Friends of Blood escrita por Ferla


Capítulo 1
Capítulo único


Notas iniciais do capítulo

Olá pessoal!
Espero que gostem dessa história, foi difícil encontrar algo bom para fazer o texto sem que ficasse muito no senso comum.
Enfim, espero que gostem e aproveitem a leitura!



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Quinta-feira, 15 de dezembro 2010, 03h59min

LYRA

Aquele vento gelado de inverno atrapalhava-me enquanto corria pelas ruas cheias de neve em Tóquio.

O nevoeiro impossibilitava a minha visão. Um sujeito de capa preta aproveitava-se das situações temporais para mostrar as habilidades em meio ao frio extremo, tendo total vantagem sobre minhas pernas curtas e acostumadas com o verão da Argentina.

Corria o máximo que podia, tentava disparar contra o inimigo, mas ele era mais rápido que eu. Na verdade, parecia que estava brincando comigo.

O meu relógio de pulso apitou assim que o horário virou para as 04h. E foi nesse momento que minha sentença de morte fora assinada.

O perseguidor acertou um tiro em cheio no meu peito e nas minhas pernas, fazendo com que caísse no chão. Meu nariz bateu com força no asfalto gelado, e pude senti-lo ficando quente com o sangue. Tentei me virar para o inimigo, observando o quão longe ele estava de mim, uma péssima decisão.

O sujeito estava bem na minha frente, encarando minha face que já deveria estar desesperada. Então, observei que tirava um facão de dentro da sua capa e o direcionava para meu braço, com calma e cautela para que eu não visse seu rosto. Levantando as mãos devagar, ele se ajoelhou ao meu lado e encarou meu braço por alguns segundos.

Tentei tomar a faca de sua mão com os movimentos que ainda tinha na parte superior do corpo, mas fora em vão.

O inimigo pareceu rir da situação, e levantou o braço mais uma vez, agora com rapidez, e direcionou o facão ao meu braço. Com uma dor extremamente insuportável, perdi meu membro superior direito enquanto ouvia uma risada assustadoramente eufórica vindo dele.

Comecei a gritar por ajuda em meio àquelas terríveis lágrimas que escorriam dormentes pelo meu rosto frio, aqueles gelados pingos úmidos.

Eu estava tentando controlar minha voz e meus pensamentos, ainda lutando para que o sujeito parasse com aquilo, que poupasse a minha vida e dor, quando sem cerimônia alguma, o vi fatiando a minha perna esquerda em pequenos pedaços, demorando para cortar cada um.

A dor presente em mim naquele instante era indescritível, jamais imaginaria que uma líder de gangue deveria passar por aquilo.

— Não! Pare com isso! Quem é você?!

Sem resposta, observei que a pessoa tirava uma tesoura afiada de seu casaco por baixo da capa, e assim senti o afiado do objeto penetrando meu abdômen com cautela, retirando meu intestino sem a mínima prática. Já não sentia mais dor.

Quando minha visão começou a escurecer, notei que tudo tinha acontecido em um único minuto.

O assassino... não sei se reconhecia aquele rosto, não sei se já o tinha visto.

# # #

JEAN

Segunda-feira, 19 de dezembro de 2010, 22h32min

— Eu ainda não superei... — disse Marco, olhando para a televisão fixamente.

Eu, Marco, Anastácia e Lyra, antes de ser morta — provavelmente por inimigos — éramos líderes de uma gangue composta por vinte pessoas. Nosso esconderijo, mais chamado como lar, ficava embaixo de um bar na zona sul de Buenos Aires, mas estávamos cumprindo uma missão em Tóquio com outros cinco capangas.

A morte de Lyra tinha nos impressionado.

— Ela era uma boa pessoa — falou Anastácia, revirando seu copo vazio de um lado para o outro.

— Agora temos que descobrir que gangue fez isso, achava que não tínhamos inimigos no Japão — disse eu, mantendo meu ar reflexivo.

Não temos inimigos no Japão. Quem fez isso deve ser de fora daqui — Anastácia lembrou, sempre como cérebro do grupo.

Anastácia era a mais nova, era a filha do falecido criador da gangue, e tinha recebido o título de chefe vindo do pai. Ela era muito inteligente, e também bastante quieta, mas apesar de suas boas características, ela não sabia como lidar com uma arma. Por esse motivo, estávamos pensando em tirá-la da posição de líder.

