Um mundo além do mundo escrita por Lobo Alado


Capítulo 46
Aliados repentinos


Notas iniciais do capítulo

Olá, meus amigos! Imprevistos e imprevistos, então, este capítulo aqui está.
Creio que um pouco de surpresa na hora de programar a ordem dos capítulos pode acabar nos mostrando rumos novos e interessantes, então, posso dizer que aprecio o meu pequeno imprevisto. Não irei me aprofundar nesta questão para não bagunçar o entendimento de vocês.
Um capítulo que gostei! Boa leitura!



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Seus olhos eram chamas obscuras que engoliam com raiva tudo o que olhava. Ismira tentava esquecer da sua partida da Montanha Oca, mas sua raiva não permitia. Raiva de Elva, de Hope, raiva dela mesma, uma raiva irracional que englobava todo o seu mundo dolorosamente.

Senhor Gorjar era um monstro corpulento danificando o solo por onde passava, numa corrida veloz ao mesmo tempo que cautelosa. O urso não parecia cansar-se, nem intimidar-se, sabendo que Ismira queria alcançar o Império no máximo em uma semana, e não interferia muito no que ela decidia... Talvez tivesse consciência de seu estado de espírito.

Poucas horas antes, ela deixava a Montanha para trás, sem ouvir o que Hope tinha a dizer, e muito menos um Rei Anão atencioso e preocupado.

— Não conseguirão interferir em meu caminho. – Ela disse de queixo erguido, tendo suas palavras enfatizadas por um grunhido grave de Gorjar. – Agora, conceda-me passagem, Majestade. – Disse ela, formalmente, para o Rei perplexo.

Foi o melhor para todos nós... Ela convencia a si mesma. Hope pode seguir para Ellesméra sem ter de se preocupar em me deixar para trás, e nem Orik precisa ficar de olhos em mim.

Ao invés de alimentar esta necessidade de sentir-se bem deixando sua amiga para trás, deveria concentrar-se no que fará quando chegar ao Império. Gorjar resmungou. Não ouvi você falar sobre em algum momento.

Ismira engoliu em seco.

Eu... preciso que me ajude, nunca fiz isso antes... Planejar. Ismira fungou, aborrecida. Poderíamos invadir cada uma das cidades até chegar em Carvahall... Disse ela, sabendo que sova estúpida. Uma garota de com menos de duas décadas de vida libertando cidades de rebeldes sozinha, não poderia ser mais ridículo.

Gorjar parecia sorrir internamente.

Bem, jovem, nossa condição e números não nos ajudarão. Mas seu nome... O urso fez uma pausa. Muitos estariam dispostos a seguir a filha de Martelo Forte, ainda mais se ela for alguém que por si só valha ser seguida.

Ismira balançou a cabeça.

Não sou alguém que valha seguir.

Eu não posso concordar... Senhor Gorjar disse gentilmente. Eu não a seguiria se não acreditasse que valesse.

A garota deu um leve sorriso e não disse mais nada.

O meio dia mostrou-se despertando Ismira de um sonho. Ver o sol novamente era aliviante, até reconfortante... A fazia lembrar de que todo dia era uma renovação, uma nova esperança. E não só o sol, mas o verde das folhas, o barulho dos animais, a vida a cercando por inteiro. Por mais que fosse mais arriscado que estar segura e escondida no interior de uma montanha. Ismira concluiu que não gostava de tanta segurança. Gostava de arriscar-se, gostava do coração acelerado, e da vida intensa e variada. Até Senhor Gorjar era mais bonito a correr entre as árvores, com uma selvageria feliz e rica... viva.

Isto a fez lembrar-se de Elva. Como o Urso sentia-se distante da feiticeira? Como a feiticeira sentia-se distante do Urso? Uma pergunta melhor seria: Como a feiticeira sentia-se? Ela distanciou-se dessa questão... era muito complicado. Antes Ismira pouco sabia de Elva, mas em Tronjhein muito lhe foi dito. O Rei Anão dissera que o fruto dos poderes de Elva era uma maldição acidental lançada pelo líder dos Cavaleiros, quando ele ainda era inexperiente. Contou-lhe o quão terrível isto foi para a recém-nascida, e em detalhes. Sua fome absurda, suas ânsias de vômito, suas previsões terríveis de infortúnios e mais infortúnios, o seu humor macabro e doentio para uma criança, o crescimento acelerado e as manipulações... Ismira sentira-se horrorizada ao ouvir.

