Daydream escrita por Nora Cipriano


Capítulo 1
Capítulo Único - Daydream.


Notas iniciais do capítulo

Olá baby's, como vão?
Como já é citado lá no Disclaimer, a fic foi desenvolvida para o desafio do site.
É uma One-shot.
Boa leitura.



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Nesse momento eu estou sentado em um dos vários bancos do Parque de Maruyama, em Kyoto. É um parque muito bonito, diga-se de passagem, e mesmo agora quando o outono nos agracia com seus ventos gélidos e com um Sol brilhante no céu, que nada esquenta, ele continua lindo, com suas cores típicas do outono o enfeitando. Certo que hoje não é um dia assim, afinal o céu está nublado e as carregadas nuvens acima de minha cabeça dão um sinal de que, em poucos minutos ou em algumas horas, irá nos agraciar com suas águas tórridas e cristalinas.

Novamente dei uma olhada ao redor observando o pouco movimento do parque, as pessoas que por aqui passavam estavam apresadas, provavelmente fugindo da possível chuva que logo cairia, dei um sorriso mínimo mesmo assim. As pessoas estão sempre tão apressadas que nem se quer param um instante para observar a paisagem que lhes era oferecida de bom grado pela mãe natureza, nem mesmo os pássaros cantavam, mas era totalmente compreensível, estavam se protegendo da chuva. Olhei para o relógio em meu pulso, marcava um pouco mais das duas da tarde de sábado, suspirei pesadamente. Não sei ao certo quando, nem como começou, mas esse lugar passou a ser mais especial ainda para mim, principalmente depois que a conheci, afinal foi nesse mesmo parque que tudo começou, numa linda tarde de primavera. Em um passado não tão distante assim.

Como sempre, eu estava a observar a paisagem local, as pessoas caminhando com seus animais ou somente pelo simples prazer de andar, observava também o leve sacolejar das árvores com o vento tímido da primavera. Pássaros nos agraciavam com o som de seu canto e uma calmaria reinava no local. Eu estava sentado em baixo da copa da grande árvore de Sakura que existe no local, pequenas pétalas caiam ou voavam para longe com o vento, o que tornava o parque cada vez mais lindo aos meus olhos. Eu como mero observador, percebi uma linda jovem se aproximar de um dos bancos próximo ao que eu estava, mais precisamente do outro lado do banco que eu me encontrava, sentada de frente para mim.

Ela era linda, estava sentada lendo um livro que a muito custo consegui ler seu nome; “Sentimentos Adormecidos”. Observei-a mais atentamente e reparei em suas feições. Ela era branca, sua pele parecia ser de porcelana, seus longos e lisos cabelos negros davam um contraste lindo, chamando muita atenção para sua beleza, percebendo que era observada, levantou o olhar de seu livro e fitou-me por um instante antes de voltar a sua leitura com as bochechas levemente coradas, mesmo não estando muito perto, percebi que seus olhos eram castanhos claros. Um olhar doce e brilhante, que combinavam perfeitamente com ela, uma garota tímida.

Fiquei observando-a ler, e gostava de apreciar suas feições enquanto lia, ela fazia algumas caretas que ficavam visíveis a cada parte boa ou ruim da história. Não percebi o tempo passar e logo anoiteceu. Ela seguiu por um caminho e eu por outro. Fui embora me perguntando se um dia voltaria a vê-la. Passaram-se alguns dias e sempre após o trabalho retornava ao mesmo parque; rotina que adquiri para fugir da correria do dia-a-dia.

E todos os dias eu ficava observando-a no mesmo parque, nem sempre com o livro. Um dia eu tomei coragem e me dirigi a ela, conversamos um pouco até que enfim descobri seu nome. A mesma me disse que se chamava Shieme Hikaru e eu me apresentei, dizendo que me chamava Yuke Kimura, naquela época tínhamos respectivamente 20 e 21 anos. Praticamente todos os dias após isso nos encontrávamos no Parque de Maruyama, mesmo com os dias frios do inverno. Eu queria muito ir ao Templo Nanzenji, ver o famoso Caminho da Água, o templo fica aqui em Kyoto o que já ajudava, afinal não precisaria ir para muito longe, por isso tomei coragem e a convidei, fiquei tão feliz quando ela aceitou!

O Templo era enorme, tratava-se de um templo zen-budista. O Templo Nanzenji é a sede da Escola do Zen Rinzaishu-Nanzenji. Em 1264 o Imperador Kameyama construiu o complexo Zenrinjiden naquele local devidos as suas impressionantes belezas naturais. Nos anos seguintes ele se tornou um imperador-monge ao aderir à fé do Monge Daiminkokushi. Desde sua construção este complexo está entre os cinco templos Zen mais importantes de Kyoto. Diversas gerações de importantes monges foram treinados naquele local. Por seu grande valor histórico, eu tinha muita vontade de conhecê-lo. Ele estava muito movimentado naquele dia e se me recordo bem, Shieme ficou verdadeiramente encantada com a imensidão do lugar, assim como eu.

