A Bella e o Monstro escrita por Leprechaun


Capítulo 1
Capítulo 1


Notas iniciais do capítulo

Espero que gostem *u*



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Forks, 1812

Nunca considerei o desespero uma boa companhia, mas agora parecia que ele insistia em cruzar meu caminho. Olhei desinteressadamente o horizonte, sentindo o medo corroer-me. O céu era uma massa plúmbea de nuvens acima da linha da água e o oceano atingia a praia com uma força que prenunciava a tempestade. Aspirei profundamente a penetrante maresia, cerrando os punhos. As bordas das delicadas conchas alaranjadas estavam cravadas nas palmas das minhas mãos, enquanto inutilmente eu lutava para superar a profunda tristeza.

Um fardo às vezes se torna difícil de carregar. Fui ingênua ao pensar que os cruéis agouros do destino tinham acabado anos atrás. Maneei a cabeça infinitas fezes. Não. Não podia culpar o destino. O único e verdadeiro responsável era meu pai, que havia nós colocado a mercê da incerteza e ao desespero.

Ainda assim, o destino estava presente, espreitando, rindo, jogando comigo. Não seria a minha presença ali, naquela manhã, um acaso maléfico do destino?

Não, não existem acasos.

Havia menos de meia hora que eu havia deixado à hospedaria do meu pai, precisava de alguns momentos a sós comigo mesma para entender, para aceitar as terríveis escolhas que ele tinha feito, e , claro, as nefastas consequências que enfrentaríamos. Caminhei pela praia, sem destino, procurando apenas acalmar as preocupações e medo.

Estremeci, observando dois homens agitados na arrebentação. Eles esperavam que as ondam os empurrassem para frente. Como oferendas, pensei, eles eram simples manchas escuras que tomavam forma conforme se aproximavam.

Na verdade, o desespero era uma péssima companhia, mas a morte era pior.

Cruzei os braços sobre o peito, observando um contorno escuro que chagava cada vez mais perto. Consegui, por fim, discernir a figura humana que flutuava: o rosto mergulhado na água, os braços estendidos e as longas mechas de cabelos emaranhados boiando como um halo de cobre. Era uma mulher. E estava morta.

Meu coração parecia querer sair pela boca, mas dei um passo à minha frente enquanto os homens buscavam tirar o fardo horrível do abraço gelado do oceano. Não foi a mórbida curiosidade, mas um misto de empatia e horror que me fez ficar congelada no lugar. Na maioria das vezes, vi o oceano como algo belíssimo. Na maioria dos dias. Mas não naquele dia.

Naquele em especial, havia nuvens inquietas, arrebentação era forte e o beijo gelado da névoa que soprava da superfície da água para tocar a terra. No fundo do meu coração havia o terrível conhecimento dos atos de meu pai e a sensação de mau presságio.

Aquele dia era semelhante demais a um dia do passado, um dia que eu havia enterrado em um canto empoeirado da minha mente. O mar. A tempestade. E ali, além de onde a rocha emergia, a sobra da mansão Pattinson, assomando, silenciosa e assustadora tendo ao fundo à água e o céu acinzentado.

Separada da curva da praia pelas ondas agitadas, a casa mais me parecia uma concha solitária e vazia, equilibrada sobre um rochedo íngreme que parecia levantar-se do oceano com o chifre de uma besta mítica; uma pinha espantosa de pedra e argamassa que não oferecia acolhimento ou calor. Pattinson era ligada ao continente por uma estreita passagem, que podia ser atravessada tanto na maré baixa como na alta, exceto no caso de uma tempestade.

Um calafrio percorreu minha espinha e eu olhei ao redor, sentindo uma estranha preocupação. Nunca fui dada as ideias fantásticas nem à imaginação, mas naquele momento eu parecia estar sujeita a ambas. Meu coração batia rápido demais e os nervos estavam à flor da pele enquanto escrutinava a praia à procura a fonte da minha inquietação. Eu podia jurar que alguém estava me observando.

