Licantropia: A Reserva escrita por Paulo Carvalho


Capítulo 13
Capitulo 12: Relocada.


Notas iniciais do capítulo

E aí, pessoal? Tudo bom? Ontem não tive como postar, me desculpem. Boa leitura!!



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Capitulo 12-Relocada.

Mais 12 dias se passaram. Lentos, quentes, fedidos e úmidos. As roupas que haviam lhe dado tinham adquirido um tom de marrom escuro e Sam se perguntava quando ela poderia tomar outro banho ou se Soren pretendia fazê-la implorar. Ele parecia gostar daquilo. Na maior parte do tempo, o carcereiro a forçava sempre a repetir o pedido, ao menos, duas vezes antes de lhe fornecer o que quer que fosse. Sam tentara minimizar seus pedidos, mas a cada por favor,sua irritação aumentava enquanto o sorriso de Soren aumentava.

Depois de todo aquele tempo, Samantha já não sentia nenhuma dor. Os cortes haviam fechado; os hematomas, sarado e os sonhos se suavizado. Ela ainda via o rosto sádico de Oscar à noite, mas já não acordava gritando e chorando. Sam ainda podia se lembrar do rosto desesperado de Soren na primeira vez que ela acordara em pânico.

–--Boas notícias, prisioneira! ---ele surgiu carregando uma bandeja cheia de comida. ---Você estava certa sobre os Rasantes. Sabe o que significa? Você vai viver por mais um tempo!

Sam nunca sabia quando ele estava brincando e temeu de que talvez aquilo fosse verdade. Que talvez ela só não estivesse morta porque as informações que dera estavam certas. Mas se eles esperam por mais... então eu estou realmente fudida. Soren tirou as correntes e empurrou a grade da cela que rangeu e gemeu. Ele depositou a bandeja com comida no pequeno banco de cimento e por alguns segundos ficou de costas para ela. Samantha não sabia se aquilo era um teste, mas Soren parecia não ter medo de outra fuga; ela não sabia se gostava ou odiava aquilo.

Ele se sentou na cadeira de metal e como todos os outros dias assobiou uma canção qualquer que Samantha não conhecia com seus olhos amarelos fixados em seu rosto. Tornara-se tão comum que ela se acostumara ao som da voz de Soren. À noite quando ele saía para buscar comida ou água, o silêncio era quase incômodo.

–--Por que você está me encarando? ---Sam perguntou algumas horas depois.

–--Não tem muitas outras coisas aqui para encarar, sabe. ---ele sorriu e se levantou. ---Você está começando a feder de novo. Venha. ---ele puxou as correntes de ferro.

–--Como assim? ---Sam franziu a testa.

–--Tomar banho. Ou você quer continuar cheirando assim tão bem? ---Soren respondeu. ---Vamos logo antes que os outros acordem. Eles ainda não são seus fãs.

–--Ainda? ---ela perguntou sarcástica.

–--Você já conseguiu um. ---ele piscou. ---Raniah. Ele não para de me perturbar.

–--Ah, claro. ---Sam respondeu e o seguiu.

Era muito cedo, ela percebeu. Dentro da cela, não havia janelas e a única marcação de tempo eram as refeições que Soren lhe trazia. O céu começava a clarear, as nuvens tinham um tom escuro de cinza que tingia as coisas ao redor em tons variados de branco e preto. O vento corria gelado e intenso, agitando os cabelos de Sam e arrepiando os pelos de seu braço. Se não fosse tão bom estar do lado de fora, ela teria pedido para voltar.

–--Frio? ---ele perguntou.

–--Um pouco. ---Sam admitiu.

–--Vai ficar pior. Por aqui. ---ele atravessou um conjunto de paredes demolidas e objetos carbonizados.

Sam o seguiu por prédios semidestruídos, escombros carbonizados e crateras gigantescas. Carros enferrujados e montes de objetos destruídos formavam corredores pelas ruas rachadas. Samantha identificou o prédio hospitalar onde tinha ficado; o prédio onde conhecera Raniah, que ela agora percebia tratar-se de um armazém e as edificações que tinha atravessado na fuga. Subiram uma rua íngreme e pararam em frente a uma trincheira de carros enferrujados. Soren ergueu a cabeça e procurou por algo no meio das árvores largas que cresciam de ambos os lados.

–--Dickens! ---ele gritou e minutos depois outro grito surgiu das árvores.

–--O que foi isso? ---Sam procurou pela origem do som, mas no meio das folhas cinzentas era impossível enxergar qualquer coisa que estivesse escondida entre elas.

–-- Um dos observadores. Você não achava que ninguém vigiasse nossas fronteiras, não é? ---ele ergueu uma sobrancelha escura. ---Achei que fosse inteligente. Venha, estamos chegando.

–--Aonde? Eu não ia tomar banho?

