You don't have to believe me
But the way I, way I see it
Next time you point a finger
I might have to bend it back
Or break it, break it off
Next time you point a finger
I'll point you to the mirror

Playing God - Paramore

Terminei de amarrar a ponta de minha trança loura, me olhando no espelho. Lauren havia deixado claro que queria que eu fizesse o meu melhor pra estar "apresentável" enquanto circulava por sua casa, e era isso que eu estava tentando fazer.

Eu havia trançado meu cabelo com capricho e enfeitado com uma faixa azul clara; havia passado e engomado meu uniforme preto com detalhes brancos e usava as sapatilhas pretas que vinha junto com o uniforme. Me olhando no espelho que ficava atrás da porta do meu quarto eu parecia até bonita.

Dobrei meu uniforme de escola e o guardei em meu armário. Meu quarto era minúsculo, mas seu espaço era bem distribuído. As paredes tinham papel de parede de rosas, um armário de madeira marrom médio e uma cama pequena de madeira também. Eu tentava ao máximo manter as coisas organizadas, era uma das regras da casa dos Marion, arrumação total.

Depois que acabei parti para a cozinha ver minhas obrigações com Paula, Lauren sempre entregava as tarefas pra ela. - Boa tarde - Cumprimentei ao entrar na cozinha.

– Boa tarde Lucy, como foi a escola? - ela perguntou.

– Foi boa, normal... A Senhora Lauren te entregou a lista das tarefas hoje? - Perguntei a fim de acabar minhas obrigações logo.

– Está aqui - ela me entregou um papel com as tarefas e em seguida se voltando para a panela que preparava o feijão - Vá logo, a senhora Lauren só foi dar um recado pra seu pai e já está voltando... Oh meu Deus, Christopher!

Segui seu olhar, assustada, e a visão me fez derrubar a folha de trabalhos. Chris estava apoiado no batente da porta de entrada com os cabelos bagunçados, um enorme roxo em volta do olho direito e um corte nos lábios finos.

– Oh, meu Deus! - disse tampando a boca com a mão.

– O que aconteceu com... - Paula começou mas foi logo interrompida por Chris

– Não há tempo pra explicar, me ajudem a ir pro meu quarto antes que minha mãe veja - seus olhos estavam suplicantes.

– Certo - Paula respirou fundo- Certo. Lucy, querida, ajude Chris a subir para o quarto, eu já vou.

Assenti. Me virei pra Chris e pus um de seus braços envolta de meus ombros e caminhei com ele por entre a cozinha. Parei na esquina que dava à sala pra ver se Álvaro estava por ali e continuei o percurso quando percebi que não estava. Subir as escadas foi mais difícil, já que Chris parecia dolorido e cada degrau era um novo gemido de dor.

Chegando ao seu quarto o deitei delicadamente na cama, ajeitando seus travesseiros para ele ficar mais confortável.

– Muito obrigado, Lucy - ele disse segurando meu pulso - Por favor, não conte pra minha mãe, as coisas só vão piorar se ela souber.

– Não vou contar, prometo - lhe assegurei- mas quero saber o que houve. Quero saber se posso ajudar.

Antes que ele pudesse me responder qualquer coisa Paula entrou no quarto com uma maleta de primeiros socorros e os botou do lado da cama de Chris.

– Meu menino - ela disse com os olhos cheios de água- o que houve? - ela perguntou enquanto passava um pano úmido sobre o machucado no lábio inferior do rapaz.

Chris se aprumou na cama enquanto fazia uma careta de dor.

– Stephenie e sua gangue aconteceram- ele disse de maneira raivosa- Odeio ir falar com Stephenie no colégio, mas desta vez tive que ir, não sabia se ela ia vir comigo ou sair com o namoradinho estúpido dela. Eu não queria ser responsável por mais uma briga familiar.

"Quando eu cheguei lá ela estava sozinha, eu fiz a pergunta que queria fazer desde o começo e ela me respondeu com grosseria, como sempre. Eu devolvi a resposta atravessada então o namorado dela apareceu por trás de mim e começou a falar que eu não devia falar assim com Stephenie, que eu era um perdedor e outras coisas ofensivas e eu apenas tentava sair de perto dele só que ele não deixava então eu o empurrei"

Suspirei tristemente. Na minha escola também tinha garotos dessa maneira. Valentões que achavam que eram os donos do mundo quando na verdade não eram ninguém.

– Foi o que bastou- Chris continuou- ele começou a me bater, bater muito e quando tentei revidar os amigos dele também vieram pra cima de mim.

– Que covardia! - eu disse indignada.

– E Stephenie? - Paula perguntou- Não fez nada? -ela parecia aterrorizada.

– Só quando eu caí no chão de dor - ele disse. Chris tinha os olhos cheios d'água mas mantinha o maxilar travado - Iria dar problemas demais para o namorado dela.

Paula balançou a cabeça em reprovação.

– Essa menina está cada vez mais terrível. - disse ela enquanto aplicava uma pomada sobre o hematoma no olho de Chris.

– Muito obrigado Paula- Chris lhe agradeceu- Eu só quero que vocês não contem para os meus pais, por favor - ele praticamente implorou.

– Como eu já disse eu prometo que não vou contar - eu disse.

