A Razão do Rei escrita por Andy


Capítulo 6
Capítulo 6


Notas iniciais do capítulo

E aí, pessoal! :D
Como prometido, eis aqui o capítulo 6! Não tenho muito o que dizer desta vez, exceto que eu espero que o capítulo agrade! (Ele é um dos meus favoritos, se é que um escritor pode falar isso sobre um capítulo, haha!) Agora as coisas começam a mudar de rumo... ;)
E por falar em mudar de rumo, a partir deste capítulo, eu volto a postar apenas de 15 em 15 dias. Infelizmente, minhas aulas na faculdade voltam amanhã, então... Mas espero que a fanfic compense a demora! Estou fazendo o meu melhor!
Mais uma vez, muito obrigada a todos que leem e acompanham! Os comentários de vocês significam muito para mim! Eu os leio e releio várias vezes, haha! Obrigada! Vocês são demais! Até o próximo capítulo! ^^



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– Eu só tenho uma pergunta, Alteza... – desarmando todas as barreiras que eu tinha erguido, deixei que ele visse o quanto eu estava cansada e o quanto desejava estar em qualquer outro lugar, que não ali. – Por que eu?

– Porque, apesar de sua completa inabilidade com lâminas de qualquer tipo... – ele sorriu, e eu não consegui definir a intenção por trás daquele sorriso. – Você ainda é a melhor arqueira que eu já vi. Melhor que os arqueiros da guarda. Melhor que o meu instrutor.

Era de se esperar que depois de tanta humilhação e tantas ofensas, eu ficasse contente com aquele “elogio”. Ou no mínimo que ficasse surpresa. Que tentasse responder sarcasticamente. Qualquer coisa do gênero, qualquer tipo de reação nesse sentido seria aceitável. Mas eu estava tão exausta e ainda tão triste pelo que tinha acontecido na batalha que a minha resposta acabou sendo completamente diferente:

– A Aurial, minha amiga que morreu... Ela era muito melhor do que eu. – falei olhando para o chão, evitando o olhar de Thranduil. Uma pequena parte de mim, que ainda estava alerta, uma pequena parte que ainda era eu mesma, ficou surpresa por eu estar abrindo meu coração daquele jeito justamente para ele. Eu, que nunca me abria com ninguém. A tristeza em minha voz me fez sentir vontade de chorar de novo. – Nós costumávamos treinar juntas quase todos os dias. Ela me ensinou boa parte do que eu sei. Mas alguns truques só ela sabia. – precisei enxugar uma lágrima que eu não consegui conter. Virei o rosto, na esperança de que Thranduil não visse. – Ela era a melhor.

Longos minutos se passaram enquanto eu mordia o lábio inferior e fechava os olhos, tentando não desabar. Quando finalmente tomei coragem para olhar para Thranduil novamente, ele estava me observando, seu rosto totalmente inexpressivo. E quando aqueles olhos penetrantes encontraram os meus e ali ficaram até que eu desviasse o olhar, eu tive mais uma vez a certeza de que eles podiam ler tudo o que se passava em minha alma.

– Vá para casa. – foi a única resposta que eu obtive. Nenhuma palavra de consolo, nenhuma afabilidade. – Encontre-me aqui amanhã no mesmo horário.

Eu apertei os olhos, tentando conter a onda de lágrimas que travou minha garganta.

– Sim, senhor.

E assim foi o resto daquela semana, todos os dias. Thranduil exigia que eu treinasse com ele, do nascer do sol até a noite, mesmo que nenhum de nós parecesse estar fazendo nenhum progresso. No dia seguinte àquele, Thranduil apareceu com um arco menor e mais leve e eu tentei lhe ensinar começando do básico, mas ele era tão ruim com o arco quanto eu era com a espada. Eu tentei, é claro, me aproveitar da situação para me vingar da maneira como ele me tratava, diminuindo-o e fazendo pouco dele tanto quanto eu podia. Isso o deixava muito irritado e frequentemente ele me lembrava de que ele era o príncipe ali e me dava uma ordem atrás da outra. Eu me divertia com isso, mas ele pagava na mesma moeda, me humilhando cada vez mais quando chegava a hora de ele me ensinar. Chegamos a um ponto em que ele desistiu completamente de “tentar” ser gentil comigo e passou a gritar e me ofender em tempo integral. Meu desprezo e meu ódio por ele apenas cresciam.

