InFamous: A Tirania de Rowe escrita por Thuler Teaholic


Capítulo 22
Honrar a Memória


Notas iniciais do capítulo

Esse aqui demorou.
Antes de falar sobre o capítulo em si, vim dizer que as postagens do Tirania vão ficar mais irregulares ainda porque eu estou escrevendo outra fic, mas dessa vez, uma original. Quem se interessar, é só procurar no meu perfil.

Nesse aqui estou trazendo um pouco mais do passado e, bem escondidinho, um dos personagens mais importantes do Second Son.
Nesse capítulo, não esperem ação, caos e pancadaria que nem o último. Esse aqui é mais para a história mesmo.
Dedicado a minha leitora maravilhosa GatoPreto, por me dar uma injeção de ânimo que eu nem sabia que precisava.
Essa é pra você, diva.
Então, sem mais delongas



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O comandante-em-chefe sondava o grupo eclético à sua frente. A expressão em seu rosto poderia passar uma sensação de descrença resignada, mas se tratava, na verdade, de uma confiança relutante.

— Você deve ser Chloe Hoen-Hauser. — O comandante-em-chefe arriscou, sondando com firmeza o rosto da hacker.

— Isso mesmo. — A resposta foi um trinar grave. O visual de Hoen-Hauser era muito punk, chegando até a se clichê. Uma maquiagem pesada que deixava seu rosto branco como osso contrastava de forma agressiva com as roupas escuras e underground e com o cabelo rosa choque raspado em um dos lados da cabeça.

— Você irá escolher seu codinome para essa missão, Srta. Hoen-Hauser. Está de acordo?

Um dar de ombros irreverente foi a resposta. A alemãzinha não iria chegar longe com essa atitude.

— E qual será?

A jovem precisou pensar por alguns instantes antes de responder.

— Kasper.

— Tem certeza?

Um sorriso de rebeldia se escondia atrás daquela pele branca como osso foi a resposta.

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Hunter removeu sua lâmina de osso do alvo de dardos enquanto Forrest, auxiliado por alguns jovens condutores que estavam escondidos no porão, empilhava os cadáveres mutilados no meio do bar. Sentia-se instável demais para ajudar naquela decoração macabra, então, limitou-se a observar igual ao loiro, Jean, que parecia extremamente entediado.

Era impressão de Hunter, ou ele estava lhe mandando alguns olhares significativos?

Talvez fossem suas roupas encharcadas de sangue.

Passinhos foram ouvidos, rápidos como o coração de um beija-flor, quando Lys chegou trazendo um quadrado grosso de papel.

— Aqui, seu mapa. — Balançou o mapa dobrado, chamando a atenção de Forrest.

O velho largou um dos últimos corpos na pilha antes de ir até a garota e tomar o mapa em suas mãos ensanguentadas. Pousou-o em uma mesa e o abriu rapidamente, até uma infinidade de papel derramar-se sobre o tampo da mesa, caindo em muito pela borda.

— Terminem de empilhar os corpos e venham aqui, todos vocês. — O velho tentava ajeitar o mapa da melhor maneira.

Quando todos os corpos estavam agrupados, os sete condutores, mais Jean e Hunter, foram até Forrest.

— Nós estamos aqui. — Pressionou um dedo sangrento na mancha que representava Manhattan. — Para onde vamos?

— Boston. — Um dos condutores sugeriu, o garoto não devia ter mais de dez anos. — Sempre quis ir para lá.

— Não. — Forrest rejeitou a ideia. — Lá deve estar pior do que aqui. Precisamos ir para um lugar mais ao Oeste, os Infames já devem ter passado por lá.

Recolheu o mapa sem abrir espaço para objeções.

— Melhor fazermos isso na caminhonete, não acham? — Sem esperar uma resposta, dobrou o mapa de qualquer jeito e abriu uma porta a qual Hunter nunca havia visto antes, talvez porque a mesma estivesse coberta por pôsteres. O lugar lá dentro era poeirento e fedia a graxa de uma forma descomunal. — Venham logo, me ajudem a tirar ela da garagem. Isso te inclui, moleque.