Apenas uma pergunta ninguém poderia lhe responder. Como Elva tornou-se o que era? Como conseguiu controlar tamanho poder, e tornar-se a feiticeira que era? Bem, isto não era importante no momento. Ela tinha de saber o que fazer quando chegasse ao império. Isto era importante.

Quando a tarde começava a ir embora, pararam. Era uma área de terreno desregular e terra grossa, as árvores de tronco acinzentado os davam um espaço digno e tranquilo, sem muita interferência de pequenos animais. Ismira desceu das costas de Gorjar com um grande salto. Quando viajava com Elva, treinava cada salto que dava das costas do animal. Gostava cada vez mais dos resultados.

Ismira recostou-se numa árvore e fechou os olhos por um instante, apenas escutando o som do pouco vento. Sua cabeça foi parar em Hope. A Cavaleira viajaria pela manhã, estava preparando-se para partir quando Ismira lhe surgiu de cima de Gorjar. Conseguiria ela o apoio dos elfos? Claro que conseguiria, era uma Cavaleira. Por um instante Ismira sorriu ao imaginar a amiga sendo recebida pelos seres mágicos. Era tudo o que ela queria... conhecer o mundo, e isto estava acontecendo.

O pensamento foi capaz de acalmar sua ira. Talvez ela pudesse voltar os pensamentos para o Império agora, o que era um grande feito. Vencer a frustração de pensar em como prosseguir por terras onde sua cabeça era valiosa já era uma vitória. Seguiria para Ilírea? Era o mais sensato a se fazer... Seus pais estavam lá, e poderia planejar a retomada de Carvahall mais facilmente, com todas as informações que a Rainha possuía, mas...

Ismira bateu na própria testa de leve. Não poderia ir para Ilirea! Seus pais a impediriam de participar na retomada de Carvahall ou qualquer outra cidade, era claro. Provavelmente seria tratada da mesma forma que foi na Montanha Oca. Então o que lhe restava? A situação das outras cidades do Império era um mistério, não podia arriscar-se tanto. Estava praticamente sem ação, a não ser que quisesse tentar retomar sozinha Carvahall.

Ela levantou-se e começou a andar em círculos.  Não existe saída, Senhor Gorjar... Ela foi até o Urso e deitou-se de bruços em sua pata, abraçando-a. Só posso ir para Ilírea e observar tudo isto acabar.

Gorjar bufou, despenteando seus cabelos.

Diga-me, Ismira. Ele disse numa lentidão que chamou atenção da jovem. Por que você quer retomar Cavahall?

Ela ergueu a cabeça, perplexa.

­– Como pode me fazer esta pergunta? – Ela surpreendeu-se tanto que esqueceu-se de falar apenas mentalmente, como o combinado.

Não me entenda mal. Obviamente você quer Carvahall de volta, mas... de onde vem o desejo de participar desta retomada? O que você quer provar? O Urso ergueu-se, fazendo-a sair de cima de sua pata. Ele circundou-a e aproximou um único olho bem aberto e violeta do rosto dela. Me responda, se não houvesse mais ninguém para tomar Carvahall, o que você faria? Desistiria?

Não. Respondeu ela com segurança.

Senhor Grojar ainda a observava, curioso, talvez.

Como eu viveria sabendo que meu lar está tomado e ainda posso fazer algo? Ela explicou-se.

O Urso riu baixinho nas entrelinhas da mente de Ismira.

E você pode fazer algo?

Ismira não gostou do tom de voz dele.

Bem, posso tentar, não? Ela disse de cenhos franzidos de chateação.