– Mas, Legolas, não faz sentido! – Pippin interrompeu a narração. – Se sua mãe odiava tanto o seu pai, como foi que eles acabaram se casando?

O elfo sorriu para ele.

– Não faz sentido, não é mesmo? Eu fiz a mesma pergunta para a minha mãe...

– Mas mamãe, você já me contou essa história milhares de vezes, e eu nunca entendi uma coisa.

Syndel e Legolas estavam sentados em volta de uma fogueira, assando esquilos recém-abatidos. A noite estava fresca e a lua cheia alongava as sombras das árvores que cercavam o campo de treinamento.

– O quê?

– Como foi que você e o meu pai acabaram ficando juntos, se vocês brigavam o tempo inteiro desse jeito? – a mãe sorriu, mas não disse nada. Legolas esperou, e como parecia que ela não ia falar, ele insistiu: – Quando foi que você decidiu que não o odiava... E que o amava? O que aconteceu para você mudar de ideia desse jeito?

Syndel riu, centenas de lembranças se passando em sua mente ao mesmo tempo.

– Bom... Não aconteceu assim, de uma vez só. – ela mordeu o lábio inferior, pensativa. – Não houve um momento em que eu pensei “agora eu não o odeio mais; a partir deste ponto, eu o amo”. A transformação foi acontecendo aos poucos no meu coração, sem que eu sequer me desse conta. Mas, pensando nisso agora, acho que foi uma série de pequenos e grandes acontecimentos que levaram a ela.

“Para ser honesta, eu acho que uma parte de mim sempre se sentiu atraída por Thranduil de alguma forma. Acho que é por isso que ele me irritava tão profundamente desde o início. É claro, agora é fácil perceber isso, depois que tantos anos se passaram. Mas na época eu era jovem e não entendia nada dessas coisas. Por isso não me dei conta da origem daquela antipatia toda. Tudo o que eu sabia era que “eu nunca gostei dele” e que “agora eu o odeio mais que tudo”.

Mas com o tempo, como tinha que ser, meus sentimentos pelo príncipe começaram a mudar.

E acho que tudo começou com aquela história...

Na primeira semana de treinamentos, como eu te contei, Thranduil me obrigou a treinar com ele todos os dias, do nascer do sol ao cair da noite. Na semana seguinte, porém, ele me pediu para passar a encontrá-lo todos os dias depois do almoço. E algumas semanas depois ele me pediu para encontrá-lo apenas em três dias a cada sete. Eu não entendi o porquê de ele estar diminuindo o tempo de nosso treinamento, mas aceitei agradecida e sem questionar.

Já havia se passado mais ou menos um mês desde que eu começara a treinar com ele, e minhas amigas ainda nem desconfiavam disso. Elas não o culpavam pela morte da Aurial, como eu, e continuavam a idolatrá-lo tanto quanto antes, mas eu aproveitava cada oportunidade que tinha para falar mal dele e dizer a elas o que eu pensava sobre a relação dele com morte da nossa amiga. Por isso, é claro que eu não queria que elas soubessem que eu estava treinando com ele, mesmo que só o estivesse fazendo por estar sendo obrigada. Assim, eu inventava uma série de desculpas para estar ocupada nos dias dos treinamentos, e até ali estava me saindo bem.

Foi então que, num dos meus dias livres, eu estava colhendo frutas no bosque com elas, quando Naïf deixou escapar aquele comentário:

– Vocês ficaram sabendo sobre o príncipe?

Eu me vi aguçando os ouvidos involuntariamente para escutar melhor o que quer que viesse em seguida.

