Não foi dita nenhuma palavra durante o jantar. Isso nunca havia acontecido antes. Os jantares da família Young eram sempre alegres, com muito falatório. De uns tempos para cá, quem ousava falar era repreendido por um sermão do chefe da família.

As irmãs se comunicavam apenas pelo olhar, porém de tempos em tempos olhavam de relance para os pais. Proibidas de falar, realizavam a leitura dos lábios.

– Açúcar– a ruiva pronunciava.

– Está... com... papai– elas tentavam diminuir ao máximo o número de palavras pois na maioria das vezes seu entendimento era difícil.
A ruiva balança a cabeça negativamente; se não ousava nem olhar diretamente para seu pai, tampouco ia falar com ele.

– Hã... papai, o senhor poderia, por favor, passar o açúcar? - pergunta a menor, nervosa.

O rei joga o açúcar com desdém.

Ela deposita o açúcar em seu suco e come seu jantar o mais rápido possível, pois não aguentaria permanecer lá por muito tempo.

Ao terminarem, se retiram educadamente e ao sairem da sala de jantar, apostam uma corrida até o quarto. Risadas ecoavam pelos corredores do sombrio castelo. Com a respiração falhando e sorrisos de orelha a orelha, elas entram no cômodo.

Gotas d'água caíam no lado de fora enquanto a jovem garota acariciava seu pequeno e felpudo dragão de pelúcia. Sua irmã deslizava a escova entre suas mechas ruivas.

– Katie, cante alguma música! Eu sei que você conhece várias! - diz a ruiva.

– Está bem, mas só uma! - responde a mais velha.

Um sorriso se estampa no rosto da pequena menina.

– A lua cheia paira, chegando com um estalo; e no alto da montanha, a princesa e seu cavalo. Lev...

Escuta-se um objeto quebrando-se no chão. As duas irmãs se entreolham, assustadas.

– Já volto, Lily - murmura a jovem ruiva à seu dragão de pelúcia.

As duas garotas caminham em direção ao barulho. Com inaudíveis passos descalços no gélido chão, elas chegam numa enorme porta de madeira escura.

– Angie, esse é o escritório do papai... - sussurra a irmã mais velha, com um pingo de dúvida.

Ambas posicionam seus ouvidos na porta e escutam.

– ... EU NÃO VOU TOLERAR ISSO, NATALIE! - era a voz de seu pai.

– TOLERAR O QUÊ, JAMES? VOCÊ PERCEBE A DECISÃO QUE TOMOU? - gritava sua mãe.

– VOCÊ PRECISA ENTENDER QUE SÓ UMA VAI RECEBER O TRONO! SÓ UMA!

– ISSO NÃO É MOTIVO PARA MATÁ-LA! - as duas arregalam os olhos. A maior puxa sua irmã para perto, com o braço envolta dos pequenos ombros da menor.

– SE QUISERMOS QUE ISSO DÊ CERTO, TEREMOS QUE CORTAR DA RAIZ, NATALIE! - seu pai nunca havia pronunciado o nome de sua mãe com tanta rigidez.

– NÃO! - a moça berrou o mais alto que pôde.

– NÃO?

– NÃO! EU NÃO VOU DEIXAR VOCÊ LEVAR ANGELINE DE MEUS BRAÇOS! - a mãe vira-se por um instante enquanto as lágrimas não paravam e percebeu, por uma brecha na porta, que suas filhas haviam escutado tudo.

Olhando diretamente para Angeline, ela pronuncia uma palavra - corra.

Sua irmã pega seu braço e a guia pelo castelo à procura de seu quarto.

Empurrando a porta com força, ela corre em direção ao armário.

– Você sempre disse que queria partir para uma aventura, certo? - Katie pega uma mochila no alto do armário de madeira polida - isso é uma aventura, mas é só sua.

Katie ajuda sua irmã à calçar suas botas e o máximo de roupas possível.

Com a mochila nas costas, ela leva a irmã até o estábulo. Correm até um cavalo branco resplandescente, mas a garota para, abraçando sua irmã.

– Eu te amo, Angie - a morena pronuncia as palavras enquanto lágrimas caem.

– Eu também - a ruiva se separa e recebe um colar.

– Mamãe me deu antes de você nascer - explica Katie - ela me pediu para que lhe desse se ela não estivesse mais presente conosco. - ela não queria dizer que só estava dando pois temia nunca mais vê-la.

– Você não vem comigo? - pergunta a pequena em meio aos soluços.

– Se eu for, o perigo vem junto comigo, Angie.

Ela ajuda a ruiva a montar em seu cavalo. Suas últimas palavras são:

– Tudo o que você precisa é amor.

E com isso, o cavalo corre, até que não se pode mais ver sua silhueta.