Contagem Regressiva escrita por Beatrice


Capítulo 37
Capítulo 35: Olhos do homem morto


Notas iniciais do capítulo

Já faz 84 anos...

Gente ??? Eu sinceramente não sei como começar a me desculpar pela demora gigantesca em postar esse capítulo, mas saibam que eu sinto muito do fundo do meu coração. Esse ano está sendo uma loucura; eu mudei de cidade por causa da faculdade e a mudança me deixou sem tempo algum, e quando voltei pra casa meu computador tinha pifado, o que significa que eu não tinha onde escrever nem postar. Só agora esse problema foi resolvido, então espero que possam me perdoar mais uma vez :')

O capítulo continua direto de onde o último acabou. Tenham uma boa leitura!



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Foi rápido, como em todas as outras vezes em que Jason fora transportado de um lugar a outro. Ele piscou e, quando abriu os olhos, ao invés de ver o jardim de inverno, deparou-se com a fachada de um dos muitos prédios de Chicago.

Seu estômago se contorceu ao olhar para a construção, familiar mesmo após tantos anos. Embora não a considerasse sua casa, havia algo de estranho em voltar para o lugar no qual crescera.

Gabriel ainda mantinha uma mão em seu ombro, como se não quisesse deixá-lo ir. Jason apenas torcia para que ele não soubesse o que havia trazido por baixo da jaqueta.

— Tem certeza de que quer fazer isso? — Gabriel perguntou.

Jason assentiu.

— Não precisa me esperar, nem ficar me vigiando. Só... mantenha isso em segredo. É algo que preciso fazer sozinho.

Não era toda a verdade, mas era melhor que uma mentira. Ao menos, foi isso que disse a si mesmo. Era o modo mais fácil de fazer com que Gabriel o deixasse ali sem envolver mais ninguém. Sem desapontar mais ninguém.

— Chame se precisar de algo — disse Gabriel, e então, partiu.

Jason respirou fundo e voltou o olhar para a entrada do prédio. Obrigou-se a caminhar até a recepção, felizmente vazia, e foi até o porteiro.

— Em que posso ajudar?

— Eu… Sou Jason Kent — ele falou com certa hesitação. — Filho de Sarah e Elliot. Eu não avisei que viria, mas se puder avisar que estou aqui…

O porteiro o olhou de forma intrigada, como se não soubesse que o casal possuía outro filho. Acabou assentindo após um momento, e pegou o telefone para confirmar sua presença. Jason mal prestou atenção à breve conversa; o nervosismo começava a tomar conta de seu corpo, e ele se forçou a respirar fundo algumas vezes para se acalmar.

— Pode subir. O elevador fica no final do corredor. Apartamento 112.

— Obrigado.

Jason seguiu até o elevador e apertou o botão para subir, colocando as mãos nos bolsos da jaqueta. Por sorte, ninguém mais entrou, e ele teve tempo para continuar respirando e pensar no que diria. Vir até aqui fora mais um impulso do que uma decisão, mas agora que estava perto, será que conseguiria encarar os pais novamente? Teria coragem de conversar com eles, de olhar nos olhos de Elliot e ver o culpado pela morte de Lionel?

As portas do elevador se abriram antes que ele pudesse se arrepender, e ele se viu de frente com a porta marcada.

Jason ergueu o pulso trêmulo e bateu duas vezes.

A porta foi aberta segundos depois, e Sarah Kent o encarou como se não acreditasse que estivesse mesmo ali. Ela estava com os cabelos escuros presos no topo da cabeça, marcados por alguns fios brancos, e seu rosto tinha algumas marcas de expressão de que Jason não se lembrava da última vez que a vira, no dia do testamento. Continuava uma mulher elegante, e ela abriu um sorriso emocionado:

— Jason! — Ela se adiantou como se fosse abraçá-lo, mas parou quando ele se encolheu minimamente.

— Oi — ele disse, engolindo em seco. Ainda não estava pronto para ser acolhido daquela forma.

Sarah não pareceu se importar, se a permanência do sorriso sincero indicasse alguma coisa.

