The Cruel Beauty escrita por Tsu Keehl


Capítulo 24
Capítulo 24


Notas iniciais do capítulo

Olá pessoal, como estão?
Finalmente um novo capítulo da fanfic e como é de praxe, peço desculpas pela demora mas, pra variar, estive em uma correria danada esses últimos tempos inclusive por conta do meu aniversário (sim, Cruellinho ficou mais velho heheh). Quero agradecer imensamente á todos os comentários e incentivo...pessoal, sem o apoio de vocês, essa fanfic não estaria até agora sendo produzida! Tento compensar meu atraso em atualizar a fanfic, fazendo o melhor possível em cada novo capítulo e também movimentando a fanpage do Cruello com fotos, vídeos e coisinhas.
Esse capítulo foi um pouco difícil de escrever mas pude contar com a ajuda das minhas lindas migas Hime e Lari que são minhas respectivas Igraine e Cruella. E ao meu primoso Renan pelo apoio e disposição caso eu precisasse de algo (ele é o Alfred!). Obrigada, gente!
Bom, mas chega de papo e vamos ao capítulo né non, monamú? XD



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/491872/chapter/24

~*~

Cruella Devil.
   Ali estava ela. Alta, magra, com seu olhar soberbo e constantemente repleto de fúria e desprezo. Cruello sentiu todo o seu corpo gelar e os batimentos cardíacos acelerarem. Sempre fora condicionado ao ceticismo e tinha orgulho de sua postura cética. Quando realizara o ritual, o fizera mais por impulso, em uma necessidade desesperada de ajudar a clarear os próprios confusos pensamentos. Não acreditava mesmo que alguma coisa real poderia acontecer.
Mas ali estava Cruella Devil, ou melhor, a alma dela. Invocada diretamente do mundo dos mortos.

   Essa constatação causou uma avalanche de pensamentos na mente de Cruello: os registros históricos, os boatos da família Devil acerca de pactos de bruxaria, filmes de terror, a vez em que encontrara um tabuleiro de oujia no porão, os registros de ligação da família com seitas duvidosas e a certeza que cometera um grande erro e não tinha como voltar atrás.
     Ele encolheu-se mais na poltrona soltando um gemido que atraiu a atenção de Cruella.

— O que diabos eu estou fazendo aqui?! Porque você me chamou?!
— ..e-eu...e-eu...
— DESEMBUCHA, MOLEQUE! Pare de agir como uma bicha medrosa! Endireite esse corpo, arrume a postura, vista-se com um casaco de peles e seja um Devil!

     Ainda tremendo, Cruello obedeceu. Exceto pelo casaco de peles pois não havia nenhum ali. Ao perceber isso, Cruella tirou o próprio casaco de peles e o estendeu ao sobrinho.

—  ...pegue.
— Por quê?
— Ora, por quê?! Você é um Devil idiota! Precisa SEMPRE usar alguma roupa ou acessório feito com pele animal!
— Eu não vou colocar esse casaco!
— ...O QUÊ?!
— Digo...digo... – diante do olhar demoníaco da mulher, Cruello se justificou. – Eu tenho os meus próprios casacos e ...e está calor aqui! – ele se empertigou. -  Obrigado por oferecer seu casaco, titia. Mas ele fica muito melhor na senhora do que em mim.
— Isso é verdade! – ela tornou a vestir o casaco. – Não queria emprestar mesmo. Só ofereci por educação e porque você é meu único herdeiro! Eu acho...será que poderia,..,não, acho que não...mas...
— O quê..?
— NÃO TE INTERESSA!
— ...mas  eu não disse nada...
— MAS PENSOU! Seguinte...posso saber porque você me chamou aqui?! Nunca acreditei que você teria a capacidade para fazer esse tipo de coisa. – ela observou os resquícios do ritual no chão. – Já vou avisando que não irei responder  nada á respeito de vida após a morte, reencarnação, coisa espírita, sentido da vida, o que há no fim do túnel nem nada disso! Eu não quero responder há nada e mesmo que eu quisesse sou proibida por leis universais do submundo!
— ...não quero respostas para enigmas da humanidade... – ele resmungou. – A tradição Devil sempre ensinou que, quando um Devil estivesse diante de um impasse que não conseguisse lidar e resolver, poderia pedir auxílio ao Devil que ele mais admirasse. Então...eu a chamei.
— ...Bom saber que você sabe reconhecer meu inquestionável valor. Pois bem...o que aconteceu?