— Mas ainda assim... jamais aceitaria fácil — falou Marco.

Marco era o mais calmo entre nós, e também o mais controlado. Ele tinha uma afeição enorme com todos, mas era como se pudesse nos matar do mesmo jeito para proteger a si mesmo. Apesar disso, era um bom amigo.

— Não importa, quando eu descobrir a maldita gangue que fez isso, quero mandar os nossos melhores pra acabar com eles em dois dias — disse eu.

Por fim, Jean, eu. Não era um cara muito simpático, mas sabia defender e liderar muito bem a minha gangue. Considerava todos os que estavam ali como meus amigos, e não podia deixar algo de ruim acontecer.

Nós tínhamos muitos problemas com gangues fora da Argentina, o que me dava quase 100% de certeza que a obra vinha de inimigos. O principal problema não era conhecer os mal-feitores, e sim fazer com que eles não começassem a matar mais pessoas além de Lyra.

— Será que devemos continuar nos preocupando... digo, será que vão matar mais alguém? — perguntou Marco.

— Eu não sei, não faço ideia — respondi.

— Mas chefia, isso pode ser um problema — falou Roberto, um cara da gangue.

— Pode, Roberto. Com certeza vai ser. Mas... sou um dos líderes, não é? Anastácia e Marco também são, não vamos deixar que algo ruim aconteça com vocês. Vamos tomar cuidado, só isso que eu tenho para afirmar agora.

# # #

Terça-feira, 20 de dezembro de 2010, 03h55min

Eu não estava dormindo bem, a cada meia hora acordava desesperado, arfando enquanto encarava meu suor no travesseiro. Depois de cheio, decidi que deveria levantar e tomar um copo de água, ou até mesmo um calmante. Não sabia o porquê de estar tão cansado, talvez por causa da morte de Lyra, que naquele horário estaria deitada ao meu lado na cama.

Rendi-me ao cansaço de ficar encarando a cama vazia, e desci as escadas para fora do edifício, sozinho na escuridão da noite, ninguém poderia me perturbar naquela hora. Eu, pelo menos, achava que ficaria tranquilo no meio da rua que pensava estar deserta.

Eu estava calmo e relaxado. Meus pensamentos estavam começando a ficar mais calmos, estava quase recuperando o sono novamente. Decidi chegar o grande relógio no meio da rua, acabara de completar quatro da manhã.

De repente, senti uma dor extremamente aguda no meu abdômen. Olhei para baixo e notei que uma tesoura afiada, grande e coberta de sangue estava atravessada na minha barriga, e um sujeito que não consegui reconhecer estava segurando a tesoura, sua capa preta era longa e possibilitava que eu não o reconhecesse.

— O que você está fazendo?! — disse num tom grande de aflição.

Não tive resposta. O sujeito retirou a tesoura da minha barriga, e pude sentir um órgão se desprendendo, foi quando fui empurrado para o chão sem ter como me defender pela dor que estava sentindo, sem contar na falta de sangue que estava começando a ocorrer.

Pude ver um sorriso no meio da capa preta, não consegui reconhecer o rosto, mas o sorriso era medonho.

— Não se aproxime! Socorro! Socorro alguém me ajude!

— Vou ter que te fazer ficar quietinho? — perguntou o atacante, movimentando a tesoura para cima e para baixo, fazendo um barulho com suas lâminas.

— Não! Fique longe!

Ele se aproximou mais e mais, ficando a poucos centímetros de meu rosto. Pude perceber que possuía um cheiro de rosas. Então, abriu as longas lâminas com calma, e posicionou-as dentro da minha boca.

Empurrei sua mão em defesa, o que fez com que meu lábio fosse cortado, ainda melhor do que perder a língua. Esse meu ato rebelde fez ele soltar um grunhido e deixar a tesoura de lado, pegando um machado que não faço ideia de como cabia dentro da capa.

Uma sensação de agonia me tomou apenas de imaginar o que aconteceria se aquele machado entrasse em uso, depois de uma tentativa de cortar minha língua. Felizmente ou infelizmente, essa agonia não durou muito e ficou pior quando tive meus dois braços arrancados com agressividade.

— Agora você não pode me atrapalhar — disse ele, rindo.

— O que você pensa que vai fazer?! — a dor agora estava pior, muito pior.