Conhecemos o aqueduto que foi construído durante a Era Meiji, para transportar água do lago Biwa a Kyoto e ele corta o templo. No templo também tinha um lindo jardim que foi mantido desde sua construção e era esse seu diferencial, mesmo com o avançar das décadas, ele continua como em sua construção. Andamos muito, mas valeu cada segundo, quando no fim do dia Shieme me dirigiu aquele sorriso alegre e agradeceu, me dando um beijo na bochecha. Após esse dia o inverno ficou mais rigoroso, o que impediu de nos encontrarmos por alguns dias.

Logo a primavera chegou e nossa pequena rotina voltou a ser como antes. O mais engraçado para mim, era que eu contava as horas para vê-la. Em um final de semana, lembro-me que estava um dia agradável de primavera, a chamei para um passeio no Jardim Botânico de Kyoto, e ela aceitou. Andávamos tranquilamente, observando os vários tipos de plantas e flores do local, estávamos caminhando num corredor de árvores de Sakuras, uma leve brisa soprava balançando as copas das árvores, fazendo uma pequena chuva de pétalas cor-de-rosa caírem sobre nós, eu olhei para Shieme e seu rosto levemente corado, cabelos voando um pouco devido a brisa e o sorriso de satisfação que ela demonstrava, me fez ter a certeza de que a primavera era minha estação favorita.

No fim daquele dia aconteceu nosso primeiro beijo.

Mais alguns dias se passaram, nossos encontros eram cada vez mais frequentes e nossos sentimentos cada vez mais visível, em nós dois. Num final de tarde, com um lindo pôr do sol, eu finalmente tomei coragem e fiz o pedido de namoro, que Shieme prontamente aceitou, aquele dia ficou marcado para sempre em meu coração. Já se passaram três anos desde então.

As pequenas gotas de chuva me despertaram de meu devaneio, uma fina garoa começava a molhar tudo que estava ao seu alcance, incluindo a mim, que ainda estava sentado no mesmo banco sentindo as gotas em meu rosto. Elas não me incomodavam, afinal eu amo a chuva. Olhei para aquele banco, o mesmo que eu vi Shieme à primeira vez e fiquei muito magoado comigo mesmo, afinal Shieme nunca irá me perdoar. Há mais ou menos duas semanas eu perdi o livro favorito de Shieme numa viagem que fizemos a Osaka, para conhecer O Castelo de Osaka.

Esse castelo é situado em Chūō-ku, o distrito mais central de Osaka. Originariamente denominado como Ozakajo, é um dos castelos mais famosos do país, tendo desempenhado um importante papel nas lutas de unificação durante o Período Azuchi-Momoyama, no século XVI. Pelo seu grande valor histórico, e pela nossa paixão por conhecer lugares novos, marcamos de conhecer aquele lugar, mas em algum momento durante a visita, perdi o livro. Quando dei falta do mesmo, já tínhamos retornado a Kyoto.

Dois dias atrás, Shieme descobriu minha perda e não me deixou explicar, me pedindo para ir embora de sua casa. Ela não sabe, mas eu busquei incansavelmente aquele livro, ao longo das duas semanas após perceber minha burrada e no dia em que comprei um novo de um colecionador de livros, que cobrou uma quantia considerável pelo mesmo e ia dar de presente contando minha mancada, ela descobriu e ficou extremamente chateada, não a culpo, afinal eu sempre soube do amor de Shieme por “Sentimentos Adormecidos”.

Nesse momento o livro já deve estar nas mãos dela, afinal o vendedor era de longe e me garantiu que o entregaria hoje pelo correio. A chuva passou a ficar mais forte, levantei a cabeça recebendo de bom grado aquelas gotas grossas. Eu estou verdadeiramente preocupado, afinal acho que perdi a mulher da minha vida. Tem dois dias que ela não fala comigo, nem atende minhas ligações e nem responde as minhas mensagens, suspirei. Algo chamou minha atenção para um ponto distante do parque. Era um guarda-chuva vermelho vivo, parecia reluzir aos meus olhos.

Não conseguia identificar quem era a dona dele, apesar de achá-lo extremamente parecido ao o que eu dei a Shieme há quase dois anos. Dei um sorriso, ela ficou tão encantada com aquele guarda-chuva que eu não consegui me conter e para alegrá-la, o comprei. Desviei a atenção da moça que caminhava com sua proteção e voltei a olhar para cima, fechei os olhos para continuar recebendo aquela chuva sobre mim e quem sabe, ela não levaria junto minha mágoa e meu sofrimento, por fazer a mulher que eu amo infeliz.

