Legado de Semideuses! escrita por Lucas Lyu Santos


Capítulo 25
A morte vem montada em dragões.




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Eles marchavam como se estivessem indo para a guerra ou algum filme de suspense. Mais e mais, eles desciam pelo túnel que dava acesso ao campo isolado no meio do nada. As espadas e machados estavam presos aos cintos dos nanicos, e os cabos chegavam a roçar no chão enquanto eles andavam feitos pinguins. Todos os dez anões ponderava uma centelha de orgulho por trás dos olhos que pouco transmitia simpatia. As barbas escuras estavam trançadas com xuxinhas demasiadamente brancas, dando-lhe um destaque bisonho em paralelo com os olhos de quem olhasse. Os uniformes dos cinzentos eram com detalhes puros de prata, e o elemento podia ser visto nas ombreiras e joelheiras que tintilavam de vez em quando. Um longo e curvado pano corria por trás das costas deles, e no final, elas se transformavam em capas de cor negra que ficava a mercê do vento. As laterais dos corpos eram trajadas igualmente com as armaduras debaixo da camisa em tom cinza claro, e no centro do peito uma grande e pavorosa caveira com o slogan de “LIRANIANOS RULES”.

As botas de couro massacravam o chão com veemência enquanto eles se aproximavam de mim. A cor verde fazia um quê especial com as escamas do tal calçado que parecia um réptil morto – gostei disso. Parecia que o jogo do século estava se aproximando massivamente. Queria imaginar o que estariam esperando os telespectadores que gritavam á muitos metros de distância como se fosse uma torcida organizada.

– Vocês estão prontos? – Aril ficou próximo de nós.

– Pera, quantos jogadores são? – Thay perguntou.

– Dezesseis contra dezesseis. – Ele afastou a capa ao lado. – Dois são torreiros; e cada um fica encarregado de proteger o gol das nossas torres, a primária e a secundária. – Aril esboçou um olhar mortífero para os dois que brandiam bastões no lugar das espadas. – Se vocês não rebaterem aquelas porcarias eu arranco-lhes as cabeças, seus patifes! Estão me entendendo, Ednefed e Rosnefed.

– Pode deixar chefe!

– Quatro são torreiros proteze; e eles barram o avanço dos inimigos pra ajudar os torreiros á ficarem um pouco mais tranquilos com os gols, não é mesmo Ocinan, Ogal, Orgen e Onainaril?

– Sim! – Eles concordaram.

– E mais quatro defende as duas bandeiras no topo das torres. – Ele apontou o dedo indicador gordo para os três atrás dele. – Nwod, Onhixiab, Adan e o astro do time, eu!

– Tá, mas e agente? – Bieringuer falou. – Fazemos o que?

– Vocês são serão nossas armas principais! – O cuspe deixava a barba ainda mais branca conforme respingos caíam. – Quero três em cada torre, dois artilheiros e um de vocês roubam a bandeira!

– Por que todos nós não vamos em cima das bandeiras e terminamos com o jogo logo? – Martinato gesticulou.

– Apenas dois podem pegar as bandeiras. E quando pegarem, tem que encostá-las no solo antes que o adversário recupere.

– Quer dizer que de dezesseis jogadores, só dois podem pegar as bandeiras?

– É uma regra. E mesmo que pudesse, não é tão fácil quanto imagina.

– Na verdade é, é igual um caça bandeira. – Martinato rebatou Aril.

– Aé? Então fazemos o seguinte sabichão, você e aquela menina ali. – Ele apontou pra Frascolli. – Vocês dois ficaram incumbidos de pegar as bandeiras. E cuidado com as distrações. – Ele sorriu. – O resto, vocês são os artilheiros, derrubem aquelas torres se preciso, mas marquem quantos gols puderem! E lembre-se, se abrirmos mais de mil pontos na frente ou derrubar as torres inimigas, o jogo acaba.

– Por quê? – Eu o questionei.