Isto é verdade... Disse o Urso. Não se irrite, criança...  Às vezes precisamos de um pouco de deboche para nos darmos nosso devido valor... Ele riu novamente. É decadente, mas é verdade.

 O que você quer dizer?! Ela suspirou. Isto não quer dizer que eu esteja disposta a tomar Carvahall sozinha.

Carvahall está muito distante. Temos outras opções.

Ismira não acreditava.

Eu não sou capaz de fazer isso! Não sozinha...

Então é bom que treinemos para que você consiga. Estou um pouco disposto. Disse ele formalmente, porém divertido.

Você é inacreditável. Ela respondeu, não contendo seu riso.

Reveja o significado desta palavra e verá que talvez seja você inacreditável. O Urso deu um rugido. Bem, vamos treinar, temos cidades para tomar.

Ismira estava prestes a sentar-se quando o animal avançou com garras afiadas para ela, fazendo-a saltar para trás. Ela caiu no chão e cobriu o peito com a mão, respirando freneticamente.

Sem treinamentos mentais hoje... pegue sua arma. Ele afastou-se para trás com garras afundadas na terra.

Está propondo que eu duele com um Urso gigante? Ela pôs a mão na testa. Por deus... não sei nem se posso chamar isso de um duelo.

Senhor Gorjar grunhiu e mostrou os dentes.

Se puder desafiar garras e dentes, o que será uma simples espada para você?

Ele tinha razão... E assim Ismira viu-se tirando a arma de lâminas gêmeas das bainhas, de frente para aquela fera. Ela sorriu, assustada, girando a arma nos dedos enquanto esperava pelo ataque.

O urso veio em sua direção com garras gigantes em membros bem apertos e uma boca mais ainda. Ela deslizou pela terra, passando por debaixo dele, sem pensar. Rolou rapidamente e tentou manter-se de pé, esperando pela próxima investida.

E quando ela veio, Ismira saltou, tentando mover Elädie o mais eficazmente que conseguia. A arma raspou em uma das garras negras enormes formando um som cristalino, e sem esperar ela saltou novamente, tentando rasgar a parte de dentro dos braços do urso.

E assim ela viu-se avida e confiante, enfrentando um urso gigante à pouca luz do crepúsculo. Era diferente de tudo o que já fizera, uma experiência única. O duelo seguiu por vários minutos, proveitosos e dinâmicos, revelando a Ismira movimentos mais abertos e investidas mais planejadas e criativas do que em um duelo simples com um espadachim. Ela estava extasiada com a eficácia do confronto e admirada ao perceber o quanto evoluíra desde que saíra de Carvahall.

*

Ismira correu desesperadamente até a árvore, sentindo a respiração junta do rugido de Gorjar. Ela desviou-se rapidamente e caiu no chão, ouvindo o Urso chocar-se com fúria no tronco.

Chega... Disse ela enquanto arfava. Já é o suficiente, por favor. Ela deitou-se de bruços na terra querendo apenas apagar.     

 Aproveite enquanto você pode escolher quando descansar, Lady. Disse ele divertido. Em nosso destino, não somos nós quem escolhe o duelo.

Ismira guardou as palavras enquanto recostava-se na arvore desajeitadamente, sem enxergar nada. O escuro envolvia-a já enquanto duelava, mas ela só percebeu depois de um tempo... estava tão concentrada em defender-se que a ausência de luz se tornou pouco limitante.

Depois de juntar galhos e acender uma fogueira com o uso de magia, Ismira foi até senhor Gorjar com pernas dormentes. Ela escondeu-se debaixo da enorme cabeça do animal até encostar-se no seu peito, e instantaneamente adormeceu.

Os dias que seguiram pelos vales não foram muito diferentes, a não ser pelo seu cansaço no fim do dia, e pela ferocidade do urso que aumentava a cada duelo. Ismira aproveitava os momentos que o sol estava no topo para praticar sua mira com o arco que Sírin lhe dera. Atirar nunca foi uma grande dificuldade para ela, mas agora sentia o que a falta de prática podia fazer... E reaprender era sempre gratificante.