A desconfiança paralisou Sam. Ela procurou ao seu redor, esperando ver Oscar, Fred e outros sádicos prontos para despedaça-la. Soren se virou confuso e tentou se aproximar, mas Samantha se afastou e preparou-se para correr.

–--Ei! Não é uma armadilha. ---ele riu. ---Tem um rio, na próxima curva. Achei que fosse melhor para você do que usar dois baldes. Acho que traumatizamos você.

–--Eu...eu...não confio em você. ---Sam respondeu.

–--Por que eu iria te levar até um rio para depois mata-la? Eu poderia fazer isso aqui e ainda receberia pedidos de ajuda. ---ele respondeu frio com os olhos amarelos cheios de irritação.

Ela ponderou por um momento e por fim resolveu segui-lo. Atrás da fronteira de carros, a floresta havia se sobreposto as ruínas da cidade; árvores cresciam desordenadamente ao redor dos escombros, flores surgiam nos locais mais inusitados possíveis, grama cobria o asfalto e raízes encontravam seu caminho pelas rachaduras. Soren a guiou por uma trilha estreita que terminava em uma queda d’água. Uma pequena cachoeira que lançava suas águas em um rio largo e verde.

–--Viu? Sem guilhotina. Só água. ---ele respondeu mal-humorado. Essas mudanças de humor deviam ser tratadas,ela pensou.

–--Obrigada. ---Sam respondeu e franziu o nariz. ---Eu...não tenho outras roupas...

–--Estão lá embaixo. ---ele apontou para uma pedra próxima à margem. ---Espero que não fiquem pequenas demais. Foram as melhores que consegui arranjar. Quando estiver pronta, grite.

Sam acenou e Soren a deixou rapidamente. Descer a encosta foi a parte mais difícil e resultou em cortes e arranhões nas mãos e joelhos que terminaram em uma queda nada graciosa nas águas incrivelmente geladas do rio. Samantha tentou ser o mais rápida possível, mas ainda assim, o cabelo loiro estava completamente emaranhado, havia marcas escuras de poeira em sua pele e o fedor do colchão estava impregnado em todo seu corpo. Depois da terceira tentativa, Sam finalmente encontrou um pedaço de sabonete sob as roupas e suspirou agradecida.

As vozes surgiram alguns minutos depois, quando ela já estava vestida e pronta. Ela identificou três vozes; uma pertencia a Soren, mas as outras duas não era de ninguém que conhecesse. Sam as ouviu em silêncio e notou o tom irritado e impaciente de Soren que parecia ansioso para dispensa-los.

–--Eu não tenho medo de Licáon, nenhum de nós tem. ---Soren respondeu. ---Voltem para o grupo de vocês e nos deixe em paz. Raniah irá se comunicar com o líder de vocês, em breve. Agora deixe-nos.

–--Nos? ---uma das vozes perguntou. ---Não estou vendo mais ninguém aqui.

–--Quem está aqui com você, Soren? ---a outra se pronunciou. ---Estamos atrapalhando alguma coisa?

–--Não, Dana. Eu me expressei mal.

–--Você mente mal. ---a voz chamada Dana respondeu. ---Nós podemos sentir o cheiro dela.

–--O que mais vocês querem? ---Soren rosnou. ---O recado já foi dado. Saiam daqui antes...

–--Não temos medo de suas ameaças, Soren. ---a outra voz respondeu.

–--Deveria ter, Ryan.

–--Só porque você é diferente? Acha que uma mordida infeccionada o torna mais perigoso? --- Ryan riu. ---Nunca vi grandes coisas em você. Licáon e sua obsessão pelas aberrações.

–--Vamos dar uma olhada na sua acompanhante antes de irmos. ---Dana respondeu e Sam se apressou em se esconder.

O som da luta encheu os ouvidos de Samantha. Rugidos e sons mais estranhos que atiçaram sua curiosidade, fazendo-a se aproximar lentamente da cena. Eles se movimentavam rápido demais para que os olhos humanos de Sam pudessem acompanhar. A cena se reduzira a imagens borradas que rugiam e rosnavam. Os de Soren pareciam mais altos e selvagens.

Um corpo foi lançado para longe e caiu com um baque pesado e forte do outro lado, manchando o solo rapidamente com o sangue escuro e denso do cadáver. Samantha tentou se manter parada, mas os rugidos de Soren enchiam seus ouvidos como bombas, fazendo-a se assustar. Os sons terminaram quando o homem chamado Ryan empurrou o corpo de Soren fazendo-o tombar e rolar pelo solo.

–--Eu vou acabar com você! ---Ryan gritou com o rosto banhado do sangue que fluía dos cortes na testa.

–--Você pode tentar, mas... ----Soren respondeu, mas foi interrompido quando a mulher Dana se lançou contra ele e prendeu seus braços.

–--Pode deixar. Nós vamos. ---ela respondeu.