– As duas bandeiras equivalem a quinhentos pontos cada uma. Então se estivermos á tudo isso de pontos na frente, mesmo que eles tentem roubar as nossas bandeiras nada vai acontecer. E se conseguirmos derrubar as torres, o jogo acaba por W.O.– Aril nos olhou de cima em baixo. – Espero que esse uniforme também tenha cabido perfeitamente em vocês. Vocês estão... Menos imundos! Agora vamos, os dragões estão a nos esperar.

...

A ideia de nos vestirmos igualmente como eles era realmente perturbador. Lorenna era assustadora, e com escamas de dragão nos pés e uma capa negra a deixava ainda mais maquiavélica. Frascolli parecia que tinha gostado do estilo, pois fazia imitações péssimas do Drácula. Thay, Martinato e Bieringuer falavam sobre suas expectativas no jogo, e algumas gargalhadas ecoavam de vez em quando. Talvez eu fosse o único que o senso de humor tivesse sido afetado, bem... Os acontecimentos de ontem haviam me abalado fortemente e meus olhos ainda estavam inchados. E por mais que Aril fosse um nanico bombado e parrudo, ele defendeu essa informação com um silêncio respeitoso – e ainda mudou de assunto quando os outros me questionaram sobre isso na hora do banho de hoje cedo.

– Escuta... Eu sei que você saiu no meio da noite ontem, e não quero saber o que aconteceu, mas lembre-se o porquê de estarmos aqui. – Lorenna falou baixo para que ninguém além de mim a escutasse

– Tudo bem... Não estou feliz, mas estou focado. – Suspirei.

– Hm, okay. – Ela alisou os cabelos trançados enquanto andava. – Se precisar eu estou aqui Lyu. Só não molha muito meu ombro, se não toma um soco.

– Haaa! Que susto, achei que a filha de Ares tinha ficado gentil. – Caçoei. – Olha que pensamento ridículo o meu.

Nada como um sorriso para disfarçar a dor e mesclá-la em algo totalmente diferente de um pensamento ruim sobre a morte. De fato, eu não a veria novamente. Minha mãe tinha ido para o submundo e o baque dessa notícia não tinha caído sobre mim de verdade, era irreal acreditar nisso. Mas era doloroso, e como era. E infelizmente eu não podia fazer nada... Exceto; vinga-la. E eu o faria.

Quando cruzamos o túnel inúmeras arquibancadas estavam postas envoltas de todo o campo que se transformou em um quadrado tão fustigado de vozes que parecia uma final de copa do mundo. Havia mais de oitenta anões nas arquibancadas, e milhares de criaturas mágicas que também contornavam os bancos com suas presenças esquisitas. Havia ninfas de todos os tipos e gostos, algumas pareciam totalmente verdes e com muitas folhagens em suas peles massivas. Espíritos do vento estavam de termo e se sentavam pouco acima delas, e de vez em quando sopravam furtivamente para que as bandeiras se soltassem das torres adjacentes – até que os anões-guardas de ambos os reinos apreenderam-os. Muitas espécies de fadas flutuantes compuseram as laterais do campo, e enormes humanoides com três braços e pernas também faziam um barulho gutural – alguns deles até manifestavam torcida para os liranianos e tinham uma camisa com o rosto de Aril cuspindo. Os outros, eu não fazia ideia do que seriam. No centro, acima de Hermafrodita estavam as duas rainhas sentadas nos tronos, ambas não se entreolhavam. Contudo, as duas asas estavam juntas em uma almofada vermelha de dourado bem no meio delas.

Elas brilhavam a todo segundo, e estavam com as asas nas laterais dos all stars amarradas com barbante para que não conseguissem zarpar voou. Assim que eu as olhei, retribui um olhar de “está lá” para os outros que logo entenderam o que eu quis dizer. Assim que entramos debaixo de uma das arquibancadas que flutuavam – uma espécie de estaleiro de dragões ficara pronta para nosso time.

– Todos possuem números na frente da camiseta, os dragões não são diferentes. – O meu era o dezesseis, que mau pressentimento.