E nesse ritmo, os dias morriam sem que percebesse, com seus finais sempre marcados pontualmente pela fogueira que ascendia para dormir no calor do Urso gigante, e seus começos bruscos quando o Urso se erguia com um grande rugido.

Naquela tarde encontravam-se numa área onde os vales eram mais abertos, recebendo mais luz do sol. Ismira pisava na grama com cautela, segurando o arco e a flecha com braços imóveis. Quando soube que não tinha chances de pegá-lo sem ser percebida, abandonou tudo e soltou a flecha, desistindo.

Para sua surpresa, acertou o pequeno porco na cocha, o lesionando completamente. Ela correu até o animal com um sorriso de divertimento. Sentia-se o próprio Rei Orik caçando Nagras pelos vales.

O porco não era maior que um bebê, mas estava orgulhosa. Não queria mais depender de Senhor Gorjar para alimentar-se, e precisava mesmo praticar seu tiro com algo vivo. Nos dias anteriores ela tentara acertar alvos enquanto montava Senhor Gorjar a correr... Não obtivera muito sucesso, mas ajudava.

Ismira esfolava o porco com uma pequena faca enquanto ouvia de Gorjar como poderia caçar utilizando-se de magia. A cada dia que passava na companhia dele, ela impressionava-se com sua sabedoria. Ele lhe instruía sobre as profundezas da magia de um jeito que ela jamais imaginara em sua vida. Ele despertava uma luz de nova cor na mente da garota... Uma luz forte, como se sempre estivesse lá, mas ela era totalmente desconhecida até o momento. Este era o mundo da magia.

Ao acender a fogueira no crepúsculo, Ismira utilizou de encantamentos para fazer do fogo uma substância densa e violeta, como Elva fazia. E assim ela fez seu próprio espetáculo, observando os chicotes violetas banhando as árvores em contraste com a fraca luz do sol, enquanto recostava-se nas costelas de Senhor Gorjar.

Acha que Hope já alcançou a Floresta dos Elfos? Ismira perguntou enquanto segurava Elädie desembainhada.

Há alguns dias, provavelmente. Que motivos o dragão teria para esperar?

Tem razão... E nós? Nem decidimos para onde iremos...

Decidimos. Afirmou o Senhor, bufando.

Ismira apertou o cabo de sua arma, surpresa.

Como decidimos? Não sabemos por onde começar!

Então por que estamos treinando todos os dias, Lady?

Bem... eu preciso, não? Ela pressionou os dentes.

Não seja tola, criança, nós já decidimos muito. Não podemos tomar uma cidade sem aliados, então estamos indo atrás de aliados. Não podemos tomar uma cidade que esteja em grande evidencia, então só precisamos escolher.

Eu não sei se sou capaz...

Quando for capaz, você o fará. Por tanto, esforce-se. Nossa estrada encurta cada vez mais.

Ismira não disse mais nada, não queria problematizar a situação, apenas seguir o fluxo. Fechou os olhos e deixou a respiração a guiar nos pensamentos. A luz construía danças intimas através de suas pálpebras, e naquele irônico momento ela apenas agradecia por estar distante de tudo. Apreciou o sentimento peculiar por alguns instantes. O cabo da lâmina dupla esquentava em sua mão suada, ela esfregava o polegar por ela enquanto pensava.

Depois de algum tempo o vento mostrou-se com menos timidez para o vale, levando levemente os fios acobreados dela para o rosto. Ismira permanecia com os olhos fechados e talvez estivesse dormitando... Ela não chegou a saber quando a pressão em suas pernas a chamou atenção bruscamente.

Ismira abriu os olhos e deparou-se, assustada, com aquelas patas marrons em seu colo. Ela ergueu os olhos para o rosto do animal. Olhos esguios e grandes a fitavam com certa curiosidade, mas carregavam identidade e firmeza que a assustaram, era um gato enorme. Ela ergueu a mão que segurava Elädie involuntariamente e emitiu um pequeno grito.

Tudo aconteceu muito rápido. Sua arma ganhou certo brilho, o gato gigante pulou para trás com um ruído áspero e duas grandes pressões começaram a amaçar sua cabeça.