Rapidamente, pegou a tesoura e colocou dentro da minha boca, cortando a minha língua enquanto soltava uma risada agonizante assim como a sensação de sangue tomando toda a minha boca.

Assim, com aquela sensação terrível, desisti de tentar ficar contra o destino.

´´Lyra, meu anjo... estou chegando´´ pensei, já que não podia mais falar.

Perdi a consciência quando podia jurar ter visto Lyra atrás do sujeito estendendo a mão para mim.

# # #

MARCO

Quinta-feira, 22 de dezembro de 2010, 00h27min

Jean tinha ido. Lyra também. Restava apenas eu e Anastácia para liderar uma gangue de muitos membros fora de controle.

— Nós precisamos e outras duas pessoas pra substituir Lyra e Jean, isso é fato! — falou Anastácia batendo na mesa com leveza, como se estivesse quase desistindo.

— Desculpa chefe, mas não é tão fácil assim — disse Carlos, um dos cinco que tinham nos acompanhado para Tóquio — Quando a galera da Argentina ficou sabendo foi a maior loucura! Fiquei sabendo até que alguns saíram da gangue...

— Fracos — comentei. Nós éramos declarados como uma das maiores gangues da América do Sul, não podia tolerar pessoal mal preparadas — Foi bom que saíram. Não preciso se gente assim na minha gangue.

— Mas Marco... — disse Anastácia — Eu não os culpo, ainda mais na forma que Lyra e Jean foram mortos.

— Até você!? — gritei, um pouco mais alto do que deveria.

— Francamente! Você não tem medo de acabar daquela forma!? Pense um pouco, Marco...

Vi os olhos preocupados e Anastácia e lembrei que esse era o porquê de não querermos ela como uma líder, era muito medrosa. Ainda assim, não podia tirá-la da liderança, o momento estava crítico.

— Tudo bem. Peço desculpas — eu disse, já um pouco mais sobre controle.

— Fique tranquilo, a situação é realmente preocupante — Anastácia tomou um gole de sua quarta xícara de café e sorriu de leve — Vou subir, minha cabeça dói.

— Pode ir. Você vai investigar comigo hoje de noite?

Ela virou e me olhou sem expressão, como se estivesse dizendo para que eu também não fosse.

— O.k, eu entendi. Até mais — respondi ao seu olhar.

Anastácia não respondeu. Ela ficou me olhando durante longos segundos e beijou minha bochecha rapidamente, então subiu para o seu quarto.

# ##

Quinta-feira, 22 de dezembro de 2010, 03h59min

Lá estava eu, parado com a arma na mão, mantendo-me concentrado para qualquer movimento e mudança de ambiente.

A luz fraca da lua encobertada pelas nuvens deixava o ambiente parecer ainda mais sombrio e quieto. Não se ouvia um mínimo barulho, muito menos algum carro passeando pelas ruas cheias de neve.

Olhei para o relógio, 3h59min. Faltava um minuto para o que o destino esperava, e eu estava determinado a não deixar que o fim de meus amigos fosse igual para mim é para o resto da minha gangue.

Chequei novamente para o relógio quando atingiu exatas quatro da manhã.

Olhei para os lados com a arma preparada, esperando o inimigo.

04h00 e quatro segundos. Podia jurar que nada me atingiria, que eu tinha treinamento para uma situação dessas, eu era forte e faria qualquer coisa para livrar meus amigos daquele destino horrível assim como foi com Lyra e Jean, os quais eu esperava que estivessem num lugar juntos e felizes.

Avistei o adversário de longe e apontei a arma, disposto para a provável batalha que estava por vir. Entretanto, meus braços amoleceram quando a luz iluminou o sujeito que usava uma capa preta, mas estava sem o capuz que imaginava que tinha feito muito uso para se esconder.

Eu jamais imaginaria que o assassino fosse alguém tão próximo, ainda mais uma pessoa que era muito inteligente, mas não tinha nenhuma experiência com armas ou ataques, quanto mais alguém que conseguisse matar Jean e Lyra, dois especialistas em combates armados.

Longos cabelos loiros caiam pelas costas, e olhos azul-escuros olhavam para mim. O sorriso que normalmente era sem expressão ou sentimento, agora parecia o sorriso de uma louca com vontade de ver sangue e morte. Anastácia estava a poucos centímetros de mim, apontando um facão enorme na direção da minha garganta.