Ryan se aproximou sorrindo como Oscar sorrira para Sam e com um dos dedos cortou o rosto de Soren da sobrancelha até o lábio inferior, fazendo escorrer um filete de sangue. Os socos e chutes fizeram memórias indesejáveis surgirem na cabeça de Sam. A mulher Dana usou uma das mãos para rasgar a pele abaixo do pescoço de Soren, arrancando um grito de dor.

Samantha não saberia explicar porque fez aquilo, mas as lembranças das aulas de luta na Reserva voltaram limpas e claras na sua cabeça, fazendo-a a chutar a parte interna do joelho de Dana e passar os braços ao redor do pescoço de Ryan.

–--Tente alguma coisa e eu quebro o pescoço dele. ---Sam respondeu para a mulher que voltava a se erguer. O homem tentava se soltar, mas Samantha não precisava de força para mantê-lo preso.

–--E você acha que ele vai permanecer morto por quanto tempo? ---ela riu.

Samantha não entendeu o que ela queria dizer, até que as peças se encaixaram. Soren dissera que ela havia quebrado sua cabeça, mas ele continuara vivo e a perseguira pela cidade; a mulher também permanecera desacordada por um momento, mas ali estava ela sem nenhum ferimento visível. Eles se curam rápido, percebeu. Estou ferrada.

Soren se moveu rápido e silencioso, lançando Dana por sobre o ombro, encosta abaixo e com um movimento simples e fluido torceu o pescoço de Ryan que cedeu com um som macabro. Ele agarrou a mão de Sam e seus olhos dourados pareciam querer dizer: Corra!

O caminho se reduziu a uma macha enquanto ambos corriam em direção a segurança da cidade. Ela não ouvia nada além do vento nos ouvidos, mas Soren rugiu e gritou que eles estavam se aproximando. A barreira de carros surgiu minutos depois e com um empurrão, Soren abriu caminho para que Sam pudesse passar. Ela tropeçou nos próprios pés e caiu no asfalto frio e áspero.

Ela viu Ryan e Dana a alguns metros atrás se aproximando rapidamente. Soren se levantou e gritou ´´Dickens`` novamente. Das árvores caíram dezenas de pessoas que aterrissaram pesadamente no chão ao seu redor e rugiram para os dois invasores. Eles rosnaram de volta, mas depois de alguns minutos se viraram e sumiram na trilha.

–--Eles eram dos... ---um homem de cabelos castanhos perguntou.

–--Nômades? ---Soren sugeriu. ---Eram. Mensageiros.

–--O que aconteceu? ---alguém inquiriu.

Soren não respondeu, mas todos podiam concluir que Sam acontecera. Os olhares que repousaram nela variavam de irritados para acusatórios. Ela se levantou e limpou as calças jeans para não encara-los. Soren parou na sua frente, os olhos sérios e a expressão congelada. Ele pôs uma das mãos sobre seu ombro e a levou pela cidade que já despertara. Alguns a encaravam com raiva, outros com curiosidade, mas nenhum deles era amistoso.

–--Por favor, só me deixe ficar em um lugar melhor do que aquela prisão. ---Sam implorou e se arrependeu no mesmo momento.

–--Fique quieta, estou tentando passar despercebido. ---ele respondeu.

–--Está falhando. Todos olham para mim.

–--Ninguém mandou você ficar tão deslumbrante nessas roupas rasgadas. ---ele murmurou.

–--Ah, cale a boca.

Soren a levou até um prédio pequeno e simples. Dois andares de concreto pintado de branco que desbotara e tornara-se cinza. Com um interior surpreendentemente organizado, Samantha seguiu por corredores limpos até o maior dos quartos no segundo andar. O chão de mármore polido estava limpo suficiente para que ela pudesse ver seu reflexo; havia dezenas de móveis antigos de madeira cheios de CD´s e instrumentos musicais; as paredes eram abarrotadas com pôsteres velhos de bandas e cantores que Sam nunca vira na vida; um sofá de couro preto estava coberto com roupas, assim como a cama gigantesca. Um piano de cauda branco estava virado para a única janela do aposento que mostrava uma parte das ruínas e o caminho de um rio que serpenteava por quilômetros a norte.

–--Bem-vinda a sua prisão. ---ele sorriu. ---É a melhor coisa que eu posso te oferecer nesse lugar. Não espere um obrigado por salvar minha vida, mas mesmo assim... obrigado. E como prova da minha gratidão... ninguém mais ficará te vigiando, tudo bem? Não seja idiota e não fuja.

Ele piscou e saiu antes que Sam pudesse responder qualquer coisa. Ela agradeceu aquilo, pois se tivesse de dizer qualquer coisa seria um obrigado. O maior obrigado de toda a sua vida. E Samantha não queria dar esse poder a Soren. Sorrindo, ela se deitou na cama macia e a sensação era tão boa quanto um sonho. Seus olhos se fecharam minutos depois trazendo consigo sonhos bons. Pela primeira vez em muitos dias, Sam não teve pesadelos.


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Notas finais do capítulo

E aí? O que acharam? Até semana que vem.



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