– O quê? – Saihel era a mais curiosa do grupo e estava sempre ávida por uma fofoca. – O que tem meu amor?

Naïf jogou amoras nela, brincando, e eu pensei que se ela não o tivesse feito, eu o faria. Talvez com um pouco mais de violência.

– Eu ouvi dizer que ele anda tendo aulas de estratégia com o general Guillion.

– Como? – eu franzi as sobrancelhas, certa de que só podia ter ouvido errado.

– Não é?? O general Guillion nunca aceitou aprendizes! Dizem que ele se recusou a ensinar o próprio Oropher, quando ele era jovem. Fico me perguntando como o príncipe conseguiu que ele lhe ensinasse... Será que o rei interveio a favor dele? Mas duvido que o general se deixasse pressionar, mesmo pela autoridade de Oropher.

– Você disse que o príncipe está estudando estratégia? – eu perguntei só para confirmar. Eu não conseguia imaginar Thranduil realmente levando a sério qualquer coisa que usasse mais o cérebro que os punhos.

– É!

– Talvez ele tenha achado que não estava pronto para liderar um exército de verdade, depois do que aconteceu com aqueles orcs? – Lyndril já começava a criar teorias, como sempre fazia, mas eu parei de ouvir a discussão, concentrando-me em meus próprios pensamentos.

A meu ver, aquilo só podia ser mentira, um mero boato espalhado por alguém. De maneira alguma o Thranduil que eu conhecia, todo arrogante e cheio de si, ia decidir que precisava estudar mais. Ele se achava o melhor em tudo e não dava valor a nada que não envolvesse a força bruta. É, com certeza aquilo era só uma fofoca sem fundamentos.

Durante longas semanas eu tentei esquecer aquela história, mas a interrogação continuava voltando à minha mente a cada vez que eu encontrava o príncipe para mais um de nossos treinamentos. Eu me pegava observando-o, tentando identificar qualquer sinal de que a história de Naïf era verdadeira. Aquilo estava me enlouquecendo. Por fim, eu acabei não resistindo e um dia, quando Thranduil declarou que eu tinha cinco minutos para descansar, eu embainhei a espada e comecei, em um tom baixo:

– Alteza...

– Hnm? – ele se voltou para mim, parecendo surpreso por eu estar falando com ele, coisa que eu evitava se não fosse realmente necessário.

– Eu posso fazer uma pergunta?

– Bom, você já está fazendo, não? – ele abriu aquele sorriso sarcástico de novo, o que quase me fez desistir de falar com ele. Mas eu já havia começado, então era melhor ir até o fim.

– Há um boato correndo o reino... Dizem que o general Guillion está lhe dando aulas de estratégia...? – eu parei, deixando a interrogação no ar.

– Sim? – ele ergueu uma sobrancelha, como se não entendesse qual era a pergunta.

– Então é verdade?

– Sim, é claro que é. Eu pessoalmente pedi ao general que me aceitasse como seu aprendiz. Há umas semanas venho estudando estratégias de combate e liderança com ele. – ele fez uma pausa, lendo a minha expressão. – Isso a surpreende?

– Bom... Um pouco. – eu ergui os olhos para ele. – Muito, na verdade. Muitíssimo.

Ele apenas sorriu.

– Seus cinco minutos acabaram. Em guarda!

Eu acho que me saí ainda pior naquele treinamento do que geralmente me saía nos outros dias. Estava distraída, tentando absorver a nova informação. Então era verdade. O arrogante cabeça-dura tinha admitido sua falha e decidido pedir ajuda e estudar. Ele tinha aceitado meu conselho e decidido estudar estratégia, algo que ele obviamente nunca valorizara antes. Aliás, tinha sido por causa do meu conselho? Ele tinha se arrependido do fracasso de nossa missão? Ou será que o rei o havia obrigado àquilo? Parecia muito mais provável. Mas qual era a verdade?