— Anastácia...

— É, fui eu. A filha imprestável do falecido chefe.

— Eu não... não entendo — senti a voz falhando. Eu jamais imaginaria Anastácia conseguindo fazer algo como matar alguém de forma terrível, ou até mesmo lidando com armas.

— Eu ouvia vocês conversando sobre me tirar da gangue. E, francamente, achavam que eu era idiota? Pararam para pensar que a sede em Buenos Aires era a minha única casa? Se eu não ficasse lá ia ter que morar nas ruas, não tinha lugar pra fugir. Como podiam dizer que eram meus amigos?

— Você podia ter conversado conosco! Não precisava de tudo isso!

— Esse não foi o único motivo — ela disse rindo e colocando o facão apoiado em seu ombro — Sabe o líder da gangue de Foz do Iguaçu que apareceu morto há um mês?

— Espera... eu não acredito...

— Sim, fui eu quem matou o brasileiro. Pobrezinho. Mas foi legal, eu amei! Cortar carne, analisar a carne, é incrível!

— Anastácia, eu não acredito que você fez isso. Matou seus amigos pra suprir suas vontades!? — perguntei, indignado.

Amigos? Vocês queriam me tirar da minha própria casa, vocês são nojentos.

— Anastácia... Fica calma, vamos conversar.

Estiquei as mãos para abraçá-la, dizendo que estava tudo bem, que iríamos voltar para a Argentina no próximo dia e poderíamos viver nossa vida tranquilamente, como ela sempre sonhou. Sorri e abracei Anastácia mesmo sem ela corresponder o movimento.

— Você é desprezível — falou ela e então, para a minha agonia, Anastácia empurrou-me e ergueu o facão com rapidez, fatiando minha garganta.

Vi o sangue começando a cair na neve como se fosse água jorrando de uma torneira.

Cai no chão.

Fiquei olhando para cima quanto ouvia a risada eufórica de Anastácia e pude sentir que ela estava começando a fatiar minhas pernas.

E agora eu, como um defunto recente, te aviso que se um dia você decidir entrar numa gangue, tome cuidado com uma líder específica em Buenos Aires. Ela pode parecer uma inocência quando você a conhece, parece não saber lidar com uma arma e com uma faca. Entretanto, essa mesma líder matou três amigos às quatro da manhã de específicos dias, tudo para suprir sua necessidade de cortar carne.

ANASTÁCIA

Quinta-feira, 22 de dezembro de 2010, 04h13min

Lyra, Jean e Marco. Todos estavam mortos, tinham sido mortos pelas minhas mãos, e eu realmente não me importava, não tinha ninguém para preocupar. Depois da morte de meu pai, não havia mais alguém para dizer que me amava.

Meu pai sempre tinha dito que me amava, eu me sentia satisfeita apenas com o seu amor, não precisava de amigos como eles, apesar de eu gostar de tê-los do meu lado.

Contudo, teve uma noite que meu pai e eu tínhamos brigado, tudo por causa daquela maldita gangue, porque eu não sabia lidar com uma arma. Isso fez com que ele dissesse que eu era uma imprestável, que eu não era a filha que ele desejava.

Então eu decidi mostrar pra ele, mas acabei indo longe demais.

Não importa, sei que quando voltar para a Argentina meu pai estará no meu quarto, sentado na poltrona como sempre fica, assistindo televisão no mesmo canal com a mesma expressão. Mas ele está começando a ficar com um odor desagradável, e as moscas teimam em ficar voando em volta dele.

Tenho que tomar providências sobre isso. Talvez eu compre um perfume japonês, e um óculos pra não ter que ficar olhando as pupilas brancas dele, já estão desagradáveis.

Eu amo meu pai. Amo meus amigos também, pensei em levar o corpo de Marco para fazer companhia ao papai, Marco era um cara legal, era meu melhor-amigo, apesar de ser desprezível de vez em quando.

Eu sei que por mais que eu já tenho feito isso, ele poderia me amar igual, não é? Eu sou amiga dele, assim como era dos outros também, apesar de serem traidores.

Tudo vai continuar bem.


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Notas finais do capítulo

Espero que tenham gostado, eu nunca escrevi uma história de um gênero mais ''macabro'' assim, mas foi uma experiência diferente...Até mais, galera o/