— Por favor, entre. Podemos conversar com calma aqui dentro, querido — ela disse, abrindo espaço para que ele passasse.

Jason não respondeu, mas entrou. O apartamento amplo tinha o perfil de seus donos: organizado, sofisticado, preenchido com móveis de última geração em tons de preto, branco e marrom. Pela janela extensa da sala de estar, era possível ver o céu coberto por nuvens carregadas, que davam a impressão de ser mais tarde do que era.

Sarah o guiou até um sofá confortável e gesticulou para que ele se sentasse.

— Elliot está no trabalho, mas não vai demorar a chegar. Vou trazer um café para nós, espere um minuto.

Jason ocupou uma ponta e a observou ir até a cozinha. Passos leves e apressados soaram no corredor, e de repente uma garotinha irrompeu na sala cheia de empolgação.

— Mamãe, quem está aqui? Ah! — ela arfou quando seus olhos pousaram em Jason. — Jason, você apareceu!

Ela correu até ele, jogando os braços ao redor de seu pescoço antes que ele pudesse reagir. Hesitante, Jason a abraçou de volta com cuidado. Sua irmã era tão pequena, mesmo com 10 anos, que ele ficou com medo de esmagá-la — e, com toda a sinceridade, não esperava que ela fosse recebê-lo com tanto entusiasmo sem ao menos se conhecerem direito.

— Eu sabia que você viria! — Margareth se afastou, mas continuou segurando suas mãos. — Mamãe e papai disseram que você não ia mais ligar, mas eu não acreditei. Você me disse que um dia nos visitaria, então é claro que viria. Eu queria tanto te conhecer, irmãos mais velhos são demais!

Jason quase não soube o que fazer com tanto carinho. Não havia pensado muito no fato de que tinha uma irmã, afinal eles mal haviam conversado. Mas o fato de que alguém, uma criança, o olhava com tanta admiração e expectativa, sem saber o que havia feito, esquentou seu coração e o fez mais pesado ao mesmo tempo.

— É bom te ver de novo também, Margareth — ele resolveu responder.

Ela abriu um sorriso enorme, encantada, mostrando que dois dos dentes que estavam faltando da última vez já estavam crescendo.

— Olha, o seu cabelo é igual ao meu! — Ela apontou, praticamente pulando no lugar. — Você é tão alto! Quantos anos você tem? Onde você mora? Vai ficar quanto tempo com a gente? Eu tenho que mostrar meus brinquedos e você pode me levar na escola, todo mundo vai adorar saber que eu tenho um irmão agora!

— Margareth, querida, deixe Jason respirar um pouco — sua mãe interrompeu, retornando com dois copos de café exalando fumaça. Ela os depositou na mesinha de vidro em frente ao sofá e se sentou ao lado de Jason, a uma distância respeitosa.

— Mas eu quero saber! — Margareth fez biquinho, olhando para ele. — Você vai ficar, não vai?

Jason engoliu em seco.

— Hã… E-eu, na verdade… — Olhou entre as duas, abrindo e fechando a boca sem falar mais nada, mas balançou a cabeça de um lado para outro.

— Jason não pode ficar para sempre, mas… — Sarah o cortou para salvar o dia mais uma vez. Ela pareceu lhe pedir algo com o olhar. — Se quiser ficar para o jantar, será muito bem-vindo.

Ele não tinha como responder àquilo sem magoar Margareth, então:

— É, claro. Parece bom.

A garota não pareceu perceber a tensão em sua voz, pois tornou a sorrir, e Jason não teve em si a força para reprimir uma pequena risada. Talvez nem toda sua família fosse terrível.

— Se puder nos dar licença agora, filha, eu e Jason temos muito o que conversar — Sarah pediu. — Vocês podem se falar mais tarde.

Margareth assentiu e acenou para Jason antes de sair, dando pulinhos de alegria.

A realização de que estava sozinho com a mãe fez Jason agarrar o copo de café para impedir as mãos de se agitarem. Tomou um gole — preto e sem açúcar, do jeito que gostava. Arriscou um olhar para a mãe, e ela parecia tão ansiosa quanto ele, segurando a xícara como se fosse lhe dar força. Sempre foram parecidos demais, afinal.