A cela em que se encontrava o meu dragão era a última, e por isso tive que passar por todos os outros. Todos; como a cor da noite, o preto massivamente repleto de escuridão. Os olhos amarelados me encaravam como se eu fosse o inimigo, e talvez para eles, eu seria uma ameaça magrela ou um banquete de ossos apetitoso. O último, porém, possuía escamas que eram uma junção de preto com verde escuro, havia algo de diferente nos olhos daquela criatura. Ele me encarou tão instintivamente que eu me aproximei sem dar um pio, e notei que os dentes enormes da criatura queriam ir de encontro ao meu corpo – eu tive certeza que ele queria arrancar um pedaço de mim.

– Vamos logo, ameba! – Ouvi o anão gritar lá do número um. – Ele não vai te matar, não ainda. E coloque essa máscara!

Sua coleira – ou sei lá o que aquilo era – estava do lado de fora. Assim que um anão abriu a cela, o dragão veio lentamente em minha direção com as patas rugindo e os dentes cerrados. O verdinho tinha pouco mais de dois metros de comprimento, e suas asas comportavam um grande volume quando ele abriu. Sua altura era também muito formidável, não mais que seus dentes perfeitos e enormes – deduzi que ele levaria cerca de meio segundo para me engolir. Eu sempre odiei répteis com toda a força do meu coração, mas dragões não me deixavam num estado tão precário quanto lagarto e lagartixas. Pode parecer besteira, mas eu não curtia muito aqueles que rastejam, e por mais que aquele bicho esteja fazendo isso agora, ele podia voar – o que pra mim fugia de tal regra. Embora eu estivesse quase me cagando nas calças, nunca considerei um dragão um simples e mero réptil.

– Cara, eu só quero jogar o negócio lá, na boa... – Ele me rodeava como se fosse uma cobra pronta para dar um bote certeiro. – Merda... Só tenho osso fio, vem não. – Meus membros não se mexiam. – Socorro... – Minha voz falhou quando a cauda dele subiu até o meu cabelo e afastou um micro topete para o lado. – Gent... Srcc... – Meus olhos estavam fechados quando a cabeça dele pairou sobre minha mão e ele mesmo fez-me alisá-lo por completo. Suspirei, aliviado, e dei graças por ele não querer arrancar minhas botas de dragões em revolta a sua raça. Cara, mais um pouco e eu precisaria trocar de calças.

Os outros estavam devidamente equipados com seus dragões e com as cordas que seriam uma espécie de cela para eles. Além das máscaras, um ferro negro com apenas buracos para os olhos. Todos, porém, quando eu pensava que estava me saindo bem ele se virava com os olhos arregalados e me fazia embolorar todos os nós que havia dado. Meu medo era um problema, e somando ao fato de que ele podia tentar me devorar a qualquer instante, eram dois problemas.

– Aqueles que os dragões não comeram, venham para o centro do campo. – Eu reconheci essa voz instintivamente quando ela retumbou sobre as catacumbas da arquibancada flutuante que estava logo sobre nós. – Venham logo caramba!

Assim que coloquei a máscara e montei no dragão, fui ao seu encontro. Quando as asas se alargaram eu quase me urinei totalmente nas calças. Elas abriram voou e o verdinho logo as brandiu para que alcançasse a altura do juiz que estava flutuando no meio do campo. Eu o reconheci imediatamente pelos cabelos loiros, era ele, claro.

– Egyash, prazer. – Ele sorria enquanto seus pés balançavam tranquilamente. – Eu serei o juiz de hoje, e acredito que alguns de vocês me conheçam. – Ele deu uma sutil piscadela para mim. – Sou o Recepcionista das disputas dentro das dimensões online, departamento meio-sangue BR. – Ele conjugou as frases com uma centelha de orgulho e entusiasmo. – Como eu não sei que merda vim fazer aqui, vocês jogam e eu apito o que achar que deve ser falta. E também narro o jogo. – Ele nos olhou com um sorriso de “por que eu vim?”. – Vão pras suas posições, onde quer que seja.

Notei que nem todos do time adversário eram anões, haviam também semideuses do outro lado. As máscaras vermelhas deles impossibilitavam reconhece-los, mas como nós, eles também tinham um número consideravelmente bom; sete.