Não era a primeira vez que me senti sendo observada. No dia anterior, foram incontáveis as vezes que virei-me de repente perscrutando os cantos escuros e os nichos sombreados, mas não encontrava nada que fosse a origem do meu medo. Suspirei. Talvez tivesse apenas sido apenas um pressagio, uma antecipação das noticias que meu pai partilharia comigo mais tarde e não uma ameaça humana e concreta.

Acho que ela está no mar há menos de uma semana Jacob Black gritou me tirando dos meus devaneios.

Ele tinha a água na altura das coxas, e o corpo da mulher flutuava perto dele.

De onde será que ela é? Riley Biers. De um navio, talvez?

O tempo tem estado bom faz mais de três semanas. Nenhum navio afundado. Se ela for de um navio, então ele se chocou com as rochas mais ao norte.

Os dois homens se entreolharam.Jacob resmungou e se deslocou o máximo que pôde, mas as ondas carregavam o corpo para longe de suas mãos. Ele ergueu a cabeça, ofeguei, seus olhos lindos negros pareciam mais pareciam querer me perfurar como arpões, e meneou a cabeça.

Vá embora, Bella. Não há necessidade de ver isso.

Ele estava certo. Não havia necessidade de que eu os visse retirar aquela infeliz mulher da água, mas não consegui me mover. A conversa a respeito de naufrágios e rochas me tinha assustado profundamente.

Havia rumores de que a costa ao norte não era segura e que, na escuridão da noite, destruidores de navios acendiam luzes falsas, simulando faróis. Eram assassinos vis que atraíam as embarcações para que fossem destruídas de encontro às rochas.

Destruídas, como a estrutura da minha vida.

Mas ao menos eu estou viva, pensei ao observar o corpo da mulher afogada. Ajeitando o xale ao redor dos ombros, suspirei, tentando acalmar os nervos, lutando contra o medo do futuro e as feias memórias do passado. Terríveis lembranças de tempestade e mar, e da Mansão Pattinson.

Jacob conseguiu, por fim, agarrar os braços da mulher morta. Ele e Riley seguraram o corpo e a arrastaram, ainda dentro da água.

Meneando a cabeça de novo, Jake fitou-me novamente.

Geralmente os corpos afundam. Não aconteceu com esse.

Eles afundam até incharem e, então, flutuam novamente como cortiça, não é? Sem esperar pela resposta, Riley continuou: A saia dela. Vê o modo como se enroscou ao redor dos tornozelos? Deve ter se enchido de ar quando ela entrou na água e isso a fez flutuar. Por isso não afundou.

Atraída, mesmo contra a vontade, dei um passo na direção da água, e mais outro, até ver a pobre mulher e imaginar a luta que ela tinha travado pela vida, os membros pesados enquanto se debatia, ofegando, orando... morrendo. Era uma imagem terrível.

Era uma horrível lembrança. De repente senti o meu peito apertado, e a respiração que trazia apenas água gelada para o nariz, a garganta e os pulmões. Com o coração acelerado, lutei contra as recordações, determinada esquecer tudo aquilo.

Jacob colocou a mulher sobre um carrinho de madeira. A tristeza que antes preenchia meu coração foi substituída pela pena, vi-a inchada e seca ao mesmo tempo, o rosto branco em contraste com os cabelos cor de cobre, e seus olhos... Com um grito, dei um passo para trás, cobrindo a boca com a mão, horrorizada. Não havia olhos, apenas órbitas vazias.

Desviando o olhar, engoli convulsivamente, fixando-me nas conchas sobre a areia da praia. Tinha ido caminhar para desanuviar a alma e pegar algumas conchas. Apenas um punhado para minha mãe. Agora, em vez de conchas e tranquilidade, carregava aquela imagem. Um novo pesadelo para atormentar-me, pensei. Imaginar o sofrimento de outra mulher não seria boa companhia nas horas escuras da noite.

De repente, sentir-me gelada e ergui a cabeça, sentindo um arrepio na nuca. Esfreguei os braços, apreensiva. Sabia que estava sendo observada.

Virei-me para fitar o grande muro formado por rochedos que se erguia ao longo da costa e medi com interesse o precipício inflexível. O som das ondas se quebrando na praia era pontuado pelo grito de uma gaivota solitária voando acima da minha cabeça. De repente, senti um movimento, a ondulação de um tecido escuro, talvez a capa de um homem.