Ela colou as mãos nos ouvidos, e desviou o olhar para sua arma que ainda brilhava... e então compreendeu de onde uma das pressões em sua cabeça estavam vindo. Era como se sua arma tocasse sua mente! Lampejos de batalhas e de pessoas sozinhas em paz vieram à sua cabeça, e ela soube que eram mensagens que Elädie lhe transmitia... e não acreditava. Tudo ainda era muito confuso para compreender perfeitamente, e havia a outra pressão em sua cabeça, diferente demais para ser a arma, ou para ser senhor Gorjar.

O grande gato aproximou-se com pelos eriçados, mas não subiu em seu colo novamente. Seus olhos amarelos arregalaram-se como que com atenção, não com medo.

Desculpe-me assustá-la, Lady Ismira. O gato era a consciência em sua mente... Uma estranha consciência. É ótimo conhecê-la. E seria bom ouvir o que tem a dizer para nós...

Ela franziu o cenho de olhos arregalados, inteiramente perplexa. Só agora ela percebia que aquilo tratava-se de um menino-gato.

Do que ele está falando, Senhor Gorjar? Ela perguntou assustada. O que eu teria para falar para “eles”?

Eles, Lady Ismira... Respondeu. São os aliados perfeitos para nós. Se quisermos conquistar alguma coisa com eficácia, precisaremos da ajuda dos meninos-gatos.

Você os contatou? Ismira sentia-se traída. Você os contatou e não me disse nada... Nem sequer perguntou se eu estava de acordo!

Senhor Gorjar mostrou-se decepcionado em sua mente.

Formalidades... Ele disse em tom de deboche. Mudou-se de lugar tediosamente, observado pelo menino-gato. Decidimos que precisávamos de aliados, decidimos que precisamos escolher uma cidade com pouca evidência, e acima de tudo, creio que precisamos encontrar a melhor maneira de invadi-la. Como não posso saber se está de acordo ou não? Não deixe que sua jovialidade impulsiva ofusque toda essa determinação e inteligência que carrega. Deixe-me provar o que prevejo, jovem... Deixe-me provar que podemos criar uma grande confiança um pelo outro, mas apenas se você cooperar.

Ismira sentiu-se tola e não sabia como responder. Então apenas insistiu na pergunta.

E o que eu direi para ele?

Diga tudo o que quer dizer. Respondeu Gorjar de imediato.

Ismira segurou Elädie mais forte e buscou refúgio em suas lembranças. Expandiu a mente até à arma e absorveu o que ela podia lhe dizer, inimaginavelmente alguns minutos atrás. Ela abriu os olhos e deparou-se com um menino-gato calmo e receptivo.

É ótimo conhece-lo também... Qual o seu nome? Ela perguntava-se se não tinha soado juvenil demais.

Ele caminhou devagar ao redor dela.

Chamo-me Petrichor. E imagino que não por uma causa qualquer seu companheiro de viagem me contatou. Ele aproximou-se ainda mais de Ismira e deitou olhos estreitos na arma que ela possuía. O artefato... o artefato forjado pela própria visionária durante sua estadia com os nômades do Leste, em suas viagens. Eu sempre quis vê-lo com os próprios olhos.

Eladie? Ela perguntou segurando ainda mais forte seu cabo. O que atrai você a ela? Ela ergueu-a sobre as mãos.

Petrichor tornou-se um vulto ainda mais misterioso, se é que era possível. Seu tom de marrom ganhava rios violeta-prateados enquanto ele navegava pela terra tardando em considerar a pergunta de Ismira.

O que me atrai à arma companheira? Me atrai o mesmo que atrai qualquer um que tem conhecimento dela.

E o que seria isto? Ela perguntou já mais curiosa que diplomática.

Procure em seu interior, Lady... Foi tudo o que ele disse. Mas minha afeição pela arma fica para depois. Temos problemas que pedem solução urgente por sua parte, e isso também me atrai até aqui.