O verdinho – carinhosamente sendo apelidado – automaticamente recuou e ficou próximo ao dragão de Lorenna e Martinato. Suas asas batiam em um ritmo perfeito, ele ficava incrivelmente instável e parado enquanto voava. Sua face medonha vasculhava totalmente o redor do campo, e olhando em volta, a cabeça de todos eles me lembrava do Onix – um dos monstrinhos de bolso da série Pokémon – só que com asas. A montaria era sem dúvida macia, e lembrei-me prontamente de Astolfa e como ela estaria sem mim. Fazia um bom tempo que não a via e acariciava os pelos brancos do meu Pégaso.

– Um... – Egyash disse. As arquibancadas flutuantes fervilhavam em prol dos gritos vindo dos assentos. Eu os olhei estupefato, e depois voltei minha atenção para o meu time que estava ansiando para o começo da partida. – Dois... – Os dragões soltavam fumaça pelas bocas entreabertas e logo deixavam o campo tenso. Reparei que os torreiros eram os únicos que estavam sem os dragões, já que eles ficaram entre as janelas da torre para proteger das bolas com os bastões. – Dois e meio... – Thay assoviou próximo de mim e me jogou uma bazuca que era larga no começo e ficava fino onde se empunhava. Ela não era tão pesada e tinha um lugar no dragão onde poderia prendê-la. Todos estavam com uma, exceto; os dois que iriam roubar as bandeiras. – Três!

Quatro tiros simultaneamente aconteceram no mesmo segundo que Egyash começou a partida. As quatro lancers, até onde consegui ver, lançou três bolas cada uma. Eu sabia que algumas delas os próprios dragões usariam como armas, enquanto as outras, as normais, serviriam perfeitamente dentro da minha bazuca. Meu arco havia sido substituído por uma espada curvada, e ela balançava conforme meu dragão mergulhava desviando dos anões alaranjados que vinham com sangue nos olhos e espadas de uma mão, bazuca em outra. Eles nem se importavam com a possibilidade de serem arrancados da montaria e voar diretamente á trinta metros de altura até o chão. Talvez a prática deles fosse suficientemente sincronizadas com os dragões para tal confiança.

As máscaras feias e as carrancas das criaturas vinham em minha direção todas as vezes que eu tentava sobrevoar a área com intenção de pegar uma das bolas que flutuavam. Eis que, de todas as doze bolas que foram expelidas pelas lancers, apenas uma restou. Adiantei os dedos sobre a corrente e puxei para que o verdinho fosse rapidamente até o encontro dela, e ele tomou fôlego para ir e bateu suas asas em uma magnificência que me deixou de queixo caído. Ele girou assim que percebeu que uma bola explodindo em chamas vinha em nossa direção, e ela passou zunindo em torno do meu ouvido. Eu senti o calor das chamas atravessarem o campo assim que ela explodiu em mil pedaços flamejantes.

O sabor de adrenalina ardia toda vez que eu tentava engolir a minha saliva. Ela entalava em minha garganta como se fosse um veneno, e todas as vezes que eu a conseguia empurra-la garganta abaixo, um gosto totalmente ardil me incomodava. Minha mão direita estava ancorada na bazuca e pronta para englobar a bola para usá-la como arma. Mas quando o verdinho chegou tão próxima dela, um mascarado tomou-a em sua posse e a capturou dentro de sua arma.

Filho de um... O vento carregava um ar totalmente de tensão. E como se eu estivesse em câmera lenta, pude ver claramente o caminho que meu dragão usou num rodopio para escapar da colisão. Nesse momento eu passei de cabeça para baixo e poucos metros do montador que, assim que nossos olhos cruzaram ele mostrou-me o dedo do meio como prova de sua vitória. Meus dentes cerraram complemente e naquele momento o que eu mais queria era socar aquele individuo até ele cair e esparramar os miolos no chão. Mas, um sorriso cruzou meus lábios quando Lorenna soltou um grito ensurdecedor dois segundos depois do nosso contato visual.

