Hoje já faz trinta anos. Tu se lembras Alice? Se lembras de mim? Teu companheiro de aventuras, teu Harry?

Eu me lembro, e nesse momento quando vou visitar-te sou invadido por essas doces memórias.

Nós brincávamos, alheios a qualquer problema, como se aquela guerra estivesse acontecendo em outro lugar.

Tu podias ser menina, mas teu coração era de um garoto, um moleque levado. Diferente das outras meninas das outras garotas tu não eras uma princesa, tu eras uma pirata, uma ladra, uma feiticeira e nas raras vezes em que concordavas em ser uma princesa, tu que salvavas os “donzelos” em perigo.

Brincávamos desde que me entendo por gente, na nossa casa da arvore, nossa fortaleza secreta, nem tão secreta assim.

Hoje, trinta anos depois, quando visito tua sepultura, que vejo tua lapide ainda sinto meu coração latejar de dor, mas essa dor agora é menor do que nos primeiros anos, mas a saudade ainda me consome.

Eu ainda me lembro de como você morreu, aquele infeliz dia em que meu mundo perdeu as cores. E agora, mesmo contra a minha vontade, sou tomado por essas dolorosas lembranças.

Nos corríamos, mas não corríamos porque estávamos brincando, corríamos para nos esconder, nos esconder das bombas que caiam do céu. Nós nos esconderíamos no nosso refúgio, mas não a casa da arvore, nos esconderíamos em um porão, para não sermos atingidos pelas bombas.

Tu se contorcias, tentando se livrar de Nana, nossa babá na época, tu querias pegar sua caixinha de música teu maior tesouro. Tu gritavas, imploravas para Nana solta-la, ela a soltou, pediu-lhe que fosse rápida e pegasse a caixinha e imediatamente retornasse. Mas tu não voltaste a tempo, a bomba caiu antes, e tu se foras, porem antes tu salvas-te tau caixinha, teu tesouro.

Hoje eu guardo tua caixinha como a minha maior relíquia e todas as noites eu escuto a melodia da música que eu aprendi a amar, o meu acalanto de Orfeu.

Meu consolo é que tu sempre serás minha menininha de melenas douradas e olhos cor de safira, minha preciosa Alice, minha querida irmãzinha casula