Todos os dias escrita por Juliiet


Capítulo 1
Capítulo único


Notas iniciais do capítulo

Oie (:
Quem me conhece, sabe que eu to deprimida, então é isso aí :(
Espero que gostem :3



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Abri os olhos naquela manhã. Minha primeira visão foi um travesseiro vazio ao meu lado. Era a mesma visão há alguns anos. De certa forma, eu já havia me acostumado a ela. Era algo reconfortante, embora sempre houvesse aquela picadinha de dor atrás dos meus olhos por um momento.

Levantei e fui até o banheiro sem antes arrumar a cama. Era segunda feira. Ao contrário das outras pessoas que eu conhecia, não tinha nada contra aquele dia específico da semana. Eu trabalhava em casa, sozinha, fazia meus próprios horários. Para mim, era um dia como qualquer outro. Pelo menos até ele.

Na primeira vez em que me apaixonei por você, você estava subindo as escadas da universidade. Era uma segunda feira de outono e o vento frio brincava com seus cabelos. Lembro que havia uma folha neles e ela caiu quando você passou correndo. Eu a guardei dentro da página quarenta e três de Romeu e Julieta. Era o livro que estávamos lendo juntos em Literatura Inglesa.

Lavei o rosto e escovei os dentes. Penteei meus cabelos e os prendi para trás num rabo de cavalo frouxo. Era outono e, pela janela do meu quarto, eu via a calçada cheia de folhas. Fui até a cozinha e comecei a fazer meu café matinal. Enquanto a água esquentava, peguei meu notebook e o abri no balcão. Tinha começado meu novo livro há algumas semanas e meu editor já pedira para ver alguma coisa. Qualquer coisa.

E por enquanto só havia uma frase na página.

A água ferveu e eu coloquei meu café na caneca. A preferida dele. Era simples, branca. Estava lascada na alça, de quando fizemos um piquenique no parque e eu a derrubei quando ele me levantou e me girou no ar.

A segunda vez em que me apaixonei por você foi quando estávamos almoçando juntos na lanchonete do campus e você sorriu. Havia um pedacinho de alface no seu dente da frente. E quando eu percebi que nem aquilo fazia diminuir minha vontade de beijá-la, eu sabia que estava apaixonado.

Peguei algumas torradas e fui para o sofá. Era lá que normalmente escrevia. Era aconchegante e claro. Ficava perto da grande janela da sala e me permitia ver as pessoas andando na rua. Embora eu não saísse muito de casa, sentia-me estranhamento confortável por ver outras pessoas, mesmo através de um vidro. Minhas habilidades sociais nunca haviam sido muito impressionantes, eu sempre havia sido a garota que observava tudo à distância.

Era uma das coisas que mais o irritava. Ele sempre estava reclamando por eu não ir a festas ou ter mais amigos. Eu nunca expliquei, mas eu sabia que tinha tudo o que precisava. Eu tinha meus livros e mil mundos em minha mente. Tinha meus poucos amigos de infância. Tinha minhas aulas. Tinha ele.

A terceira vez em que me apaixonei por você foi quando você ficou bêbada com uma única dose de tequila. Eu precisei levá-la para casa em minhas costas e lembro que a cada passo, eu podia sentir o calor da sua respiração em meu ouvido e, mesmo que você fosse pesada e que carregá-la por seis quarteirões tenha sido difícil, eu queria que o caminho durasse para sempre.

Olhei para aquela única frase na tela do notebook. Eu normalmente não tinha dificuldade em iniciar uma história. Meu cérebro, desde que eu era muito pequena, parecia programado apenas para isso. Para inventar, criar, afundar em mundos novos, em situações malucas, em personagens apaixonantes, em amores impossíveis. Mas agora, era como se eu estivesse vazia. Como o travesseiro ao meu lado na cama. Não havia nada lá. Porque eu já havia vivido tudo. E não importava o quanto eu tentasse, eram apenas as suas palavras que vinham à minha mente, e não as minhas. Era como se eu esquecesse de mim. E só lembrasse dele.

A quarta vez em que me apaixonei por você foi quando você gritou que me odiava. Que era impossível se apaixonar tantas vezes pela mesma pessoa. Que eu era insensível, idiota e sem coração. Meu coração parecia bater ainda mais alto e forte do que o normal naquele momento, para provar que você estava mentindo. E, mesmo que suas palavras duras me machucassem, tudo o que eu queria fazer era beijar as lágrimas nos cantos dos seus olhos e te abraçar. E nunca te deixar ir.

O estranho é que, mesmo que eu o tivesse conhecido a minha vida toda, eu passei bem pouco tempo apaixonada por ele. Alguns anos só. Ao contrário dele, eu não podia dizer exatamente quando meus sentimentos mudaram. Eles não estavam lá num dia e, de repente, simplesmente estavam. Inteiros, intensos. Foi de uma vez só e não mudou. E não havia nada que eu ou ele pudéssemos fazer sobre isso.

