O caso dos três ruivos escrita por Maiumy hime


Capítulo 2
Disfarce


Notas iniciais do capítulo

Muito obrigada a todos que fizeram esses comentários LINDOS e produtivos



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/514597/chapter/2

Holmes cheirava o balcão e olhava o morto com sua lupa quando me chamou para ver. De um buraco no peito do policial, algumas gotas de sangue ainda escorriam para acumularem sobre suas pernas. Em cima do balcão estavam uma taça de vinho pela metade, um cigarro fumado e um prato com petiscos.

–Cuidado, Watson!

A voz autoritária de Holmes me alertou sobre a outra pista que ele apontava: um lenço de seda caído no chão.

–O que isso significa, Holmes? Digo, além de que atiraram nele.

–Bom, agora começamos a enxergar um suspeito, ou melhor, suspeita.

–Uma mulher?

–Sim, meu caro, uma mulher assassinou esse policial com um tiro. Repare que a ponta do cigarro não está úmida e revela o uso de uma piteira, não muito comum entre homens. O lenço no chão só pode ter caído quando quando se levantou e é hábito feminino colocar lenços no colo ao comer. Mas a prova conclusiva está aqui.

Ele colocou sua lente de aumento sobre a taça e pude ver claramente uma coloração avermelhada, típica de uma marca de batom que alguém tentou apagar.

–Por Deus, foi mesmo uma mulher!

–Sim, uma mulher de alta classe e com as iniciais J.J.

Lestrade e Gregson que ouviam tudo pareceram tão assombrados quanto eu, mas logo percebi como ele sabia daquilo: estava bordado no lenço, que era de um tecido nobre e fora esquecido.

–Sr. Carter- Holmes se dirigiu ao homem que até então esperava do lado de fora- a que horas encontrou o corpo?

–Por volta das dezesseis horas.

–E não reparou no sangue nas pernas ou no buraco de bala?

–Não, sr. Holmes, eu toquei nele quando estava de costas.

–Então como viu o distintivo?

–Estava caído.

–E onde está agora?

–Joguei-o no chão, não sei bem onde. Estava em choque e só pensei em chamar a polícia.

–Disse que não conseguia encontrar transporte. Como saiu daqui?

–Deixei o bairro a pé e depois encontrei uma carruagem.

–Muito bem. Vamos, Watson, não há nada mais para se fazer aqui e precisamos pensar em nosso próximo ato.

Não entendi o motivo de tantas perguntas ao sr. Carter sendo que a assassina era mulher, mas confesso que me agradava vê-lo tratando o homem com reservas. Estávamos subindo novamente em nosso cabriolé quando o ruivo se aproximou.

–Senhor Holmes, posso passar em seu apartamento para saber notícias do caso?

Tive vontade de pular por cima de Holmes para apertar o pescoço do homem, porém me contentei em quase esmagar a ponta de minha bengala. Depois de alguns instantes de hesitação, meu companheiro respondeu e minha raiva voltou-se contra ele.

–Claro, senhor Carter, sempre que quiser.

Não abri a boca durante o caminho todo e, nas poucas vezes que o encarei, Holmes tinha uma feição sombria e preocupada. Quando chegamos em Baker Street eu planejava dizer qualquer coisa, mas ele calou-me colocando dois dedos sobre meus lábios. Se dirigiu à mesa de centro e pegou um telegrama, franzindo as sobrancelhas assim que o leu.

–Precisaremos agir mais rápido do que eu gostaria, a irmã do sr. Carter dará uma festa amanhã em homenagem a seu casamento com Sir Elliott Hall e isso irá reunir toda a nobreza de Londres em um só lugar.

–Como vamos aparecer pra investigar?

–Você terá uma acompanhante italiana muito rica, caro Watson.

–Quem?

–Vou deixar para que descubra na hora.

–Hoje você está fazendo ainda mais mistério do que o habitual. Tem alguma coisa te preocupando nesse caso do policial, não é Holmes?

Ele acendeu o cachimbo, franziu as sobrancelhas novamente e apoiou o queixo sobre o peito, andando de um lado para o outro durante alguns minutos enquanto soltava círculos azulados de fumaça no ambiente.

–Vou lhe fazer uma pergunta, Watson, e preciso que me responda com toda a sinceridade.

O olhar que dirigiu a mim foi tão sério que fez minhas mãos suarem, nervoso ao concordar com um aceno de cabeça.

–Se acabássemos nos envolvendo em um caso perigoso demais até para a polícia e eu pedisse para que me deixasse trabalhar sozinho, você o faria?