– Pelas estrelas... – Thranduil abriu aquele sorriso torto para mim, a ponta de sua espada a milímetros da minha garganta. – O que há com você hoje? Se é que é possível, está ainda pior do que nos outros dias! – ele me observou por um instante enquanto eu o encarava, depois riu de leve, embainhando a espada. – Ande, levante daí. Vamos encerrar por hoje. – ele se virou, passando a mão pelos cabelos.

Eu me levantei, contente por aquele dia ter acabado, e bati a poeira das minhas roupas. Tudo o que eu queria era ir para casa para poder pensar em paz e tentar aceitar aquilo. Eu pus minha espada de volta na bainha e fiz uma mesura, mesmo que o príncipe estivesse de costas para mim.

– Boa noite, Alteza. Até depois de amanhã.

– Boa noite. – ele não se virou para mim.

Eu dei as costas para ele e me dirigi às árvores, pronta para tomar o caminho mais longo de volta à minha casa quando o ouvi chamar:

– Syndel. – diferentemente das outras vezes, seu tom foi baixo, um chamado normal, e não um comando. Eu parei onde estava.

– Senhor...?

– Eu sinto muito. – ele permaneceu de costas enquanto falava, mas o tom profundo de sua voz me deu a sensação de que estava sendo sincero. – Pelo que aconteceu à sua amiga. Na batalha sob meu comando. Eu realmente sinto muito.

Eu fiquei estática, sem conseguir acreditar em meus próprios ouvidos. Eu quis responder, mas não conseguia encontrar a minha voz e nem as minhas palavras. Até que o momento passou. Sem obter resposta, o príncipe, ainda de costas, falou novamente:

– Boa noite, Syndel. – e seguiu em frente sem olhar nem uma vez para trás, desaparecendo nas árvores em direção ao palácio.

“Depois daquela demonstração de arrependimento de Thranduil, alguma coisa imediatamente começou a mudar dentro de mim. Foi como se um balde d’água tivesse sido jogado na chama do meu ódio por ele, extinguindo-a. Eu continuava a não gostar da personalidade dele, tanto quanto não gostava antes da batalha contra os orcs, mas era apenas isso. Toda a raiva e todo o ódio que eu vinha sentindo por ele desde a morte da Aurial foram gradualmente desaparecendo até que, em apenas um mês ou dois, tudo havia se convertido em mera antipatia. Até hoje, quando paro para pensar no assunto, eu me surpreendo com a rapidez com que eu perdoei o seu pai, quando eu havia jurado odiá-lo por toda a eternidade. Mas de algum modo aconteceu, e mesmo querendo odiá-lo conscientemente, lá no fundo eu sabia que já não me sentia mais do mesmo jeito.

Mais ou menos sete meses depois que começamos a treinar juntos, veio a segunda surpresa.

O sol brilhava alto no céu e o vento ainda gélido do fim do inverno mordiscava meu rosto e atrapalhava nosso treino com o arco-e-flecha. Para mim ou para você, Legolas, arqueiros experientes, o vento é apenas um fator a mais a se considerar na hora de fazer um disparo, mas para Thranduil era um verdadeiro entrave. Era impressionante e frustrante para mim, constatar que mesmo depois de quase um ano de treinamento, o príncipe parecia não ter progredido quase nada com a arma. Ele havia atirado seu arco na neve pela quinta vez depois de errar mais uma flechada e xingava irritado quando eu decidi que era uma boa hora para fazer uma pausa para o almoço.

– Eu já disse, Alteza. Dar ataques de raivinha não vai ajudá-lo em nada. – eu me abaixei e recolhi o arco dele. – E se o senhor continuar atirando seu arco ao chão desse jeito, vai quebrá-lo.

– Eu vou é trocar essa porcaria. Deve haver alguma coisa de muito errado com ele.

Abrindo-lhe minha melhor imitação de seu próprio sorriso sarcástico, eu me aproximei e, pegando uma flecha de sua aljava, atirei uma vez com o arco dele, acertando o centro do alvo na primeira tentativa.