   Ainda que Cruella Devil estivesse ali, era difícil para o rapaz assimilar isso. Afinal, sua tia e mentora estava morta há mais de dez anos e ele estava falando com o espírito dela.

— Como posso começar...
— A Devil’s está com problemas?! Você faliu a minha empresa?! Eu sabia que não deveria ter passado tudo para o seu nome em meu testamento! Mas era você ou aquele bando de advogados sanguessugas da empresa!
— Não é isso, a empresa via bem. Logo faremos um desfile exclusivo para um sheik dono de estações de petróleos e hotéis de luxo de Dubai.
— Ah, isso é muito bom! A Devil’s é uma grife de qualidade! Nosso foco é o centro do poder e não a ralé! – Cruella encarou o rapaz. – Se não é a empresa...você fez alguma besteira que virou um escândalo?! Eu avisei que como proprietário da Devil’s precisa ter noção de que o culto positivo a sua própria imagem é importante! A mídia está sempre de olho! Nada de vexames, nada de polêmicas que não possam ser moldadas á seu favor! Você sabe muito bem disso! Temos que usar a mídia e não elas nos usar!
— Sim, tia...está tudo bem na parte da mídia.

“ Bom, nem tanto. Espero que no submundo onde a alma dela está agora, não tenha acesso ao que ocorre aqui porque se ela ver a Igraine, serei assombrado por seu espírito o resto da minha vida...”

— Você não está escondendo algo de mim....está, sobrinho?
— ....eu não...
— Não me diga que finalmente se assumiu?! Tudo bem é um direito seu mas trate de saber que querendo ou não será obrigado a deixar um herdeiro legítimo! E quando eu digo legítimo, eu me refiro á sangue! E se for pra misturar seu sangue tem que ser com outro de boa qualidade! A linhagem Devil não pode ficar sendo manchada!
— Eu não sou gay, tia!
— ...com esse tanto de trejeitos e siricuticos?
— O que há de errado com meus trejeitos?! – ralhou ele com ambas mãos na cintura e batendo o pé no chão nervosamente.
— Se não se assumiu...não me diga que você está envolvido com uma qualquer?! Depois de tudo que te ensinei e te mostrei, só faltava você ter se enroscado com uma interesseira vulgar que só quer lhe dar o golpe! Pior! Só falta ter se enrabichado por uma caipira sem graça defensora dos animais! ISSO SERIA UMA LÁSTIMA  para a linhagem Devil!

  Cruello trincou, engolindo em seco.

— Não tia...não...não é isso...
— Então o que é?! Fala logo! Eu não tenho a eternidade toda do meu espírito para ficar ouvindo você! Sou uma pessoa muito ocupada e enrolação só cansa minha estupenda beleza!
— ...eu...eu fui assediado, abusaram do meu corpo!
— O QUÊ?!  A mídia está sabendo desse escândalo?!
— ...você nem vai perguntar se eu estou bem?!
— Olhe para você! Um homem desses é lógico que iria ser alvo de cobiça! Meio mundo tem vontade de te catar, isso se já não catou! – Cruella o pegou pelo colarinho da camisa. -  Você não pode se deixar enganar!  Existe algum registro do que ocorreu?! Quem estava presente? Quem fez isso?!
—  ...uma...ex-peguete minha, ela é louca! Mas a Scarlet chegou a tempo de evitar algo pior.
— Scarlet?! Aquela sua amiga esquisita e anti-social?! Aquilo não serve pra nada!
— Ela mudou muito em dez anos tia. É meu braço direito na Devil’s e no culto á minha imagem.

  Cruella ergueu as sobrancelhas, desconfiada.

— Mas isso não vem ao caso! – ele continuou. – Eu estou meio confuso diante de tudo isso! Tem coisas das quais não consigo me lembrar...eu fui dopado mas parece que não fui abusado totalmente e eu sai do SPA totalmente em fúria e vim aqui e de Patrick Star souber disso vai colocar em todos os tabloides inventando absurdos só para me prejudicar, será um escândalo!  Isso pode ser pior do que aquela vez que me flagraram dançando pole dance no meio da boate GLS com dinheiro sendo colocado na minha calça e...

