Literatura escrita por LiKaHua


Capítulo 5
Capítulo 05 - Processo de Negação


Notas iniciais do capítulo

Oi gente linda! Aqui está mais um capítulo para vocês, obrigada a Cristal Tally que comentou no último capítulo e espero que vocês estejam gostando.



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Como eu não tinha visto aquilo antes?! Eu me sentia tão idiota que as lágrimas não conseguiam parar de cair, mas por que eu estava chorando? Era ridículo e não tinha nenhum sentido, afinal aquela situação em nada devia me afetar. Não sabia o que tinha me dado, minha cabeça estava um amontoado de idéias e eu ainda não havia decidido qual delas era a mais idiota. Continuei andando desejando que Davi estivesse ali comigo e me disesse o que fazer, normalmente eu odiava quando ele fazia isso, mas naquele momento eu precisava. A minha situação mental crítica pedia que alguém me guiasse, mesmo que a pessoa em questão tivesse menos sanidade que eu. Mas o Davi não podia mais vir, ele não estaria na praça em vinte minutos se eu ligasse, na verdade já fazia meses que o telefone dele não chamava mais. Passei a maga do casaco pelo rosto para enxugar as lágrimas que insistiam em descer e me impediam de ver com clareza, eu já havia alcançado o centro da cidade, em mais ou menos meia hora chegaria em casa, passei antes em uma lanchonete ainda aberta e comprei um pastel de frango, não havia comido nada desde o almoço e meu estômago começava a reclamar, talvez enquanto eu comesse minha mente se acalmasse um pouco e me deixasse em paz. Funcionou.

– Laura? – Minha mãe perguntou espantada ao me ver. – Por que em casa tão cedo?

– Hum... Reunião para os professores... – Menti. – Vou tomar um banho e ler um pouco tá bom?

Aproximei-me dela e dei um beijo em seu rosto saindo em seguida para o meu quarto antes que ela percebesse que eu havia chorado, ela era muito boa nisso. Sorte minha que eu era tão boa quanto em esconder os traços dos meus ataques de nervos. Tomei um banho longo enquanto tentava limpar meus pensamentos junto com a água que percorria meu corpo, mas não obtive sucesso. Coloquei o baby doll e peguei novamente o caderno onde deveria estar sendo escrito o livro que eu estava fazendo, mas que não conseguira tocar àquele dia. Revi onde havia parado e quase me pus a chorar novamente, mas engoli as lágrimas e ignorei o nó que apertava minha garganta e continuei escrevendo tentando convencer a mim mesma que aquele simples encantamento iria acabar tão depressa quanto começara, porque era simplesmente isso, eu ficara tão encantada com ele que ignorara até os detalhes óbvios, eu costumava ser impulsiva e cega com algo que estava bem à minha frente.

Alguns minutos se passaram e Emma estava satisfeita, a comida estava maravilhosa, ela conhecera poucos homens que cozinhassem tão bem. Sua avó tinha razão quanto a conquistar um homem pelo estômago e agora a garota percebia que isso também funcionava com mulheres. Ela colocou a bandeja sobre o criado mudo ao lado da cama e sentiu uma pontada aguda na costela direita, a dor fez Emma paralisar por um momento, como ela não havia sentido nada daquilo antes? Com algum esforço ela levantou e caminhou zonza até o banheiro, para se olhar no espelho.

A imagem que viu refletida nele não foi das melhores, havia um corte no seu lábio inferior com sangue seco, um hematoma grande no lado esquerdo da sua testa, seus braços tinham marcas roxas também, e seu corpo doía o que fez Emma presumir que havia apanhado muito dos brutamontes. Foi então que ela recordou que Leandro não tinha nenhuma marca. Ele bateu nos três homens sem levar um único tapa? Sua cabeça doeu e ela decidiu voltar para a cama, precisava ligar para os pais e dizer onde estava e o que estava acontecendo, mas ela não sabia exatamente onde estava. Na volta para cama em passos lentos ela sentiu suas pernas cederem e a dor nas costelas voltou mais forte, será que havia quebrado alguma? Foi quando ia caindo que sentiu braços fortes envolverem seu corpo, ela gemeu de dor ao senti-los tocar suas costelas, e ouviu Leandro reclamar:

– O que está fazendo?! – Repreendeu-a. – Você ainda não pode levantar. O médico disse que você tem machucados por todo o corpo e precisa de repouso.

– Desculpa, eu... Queria me ver no espelho. – Falou tentando recobrar as forças, mas Leandro colocou os braços em torno do corpo dela erguendo-se.

– Como ela está, amor?

A voz aveludada que surgiu por trás dele tirou Emma da realidade e fez tudo paralisar. Ela fitou a mulher caucasiana de pele bronzeada, lisa e perfeita como uma pintura, os dentes alinhados e branquíssimos, longos cabelos negros que despencavam em um corpo de miss universo. Leandro colocou-a na cama e fez um sinal para que a mulher se aproximasse. Ela deu alguns passos na direção da cama onde Emma a olhava ainda sob efeito do choque.