– Parece bom para mim.

Ele olhou feio para mim e arrancou o arco da minha mão. Eu ri de leve.

– Pausa para o almoço. – eu me virei em direção a uma pedra, sobre a qual havia deixado uma cesta com lembas. Não era muito apetitoso, mas era o melhor que se podia conseguir naquele clima.

Thranduil se sentou ao meu lado, desembrulhando a pequena trouxa que continha seu almoço. Lembas e algumas frutas. É claro. Ele era o príncipe, tinha direito a essas regalias. Eu não precisei perguntar para ter certeza de que aquelas frutas tinham vindo de algum lugar muito distante, encomendadas por Oropher. Afinal, a Floresta Verde ainda estava apenas começando a descongelar. Thranduil não me ofereceu nem uma uva sequer.

Comemos em silêncio, absortos em nossos pensamentos particulares. Era sempre assim: nós nunca conversávamos. Só trocávamos palavras quando isso era absolutamente necessário ou quando víamos uma chance de humilhar um ao outro. Apesar do pedido de desculpas dele ter apagado meu ódio, nada havia mudado em nossa relação. Por isso mesmo, eu me surpreendi quando ele me chamou, enquanto descansávamos antes de retomar o treino:

– Syndel? – ele esperou que eu olhasse para ele. – Eu... Bom... Eu vou precisar cancelar nossos treinamentos da semana que vem. Você sabe que o dia de Achernar está chegando e eu preciso ajudar o rei com os preparativos, então...

– Tudo bem. Eu também tenho muito que fazer, na verdade. Preciso trabalhar com os outros escravos.

– Você fala como se o dia de Achernar fosse apenas para o rei e a corte.

– Tudo bem, admito. Isso não é bem verdade. O dia de Achernar é o meu dia preferido no ano, desde que eu era criança. É tão bonito... Mas o senhor tem que admitir que dá muito trabalho.

– Sim. Mas o trabalho é para todos. Nós da corte também nos cansamos com os preparativos.

– Ah, imagino como deve ser exaustivo ter que escolher suas melhores roupas cerimonias e trançar os cabelos daquele jeito, sem falar em como deve ser horrível ter que provar o vinho e a comida que os cozinheiros preparam para garantir que tudo esteja perfeito para seus convidados! Quanto trabalho...

– Você não tem a menor noção do quanto é difícil ser um anfitrião, não é mesmo? Ainda mais para um reino inteiro.

– Se é assim, porque não passam a deixar a ralé de fora, como em quase todas as outras festividades? Meu senhor Oropher podia arranjar isso. Seria uma quebra na tradição, mas nada que ele não possa fazer. Ele é o rei.

Thranduil abriu aquele sorriso torto, mas não disse nada. Em vez disso, ficou pensativo por alguns instantes, e eu imaginei que ele estivesse considerando a ideia. Depois de vários minutos, ele balançou a cabeça, ainda sorrindo, como se estivesse tentando espantar algum pensamento e se virou para mim:

– Tem mais uma coisa que eu queria falar com você... – seu tom de voz, suave, me surpreendeu.

– Sim, Vossa Alteza? – eu ainda estava tentando ser sarcástica.

– Eu gostaria muito de levá-la ao Baile da Estrela. – ele estendeu a mão e com as pontas dos dedos ergueu meu queixo para me olhar nos olhos. Eu imediatamente fui hipnotizada por aqueles olhos azuis que sempre evitava. – Você me daria essa honra?

Eu senti meu rosto arder e soube que estava corando, o que me irritou consideravelmente. Constrangida, eu me levantei de um salto, afastando-me de onde Thranduil permanecia sentado com a mão ainda erguida. Respondi olhando na outra direção:

– Nem pensar! – em meio a todo aquele embaraço, minha última preocupação era pensar se estava sendo rude ou não. – Com o senhor? De maneira alguma! Nem em mil anos! – eu balançava a cabeça freneticamente, tentando clarear meus pensamentos e afastar aquele rubor. E por que minhas mãos estavam tremendo?