Ele se lascou. Com a cabeça para trás eu prestigiei a filha de Ares saltar sobre o seu dragão e pousar desgovernadamente em cima do outro animal mascarado que quase tombou com o impacto do corpo de Lorenna em suas costas. Ela tirou sua adaga da cintura e escalou o monstro pelas escamas até chegar ao anão, que por sua vez, estava prestes a refazer o caminho da torre secundária e aplacar a bola entre a janela de Ednefed. Embora ele tenha demorado em perceber o que estava prestes acontecer, ele se virou tão facilmente que recebeu o soco bem no meio da bochecha que o arremessou para fora do dragão. Ele despencou lindamente deixando a bola flutuando no ar, que aquele ladrão havia roubado de mim, e após Lorenna ter pulado e remontado em seu dragão. Ela rapidamente sacou sua bazuca acoplada no dragão e a capturou. Ela foi abruptamente para o ataque.

Se aquele anão sobreviveria eu não sei, mas que ele estava ferido, isso eu podia afirmar com toda a certeza. Deixo claro que se fosse eu no lugar da morena, tinha arrancado com muita firmeza aquele dedo hostil. Embora o dragão dele houvesse mergulhado para socorrê-lo, acredito que ele não conseguiria pegá-lo a tempo. O anão se espatifaria. Todo o time laranja gritou em uníssono pedindo falta, mas tudo que o juiz disse foi, “falta de habilidade, foi tudo certinho. E vai Loog!”

– E olha lá, Lorenna está com a bola e... Que golaço! Gente, até o anão laranja ficou com medo daquela brutal garota. – Egyash estava com um microfone acoplado em sua boca. – Cinquenta á zero! – Ele interrompeu. – Não, gol dos laranjas! Zelo, Magazine Luiza e Casas Bahia, que loucura é isso! Cinquenta á cinquenta!

A voz do garoto era reproduzida em todos os cantos do estádio aberto. E, de vez em quando alguns telões apareciam diante das arquibancadas e mostrava o lance que culminara em um gol. A partida ficava ao todo violenta a cada minuto que se passava. Meu dragão desviava, expelia as bolas explosivas e até conseguia rodopiar escapando dos proteze, que com sangue nos olhos vinham em fúria para cima de mim. O que dava a oportunidade para Thay e Bieringuer fazerem dois gols cada um. O placar marcava agora Trezentos e cinquenta á Duzentos para os liranianos, e Aril já tinha distribuído seus cascudos para os torreiros que não conseguiram alcançar as quatro bolas que tinham entrado na torre. A cada gol, um estrago. E a cada estrago, mais chances do jogo acabar. Mas meus olhos não desgrudavam das sandálias aladas que estavam amarradas e de longe percebia o olhar frio da rainha Laura que nem ao menos se importava de seus cabelos vermelhos – como as chamas – esvoaçassem perante os ventos que levantavam poeira. Os olhos negros exibiam tamanha diferença com os da outra rainha que não esboçava qualquer reação, já ela, esgoelava-se perante seus jogadores e falava cada palavra que eu acho bem melhor nem citar. Mas até que ela me passava uma imagem divertida e extrovertida.

Mais uma vez o estampido irrompeu dos lancers que expeliram mais bolas normais e explosivas. Ao longe houve o barulho de aço retinindo e notei Martinato quase sendo derrubado por Arual que veio barra-lo no momento que ele tentaria roubar a bandeira. Ignorei-o um pouco, e do outro lado Frascolli estava com uma ampla vantagem dos seus perseguidores que passaram tão secamente entre o rodopio do dragão dela, que a moça simplesmente rogou um feitiço de zombaria no ar que deu resultado imediato de irritação dos dragões adversários. Eles perderam o controle.

– Opa, aquilo foi um feitiço? Pode parar com a palhaçada, falta pro time dos laranjinhas e vai tacar feitiço na mãe! – Egyash flutuou perto dos dragões e disse algumas palavras que fizeram os dragões voltaram novamente em si.

Assim que o juiz e narrador virou suas costas houve um lampejo e Adan voou longe de seu dragão bem diretamente de cara na torre. Seu corpo se prendeu como se fosse um desenho animado e ele foi arrastando com a face até desgrudar e ser lançado para baixo. O adversário então, aproveitando desta jogado “cega” para os olhos do juiz, aproveitou para marcar dois gols com suas bazucas que eclodiram dentro das torres primárias e secundárias. O alarme tocou, Trezentos e cinquenta á Trezentos.