– Emma essa é Ashley. Minha esposa.

Foi então que o peso de realidade caiu sobre ela, como um manto frio sobre seu corpo ela tentou, mas não conseguiu conter a estupefação em seu rosto. A mulher se aproximou dela com um sorriso delicado enquanto Leandro a olhava sério.

– Olá Emma, é um prazer te conhecer. – Falou suavemente.

Foi quando Emma viu o anel dourado com uma pedra brilhante adornando o dedo anelar esquerdo dela e, fitando a mão de Leandro uma argola dourada simples no mesmo dedo. Como havia ignorado aquele detalhe?

Desisti de digitar aquilo naquele momento e deixei apenas registrado no caderno. Eu refleti por um momento que deveria tomar cuidado, aquele livro poderia começar a virar um diário sem que eu percebesse.

*

Não sei a que horas fui dormir e muito menos que horas eram quando acordei. Era sábado, minha mãe havia ido para feira de frutas e verduras fazer as compras da semana e eu esperava que meu pai tivesse tomado café ou eu teria problemas quando ela chegasse em casa. Ouvi o barulho de Amberly lavando os pratos e, ao fitar o relógio analógico sobre a cômoda vi que eram onze horas. Eu não queria levantar, não queria arrumar a casa, não queria ver ninguém. E eu não ia. Permaneci quieta no meu quarto durante todo o dia.

Quando entardeceu e o relógio sobre a cômoda marcou duas e meia minha mãe chegou em casa, ouvi-a conversando com Amberly e perguntando por mim, eu tinha que me preparar para a maratona de perguntas e reclamações que viriam a seguir, mas me sentia imersa em tal letargia que nem me importava.

– Laura? – Minha mãe abriu a porta, preocupada. – O que você tem?

– Nada. – Respondi sem me mover.

– E porque está enfurnada nesse quarto o dia todo? – O tom de sua voz ficou um pouco alterado.

– Nada. – Respondi de volta dando as costas para a porta e virando para a parede.

Ela reclamou alguma coisa que não prestei atenção e saiu fechando a porta em seguida. Permaneci assim o sábado inteiro, não queria ler, não queria escrever, não queria fazer nada. O que estava havendo de errado comigo? Okay, ele era casado, mas e daí? Isso não me afetava em nada. Daqui quatro anos eu sequer ia vê-lo! Foi essa raiva que me motivou a sair do meu estado apático e agir, eu não tinha nenhum motivo para ficar daquele jeito, aquilo não me dizia respeito e quando encontrasse Rafael novamente na segunda feira nada seria diferente. Peguei o livro que estava lendo, Romeu Imortal, a sequencia de Julieta Imortal que eu havia ganho da minha mãe no ano passado, e continuei minha leitura.

"Eu terei de fazer o que for preciso, como a embaixadora disse ainda não sou um deles. Ainda posso mentir, enganar e matar para conseguir o que eu desejo, e o que eu desejo é que Ariel viva."

Um sorriso brotou em meus lábios ao ler aquilo, era tão incrível o modo como a literatura se casava com a vida, era fruto de uma experiência mágica da mente, do coração e das vivências de alguém que mesmo sem te conhecer, conseguia descrever com uma precisão assombrosa como você se sentia.

*

Odeio fins de semana, eles passam depressa demais, mal dá tempo de a gente descansar todo estresse acumulado na semana. No domingo eu fui à missa e me senti revigorada, eu sempre fui uma pessoa muito religiosa, mesmo que depois de grande tenha me distanciado um pouco. Quando cheguei à faculdade aquela noite já era por volta das sete, cheguei mais tarde de propósito, não queria correr o risco de encontrar com Rafael sozinho. Entrei na sala que infelizmente ainda estava vazia e tomei meu lugar abrindo novamente meu livro e ficando imersa na leitura.

"Ele se levanta e cambaleia até a porta de entrada. Quero pedir a ele que pare, que uma ambulância não vai ajudá-la, mas, quando abro a boca, tudo o que sai dela é um grito. Um longo grito solitário, como os que gemem dentro dela. As almas perdidas estão gritando e devo gritar junto com elas porque sou irmão delas. Minha magia emprestada e meu corpo vivo não importam. Bem no âmago, onde o verdadeiro Romeu está encostado num canto, ainda sou uma criatura das trevas. Nunca vou conseguir escapar. É assim que vou terminar, como uma das criaturas que gritam, perdido e sozinho exceto por esses breves momentos quando posso penetrar no interior de alguém como Ariel e, por alguns preciosos minutos, fazer que meu sofrimento seja ouvido."

– Oi. – A voz me assustou, mas dessa vez não gritei. Quando olhei para a porta vi o estranho do bloco G. – Que bom te encontrar mais calma.

– Ah... Me desculpa por sexta... Eu...