Hunter, assim como todos os outros, obedeceu.

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—Qual seu nome?

— Lai Lin Yao — O asiático respondeu. Era alto, magro de ombros largos e usava um conjunto totalmente preto, jeans e agasalho de capuz. Não era possível afirmar se os olhos estavam semicerrados por sono, desinteresse, ou etnia.

Talvez o segundo por causa dos braços cruzados.

— Sr. Yao, o senhor deve escolher um codinome para essa missão, está de acordo?

O chinês assentiu de forma imperceptível, fazendo o cabelo liso e curto escorrer um pouco para frente.

— Durand. — Respondeu claramente.

— O senhor tem certeza? — O comandante-em-chefe se certificou.

Durand socou a palma da mão esquerda com a direita em resposta.

Era possível ver os músculos tensos como cabos sob o casaco.

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Os músculos de Hunter estavam tensos como cabos enquanto ele ajudava a empurrar o caminhão.

— Essa bodega tem gasolina, por acaso? — Perguntou arfante, apoiando sua força nas costas da cabine da grande caminhonete, que era mais como um pequeno caminhão na concepção do jovem.

— Não, seu imbecil. — O jovem imaginou que fosse sarcasmo do velho lá dentro, que tentava fazer a caminhonete pegar. — Eu inventei um motor híbrido que funciona com eletricidade ou calor, e tem outro lance que eu criei que extrai o óleo da madeira que a Lys cria, que a gente usa no lugar do óleo de motor.

— Caralho, você tá em todas, hein velho! — Hunter gritou para sobrepujar o súbito ronco do motor.

—Isso, menina! — Forrest buzinou feliz, parabenizando a caminhonete. — Parabéns para vocês aí também, meninas! — Um insulto acalorado para ver se sua matilha estava atenta.

Os jovens condutores se parabenizavam pelo esforço conjunto, distribuindo tapinhas nas costas, apertos de mão e réplicas igualmente mordazes ao barman.

Em um canto, o tal condutor Jean observava tudo silenciosamente, observando Hunter como se precisasse lhe contar um segredo.

Não exatamente um segredo, mas o que era afinal?

Forrest desceu da cabine com um sorriso no rosto, mas assim que seu olhar cruzou com o do jovem humano, uma sombra lampejou por seu rosto.

— Venha comigo para o bar, moleque. — O velho caminhou a passos duros até o bar, chamando Hunter com um aceno.

— Por quê? — O normal indagou, seguindo o velho.

— Preciso da sua ajuda para quebrar umas garrafas.

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—Qual é o seu nome? — O comandante-em-chefe franzino questionou, parando na frente de um homem em seus trinta e cinco anos, o medindo com os olhos. Ele era alto e robusto, os braços grossos pendiam de forma diligente ao lado do corpo, o queixo quadrado e forte estava levemente erguido e os olhos escuros evitavam o olhar do oficial respeitosamente.

— Lance Geoffrey Wesley. ­— A resposta foi dada com presteza.

— Você irá escolher o seu codinome para essa missão, Sr. Wesley. Está de acordo? —Não fora, exatamente, uma pergunta.

— Aye Aye, senhor. ­— Respondeu assentindo, fazendo com que uma mecha de cabelo alaranjado escorresse por seu rosto, cobrindo a têmpora esquerda. Lance tratou de arrumar a dissidente junto com o restante do cabelo em um rabo de cavalo curto.

— E qual será.

— Langley, senhor. — O atirador parecia ter todas as respostas na ponta da língua.

— Tem certeza?

— Toda certeza, senhor. — A pose era tão séria que parecia uma zombaria.

O mais provável era que fosse mesmo uma, Langley tinha tanto fogo nos cabelos quanto no olhar.

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O fogo refletiu no olhar de Hunter e secou o sangue em sua roupas, formando crostas escuras e malcheirosas.

As labaredas lambiam a construção do Forrest’s, lançando espectros de luz alaranjados noite adentro.

Aparentemente, cadáveres cobertos de cachaça queimavam como velas porque o incêndio avançava sem escrúpulos através da construção, afogando em seu calor muito mais do que Infames indigentes.