– Eu não sei- Paula disse enquanto guardava as coisas de volta na maleta- Talvez seus pais pudessem resolver isso...

– Eles não vão Paula -Chris a interrompeu- Nós dois sabemos que não vão. Eles vão passar a mão na cabeça de Stephenie como sempre fazem.

Um silêncio incômodo se instalou no quarto. Chris parecia melancólico, eu estava apreensiva e raivosa com Stephenie, Paula parecia estar presa em um dilema interior.

– Paula! Lucylle! Alvaro! - a voz de Lauren cortou o silêncio da casa - Onde vocês estão seus imprestáveis?

Não me contive e revirei os olhos enquanto começava a me levantar.

– Lucy, fique. - Paula disse enquanto se levantava - Ajude Chris no que ele precisar enquanto eu arrumo uma desculpa para a Senhora Lauren. Cuide-se meu menino. -ela disse enquanto saía do quarto.

Um silêncio constrangedor se instalou entre mim e Chris e eu já sentia minhas bochechas ruborizando.

– Lucy - Chris disse baixo- pode me ajudar a chegar no banheiro?

Pisquei algumas vezes desorientada.

– Ah, claro!

Me aproximei de sua cama pondo seu braço por cima de meu ombro novamente e o levei até o banheiro.

– Muito obrigado, pode deixar que daqui eu me arranjo - ele riu nervosamente e eu o acompanhei.

Outro silêncio constrangedor.

– Bem, posso mexer no seu guarda roupa? Sabe, pra achar uma roupa pra você - falei rapidamente. Estava cansada de silêncios vergonhosos.

– Claro - ele disse- Bem, depois que você pegar, pode ir indo. Não quero que você se encrenque com minha mãe por minha causa.

Assenti, as vezes não me acostumava com a doçura de Chris.

– Tudo bem, eu vou - lhe disse- Mas, qualquer coisa, qualquer coisa mesmo, você pode me chamar.

– Muito obrigado de novo Lucy - ele estendeu a mão e acariciou a ponta de minha trança- você está linda hoje.

Devo ter corado mil tons de vermelho, mas meu sorriso pareceu deixa-lo contente.

– Obrigada, vá tomar seu banho... - eu disse enquanto encostava a mão na maçaneta.

– Até mais senhorita Lucy - ele sorrindo pra mim

– Até mais senhor Chris - respondi sorrindo também enquanto fechava a porta.

Demorei a sair do quarto o suficiente pra ouvir Chris cantar. E a voz dele era maravilhosa.

{♥}

Estava passando o pano sobre a mesinha de centro da sala de estar quando Alvaro abriu a porta para Stephenie e um garoto entrarem.
Por algum motivo eu já sabia que aquele era o namorado de Stephenie. Logo abaixei os olhos, poderia ser de minha irritação começar a ficar visível.

– Onde está minha mãe Alvaro? - ouvi Stephenie perguntar.

– Acho que está lá fora, senhorita. Você sabe, controlando o novo designe do jardim - Alvaro respondeu prontamente.

– É bom que ela realmente esteja lá - Stephenie resmungou enquanto jogava os cabelos por sobre um dos ombros- John, querido, me espere aqui eu já chego.
Stephenie conduziu o garoto pra perto de onde eu me encontrava e pude ver melhor seu rosto.
Ele era bem diferente de Chris. Era alto e musculoso. Sua pele era bronzeada, ele tinha olhos castanhos escuros e cabelos negros em um corte militar.

– Vá lá princesa - eles trocaram um selinho e ele lhe deu um tapa em sua bunda. Stephenie riu e enquanto saía seu olhar prendeu-se em mim e seu sorriso morreu. Achei que ela ia dizer alguma coisa mas então ela apenas se virou e andou rapidamente até a cozinha.
Alvaro seguiu Stephenie e eu continuei minha limpeza na mesa. Parecia uma tarefa fácil, mas Lauren me fazia esfregar o vidro em movimentos circulares e de leve para não arranhar.

– Onde está o viadinho do Chris, hein?- o garoto disse de repente.
Levantei os olhos rapidamente e percebi que ele olhava pra mim. Os abaixei novamente, temerosa.

– Eu sei que você estava cuidando dele vadiazinha -ele disse se ajeitando na ponta do sofá- Seu uniformezinho patético está manchado -ele sorriu debochado.
O olhei de maneira dura. Queria responder que não era da conta dele, que ele deixasse Chris em paz, que ele era um grande idiota, mas dizer isso era pedir para ser expulsa da casa dos Marion e não poder ajudar minha mãe. Desviei os olhos de novo.

– Me responda cadela - minha trança, que antes fora tão docemente acariciada por Chris foi puxada pra baixo com força pelas mãos grossas daquele menino desconhecido - Não me olhe com essa cara insolente, você não é ninguém está me ouvindo? Você é...

– John! - A voz de Stephenie ecoou pela sala- Solta ela!

O menino soltou meus cabelos e me olhou com raiva.

– Vá embora daqui! - Stephenie disse pra mim- E não ouse abrir essa boca pra minha mãe.

Engoli em seco e passei correndo por eles em direção ao meu quartinho. Chegando lá me sentei no chão e pus a cabeça entre os joelhos e me segurei pra não chorar. Eu não iria chorar.
Talvez viver nesta casa fosse mais difícil do que eu imaginava.