– Tudo bem. – Ele assegurou com um sorriso. – Foi sorte.

– Sorte? – Perguntei, confusa. – Eu esbarrei com você no corredor e quase te derrubei no chão. Como assim sorte?

Ele riu de maneira contagiante. – Algumas pessoas tem definições próprias de sorte.

Dizendo isso ele saiu com seu andar apressado de sempre, e só então eu me dei conta de que mais uma vez não perguntei o nome dele. Fechei o livro e tirei meu caderno de rascunhos da bolsa, eu fiquei me sentindo estranhamente bem depois de conversar com aquele estranho, me senti inspirada e mais confiante para prosseguir com o plano, mas por alguma razão a ideia de encontrar Rafael novamente era constrangedora e me deixava nervosa.

– O prazer é meu... – Balbuciou Emma, tentando parecer simpática.

– Que horror você passou minha querida, eu sinto muito. – Ela parecia estar sendo sincera.

– Ahn... Fui parar no lugar errado, na hora errada. – Explicou-se Emma. – Dei azar.

– Já avisou aos seus pais? – Ela perguntou carinhosamente. – Eles devem estar loucos de preocupação e você vai ter que ficar uns dias aqui.

– Na verdade, é só o meu pai... Não conheci minha mãe. – Emma respondeu tentando sorrir sem muito sucesso.

– Sinto muito. – Ashley falou com pesar. – Bom, ligue quando quiser e se sinta a vontade, nós vamos cuidar de você até que fique melhor e possa voltar para casa.

– Obrigada... É muita gentileza sua.

– Descanse, mais tarde trago mais alguma coisa para você e se precisar de qualquer coisa, é só chamar.

Quando Ashley saiu do quarto, Emma percebeu que Leandro ainda estava sério e mantinha o olhar fixo na janela. Um silêncio profundo passou até que ele finalmente o quebrou.

– Eu sinto muito. – Sua voz soou fraca. – Não queria que nada disso parecesse mais do que é.

– Não sei do que está falando. – Mentiu Emma, fingindo completa indiferença. – Só quero saber como você sabia que eu estava lá. Como sabia onde eu estava sempre? Você é quem, Edward Cullen?

Risquei o nome do personagem pensando que ficaria muito inconveniente, pensei um pouco sobre o que poderia substituir quando Rafael entrou na sala, amaldiçoei em pensamentos aqueles alunos que nunca chegavam na hora! Ele deixou a mochila em sua mesa e veio sentar na cadeira de Ariana enquanto eu tentava me manter controlada.

– O que aconteceu, Laura? – Perguntou preocupado. – Você saiu correndo de mim na sexta feira, depois foi embora e Ariana me disse que você estava passando mal.

– Não foi nada. – Menti e me surpreendi com a segurança na minha voz embora por dentro eu estivesse me contorcendo. – Apenas um breve ataque nervoso. Ocorre às vezes.

– Tem certeza? – Perguntou ele e percebi sua desconfiança. – Você parecia muito bem quando eu cheguei.

– Sim, eu tenho certeza. – Assegurei.

Para minha felicidade, Ana entrou na sala, seguida de Sabrina e Ariana, me senti mais leve. Rafael fez um gesto positivo com a cabeça e tomou seu lugar no birô, Ariana falou comigo e eu cumprimentei-a rapidamente, fazendo um esforço sobre-humano para controlar meu estômago embrulhado, minhas mãos geladas e meu coração acelerado. E foi com essa determinação que eu voltei para o meu mundo imaginário tentando me esforçar par ignorar a presença de Rafael.

[...] O que você é? Alguma espécie de stalker?

Emma percebeu quando Leandro comprimiu os olhos, incapaz de responder, ela não conseguia imaginar nenhuma razão para ele estar sempre presente quando ela precisava. Primeiro no bar quando ele a defendeu de um cara bêbado, depois certa noite quando ela voltava da casa de Cassandra e foi surpreendida por um ladrão e agora os três brutamontes que a haviam encurralado quando ela saía da festa de aniversário de sua melhor amiga Christine tarde da noite.

– Acha que eu não percebi? – Ele falou desviando o assunto. – Você ficou “balançada” comigo.

– Você está se achando demais, não acha? – Contrapôs-se ela fingindo não saber do que ele estava falando.

– Não, eu não me acho. Principalmente porque eu senti a mesma coisa. – Admitiu.

– Não se preocupe com isso. – Ela falou em tom frio tentando não transparecer o choque e a emoção que as palavras dele lhe causaram. – Sua esposa não vai ficar ciente disso. Agora, se me permite, preciso ligar para o meu pai.

Rafael começou a aula e eu escutava a série de regras sobre a primeira declinação e o dicionário de latim. De vez em quando percebia os olhares dele em minha direção, mas olhando para o caderno diante de mim eu me decidi, aquela história era minha e já estava mais que na hora de eu começar a decidir que rumo ela tomaria. Era eu que estava escrevendo, eu sabia como tinha de terminar.


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