— Como você está? — ela perguntou, por fim.

— Eu estou… — Estava prestes a dizer “bem”, mas a palavra ficou presa em sua garganta. Lampejos de suas próprias mãos sujas de sangue passaram por sua mente quando piscou. — Eu vim na intenção de falar com Elliot, na verdade.

— Ah. — Um brilho de decepção passou por seu rosto. — Algo em que eu possa ajudar?

Jason ficou em silêncio. Duvidava de que Sarah tivesse tido algo a ver com o motivo por estar ali.

— Não.

Um silêncio mais pesado caiu sobre eles. Jason desviou o olhar de volta para o seu café e se ocupou em beber, enquanto Sarah buscava um modo de recomeçar. Ele podia ver que ela estava desconfortável, mas não podia fazer nada quando suas próprias memórias dela o deixando num hospício invadiam sua mente cada vez que a olhava.

— Jason — Sarah chamou, gentilmente. — Eu sinto muito.

Jason congelou.

— Eu sinto muito por ter feito o que fiz. Por ter desistido de você quando mais precisava de mim. Eu falhei com você. Estava tão cega pelo meu próprio medo que não pensei no que você estava passando. Você merecia melhor do que aquilo. Eu sinto muito, filho. Abandoná-lo foi o maior erro que já cometi, e não há um dia que passe sem que eu me arrependa dele. Eu sei que nenhuma palavra vai mudar o que fiz, mas… Se puder me dar uma chance, eu gostaria de me redimir. Gostaria de ter o meu filho de volta, se puder me perdoar.

Jason sentiu os olhos arderem. Não viera ali para isso, não viera em busca de um pedido de desculpas ou uma explicação. Não era o que queria.

Ou era?

Fazia muito tempo, havia se conformado com o fato que seus pais o odiavam. Que o que fora quebrado entre eles não poderia ser consertado. Mas, agora, ao erguer a cabeça e ver os olhos marejados de sua mãe, tão sinceros quanto antes, e cheios de arrependimento e esperança, ele não pôde deixar de notar a falta que ela fizera todos esses anos. Havia um buraco de ressentimentos no lugar em que ela deveria estar.

E, Jason percebeu, ele queria tanto mudá-lo para algo melhor. Havia uma parte de si que havia em todo ser humano, que só queria ser amada sem cautela.

Ele tentou falar alguma coisa, mas tudo o que escapou foi uma lágrima. Sarah se aproximou com cuidado, dando tempo para ele se afastar, e esticou a mão para limpar sua bochecha, com tanta ternura que ele quase fechou os olhos.

— Você se tornou um homem muito bonito — Sarah falou. — Ouvi que se formou em Yale. Estou muito orgulhosa de você, Jason. — Ela respirou fundo e segurou a mão dele que estava livre da xícara. — Eu amo você. Você sempre será o meu garoto. Se me deixar voltar a ser sua mãe, podemos recomeçar. Não precisa ser agora. Nem hoje. Quando você estiver pronto, eu vou estar aqui.

O menor dos sorrisos se formou nos lábios de Jason. Ele apertou a mão dela em retorno. Recomeçar soava bom; soava incrível, depois de tudo o que acontecera.

Não, disse a vozinha no fundo de sua mente, que o perturbava mais frequentemente desde Sean. Ninguém quer estar perto de você, muito menos seus pais.

O café chacoalhou em sua mão com o esforço de espantar aquele pensamento. O sorriso se desfez, e ele tentou não ser rude ao se desvencilhar da mão de Sarah. As dúvidas se instalaram em seu coração.

— Por que você não foi atrás de mim? — Jason perguntou, a voz baixa.

Sarah enxugou as lágrimas e cruzou as mãos no colo. Um trovão ribombou lá fora.