Girei o corpo com tanta rapidez que quase perdi o equilíbrio. Apoiei a mão sobre a coxa esquerda, tentando forçar os músculos a se endireitarem e me manterem em pé. Conseguiria, caso tivesse sorte. Ou então, a perna fraquejaria, como de frequência, e eu acabaria caindo na areia em um movimento nada gracioso. Depois de um momento, consegui erguer o corpo e voltei à atenção para o lugar onde tinha vislumbrado a estranha sombra. Porém, não havia ninguém à beira do precipício, nenhuma silhueta contra o céu cinzento. O homem, se é que eu o havia visto, fora embora.

Mas a sinistra inquietação dentro de mim permaneceu.

Saindo da praia, avancei lentamente pelo caminho estreito de terra que abraçava o precipício. Meus pensamentos giravam ao redor dos meus próprios tumultos e do horror daquele trágico afogamento. Chegando ao topo, parei, a atenção atraída pela prima de meu pai, Esme Swan. A delicada mulher parada à beira do precipício tinha os braços erguidos, o cabelo, um castanho claro repleto de mechas grisalhas estava solto agitado pelo vento e as formas envoltas por camadas de roupa preta. De frente para o redemoinho do mar violento, sob o céu plúmbeo e opressor, ela convocava a tempestade, precariamente equilibrada.

Prima Esme gritei, com as mãos em concha ao redor da boca para me fazer ouvir melhor. Saia de perto do precipício.

O vento e o barulho do mar engoliram meu grito, ou talvez Esme tivesse me ignorado. Não teria sido a primeira vez. Quando a alcancei, ela esticou o braço, fazendo um movimento que abrangia a praia e os rochedos.

Vi uma luz cerca de uma semana atrás Esme disse, entrando no assunto sem preâmbulo. Sua voz era forte, embora o corpo começasse a fraquejar com o peso da idade. Era ao norte. Uma luz diabólica e falsa. Me olhou atentamente antes de acrescentar: Uma luz dos destruidores de navios.

Não diga isso sussurrei, com uma sensação ruim crescendo dentro de mim.

Eu digo por que vi. Ouviremos a história de um navio afundado e destruído dentro de pouco tempo, minha garota. Preste atenção ao que estou dizendo. O que mais pode ser além dos destruidores? O quê?

Aquela luz, tão perto de La Push... Quando Jacob e Riley haviam tirado a mulher do oceano, tinham achado que ela estava na água por alguns dias e comentado que ela deveria ter vindo de algum navio afundado na costa norte. E, se fosse aquilo mesmo... Para já com isso. Eu não queria mais me preocupar. A tristeza daquele dia já tinha sido demais.

Oro para que esteja errada murmurei.

Eu também. Mas vou dizer a você... A mulher que foi tirada da água esta manhã... Ela veio daquele navio. E morreu por causa da ganância dos homens. Envolveu-se nos próprios braços, o corpo oscilando para frente e para trás. E é ele, a vinda dele, que trouxe o mal até nós prosseguiu, apontando um dedo na direção da Mansão Pattinson.

Com as horríveis notícias que meu pai me havia dado e a imagem da pobre mulher afogada ainda frescas em minha mente, preferi não pensar em Pattinson, para não se recordar de mais nada.

Ele está ligado ao demônio. Posso sentir isso nos meus ossos. Esme torceu os lábios, mostrando desgosto e revelando os três dentes que lhe faltava na boca.

O novo proprietário? Perguntei, começando a odiar um homem que eu nem conhecia. Não sabemos nada sobre ele.

Dando de ombros, Esme arrastou os pés pelo caminho, ajeitando a capa sobre os ombros.

O que sabemos sobre ele? Lançou a mim um olhar astuto. Podemos adivinhar que tem uma fortuna muito grande, pois pagou caro por Pattinson. Mas de que forma ganhou tanto dinheiro... A voz fraquejou, dando um tom ainda mais sinistro à observação.