– Juíz, seu filho de uma ameba, isso foi falta! – Aril gritou assim que conseguiu pegar o corpo de Adan. – Olha só, ele até está inconsciente. – E como se percebesse que o dragão do anão estava abaixo, ele deixou que o corpo caísse ao seu lado. Por sorte, ele pousou bem nas costas do dragão e se fixou por lá mesmo.

– Cale sua boca barrilzinho de chope, quem manda aqui sou eu! – Ríspido, Egyash terminou.

Indiferente de haver uma falta aqui e ali, o jogo não parava. Havia cerca de quatro torres, e as quatro estavam sofrendo ataques repetidamente para que as bandeiras fossem roubadas.

Mesmo não tendo feito absolutamente nada, o verdinho bailava entre os ares e os proteze que vinham brutalmente tentando me derrubar para o tártaro. Uma bola explosiva veio tão fortemente em nossa direção que se não fosse a voraz boca do verdinho para engoli-la e envia-la de volta, teríamos virado alguma coisa a milanesa.

As lancers ficavam sempre aos cantos do estádio como se fossem canhões flutuantes prontos para jorrar bolas para os artilheiros. Entrementes, elas tinham vontade própria e só lançava uma determinada quantia de instrumentos por rodada. Quando uma quicou bem na minha frente, a bazuca que eu segurava na mão destra a englobou perfeitamente. Estive no meio das duas torres inimigas, cada uma localizada vinte e cinco metros da outra e sempre nas extremidades. A primária era a mais alta, erguida com exuberância e tijolos que brilhavam. Enquanto a secundária era menor e igualmente iluminada, porém com despojos de que algum dia fora algo bonito. Por hora só havia uma única bola em jogo, e ela estava comigo. Não demorou muito para que eu pudesse ouvir a torcida gritar excitada, e olhos se voltaram em mim como se eu fosse um pedaço de carne.

– Derrubem-no! – A voz fluiu desde a janela da torre inimiga até os proteze que zumbiram com a ordem. – Derrube ele, derrumbeeeeeem agora! – Até mesmo a rainha dos laranjas entrou em uníssono com os torcedores que estavam em pé.

Notei um ligeiro e minúsculo reflexo de aço que veio de encontro aos meus olhos. Um anão, o mais distante da torre exibiu sua arma em mãos e vinha com seu dragão rugindo em minha direção. Até mesmo os proteze da torre secundária deixaram seus postos para vir em socorro á primária que estava sendo mirada como alvo por mim. Uma parede de quatro dragões e anões aparecerem tão prontamente que o verdinho se assustou com uma abocanhada que quase levou em sua cauda. Os dragões não se importavam nem mesmo uns com os outros. Ele passou tão batido que mesmo se pegasse o retorno em meio ao ar, ele não nos alcançaria. Desta forma, haviam apenas três que não tardaram em cercar o meu avanço, mas o verdinho mergulhou como se fosse um golfinho em busca da água depois de um longo e perigoso pulo.

O vento roçava meus olhos e mal conseguia abri-los em meio á velocidade que o dragão descia pelos ares como se fosse uma bala em ascensão. Meus pensamentos nublaram como se fosse o dia mais frio e chuvoso de todos os tempos, e os trágicos pensamentos já dilatavam minhas pupilas que se amedrontava a cada instante.

– Ele vai diretamente para o chão, freia isso ai amigo. – Egyash esbravejava. – E ele continua, são quinze, não, dez metros do chão! E ainda está sendo perseguido pelo dragão do anãozinho barra pesada do Zeugnimod, por sorte ele é gordo demais e ta atrasando seu próximo dragão. – Ele continuou exasperado e em seguida, muito excitado. – Até Hermes deve ta vendo isso, deuses!

Minha mão esquerda segurava tão intensamente a corrente que estava envolto do dragão que eu o deixei seguir as próprias instruções naturais do animal. Coloquei a bazuca entrelaçava no prendedouro e me certifiquei que assim como ela, eu não seria pego pela alta corrente de ar que elevava qualquer um do assento. Fui de encontro ao pescoço do verdinho, e agarrei-o pesadamente para me segurar enquanto os olhos negros nem ao menos desviavam do chão. Vá com calma, vamos lá... Eu o disse, e ele rodopiou para o lado e abriu as asas para que o vento pudesse estabilizar a nossa altura, o anão passou diretamente e foi de encontro ao chão.