Thranduil não disse nada, ficou apenas olhando enquanto eu me recuperava. Então, eu respirei fundo e tentei corrigir o meu erro:

– E-Eu... – cerrei os punhos, irritada comigo mesma por estar tão nervosa. – Eu agradeço o convite, Alteza. Mas irei declinar. – eu me curvei, tentando ser o mais formal e educada possível. – Obrigada.

O príncipe assentiu e fez sinal para que eu me reerguesse. Eu esperei pelos gritos, pela ofensa ou por qualquer outro tipo de retaliação. Mas Thranduil não fez nem disse nada e nem sequer olhava para mim, olhando fixamente, de maneira distraída, para a grama cinzenta que começava a aparecer em meio à neve. Esperei mais alguns instantes, e como parecia que ele realmente não ia se enfurecer, minha perplexidade acabou falando por mim:

– O que eu perdi?

– Perdão? – ele estreitou os olhos ao erguer a cabeça para olhar para mim. A luz o incomodava. Mesmo assim, eu pude ver uma emoção nova neles... Ele parecia cansado... e triste.

Eu me sentei de novo ao lado dele:

– É que... Essa não seria a hora em que você normalmente diria “isso é uma ordem” e me obrigaria a ir com você ao baile de qualquer jeito?

Ele suspirou e virou o rosto, observando o vento castigar as árvores. Para mim, pareceu levar uma eternidade antes que ele finalmente respondesse:

– Não... Quero dizer, acho que seria. – ele franziu as sobrancelhas. – Mas eu não vou fazer isso. Aliás, eu não quero mais te obrigar a fazer coisa alguma. – ele olhou para mim, sério. – Estou cansado de ser o tirano aqui.

– Isso quer dizer...? – eu engoli em seco, sentindo meu coração disparar, sem fazer ideia do motivo.

– Quer dizer que você está livre para ir embora e nunca mais voltar a treinar comigo, se assim quiser.

Aquelas palavras me atingiram como um golpe e eu senti os olhos ardendo, mas até hoje não entendo o motivo. Só sei que senti uma súbita vontade de chorar, e não era de alívio. Meu peito doía, meu coração reclamava. Eu precisei de algum tempo para conseguir falar, e as palavras saíram como que por conta própria:

– Não, eu... Eu quero continuar, sim. Eu acho que estou até aprendendo alguma coisa.

Ele abriu aquele sorriso torto.

– Fala sério, você continua tão péssima quanto sempre.

– E eu posso dizer o mesmo do senhor. – eu tentei imitar o tom de voz sarcástico dele.

– Mesmo assim, não quer desistir de mim?

– Não. – e ao dizer aquilo em voz alta, eu soube que era completamente verdade, embora estivesse longe de compreender meus próprios motivos. – Agora é uma questão de honra. Eu vou ensinar a Vossa Alteza, nem que seja a última coisa que eu faça. – completei, apenas para dar uma justificativa.

Ele riu de leve e não disse mais nada por um bom tempo. Eu fechei os olhos, sentindo o vento agitar meus cabelos. Foi estranho, mas o silêncio que se estabeleceu entre nós não foi desconfortável. Muito pelo contrário, ele me trouxe paz. Eu me sentia subitamente muito leve, como se um peso tivesse sido tirado de cima de mim. O peso dos grilhões.

Só tornei a abrir os olhos quando senti que Thranduil estava se levantando. Ele estava de costas para mim, alongando os braços.

– Tem mais uma coisa. – ele se virou para me olhar, e eu me levantei. – Já basta dessa história de “Alteza” e “senhor”. – ele estava muito sério. – De agora em diante, me chame apenas pelo meu nome. E se refira a mim com “você”. Entendido?

Eu sorri: – Isso é uma ordem?

Ele retribuiu o sorriso, e desta vez não estava sendo sarcástico: – Não.


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