  Cruella o agarrou com força e deu alguns tapas no rosto do rapaz.

— PARE! PARE! Pare de choramingar! Seja um Devil! Agora me escute! – os olhos dela faiscaram. – Você é maior do que isso. Não deve se lamentar, deve agir! O que os Devils fazem com qualquer um que tente nos prejudicar? ELIMINAMOS! Porque somos poderosos e ricos! Você é Cruello Devil! E não será a tentativa de um abuso de uma louca ou um jornalista de baixa patente que irá ser empecilho! Não gerando um bastardo está tudo bem, me entendeu?!
— ...s-sim...

  Ela o soltou.
— Pelo visto você ainda tem muito o que aprender. Eu ficarei de olho em você ocasionalmente! Não vou deixar que manche a honra dos Devil e farei com que seja exemplar! E se você por acaso aprontar algo que não deve.... – ela estreitou os olhos. – Eu vou acabar com você!

~*~

Cruello arregalou os olhos de espanto, observando o teto do quarto. Arfante, ele olhou ao redor, assustado. Estava sozinho.

“ Um sonho?!”

     Endireitou-se na poltrona e olhou em seu relógio de pulso. Já era começo da noite, na certa havia cochilado por alguns minutos. Tudo estava exatamente como havia deixado e sem sinal nenhuma da presença de sua falecida tia Cruella ali. Mas a conversa que tivera com ela havia sido tão real que chegou a acreditar mesmo que o ritual de invocação dera certo, mesmo ele sendo um cético agnóstico assumido.

   Olhou para o ritual no chão. Havia sido algo bem real...pelo menos parecera. E a conversa ainda estava vívida em sua mente. Se levantou, abrindo a janela e debruçando-se no parapeito. Cruella Devil tinha razão. Ele era um Devil, não deveria se abalar e se encolher diante das adversidades. Deveria moldá-las  a seu favor e criar modos de tirar proveito das adversidades, transformando-as em ganhos.

~*~


   Quando se viu diante da mansão Devil, Igraine engoliu em seco.
Aquele lugar era enorme. Uma construção extremamente bela, mas ao mesmo tempo aterradora, exatamente como seu avô Roger sempre contara quando inventava histórias da “bruxa Cruella” para uma então Igraine criança.

   Era como se estivesse diante do palácio de um conde de tempos muito antigos
  Alfred voltou ao carro após abrir os grandes portões de ferro e eles atravessaram um imenso jardim até estacionarem bem na entrada da mansão. Igraine notou que, embora o jardim fosse enorme, não possuía flores ou plantas de aparência vívida. Estava cuidado, com a grama aparada e as arvores podadas porém parecia frio, sem vida e até um pouco mórbido. As árvores tinham caules secos e o verde das plantas era opaco, sobrepujado pelo tom amarelo e castanho de folhas secas.

— Chegamos, senhorita. Bem vinda á mansão Devil.

   Desceram do carro e Igraine sentiu um ar gelado, fazendo-a abraçar a si mesma. Já era final da tarde e no céu, via nuvens escuras começando a se juntar. Pelo visto, a previsão do tempo para chuva á noite estava certa. Alfred pegou sua mochila e com um gesto pediu que ela o seguisse, o que Igraine fez. Subiram um pequeno lance de escadas e diante da imensa porta principal, Igraine notou todos os entalhes de arabescos na mesma. Mas trincou ao ver que o batedor da porta era na forma de uma horrenda face de demônio.

    Assim que entraram, ela não conseguiu conter uma expressão de espanto diante da imensidão do local. Tudo parecia impecável e as paredes eram todas pintadas em um tom de vinho. A imensa escada do hall que levava ao segundo andar possuía um tapete vermelho e o chão em que pisava, embora fosse de um piso escuro, estava tão bem encerado que ela quase podia ver o próprio reflexo.