— No começo, eu estava assustada sobre como você reagiria quando me visse de novo. Depois, eu quis visitá-lo, mas… O seu pai não quis. Era ele quem tinha assinado os documentos, e ele não permitiu nenhuma visita. Disse que você não estava melhorando e era melhor deixá-lo. Para que todos pudéssemos seguir em frente. Foi só anos mais tarde que eu ajudei Lionel a questionar os documentos.

Jason sentiu-se empalidecer. A ponte que pensou poder construir para esquecer o passado se desfez em um piscar de olhos, e sua mãe percebeu. Ela abriu a boca para explicar, mas o som da porta de entrada sendo aberta a interrompeu.

Elliot foi até a sala com o começo de uma pergunta na boca, que morreu assim que identificou o filho.

— Jason? — Elliot disse, incrédulo. Largou a pasta e as chaves na poltrona e se aproximou um passo. — O que está fazendo aqui?

Vê-lo fez toda uma onda de raiva crescer no peito de Jason, e ele depositou o café pela metade na mesinha para deixar as mãos livres. Quase imperceptivelmente, ajeitou o cós da calça e a parte de trás da jaqueta ao se levantar.

— Eu queria falar com você — respondeu, sua voz estranha e vazia aos próprios ouvidos. — Podemos ir para um lugar mais reservado? Eu não quero que Margareth ouça.

Elliot pareceu surpreso por um minuto, mas então se recuperou.

— Claro, é claro. Podemos ir até o terraço, ele deve estar vazio a essa hora, mas vem chuva por aí.

— Não vou demorar.

— Se insiste. — Elliot deu de ombros. — Siga-me. Já voltamos, Sarah.

— Não demorem.

Ela tentou chamar a atenção de Jason e lhe dar um sorriso, mas ele não se virou para encará-la. Não olhou para trás. Apenas seguiu Elliot para fora do apartamento e para as escadas, lembrando-se do que viera fazer.

 

~

 

Ver Elliot tão descontraído, calmo, em seu terno caro e arrumado subir as escadas até o terraço fez Jason fechar a mão em um punho. Como ele podia agir daquela forma como se fosse inocente? Como ele podia olhar nos olhos de Jason e fingir que estava tudo bem? Nada estava bem. Nunca estaria bem, enquanto ele continuasse livre.

Já era final de tarde, e o céu estava ainda mais escuro quando alcançaram o terraço. As nuvens cinzentas estavam bem em cima deles, e algumas gotas já começavam a cair. Elliot empurrou a pesada porta de ferro e deixou que Jason a fechasse. Era um terreno sem graça; havia apenas alguns vasos com plantas meio mortas, e o chão era feito todo de concreto, as bordas cercadas por uma mureta e grades.

Elliot andou até o centro, para perto de um banco de madeira, e se virou, abrindo os braços.

— Então, o que queria me dizer?

Jason o olhou de cima a baixo, ignorando o vento frio que soprava.

— Você contou a eles onde meu avô morava.

Um brilho de reconhecimento passou pelo rosto de Elliot antes que ele pudesse disfarçar. Franziu as sobrancelhas.

— Do que está falando?

— Você sabe do que eu estou falando — rosnou Jason, as mãos tremendo ao lado do corpo. — Você sabia, quando contou? Sabia que arriscaria a vida dele? Ofereceram dinheiro pra você falar?

— Escute, Jason, eu não sei o que…

— Pare de mentir! — Jason gritou, e seu pai deu um passo atrás. — Você sabia ou não sabia? Foi você, não foi?

— Sim! — exclamou Elliot, por cima do barulho do próximo trovão. A chuva desabou, pesada e fria, encharcando o terraço em questão de segundos. — Sim, eu sabia! Era isso que queria ouvir? Eu achei que fosse uma ameaça vã, mas me foi dito que você estava causando problemas e era o único modo de pará-lo. Ele disse que meu pai estava acobertando você. Era uma informação em troca de uma promoção no trabalho, como eu iria adivinhar que a vida de um velho valia tanto para alguém?!

Seu desgraçado!

O punho de Jason acertou o queixo de Elliot com tanta força que ele cambaleou para trás e caiu no chão, segurando o rosto.