–É claro que não. Se é perigoso demais para a polícia, quem dirá você sozinho com aqueles petulantes da Scotland Yard.

–Certo. Agora- sua expressão suavizou repentinamente- deite-se no sofá e vamos ver se consigo fazê-lo dormir.

–Não pode testar suas melodias de violino no meu quarto? Não que o sofá seja desconfortável, mas tenho a impressão de que você vai passar a noite andando pelo apartamento.

–Tudo bem então, se você prefere. Mas não planejava tocar violino.

Um sorriso se formou em seus lábios e senti meu rosto esquentar. Fui até meu quarto e me deitei, Holmes vindo junto comigo e me abraçando por trás. Ao contrário de tudo que eu havia imaginado, ele apenas ficou ali acariciando meus cabelos e aspirando meu perfume com o nariz encostado em minha nuca. Depois de algum tempo, sucumbi à paz que aquilo me proporcionava e caí no sono.

Logo ao amanhecer acordei sobressaltado, surpreso ao vê-lo de pé ao lado da minha cama. Por um segundo captei certa melancolia em seu olhar, no entanto essa sombra sumiu quando Holmes percebeu que eu estava desperto.

Você dormiu profundamente. Estava esperando para tomarmos café da manhã.

Eu não poderia ficar mais surpreso. Levantei-me o mais rápido que pude, como se aquele fosse um sonho que iria se despedaçar se permanecesse mais um segundo deitado. Comemos em silêncio como sempre, respondendo apenas algumas vezes em que a sra. Hudson tentava dialogar. Holmes, porém, mal se alimentou e mantinha um olhar pesado sobre a xícara de chá.

Passei o dia visitando alguns pacientes e percebi que Holmes estava no mesmo lugar em que eu o havia deixado, ou seja, trancado no quarto. Não ouvia, porém, os passos ritimados de sempre. O horário do baile estava mais próximo do que eu gostaria, então fui tomar banho e vestir roupas apropriadas. Quando voltei para a sala quase passei mal ao me deparar com uma senhora sentada no sofá, mas esse susto não foi nada perto do que levei ao cumprimentá-la.

–Boa noite, senhora.

–Vejo que funciona.

Quase gritei ao ouvir a voz de Sherlock Holmes e precisei me certificar que vinha mesmo da pessoa à minha frente.

–Por Deus, que ideia é essa de se disfarçar de mulher?!

–A sociedade londrina atrasada não conceberia dois cavalheiros de mãos dadas no baile, Watson. Além disso, será muito mais fácil investigar nossa suspeita desse jeito.

–Céus...se não falar nada, você está irreconhecível.

–Excelente.

E estava mesmo. Usava um vestido azul simples e recatado, colar largo para cobrir o pescoço, luvas de renda preta, peruca com uma trança e cachos negros e um chapéu com renda que lhe cobria os olhos. Estava ainda mais alto por causa do salto nas botas e seu rosto naturalmente estreito ficara quase delicado com a aplicação de maquiagem. O que realmente destoava eram seu nariz curvado e o queixo proeminente, que no entanto não interferiam na aparência geral.

–Uma coisa que tem me atormentado sobre esse caso é o modo como a mulher escondeu a arma, Watson. Não tenho seios e já se tornou muito incômodo para mim guardar o revólver entre o espartilho e o corpo. Como, então, ela fez?

–Na bolsa?

–Pensei nisso a princípio, mas veja que mal consigo ocultar o formato de minha lente de aumento.

De fato o contorno do objeto aparecia sob o tecido.

–Bem, não adianta ficar fazendo conjecturas. A propósito, meu caro, esse fraque ficou perfeito em você.

Minha face ardeu, porém não tive tempo de agradecer porque uma carruagem estava nos esperando lá embaixo. Fizemos o caminho em completo silêncio e quando chegamos ao salão de baile eu estava tão nervoso quanto um ser humano poderia ficar. Se descobrissem o disfarce seria o fim da investigação e de nossa dignidade.

–Watson, assim que entrarmos quero que procure uma mulher ruiva.

Preferi não discutir e, assim que entramos, descobri que não seria tão fácil como havia imaginado: a festa parecia uma reunião de todos os ruivos da Grã-Bretanha, haviam cabeças vermelhas por toda parte.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

E agora, como sair dessa? Por que uma mulher ruiva? E que reviravoltas são essas no humor do detetive? Qual o grande perigo que ele vê? Será que Donald Carter fala a verdade? E qual o motivo do tratamento que Sherlock dá a ele? Espero que tenha sido uma boa leitura



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "O caso dos três ruivos" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.