Hunter e Forrest haviam coletado todas as coisas de maior valor. Livros, alguns souvenires, miniaturas, além de um computador antigo e uns grandes caixotes com as bebidas mais importantes, lúpulo, sementes e um tonel médio de cerveja. Todo resto havia ficado para trás e agora ardia naquele inferno.

Um estalo alto de madeira se condensou no âmago de Hunter como uma promessa silenciosa. Uma promessa feita de cinzas e brasas.

Todos os sete condutores choravam. Alguns de forma discreta, como Lys, e outros de forma mais espalhafatosa, como um jovem chamado Charlie. Todos estavam abraçando Forrest que encarava as chamas com um fanatismo determinado, sem verter uma única lágrima.

Aquilo não era o fim do velhote, aquele saco de ossos iria viver para carregar o caixão de todos ali, o jovem normal sabia. Ele iria se erguer, e com aqueles olhos sábios, veria a guerra acabar.

Ele merecia isso.

Os únicos que estavam fora daquele abraço e daquele mar de lágrimas eram Jean e Hunter, que olhavam as chamas procurando ali algum significado.

Um farrapo de tecido dançou do fogaréu e flutuou errante até que Hunter o pegasse. Era a águia dos Infames, meio derretida e meio desfeita. Ela virou pó na mão do humano, era aquele lance de condutores sumirem com suas roupas.

Hunter esfregou a poeira negra em suas mãos e deixou que o ar quente a levasse em uma cortina de partículas.

Ele não gostava de tomar lados, mas no fundo, desejou que aquela águia se desfazendo em pó fosse um presságio.

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— Ah! Você deve ser Reyk Garside, não? — O comandante-em-chefe adivinhou de primeira.

Reyk concordou. — Exato.

— Seu dossiê diz que você é filho de Nicolle Jamielle e de Frederick Garside, isso está certo. — O baixinho folheou a ficha do jovem negro.

­— Os dossiês não tem o costume de mentir. — Respondeu sem sarcasmo.

— Ah! — O baixinho sorriu. — Vejo que tem a língua da sua mãe. — Apenas o jovem captou o duplo sentido naquela frase. — Sabe, eu trabalhei com seus pais.

— Estou ciente disso. — A resposta foi seca.

— Seu pai era um filho da puta casca-grossa. — O comandante-em-chefe confidenciou. — E sua mãe, ho-ho, ela sabia tirar qualquer informação de um homem. Da forma que fosse necessário. — Aquilo foi muito mais alto do que o necessário.

— Sabia que o apelido do seu pai era Rake, como o monstro? — O baixote continuou, com um sorriso cada vez mais largo. — Porque se você o visse uma vez, ele iria te matar durante o sono.

— Eu se...

— É por isso que o seu nome é Reyk? Por causa desse apelidinho infame? — Aquilo já estava ficando ridículo.

— Não, senhor. Meus pais se conheceram na capital da Islândia. O nome da cidade é Reykjavík, como o senhor faria bem em saber.

O comandante-em-chefe deu uma sonora gargalhada, mas ninguém o acompanhou.

— E qual será o seu codinome, Rake? — Reyk conseguiu ouvir aquilo, aquele insulto. — Rake, talvez?

Essa questão o atormentava já fazia um tempo, e nenhum codinome soava magnâmio ou épico como deveria ser. Então, acabou optando por... — Hunter.

— Muito bem, eu espero que você honre seus pais com esse nome, Hunter.

— Se o fizesse, o senhor já estaria se engasgando com as próprias vísceras.

Ver o sorriso daquele imbecil murchar havia sido a maior conquista de sua vida.

Kasper se inclinou na direção dele quando o comandante-em-chefe lhes deu as costas e sussurrou em seu ouvido. — Gostei de você, Hunter.

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— Hunter. — O Humano se virou para atender. Era Jean que o chamava.

O loiro se aproximou. — Preciso confirmar uma coisa. — E, em um movimento impossivelmente rápido, ele formou uma lâmina reluzente de vídeo azul e golpeou o ventre de Hunter, mas a lâmina etérea se desfez ao entrar em contato com o sobretudo que o jovem usava.

