Essa cidade é muito quente...

Eu olhava pela janela e me deparava com o mar enorme. Algumas pessoas já tomavam sol, algumas crianças faziam castelos de areia, os vendedores gritavam em prol de seus produtos. Essa era a manhã de Ponta Negra... E a minha manhã? Isso não é o pior caso. Estou no quarto de um hotel com o meu primo de ressaca deitado na minha cama.

–Taylor, fecha essa janela... Minha cabeça vai explodir - Adam reclama pela terceira vez no dia.

–Você tá parecendo uma velha. Eu devia ter te deixado em casa.

Fecho a janela e vou até a minha mala. Pego um dos meus comprimidos e lhe entrego com um copo de água.

–Eu já tomei remédio - diz.

–Esse é mais forte. Em 10 minutos você vai está novinho - sento ao seu lado na cama - Adam... Você lembra o que aconteceu ontem?

–Não de tudo. Lembro-me de ter ficado com Chris, enchido a cara com ela e tenho uma breve lembrança de uma confusão. Mas não sei se ela foi real ou não.

–Foi real. Uma ruiva, Beatrice eu acho, apareceu lá. Ela me parece um poço de problema.

–E é. A Bea é o diabo em forma de gente. Por isso eu gosto da Chris, ela é uma das poucas garotas que não tem medo dela.

–Qual o problema dela com a Paula?

–Isso eu não seu dizer, prima. Aquelas duas vivem brigando. Coitada da Paula, ela é um amor de menina, mas a Beatrice faz a vida dela um inferno. É bem possível que a Chris tenha dado uma surra nela ontem.

–Quando saímos de lá o clima tava pesado. Depois agradeça ao Jó por ter me ajudado a carregar você, eu não iria conseguir sozinha.

–Tudo bem. Você sabe se meus pais ligaram? Cadê meu celular? - ele levanta.

O garoto era tão sem vergonha que pouco se importava em estar só de cueca.

–Tá no banheiro.

Pego o meu no criado mudo e logo ele está ao meu lado com o dele.

–Qual a senha do WiFi daqui? - pergunta.

–7668263472.

–Que porra de senha é essa?

–Os algarismos de Ponta Negra no teclado do telefone.

–Ah sim...

–Conseguiu conectar?

–Consegui... E recebi um vídeo que vai revelar muita coisa que não presenciei.

Aproximo-me dele para olhar o tal vídeo.

Surpreendo-me em me ver na telinha. Foi na festa de ontem. Estávamos eu, Adam, Chris e a garota ruiva.

Lembro bem quando ela chegou e disse:

–Então Chris, você também beija as pessoas a força como sua melhor amiga? - ela vira para Adam - Foi assediado por ela? Cadê a loira magricela?

Quando ela disse aquilo eu quase dou um soco no meio daquele nariz empinado. Mas Paula aparece um segundo depois e nos manda ir embora.

O vídeo mostrava agora as duas garotas brigando no chão e Paula tentando separar. O pior é saber que ninguém ali faz nada pra ajudar, apenas documenta tudo em seus celulares.

A briga para e vejo aqueles olhos azuis com uma raiva que me era desconhecida. O tapaque Paula dá garota faz todos se calarem e as palavras a seguir também.

–Eu nunca beijaria você. E se eu tivesse beijado, eu estaria morta com o veneno que você deve soltar. Pare de inventar essas mentiras ou eu digo pra todo mundo o que você fez naquela noite.

Foi isso que ela disse. E o vídeo acaba segundos depois com as duas amigas indo embora.

–Caralho, a coisa foi feia dessa vez - Adam afirma.

–Foi? Você não disse que elas vivem brigando?

–Vivem brigando, mas a Paula nunca levantou a mão para a Beatrice. É sempre a Chris que dá uns tapas nela. Foi a segunda vez na semana, acho que essa ruiva gosta de apanhar.

–Segunda vez? A Chris bateu na Beatrice outra vez? Sua namorada é muito barraqueira.

–Ela ainda não é minha namorada. E ela não é barraqueira, apenas defende sua melhor amiga.

–Mas qual o motivo da primeira briga?

–A ruiva estava espalhando por ai que a Paula tentou agarra-la.

–Que desgraçada.

–E ela emburrou a Paula lá no clube, fazendo-a bater com a cabeça em uma pedra e cair na piscina. A Paula ficou no hospital por 3 dias.

Aquilo me pegou de surpresa.

–Nossa... E a Paula não denunciou ela?

–Pelo visto não.

–Por que não? Será mesmo que a Paula é afim dela?

Adam dá uma gargalhada alta.

–Obvio que não. Ela já até namorou o irmão da Bea, mulher não é a praia da Paulinha. Vai ver que ela não quis mais confusão. De qualquer forma não ia dá em nada, o pai dela é juiz e ia livrar a cara da filha rapidinho.

Adam levanta e começa a vestir suas roupas.

–Vai pra casa? - pergunto.

–Vou, imagino que você tem que fazer o relatório completo para Jessica - pega a chave do carro.

–Tenho mesmo. Vou ligar pra ela daqui a pouco.

–Então eu já vou indo - dá um beijo na minha testa.

–Sinto muito que aquilo tenha acontecido.

Ele me dá um sorriso relaxado.

–Não sinta. Já faz um ano, eu estou bem agora.

–Se você diz.

Aceno pra ele e fico sozinha. Mais uma vez.

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“Comando 021.

Domingo, dia 02.

O encontro de ontem foi um sucesso. Abordagem concluída. O alvo está na mira e pronto para ser abatido. A continuação do processo acontecerá amanhã em aposentos escolares.

Não há perigo iminente. O alvo tem um histórico hospitalar e necessita de cuidados médicos efetivamente.

Agente 101 desliga.”

Coloco o gravado de volta no lugar.

O céu está estrelado. Eu gosto disso.

Perdi a conta de quantas vezes eu me senti tão sozinha quanto sinto essa noite. Faz 5 anos que aquilo aconteceu e estava próximo de acabar, eu só precisava fazer as coisas direito e tudo ficaria bem. Mas meu coração dizia que algo ruim pode acontecer e isso me dá medo.

Aqueles olhos eram iguais aos da garota que conheci há 6 meses. Os cabelos e cor da pele não são. Os dela eram loiros, os da outra era ruivos. Não era mudança genética, mas sim química. Outras diferenças eram percebidas. O sorriso, os gestos, o porte, o modo de falar... Tudo isso era melhor na “versão recente”. Essas melhorias estão acabando comigo.