As gotas pararam de cair sobre mim. Não entendi a princípio, afinal o som da chuva ainda se fazia presente, abri os olhos e olhos castanhos claros me fitavam irritados. Shieme estava com aquele guarda-chuva sobre nós dois. Ela vestia uma calça jeans e um sobretudo preto, com uma bota cano alto também preta, seus cabelos soltos caiam como cascatas a sua volta e uma presilha em formato de flor na cor roxa, prendia sua franja. Enquanto eu estava com minha jaqueta de couro e a calça jeans preta encharcadas por causa da chuva, meus cabelos grudados na testa, por estarem molhados.

— Yuke — Shieme começou me fitando séria — Quer ficar doente? — eu a fitava sem entender. O que ela fazia ali? Ela não estava com raiva de mim? Shieme não tinha terminado comigo? Sem obter resposta, chamou minha atenção novamente, dessa vez mais irritada — Yuke, te fiz uma pergunta!

Pisquei algumas vezes antes de responder — Não, Shieme... — eu disse meio perdido — O que faz aqui? — eu perguntei um pouco confuso.

Shieme arrumou o guarda-chuva sobre nós e se sentou ao meu lado, como sempre ela não se importou pelo banco estar molhado — Sabe Yuke, eu fiquei bem chateada quando descobri que você tinha perdido meu livro favorito — ela não olhava para mim, olhava para frente — E eu não queria mais te ver... — meu peito doeu com aquilo, mas eu sabia disso desde o começo não? Shieme me olhou e sorriu — Mas depois que eu me acalmei eu pensei, um livro eu posso comprar quantos forem possíveis, mas o Yuke, eu só tenho um... — ela fechou os olhos e corou um pouco — Com o Yuke, eu posso ter lembranças incríveis...

Eu sorri um pouco e a olhava, analisando todas as suas feições — Me perdoe Shieme — eu comecei chamando a atenção dela, o que fez a mesma abrir os olhos — Eu não queria perder aquele livro... — Shieme me impediu de continuar.

— No final das contas Yuke, o que me deixou tão arrasada naquele dia não foi descobrir que você perdeu meu livro favorito. — ela me olhou um pouco ressentida — O livro já não era mais tão importante assim, ele passou a ser a segunda coisa mais importante que eu já havia ganhado...

Eu não entendia o que ela estava querendo me dizer, desde sempre Shieme declarava aos quatro cantos o amor que ela sentia por aquele livro... Então por quê?

— Shieme, eu não estou entendendo... — eu disse verdadeiramente confuso.

Ela me olhou novamente e eu me espantei um pouco, seus olhos estavam marejados, ela queria chorar — Naquele dia eu estava sim procurando por algo, eu já tinha notado a ausência do livro, mas outra estava se sobressaindo... — ela desviou o olhar — eu estava procurando este guarda-chuva Yuke...

— Como assim? — eu perguntei sem entender mais nada.

— Eu fiquei muito envergonhada de ter perdido o primeiro presente que você me deu e não queria que você descobrisse até que eu o encontrasse novamente. — ela deu um suspiro pesado — O livro era sim muito especial, mas o guarda-chuva é muito mais, eu não poderia perdê-lo... — ela deu um sorriso pequeno, apertando o cabo do guarda-chuva — Depois de dois dias procurando o encontrei guardado em um cômodo cheio de bagunças e só depois disso eu poderia vir te pedir desculpas por ter agido de forma tão infantil... — ela me fitou com um olhar intenso — Você me perdoa, Yuke?

Eu a fitei por alguns instantes e sorri, como poucas vezes me permiti sorrir. Meu relacionamento não estava perdido e isso me encheu de alegria, não me importei para o motivo que nos levou a estar nessa situação, afinal meu amor por ela é maior do que qualquer mal entendido entre nós.

— É claro que te perdoo Shieme — eu disse a abraçando, derrubando o guarda-chuva no chão, mas depois me lembrei das roupas molhadas e que ainda estava chovendo, me afastando rapidamente — Me desculpe, não queria te molhar... — fui surpreendido quando Shieme me abraçou sem se importar em molhar suas roupas ou com a chuva que caia sobre nós.

— Eu senti saudades Yuke! — ela murmurou em meu pescoço, a envolvi num abraço também, sentindo seu doce aroma que eu tanto amo sentir — A propósito, eu amei o livro... — ela se afastou um pouco, o suficiente para olhar em meus olhos, dando um sorriso em seguida — Obrigada por me dar um novo...

— De nada Shieme! — eu disse afastando uma mecha de seu cabelo que estava na frente dos olhos — Sabe que faço de tudo por sua felicidade...

Shieme assentiu e pegou o guarda-chuva do chão nos protegendo novamente, eu a abracei pelos ombros e ela se aconchegou mais a mim. Eu sorri, independente do mal entendido que tivemos, meu amor por Shieme não era algo a se duvidar e nem o sentimento dela por mim... Seja por um livro, ou por um guarda-chuva. Eu sempre amaria Shieme e ela sempre me amaria, com erros e acertos, afinal o amor não é um sentimento previsível.

FIM.


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Notas finais do capítulo

Obrigada a quem leu...
Até a próxima baby's :D