Entre conflito e tristeza e amor escrita por Lulu Tril


Capítulo 1
Droga da opinião social




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Não sei o que acabou de acontecer.

Não, minto. Eu sei exatamente o que acabou de acontecer.

Pela primeira vez na minha vida, recebi um soco do meu pai, Takao Yoshiaki. A minha mãe estava apavorada escondendo as minhas irmãzinhas gêmeas Mika e Saki (inocentes e puras de quaisquer horrores do mundo).

– Você sabe o que está fazendo!?- o meu pai gritou enfurecido. Seu rosto estava roxo de raiva, e tremendo. – Isto... Isto é... Um absurdo!

Eu, estava no chão segurando a minha bochecha esquerda que latejava. Mordi o lábio. Mordi tão forte até que saísse mais sangue além do que saía do corte que fez-se quando me bateu.

Eu queria chorar. Eu queria gritar. Eu queria berrar!

O que eu fiz de errado? O que eu fiz, heim?

Olhei como ódio para o meu pai. E ele retribuiu o olhar.

Nunca o desrespeitei, nunca xinguei dentro de casa e nunca desobedeci. Depois de 16 anos, foi isso que recebi em troca: um soco na cara.

– Amor, acalme-se. – a minha mãe tentou acalmar ele segurando o braço. As pontas dos seus dedos tremiam e o rosto estava pálido. Me senti muito mal pelo estado dela.

– Acalmar? Acalmar!! Como eu posso me acalmar? Se o meu filho é... é...

Ele não queria terminar a frase como se a palavra fosse algum xingamento ou nome do diabo. Mas eu sabia o restante: “Se o meu filho é gay”.

Não é bem assim. Pensei comigo mesmo.

Eu não sou exatamente “gay”. Não sinto se quer uma atração em homem. Acho até as garotas bonitas. O ponto é que eu sinto algo especial por Shin-chan. Não é porque ele é homem. Mas o simples fato de que ele é o Shin-chan. Nenhuma mulher na face da terra teria atração que nem ele tem. NENHUMA.

Então por que eu estou sendo errado? O que ele pode falar do Shin-chan? Ele nem se que o conhece!

Não sabe o tamanho esforço que o Shin-chan faz para ser escolhido pelo destino, não sabe da sua fala engraçada, não sabe do item da sorte, não sabe do Oha-asa, não sabe quanto ele se dedica no basquete, não sabe quanto nós amamos um ao outro, não sabe do seu sorriso de leve que dar só de vez em quando, não sabe da mão delicada quando toca em mim... NÃO SABE DE NADA!!

Mas o que adianta? O homem á minha frente não vai querer ouvir. Nem vai querer escutar as minhas explicações. Que mundo hipócrita e homofóbica. Eu odeio esse mundo. Eu odeio porque não aceita eu e o Shin-chan. Odeio também porque isso entristece-o. E isso, eu realmente odeio.

Sorri sarcasticamente. Tudo aquilo era pura idiotice.

– O que foi? – o pai perguntou mal humorado.

– “O que foi”? O que foi digo eu! Mas que droga é essa!? E daí se eu estou gostando de um homem? E daí se eu NAMORO um homem? É por causa disso que vou deixar de ser gente? É por causa disso que vou deixar de ser o seu filho!? – no final estava gritando.

Ele não me respondeu. Nem se quer olhou na minha cara.

Agora, eu é que estou com raiva.

– Que se dane também!

Bati a porta da sala com força. Subi a escada correndo e entrei no meu quarto. Peguei uma bolsa qualquer e coloquei tudo que encontrei pela frente que achasse necessário. Peguei roupa, material e... E sei lá o que mais peguei. Estava tão fora de si que nem sei o que enfiei na bolsa.

Isso tudo durou dois minutos. Deixei o quarto revirado mesmo. Não dei importância no momento.

Desci correndo a escada e foi quando estava colocando o tênis. Eu parei de amarrar o cadarço por um momento. A minha mãe estava se aproximando silenciosamente até mim. Sabia ante mesmo de virar para trás por causa do Hork Eye. A minha mãe, Takao Kazuha, estava á ponto de chorar. Me apertou o coração e deu vontade de chorar também. Ela agachou-se na minha frente e acariciou a minha bochecha com a palma da mão.

– Onde você vai meu filho? – perguntou com a voz trêmula. – Não se preocupe com o seu pai. Ele só está confuso. Tá? Ele só está confuso. – não sei se ela tentava dizer isso para mim ou para ela mesma. – Não sabe como se lidar com isso. Ninguém dar um manual de pais para a gente. Na nossa época não tinha muito disso. É novo para nós Kazu-kun. Mas... você vai voltar, não?

Foi isso que ela queria perguntar por final.

Aquilo foi como se fosse a última gota d’água. Ela me abraçou fortemente me apertando contra os seus peitos e eu agarrei nela.

Era tão bom saber que a minha mãe estava ali.

Era tão bom saber que ela ainda me considerava como um filho.

– Eu... eu volto mãe. Só vou passar uns dias fora. Até a poeira baixar.

Se é que vai baixar.

– Promete? – diz enxugando as lágrimas que derramaram.

– Prometo.

Ela pegou no meu rosto, tomando cuidado com o lado machucado, e beijou na minha testa. Certas coisas não mudam desde que você entra no primário ou quando estiver no primeiro colegial.

– Você sabe que pode voltar quando quiser tá Kazu-kun.

Assenti com a cabeça. Não conseguia nem falar. Pois se falasse, as lágrimas iriam escorrer, e a última coisa que quero agora é que me vejam chorando.

Terminei de amarrar o cadarço, peguei a bolsa e sair de casa.

Não virei para dizer boa noite.

X

Corri.

Corri que nem um idiota.