Ismira balançou a cabeça com avidez, concordando com o gato, mas a questão da arma feita por Elva ainda não saia de sua cabeça.

Petrichor, meu companheiro acredita que podemos reconquistar cidades que foram tomadas pelos rebeldes no império. Mas para fazermos isso precisamos de aliados, e também precisamos decidir melhor como começar isso. Ismira abaixou a cabeça, desmotivada por um instante em seu discurso. Confesso que não sou capaz nem de imaginar por onde começar a fazer isso.

Tudo o que precisa no momento é de sua determinação, Lady. Senhor Gorjar acrescentou rapidamente, como que reforçando a capacidade dela ao menino-gato.   

A consciência pareceu amornar-se em sua cabeça, e o gato encostou seus pelos macios em seu joelho, fazendo-a sentir um ronronado.

Não se preocupe, Jovem Ismira, iremos ajuda-la o quanto pudermos. Permita-nos acompanha-la em sua viagem e resolveremos tudo pela manhã.

Ismira estranhou a tamanha gentileza e o carisma repentino da criatura, mas não expressou.

Seja bem-vindo à viagem, Petrichor. Você e quem o acompanha. Disse ela com um sorriso, acariciando levemente as costas do menino-gato com as unhas.

Ele pareceu sorrir.

Quem me acompanha... Repetiu.

Então farfalhos e outros barulhos os circundaram harmoniosa e cautelosamente. Silhuetas de rabos agitados a cercaram, ainda mais perceptivas devido aos olhos contra a fogueira violeta. E quando ela via-se surpreendida por inúmeros meninos-gato, entre as sombras saiu uma longa sombra com passos firmes e nada de olhos oblíquos. Era definitivamente um homem.

Quando mostrou-se à luz, com uma pele acobreada e cabelos curtos, sorriu. O rapaz vestia couro fervido quase que por inteiro, e carregava uma bainha vazia. Isso foi tudo o que Ismira percebeu nele, nada mais, nem simpatia nem empatia.

­– Lady Ismira... – O sorriso alargou-se, como que estivessem num baile tranquilo em meio a comemorações esplendorosas. – Fico feliz de finalmente encontra-a.

Ela franziu os cenhos por um breve instante.

Todos estão felizes em me encontrar? Ela questionou-se a Senhor Gorjar.

O quão ainda duvida de sua popularidade? Ele disse divertido.

— Você acompanha os meninos-gato? – Ela ergueu as sobrancelhas.

— Digamos que fui acolhido por eles. – Ele ergueu as mãos. – E asseguro-lhe que posso ter alguma serventia para seus propósitos. Posso auxilia-la melhor que qualquer um, pois entendo o que está acontecendo na Alagaësia.

— E o que você sabe sobre meus propósitos? ­– Ela questionou um pouco perturbada.

O rapaz retesou-se, como que atingido por um instante, mas logo recompôs-se, novamente com o sorriso no rosto.

— Bem, creio que estou indo muito rápido, Lady. Mas imagino que pretenda recuperar o que perdeu.

Ela assentiu.

Sim, isto é certo... Ela pensou consigo mesma.

— E creio também, que sei por onde deve começar, e não é por alguma cidade do Império Varden, como imagina. – Ele aproximou-se um pouco da fogueira, franzindo o cenho para as chamas violetas. – O lugar com menos evidência e com mais a oferecer para sua retomada encontra-se bem mais próximo de nós, no momento. – Dessa vez seu sorriso carregava segredos com promessa de serem afoitos. – Eu falo de Surda, minha senhora.

Ismira inspirou involuntariamente, completamente perplexa?

— Quem é você? – Ela perguntou quase que imediatamente.

Ele juntou as mãos perto do fogo e fitou-a, desta vez sem um sorriso.

— Bem... chamo-me Harán... Se é que responde sua pergunta.

      

      


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Notas finais do capítulo

Bem, sinto extrema satisfação ao entregar-lhes este, e sinto-me também um pouco mais completo.
Até o próximo! E espero que não tarde tanto quanto este. E lembrem-se... ele virá!
18/09/16



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