– Que espetacular! – Gritou o narrador. – Gente acho que vou trocar minhas calças por que me borrei todo com isso tudo, que fantástico! – A torcida gritava. – Entrem as fadinhas e curem Zeugnimod, se ele estiver vivo. Mas não tirem os olhos do Lyu, ele agora está retornando feito uma bala em direção ao torreiro. – Egyash estava maravilhado.

Eu definitivamente estava tão concentrado que ouvi apenas as palavras vivo e Lyu. Mas, quando retornamos á mesma altitude notei que até mesmo os próprios artilheiros se emparelharam sobre o gol que ali estava. As perseguições agora ficavam totalmente mais perigosas, eles atacavam com intensão de me tirar do jogo, e não, para roubar a bola. Assim que o verdinho retomou ao lance e contornou em pleno o ar, uma semideusa – os cabelos negros corriam por fora da máscara – simplesmente deixou que meu dragão ficasse lado a lado com ela sem que me atacasse. Nossos olhos se encontraram, e estranhamente eu achei que ela tinha piscado para mim.

– A artilheira teve a chance de derrubar o Lyu, mas não o fez. – Ouve-se o murmúrio da torcida. – Mas olhem lá, a outra semideusa está indo em direção do filho de Apolo e vai esmaga-lo, vai Giu!

Minha visão foi abruptamente ofuscada por uma sombra e assim que mirei meus olhos para cima, uma enorme e maléfica criatura estava pronta para mergulhar com a sua dona exibindo suas duas espadas. Ela alcançou-me tão facilmente, que eu fiquei abaixo dela sem ter para onde ir, já que outros dois estavam bloqueando a passagem da frente. Eu estava terrivelmente encrencado.

– OLHA AQUILO, E DEPOIS EU QUE SOU FILHO DA RIVALIDADE? – Egyash esgoelou-se. – ESTOU CHOCADO, LORENNA SE ATRACOU COM GIU E SALVOU LYU MAIS UMA VEZ.

O breve suspiro deu-me forças para tentar alguma manobra ousada para cima dos dois únicos proteze que residiam em minha frente, mas, uma louca loira apareceu do nada e usou seu dragão para arremessar um deles á metros de distância. Que sorte eu a tê-la como aliada, que sorte Thay ser filha da deusa da sorte. Menos um, então, mas minhas orações foram subitamente atendidas quando Bieringuer meteu a espadada esquisita no meio da lombar do anão que urrou de dor. Se não bastasse, o dragão escuro de Felipe deu-lhe uma abocanhada na pata do único proteze restante, isso foi suficiente para abrir caminho para mim.

– DERRUBEM-NO! – Arual gritava lá de cima, ele também era um proteze, contudo, sua função era defender a bandeira junto aos outros três; dois em cada torre. Eles foram os únicos que não largaram suas posições.

– BIERINGUER DERRUBOU UM, LORENNA OUTRO E THAY FINALIZOU O GRUPO DOS PROTEZE PRIMÁRIO, AGORA OS ARTILHEIROS JÁ NÃO ALCANÇAM LYU! – A voz ficou absolutamente alta na minha cabeça. Eu tirei a bazuca e o mirei, analiticamente no buraco da torre. – E ELE DESEMBAINHOU A BAZUCA, MIROU E... GOLLLLL!

O murmúrio da torcida acinzentada explodiu no campo que delirava com o gol que havia sido arremetido por mim. Meus pelos levemente se eriçaram, e eu quase entrei em colapso com tantos olhares e urras vindo em minha direção, eles eram intermináveis.

Mas, os aplausos se prolongaram tanto que eu mal notei que eles mais gritavam por que Martinato estava em um mergulho fatalmente com a bandeira da torre primária em braços. Se ele conseguisse jogá-la no chão, ganharíamos quinhentos pontos. Todos foram em seu encalço, exceto; os dois guardiões da bandeira secundária, os dois torreiros e dois artilheiros da equipe adversária que ficaram simplesmente parados observando Martinato. Mas em vão, assim que o garoto ficou á cinco metros de altura ele arremessou o fino cabo da bandeira que se fincou no chão.