Queria arrancar tudo o que tinha acontecido da minha cabeça.

Não queria pensar em nada. Por isso corri.

Ignorando as lágrimas surgindo nos canto dos olhos, contra a minha vontade.

X

Quando cheguei na frente da casa do Shin-chan, estava suado e sem fôlego. Me apoiei no muro até recuperar a respiração. Porém antes mesmo de eu apertar a campainha, o lançador número um da Geração Milagrosa apareceu na porta.

– O que você está fazendo aqui Takao? Sabe que hora que é? – franziu a testa e disse seriamente como costume. Mas era aquilo que eu queria. Era ele quem eu necessitava em todo sentido. Não pensei duas vezes e pulei até ele. Abracei-o fortemente me enterrando no seu tórax. O cheiro do sabonete que ele sempre usa me acalmou. Aquilo era tão relaxante...

– O que foi Takao? Você ficou doido? Você... – ele tentou se afastar de mim, mas quando viu o minha bochecha roxa e inchado, ficou pálido, depois vermelho de raiva. – O que aconteceu?

O tom da sua voz estava muito mais baixa do que de costume. Acho que nunca tinha o ouvido nesse tom quase ameaçador.

– O que foi que aconteceu? – repetiu a pergunta, desta vez mais forte. Agora ele segurava os meus ombros olhando fixamente nos meus olhos. Seria uma cena romântica se não tivesse tanta raiva explícita nos seus olhos verdes.

– Não foi nada Shin-chan.

– Se não foi nada com certeza você poderia falar para mim.

Droga. Me esqueci que ele é super teimoso quando quer ser.

– É que... sabe Shin-chan...

– Quem foi?

Acho que percebeu que eu iria desviar do assunto, então ele mudou a pergunta. Desviei os olhos. Após alguns segundos se silêncio, ele suspirou profundamente e tocou na bochecha inchada com as pontas dos dedos acariciando levemente.

– Alguém te machucou, não foi? Ninguém faz ferida do nada.

Ele não é uma pessoa que expressa muito os seus sentimentos para fora. Mas naquela hora, foi inevitável perceber que estava preocupado comigo. Acho que a minha bochecha está pior do que eu imaginava. Não deu nem tempo de ver no espelho.

Mas se eu falasse, ele se machucaria por dentro também. Pensei vagamente.

Estendi a mão para o seu rosto lindo e acariciei-o. De repente me aproximei e beijei. O que me surpreendeu foi que ele retribuiu o beijo. Mas deixe o espanto para lá. Eu precisava muito dele. Precisava todo dele. Principalmente agora do seu beijo.

Após longo momento de beijo, ele perguntou:

– Foi alguém que eu conheço? Por isso que você não quer fala Takao?

Merda. Ele ainda não esqueceu desse assunto.

– Não é Shin-chan. Duvido muito que você conheça.

– Então por quê? – agora o rosto dele expressava tristeza.

De um jeito ou de outro, vou acabar ferindo-o. Então seria melhor contar de uma vez.

Mas vou ter que admitir. Eu sou um covarde de meia tigela e não tive a coragem para dizer aquilo olhando para ele. Fechei os olhos e virei o rosto em direção ao chão para Shin-chan não me ver.

– Foi o meu pai.

Forcei muito para poder dizer aquilo. Nem sei se consegui dizer certo. Para falar a verdade nem queria admitir que o meu pai não aceitava. Ou pior, que odiava a ponto de me bater.

Abri os olhos lentamente e virei para ele como medo. Arregalei as pálpebras. Agora quem estava olhando para o chão era o lançador. Porém percebi que ele estava cerrando os punhos e tremendo um pouco.

Aquilo doeu tanto, mas tanto!

Peguei a mão dele enfaixado delicadamente.

– Shin-chan... Olha para mim.

Nem se quer se mexeu.

– Olha para mim Shin-chan, por favor. – minha voz saía baixo, e triste. – Você não Shin-chan. Você não. Por favor, não se lamente. Se você fazer isso eu não vou ter mais certeza de nada. Não fique triste Shin-chan. Por favor Shin-chan, olha para mim. Não precisa dizer que me ama, mas olha para mim.

Estava quase implorando. O lançador abriu a mão lentamente e entrelaçou os dedos no meu. Como se quisesse confirmar que eu estava aqui.

Demorou um pouco. Mas acabou virando o rosto para mim. O seu rosto lindamente branco de cílios longos e olhos verdes que nem boneca, a boca macia e quente... Passei o dedo em cada um desses elementos. Não sei. Eu estou o vendo na minha frente, portanto, tinha medo de que ele sumisse que nem fumaça. Queria ter certeza que ele estava lá.

Aproximamos, ao mesmo tempo desta vez, para tocar no lábio do outro. Foi só um celinho. Nunca achei que precisaria tanto tocar nele.

Não seu o que os outros acha. Nojo? Fala sério! Homem e mulher fazem a mesma coisa, ou até coisas mais nojentas!

Abri os olhos para ver os dele fechado, balançando os cílios de acordo com o vento. Como alguém poderia ter nojo dele? Eu sei que ele é meio esquisito. Tudo bem, eu corrijo. Ele é MUITO esquisito. Mas não vi nenhuma pessoa mais honesta e pura do que Shin-chan. O lançador não mente. Não sabe mentir. Sempre vivendo do modo que achasse certo e nenhuma opinião faz mudar a sua postura. Não encontra falsidade no seu olho.

Enrosquei os braços no seu pescoço. Que bom que quase ninguém passa por esta rua. Hoje já bastou o meu pai.

Então ficamos ali, na entrada da casa do Shin-chan, tentando sentir o máximo possível um ao outro para não deixar escorrer as lágrimas que acumularam.


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