  Igraine estava tão impressionada, que caminhou a esmo, observando os móveis em estilo vitoriano, as estátuas de arte moderna sobre eles mas principalmente se viu atraída pelos quadros, todos eles cópias fiéis de grandes obras de arte.

— Senhorita Igraine, é por aqui que iremos.

   Ela virou para trás, notando que afastara já alguns bons metros do hall. Constrangida,  voltou-se, notando que Alfred conversava com um casal de empregados de meia-idade impecavelmente vestidos como se fossem empregados de uma mansão vitoriana.

— Esta aqui é a senhorita....como é seu sobrenome mesmo? – perguntou Alfred.
— É...sou Igraine Radcliffe, muito prazer.

 O casal pareceu um pouco surpreso quando ela disse o nome, mas foram cordiais em cumprimentá-la. Mas Igraine notou em seus rostos magros, uma austeridade assustadora.

—  Este é o casal Raven, eles são  os líderes dos empregados da mansão Devil. Mordomo e governanta da senhora Cruella Devil e que agora servem ao chefinho.
—...ao senhor Devil. –  corrigiu a mulher de forma seca.
— É que seja...
—  Não fomos informados de que você viria aqui, ainda mais acompanhado. O que significa isso, Alfred?!

  Igraine estranhou o uso do primeiro nome do rapaz pelos empregados, mas nada disse.

— Houve alguns contratempos. Ela é a...
  Silêncio. Alfred encarou Igraine, que o encarou de volta.

— ...eu sou a namorada do Cruello. Ele me pediu em namoro e eu aceitei.

  O casal mediu Igraine de cima á baixo, avaliando de forma impassível, mas com um certo desprezo.

— O senhor Devil foi informado?
— Não. Ele saiu putaço lá do apartamento, aconteceu umas coisas muito tensas  com ele pelo que me disseram. Ele avisou que ia vir pra cá mas desligou o celular.
— ...o senhor Devil não está em seus melhores dias e pediu para não ser incomodado.
— Mas precisávamos vir.
— ...ela também?
—  Uma coisa séria aconteceu com o Cruello. – Igraine se adiantou, irritada – E eu estou aqui para ajudá-lo a lidar com isso! Onde ele está?
— ...provavelmente ele está no alto da torre central e obviamente nenhum Devil deve ser incomodado quando se tranca ali. É a tradição.
— Bom, eu vou subir então. Vem comigo, senhorita Igraine? Vamos procurar um quarto disponível para você.
— Alfred! – ralhou a governanta. – Que modos são esses?! Não pode ir levando a visita á esmo para os aposentos!  Tenho de preparar um dos quartos! E você trate de tentar falar com o senhor Devil e informar sobre isso.
— Mas e quanto á...
— A senhorita poderá aguardar na sala de visitas, como manda as ordens desta casa. – falou a mulher. – Pedirei que a empregada faça um chá.

   O casal curvou-se respeitosamente e saíram do local em direção á um dos vários corredores.

— ...olha, que isso fique entre nós... – sussurrou Igraine. – Mas esses empregados foram meio...arrogantes.
— Eles sempre são assim. A nossa família tem gerações e gerações servindo aos Devil. É normal que acabe absorvendo algumas posturas e manias também.
— “Nós?”  Por acaso...
— ...eles são meus pais.

   O rosto de Igraine ficou igual ao quadro O Grito.

— Você tem pais?!
— Lógico. De uma laranjeira que eu não nasci.
— ...e você não quis trabalhar em algum lugar que não fosse algo relacionado á família Devil?
— Nunca tive perspectivas da minha vida então do jeito que está, está bom.
— Hum...e você...chegou a conhecer o Cruello quando ele era criança?
— Sim. Vejo e aturo ele desde que nasceu. – Alfred faz uma careta, mostrando que não tinha muitas boas lembranças sobre isso. - Venha, vou te levar até a sala de visitas e depois procurar o chefe.

~*~

Alfred subiu até o alto da torre principal da mansão Devil tendo que apoiar-se na parede para recuperar o fôlego logo após o grande lance de escadas que levava até o local. Observou a porta de madeira maciça e conferiu a maçaneta, percebendo que estava trancada.

— Ei, senhor Devil. – chamou, dando três batidas de leve na porta. – Sou eu, Alfred.