– QUINHENTOS PONTOS PARA OS LIRANIANOS! – Egyash berrava de excitação. – SE CONTINUAR ASSIM OS LAURIANOS VÃO PERDER... DROGA, PERDI. – Três apitos surgiram. – VAMOS DAR UMA PAUSA, EU PRECISO IR NO BANHEIRO E NÃO SEI POR QUE TO GRITANDO.

A excitação da torcida fora se acalmando enquanto todos se retiravam do campo de jogo, ou melhor, do campo de guerra. Alguns do time adversário retiraram os capacetes e pude ver claramente a faceta atraente de outra filha de Ares conhecida como Giuliana Reis, renegada. Como se não bastasse, assim que desmontamos de nossos dragões e ficamos em direção oposta do outro time – que estava cerca de vinte metros em baixo de outra arquibancada que servia como vestiário e recanto dos dragões – mais quatro renegados se prostraram ao lado dela. Luckas, o filho de Atena. Cody, a cria de Afrodite. Perin e Caique, ambos filhos de Hermes. Ao que me lembrava havia mais dois semideuses que estavam jogando, mas quem poderiam ser? Eles nos encaravam com um olhar sanguinário. Todos, com as mãos no peito ou na cintura espreitando algum momento para nos atacar.

– Sabemos que vocês estão aqui para o mesmo propósito que nós. – Giuliana disse, séria.

– Aé mesmo? Sério querida? Não me diga. – Lorenna rebateu. Martinato, Thay, Bieringuer, Frascolli também estavam ao meu lado.

– Hmm. – Ela sorriu de forma misteriosa. – Lorenna Kogawa, minha irmã que se acha o centro do universo e a preferida de nosso pai.

– Filha eu não me acho, eu sou. – Ela cerrou os punhos. – E acho melhor calar a boca ou eu mesma vou até ai e faço esse favor.

– Estão abusados, ultimamente. – O garoto de óculos nos fitou severamente enquanto bradava calmo. Logo, ele havia tomado a atenção para si. – Escrevam o que eu digo; ao menos um de vocês nunca mais vai voltar a ver o sol.

– O que esse menino tem de bonito ele tem de metido, me segura rosana, me segura se não meto a mão na cara desse moleque! – Frascolli deu umas gingadas de capoeira.

– Hm, é sério isso? – Perin riu, ironicamente. – Vocês são sempre tontos assim, ou...

– São retardados? – Caique completou. – Mesmo sendo paus-mandados dos deuses, deveriam se comportar de uma maneira menos idiota. Idiotas.

– Se fala demais heim otário, vamos resolver agora na espada, vem logo. Vem. – Martinato foi em direção dele quando Egyash apareceu no meio.

– Aquietem o cú os dois times. – Ele simplesmente estava com uma roupa de monge. O que destacou plenamente o seu grande corpo. O vento soprava frio naquele lugar. – Querem brigar? Eu brigo com vocês e mato todo mundo antes que vocês pisquem. Agora se querem se matar façam isso lá em cima, não aqui em baixo. Estão me entendendo?

– ... –

– Ótimo, andem, seus... – Ele me pareceu pensativo. – Preciso achar o banheiro, onde fica? – A rainha liraniana vinha em nossa direção.

– Não sei... Por qual motivo eu usaria o banheiro?

– Você num caga?

– Não, por que eu sou uma rainha, procure logo e vê se não suja meu terreno, meus escravos limparam esse lugar hoje.

– Ah, bakayarou...

E ele finalmente desapareceu num véu de fumaça. Entreolhamos, e os renegados ainda estavam nos olhando de forma questionável. Me pergunto se Hermes estaria vendo toda essa disputa calado, e é claro que estaria. E por um segundo, sobre os olhares maquiavélicos e sorrisos malignos dos renegados. Eu tive completa certeza de como a segunda parte do jogo seria tão sanguinária como a primeira; a ordem agora é matar.


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