Aprendi que havia muitas maneiras diferentes de amar. E que uma única pessoa pode amar infinitas vezes.

Às vezes, a mesma pessoa.

A quinta vez em que me apaixonei por você foi quando você foi embora. Eu sabia que a tinha machucado. Eu sabia que estava errado. Mas você também estava. Estava errada por quebrar meu coração. Mas você diria que o coração é um músculo e não pode ser quebrado. Mas você conseguiu mesmo assim. E saber que, no instante que você voltasse, seria como se o ar voltasse a entrar em meus pulmões e como se os mil pedacinhos que haviam restado do meu coração se unissem de novo – perfeitamente, sem nenhuma cicatriz –, me fez amar você outra vez.

O dia foi lentamente passando. Tomei mais duas xícaras de café e fiz uma pequena salada para comer no almoço. E, mesmo assim, nenhuma palavra foi adicionada na minha história. Era uma história de vingança, ódio, guerra. Eu era boa com histórias assim. Ele gostava quando ficávamos acordados até tarde e eu lia para ele. Nunca era interrompida e, quando seus olhos se fechavam e eu parava de ler por achar que ele estava dormindo, suas pálpebras se abriam e ele me pedia para continuar.

Fizemos isso mais vezes do que eu podia contar.

A sexta vez em que me apaixonei por você é fácil de dizer. Foi quando você voltou. E quando gritou que não podia me deixar, mesmo que quisesse. Que não era justo, afinal, eu a deixaria. Mas que você não conseguia simplesmente me abandonar. Que mesmo que a matasse, você ficaria comigo até o final. Eu a amei tanto naquele momento, que senti que morreria.

O sol começou a baixar no horizonte e eu nem mais olhava meu notebook. Eu olhava para a janela. Eu via a luz esfriando, com seu espetáculo diário que, embora fosse diferente a cada dia, era essencialmente o mesmo. Foi exatamente como ele me disse que se sentia por mim. Que nunca era igual, mas de alguma forma, era.

E, quando, ao final da faculdade, ele me disse que, em breve, não poderia mais estar comigo, eu o odiei. O odiei por me deixar sem ter para quem ler minhas histórias e por me deixar sem alguém para me rodar no ar e lascar canecas em piqueniques. Por me fazer amá-lo tanto que meu mundo não era o mesmo quando ele não estava. Por me fazer acreditar que ele sempre estaria ali. Por continuar sorrindo, embora eu estivesse chorando. Por não ter medo. Por confiar que eu ficaria. Por confiar que eu o amaria mesmo quando ele já tivesse ido.

Por me fazer acordar ao lado de um travesseiro vazio todos os dias.

Acho que eu deveria dizer agora “a última vez em que me apaixonei por você...”, mas a verdade é que não posso. Não posso, porque me apaixono por você todos os dias. A cada minuto, a cada segundo. Te amo por sorrir, por nunca me interromper quando eu falo, por ficar quieta e, quando eu reclamo por me sentir num monólogo e não numa conversa, você diz “é que eu gosto de ouvir o som da sua voz”. Te amo por sempre me abraçar e por ler suas histórias para mim. Te amo por confiar em cada coisa que digo. Te amo por respirar. Te amo por você me deixar, por me amar de volta e, mesmo que eu saiba que está te machucando, por ficar ao meu lado.

Não tenho medo de nada. Nem da morte.

Apenas por que te amo.

Todos os dias.

A noite foi chegando. Ele sempre amava esse momento. Aliás, ele amava o amanhecer também. A morte do dia. A morte da noite. O começo de algo novo. Ele dizia que era como se a vida, a cada dia, nos desse a oportunidade de mudar. Podíamos ser mais felizes. Mais corajosos. Mais malucos. Mais esforçados.

Mas principalmente ele dizia que, a cada dia, ele tinha a oportunidade de se apaixonar por mim de novo. E era diferente a cada vez.

Já fazia algum tempo, mas meus dias eram sempre assim. Iguais. Eu acordava, trabalhava e pensava nele. Mas nunca chorava. E, no entanto, lágrimas agora corriam por meus olhos. Talvez eu finalmente tivesse entendido. Talvez esse tempo todo sem ele tivesse finalmente me feito enxergar melhor as coisas.

Suas palavras passaram a finalmente fazer sentido. Ele não tinha medo não porque eu o amava, mas porque ele me amava.

A noite chegou e, com ela, a oportunidade de fazer algo novo.

Apaguei a única frase que havia escrito. Uma frase vazia. Uma frase que iniciaria uma história de violência, ódio, morte.

Em seu lugar, escrevi outra frase.

Sabe todas aquelas coisas que eu disse sobre estar apaixonada? Eu estava errada.

Talvez fosse uma boa hora para escrever uma história de amor.


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Notas finais do capítulo

Não sou muito boa com oneshots, porque não sou boa em resumir, gosto de coisas longas, demoradas e bem desenvolvidas, mas se você chegou até aqui, espero que tenha gostado.
Muito obrigada por ler (: