Deixar sua mãe aberta a qualquer ataque de algum inimigo estava totalmente fora de seus planos, mas não era apenas por isso, seus Guardiões também deveriam ir consigo e não seria fácil controlar alguns deles em território mafioso – ainda mais um destes sendo Hibari Kyoya, se este fosse é claro.

Inspirou e respirou, profundamente. Precisava pensar em uma forma de contar a mãe sobre a viajem a Itália, sobre a máfia e sobre sua posição dentro da mesma... Ainda havia seu pai, tinha de contar a respeito dele também, e dos supostos amigos que os visitavam de vez em quando...

– Merda... – resmungou, arremessando o celular contra a parede oposta a sua cama. O aparelho chocou-se num baque alto e logo passos foram ouvidos através do corredor.

– Tsu-kun? – chamou a doce voz de Nana. – Está tudo bem? – e lentamente a mulher abriu a porta do quarto do filho, deparando-se com o mesmo deitado sobre a cama com um braço cobrindo os olhos. Assim sorriu com a cena. – Querido você esta começando a ficar preguiçoso. – riu-a de forma tímida e única.

A mulher ficara parada por uns instantes apenas apreciando o seu adorado filho, já um adolescente, deitado aparentemente adormecido. E quando esta já dava as costas e retirava-se do local, a voz de Tsunayoshi ecoara.

– Mãe... – chamou, baixo, mas a mulher de cabelos castanhos, estes que já passavam dos ombros, ainda sim o ouviu.

– Sim querido? – e então ela se aproximou-se, não hesitando em sentar ao lado do rapaz e passar a mãos pelos cabelos bagunçados do mesmo. Antes que pudesse dar-se conta o menino já a abraçava pela cintura, escondendo a face avermelhada do rosto surpreso da mulher. – Tsu-kun?

– Eu amo você mamãe... – sussurrou-o, sentindo-a novamente acariciar seus cabelos. – Não importa o que pense de mim, eu sempre vou amar você.

– Tsu-kun... – e um sorriso gentil se abrira nos lábios da mulher, a face de surpresa prontamente desaparecera enquanto a mulher de cabelos castanhos olhava terna seu querido filho. – Eu também amo você querido. – disse-a enquanto acariciava os fios acastanhados espetados.

E apesar das palavras ditas com tanto carinho e amor, o Sawada mais novo ainda sim temeu o futuro, pois ele era inevitável. Engolindo o choro, agarrou-se mais fortemente a mãe, apreciando a companhia da mesma naquele momento, apreciando a companhia de sua progenitora mais do que em qualquer outro momento, afinal, podia perdê-la num piscar de olhos caso sua localização e identidade fossem descobertas pela máfia. Mas não era apenas por isso que Tsunayoshi a abraçava e se expressava tão diretamente assim, era por que ele tinha medo de que sua mãe descobrisse sobre a verdade do império que ele herdaria e que, após isso, o repudiasse. Isso, certamente, seria o fim de seu mundo.

Por favor. Implorou a um Deus que nunca acreditara. Não a tire de mim.

Da maneira mais dolorosa ele descobriria – dali a um par de anos – que tal pedido jamais fora atendido.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

O que acharam?
Bom?
Digamos que os capítulos serão todos longos assim, ou maiores que esse cap.
Não esqueçam de dizer o que acharam.
Bye



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Ciclo Vicioso" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.