— Como pode dizer isso? — Jason berrou. — A culpa é toda sua e você não se importa?

— É claro que eu me importo! — Elliot berrou de volta, cuspindo água da chuva e sangue. — Mas nós precisamos fazer escolhas, Jason! E às vezes as escolhas custam caro.

— Escolhas! — Jason o socou mais uma vez quando ele fez uma tentativa para se levantar, e ele caiu de joelhos. — E quando você fez a escolha de me internar e me esquecer, você também usou essa desculpa para se consolar?

— Eu queria o melhor para você!

— Para de mentir! Você só não queria um filho louco que fosse te envergonhar na frente dos seus clientes. Você não pensou em mim nem por um segundo.

— Não é verdade, Jason, eu queria que você se recuperasse, mesmo que tenha sido difícil…

Cala a boca! — O chute que Jason lhe deu o derrubou de vez. — Você não sabe nada do que acontecia lá! Por sua culpa, o meu avô está morto, a única pessoa que se importou o suficiente para não me deixar apodrecer num manicômio. Por sua culpa, eu sou todo ferrado. Todas as vezes que eles me drogavam, todas as vezes que eles me isolavam, quando me davam choques falando que era para o meu bem, eu só queria que você me tirasse de lá, e você não deu a mínima. Eu odeio você. Você me arruinou.

A arma estava em suas mãos antes que Jason tivesse de pensar, apontando para a cabeça de Elliot em uma mira firme, apesar da visão embaçada. A chuva continuava caindo ao redor deles, impiedosa, e Elliot parecia em choque, os olhos arregalados para o cano do revólver.

— Jason, por favor…

— É culpa sua — a voz de Jason vacilou, embargada, e ele percebeu que estava chorando. Suas lágrimas se misturaram com as gotas de chuva, e ele só podia ver o medo nos olhos de seu pai.

— Por favor, Jason, eu sinto muito — ele implorou.

Jason quase poderia ter acreditado nele, mas não conseguiu.

— Quem veio atrás de você para perguntar sobre o meu avô? Quem?! — gritou quando Elliot ficou calado.

— Eu não sei! Eu não sei, era um homem. Jovem, cabelos e olhos castanhos, eu não me lembro direito. Ele segurava alguma coisa, algum tipo de bastão com… Eu não sei, uma cobra. Jason — Elliot ergueu as mãos em rendição. — Por favor, não faça isso.

Jason engatilhou a arma.

— Às vezes as escolhas custam caro, pai.

Seu dedo se moveu no gatilho quando a porta do terraço foi escancarada e bateu na parede.

JASON, PARA!

Ele olhou para o lado, espantado. Rebeca estava na soleira da porta, ensopada e ofegante, fitando-o com desespero.

— Rebeca?!

— Jason, abaixa a arma, por favor — ela pediu, mas não saiu do lugar.

Jason ouviu, mas não processou. O que ela estava fazendo ali? Não deveria saber onde ele estava, essa era exatamente a questão, Rebeca não podia saber porque ele não podia decepcioná-la, essa era a última coisa que queria fazer.

Apertou com mais força a arma. Elliot choramingou no chão, murmurando pedidos de desculpas, mas nenhum deles chegou a seu ouvido.

— Jason, por favor — Rebeca repetiu. — Você não quer fazer isso.

— Quero, sim — ele disse, sem reconhecer a própria voz. — Você não sabe o que eu quero. Ele merece isso.

— Não, Jason. — Rebeca deu um passo para frente, a mão esticada. — Isso não vai mudar nada.

— Como você sabe? — Jason explodiu, gritando para ela. — Ele acabou com a minha vida, Rebeca. Eu não aguento mais isso.

— Atirar agora não vai corrigir as coisas. Você não precisa ser como ele.

Jason sufocou um soluço. Lembrou-se de uma conversa, há o que parecia ser muito tempo, com Rebeca, em que ele havia perguntado se eles podiam ser como os monstros contra os quais lutavam, e ela dissera que deviam tomar cuidado.