— Seu sobretudo é feito de matéria-nula que anula qualquer tipo de energia, ou eu estou enganado? — A pergunta soou mais como um pequeno monólogo.

Hunter apenas assentiu, o que fez o alívio ficar estampado no rosto de Jean.

— Só pra confirmar. — Se aproximou mais um pouco de forma conspiratória e sussurrou no ouvido do humano.

Quando se afastou, a expressão de Hunter era significativa.

— Ah, é você? — Perguntou, por fim. O condutor fez que sim.

— Você entendeu o que eu te disse? — A pergunta de Jean foi grave, ele segurou o ombro do humano. — Precisa que eu repita algo?

— Não, eu entendi. — Hunter se desvencilhou. — Suba logo, eles estão de esperando.

O loiro concordou e subiu na carreta aberta, fechando-a atrás de si com um rugir de aço com aço.

Hunter ajeitou o sobretudo, checou se tinha tudo no lugar e se pôs a caminhar até o epicentro da confusão, seguindo as torres de fumaça no céu e tomando o Empire State como guia.

Deu os primeiros cinco passos, sentindo o peso estranho da escopeta na cintura quando ouviu a buzina.

— Hey, moleque! — Forrest chamou, pondo a metade superior do corpo pela janela e batendo na lataria de forma vigorosa. — Venha conosco, a gente tem lugar pra você aqui.

O jovem humano olhou por sobre o ombro e girou nos calcanhares, caminhando até o velho.

— Não, vocês não têm. — Respondeu com um sorriso muito ínfimo, mas que sabia que o velho veria.

— Isso não é hora para essa viadagem. Isso aqui não é um filme do Tom Cruise! — Forrest bufou. — Quanto antes você subir, antes chegaremos.

— E aonde vocês vão, afinal? — Pôs as mãos nos bolsos do casaco, sentindo uma corrente de ar frio.

O ex-barman revirou os olhos. — Para um lugar melhor, espero. Sem tanto ódio, tantas brigas e toda essa lenga-lenga. Não sou mais tão jovem. — Pela segunda vez naquela noite, Hunter percebeu o quão velho Forrest realmente era. — Venha Hunter, por favor.

O jovem deu de ombros. — Desculpa velho, não vai dar. — Sorriu novamente, mas dessa vez, de forma calorosa. — Aí não é o meu lugar.

— E onde é o seu lugar?

Hunter deu as costas à caminhonete e retomou o seu caminho de caos e destruição, sentindo o incêndio aquecer seus ombros.

—Quando eu descobrir, eu te conto.

Deu vinte passos, antes de ouvir a voz do barman crescer, uma última vez.

— Moleque! — Forrest chamou, mais uma vez. — Não deixe que eles te peguem!

Sem parar de andar, sem olhar para trás, Hunter ergueu o braço o mais alto que pode e arregaçou a manga, revelando a pinball gun que reluzia com as chamas.

— Não vou.

Encolheu o braço e continuou andando sem hesitar.

Nem mesmo quando ouviu os pneus da caminhonete cantando e ouvir seu motor rugindo cada vez mais longe.

Nem mesmo quando ouviu os infinitos neons da fachada do bar explodirem em um coro assustador.

Nem mesmo quando, em um último estalo trágico, a fundação do bar cedeu junto com a estufa. Explodindo em uma cacofonia de vidro quebrando e madeira se partindo.

Nada disso o impediu de seguir seu caminho.

Seu ritmo lento e inexorável foi apenas quebrado quando uma chuva fria e torrencial desabou sobre sua cabeça, colando os cabelos ao escalpo.

Olhou para cima e ouviu a chuva chiar sobre as chamas que já estavam longe, sentindo a água levar para longe o sangue que havia secado sobre suas roupas.

Aquilo, ao contrário do que ele esperava, o fez se sentir mais sujo.

Ele, então, engoliu em seco e correu tendo o Empire State como guia.

E, sob aquela tormenta que o molhava até os ossos, Reyk Garside sentiu em sua alma uma profunda saudade de casa.


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Notas finais do capítulo

E então? O que acharam, quero saber de verdade! Comenta aí, vai!