Sei que isso não é da minha conta disse, com gentileza. Eu sabia aonde aquela conversa iria chegar. Esme adorava se imiscuir nos segredos dos vizinhos e, se encontrasse alguém interessado, providenciaria detalhes oriundos de sua própria imaginação.

O dinheiro dele deve ter sido conseguido desonestamente. Contrabando, destruição, talvez assassinato Esme continuou, olhando para o céu.

Destruição. Assassinato. Lembrei de novo do terrível rosto da mulher retirada do mar e aquela imagem despertou-me a mesma sensação que tivera naquela manhã: a de estar sendo observada. Céus... haveria apenas escuridão naquele dia e nos subsequentes, apenas tristeza, perda e medo?

Há um vento malévolo soprando disse minha prima, como se respondesse a alguma pergunta muda que eu não pronunciei. Acho que sopra de Pattinson e do homem que será o dono.

O homem que será o dono... Repeti.

Não me lembrava da mansão habitada. O proprietário anterior havia partido duas décadas atrás, antes de me mudar para Forks, e a casa estivera vazia desde então. Senti uma estranha curiosidade em saber quem era o homem que tinha comprado aquele amontoado de rochas e argamassa. Devia ser alguém misterioso e sombrio. E de grande fortuna, se Esme tivesse razão. Um pirata, um contrabandista, um destruidor de navios.

Estremecendo, virei e me pus ao lado da minha prima, que circundou meu pulso com dedos envelhecidos.

Você viu o novo proprietário, Esme? perguntei, embora já eu já soubesse a resposta. Se ela o tivesse visto, todo a Forks já saberia.

Não o vi Esme respondeu, entrelaçando seu braço ao meu. Ele chegou no meio da noite e não parou para beber ou conversar. Gostaria de saber que tipo de homem não aprecia a companhia dos vizinhos.

Um homem que prefere sua privacidade. Tirei as luvas pretas de lã do pequeno bolso que costurara no interior de minha capa e as calcei ainda de braço dado com Esme.

Sim, mas por que ele prefere a privacidade? É uma boa pergunta. Estreitando os olhos, Esme apoiou a ponta do dedo na pele enrugada do rosto. E por que escolheu esse lugar? Há casas menos isoladas e em melhores condições na região.

Eu compreendia tal escolha. Apreciava a magnificência inflexível e solitária do lugar, que era meu lar havia mais de uma década. Conhecia o esplendor das floretas e pântanos, o duro apelo do vento salgado e úmido, a beleza das ondas batendo nos rochedos. E sabia que a Mansão Pattinson chamava aqueles que a ouviam.

Talvez ele queira isolamento e privacidade.

Isolamento é bom para certas atividades... realizadas em uma costa rochosa sem nenhuma testemunha. Esme resmungou.

Senti um peso no peito, que dificultou minha respiração. Meneei a cabeça e disse com firmeza:

Talvez ele tenha escolhido Forks por sua beleza.

É, pode ser. Um lugar inóspito, solitário e lindo. Mas não foram esses os motivos que o trouxeram para cá. Anote minhas palavras. Esse homem é a morte disfarçada. Sinto na profundeza de minha alma.

A morte não é estranha em Forks e tampouco em Pattinson Observei, pensando na pobre mulher recolhida do mar próximo a casa.

Esme apertou meu braço com gentileza.

Agora vou deixá-la. Tenho algumas costuras para fazer. E é melhor que você vá para casa antes da tempestade.

Sim, faria bem voltar para casa antes da tempestade. Aquela tinha sido uma lição bem aprendida. Os dedos frios do passado tocaram minha pele, fazendo-me estremecer. Deveria ter voltado depressa para casa antes da tempestade, naquele dia distante. As lembranças me atormentavam.

Despedir-me de Esme, que se afastou na direção de sua pequena casa na extremidade da aldeia. Observando-a, tentei afugentar minha inquietação e a sensação de que um grande infortúnio logo chegaria a Forks. Na verdade, uma calamidade já me atingira, provocada pelas excentricidades e escolhas erradas de meu pai. Contudo, eu tinha a sensação que haveria algo maior e ainda pior do que o momento infeliz que estava vivendo. O pensamento era realmente terrível.


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Notas finais do capítulo

Vou postar o 2º já já....