Mas Jason já era esse monstro. Havia se tornado um quando puxara o gatilho em Sean, e estava prestes a fazer a mesma coisa agora. No entanto, quando olhou para Elliot, caído no chão, tudo o que pôde ver foram os olhos de Sean encarando-o de volta, por cima da mesma arma que empunhara nem uma semana atrás.

Culpado, culpado, culpado…

Assassino, assassino, assassino…

Mas para quem a voz gritava?

Jason apontou o revólver para Elliot. Se atirasse, talvez a voz se calasse. Se atirasse, talvez ele provaria que ela estava certa, e ela não o perturbaria mais.

— Jason — Rebeca chamou, e ele viu que ela estava mais perto, os cabelos colando no rosto pela água.

Algo se quebrou dentro dele.

— Por que está insistindo em mim? — ele berrou, tremendo. — Por que veio até aqui? Só estou atrasando a sua vida, eu sou uma causa perdida e você não consegue entender isso. Está na hora de aceitar a verdade, Rebeca: eu não tenho conserto.

— Eu não quero te consertar, Jason, porque você não precisa de conserto! Você não é quebrado.

— Tratamentos de choque, Rebeca!

— Eu sei — ela baixou a voz e, a essa distância, ele podia ver que os olhos dela estavam vermelhos. — E eu nunca vou poder entender o que você passou. Mas matá-lo não vai apagar o que aconteceu nos últimos catorze anos. Matá-lo não vai mudar o que fizeram com você. Só vai adicionar mais um peso nas suas costas, e você não precisa disso.

Um relâmpago cortou o céu, seguido por mais um trovão, que pareceu sacudir as estruturas do prédio de tão alto. A não ser pela barreira de água que atingia o concreto, cegando mais de um metro na frente dos olhos, o mundo se fez quieto. O frio e o vento cortantes acertavam o corpo de Jason, e ele só pode tremer, a mira da arma de repente não tão firme quanto antes.

— Jason, abaixe a arma. Por favor.

O apelo de Rebeca foi o bastante para terminar de quebrar sua determinação.

Ele não era capaz de atirar. Não era capaz de puxar o gatilho e ver alguém morrer por suas mãos novamente. Não podia provar que a voz estava certa. Seria mais um passo no caminho de se perder, e Jason estava cansado.

Baixou a arma.

Rebeca estava ao seu  lado em um instante, tirando o revólver de suas mãos e, com ele, o peso que carregava desde que pusera os pés ali.

Jason achou que ela se afastaria, desapontada e assustada com seu comportamento, mas Rebeca o puxou para seus braços, afagando seus cabelos e sussurrando palavras de conforto. Jason não se deu conta de quando começou a soluçar; fechou os olhos e se encolheu contra ela pela segunda vez.

Elliot escondeu o rosto nas mãos e chorou.

— Vem, vamos embora — Rebeca disse suavemente, começando a guiar Jason até a saída.

— Desculpa, Beck — Jason murmurou.

Ela balançou a cabeça, querendo dizer que não era necessário, e abriu a porta.

— Jason — Elliot chamou, quase baixo demais para ser ouvido. Jason parou, tenso. — Eu sinto muito.

Ele não recebeu uma resposta, muito menos um olhar. Jason o deixou para trás e foi embora, sem querer voltar ali nunca mais.


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Notas finais do capítulo

É isso por hoje, lindos! Espero que não tenham desistido de mim nem de Contagem Regressiva haha. Comentem comigo o que acharam do capítulo, como posso melhorar e o que esperam ver :3

Título inspirado pela música Dead Man's Eyes, da Apocalyptica. Vocês podem conferir a tradução aqui: https://www.letras.mus.br/apocalyptica/dead-mans-eyes/traducao.html

Última coisa antes de parar de encher o saco de vocês: eu tenho uma fanfic aqui de Percy Jackson/Heróis do Olimpo, porém estou cheia de problemas e não estou com tempo ou inspiração para me dedicar a ela. Se conhecerem alguém que tope ser um co-autor/autora, me avisem! Me mande uma mensagem e vamos conversar, porque eu realmente não quero abandoná-la ^^

Beijos e até o próximo capítulo!



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