  Sem resposta.
— Senhor Devil! Senhor Devil! – bateu novamente.
Nada.
— Senhor Devil! Ei, senhor Devil!!! Senhor Devil! Senhor Devil! – a intensidade das batidas na porta aumentaram. – Senhor Devil! Chefe, ei chefe! Chefinhooooooo!!!!

Silêncio.
— Ei! Chefe! Cruello! Cruello! Está tudo bem por aí?! EEEEEI! – batidas incessantes na porta. – Cruello, abre a porta! ABRE A PORRA DA PORTA, DEVS!
  Irritado, Alfred chutou a porta com violência. A porta não cedeu e Alfred levou a mão ao pé massageando-o e gemendo de dor. Irritado, voltou a bater na porta, praticamente a esmurrando.

— Ei Cruello! Eu sei que você está aí! Abra essa porta!

  Um pensamento súbito lhe ocorreu. Teria Cruello Devil ingerido uma quantidade excessiva de remédios e sofrido uma overdose? De repente pegara uma das armas da coleção  do escritório e atirara na própria cabeça. Ou ele teria se enforcado amarrando uma corda no lustre e chutando a cadeira? Pior, poderia ter se jogado da janela e se espatifado no chão.
   Alfred prontamente sacou um revólver e atirou na maçaneta, destruindo-a. A porta abriu e ele entrou.
   Viu então Cruello apoiado no parapeito da janela, o vento agitando seus cabelos enquanto ele mantinha um olhar assustado.

— NAAAAAAAAAAAAAAAAAAO!

   Alfred segurou Cruello com uma técnica eficaz e assustado, o rapaz começou a se debater.

— Ei, me solta! Ficou maluco?!
— O senhor que ficou maluco! Eu não vou te soltar! Não pode fazer isso com a sua vida!
— Fazer o quê com a minha vida, seu idiota?!
— Jogá-la fora! Eu imagino que deve estar se sentindo mal mas não é o suficiente para se matar! Não vou deixar que se jogue dessa janela!
— Que maluquice é essa?! – Cruello se desvencilhou, irritado. – Eu não vou me  jogar, aloka criatura!  De onde tirou um absurdo desses?!
— É que..a senhorita Igraine e madame Scarlet me contaram sobre o quê...
— ...não me lembre disso!

  Irritado, Cruello se virou e apoiou ambas mãos  na janela.

— Chefe não faça isso! Você pode superar esse trauma com ajuda profissional e...
— Eu já falei que não vou me matar, seu idiota! Até parece que eu me mataria por causa do que aquela maluca da Charlene tentou fazer comigo!  Eu sou um Devil! Jamais iria me matar de uma forma totalmente sem glamour e por algo tão pequeno!

  Silêncio. Alfred suspirou aliviado e então deu uma olhada ao redor, observando os objetos espalhados e o estranho símbolo desenhado no chão.

— ... o que aconteceu aqui?
— ...nada...
— VOCÊ ESTÁ INVOCANDO O CAPETA?! Não acho que precise vender sua alma, já tem tudo o que poderia querer!
— Eu não estava invocando o capeta!

  Cruello falou e então lembrou-se da imagem furiosa de Cruella Devil vindo em sua direção.

— Então o que o senhor está fazendo? E esse monte de coisa espalhada no chão e...
— NÃO TOQUE EM NADA!
— Mas o que o senhor estava faze...
— ISSO NÃO LHE INTERESSA! Aliás...o que diabos está fazendo aqui?- ralhou Cruello. – Eu não pedi para você vir! Volte para Londres!
— Eu não posso. Fui mandado para cá.
— O quê?
— Madame Scarlet ficou furiosa quando soube que você tinha vindo para cá e ficou incomunicável. A senhorita Igraine também se enfureceu e decidiu vir comigo.

   Um silêncio sombrio pairou no aposento e Cruello virou-se lentamente na direção do empregado, os olhos azuis faiscando.

— Você trouxe a Igraine para a mansão Devil sem a minha prévia permissão?! Está achando que isso aqui é algum tipo de hotel?!
— Eu...eu não pude evitar! Ela e madame Scarlet se juntaram, me intimaram a vir para cá e trazer a sua namorada!
— Scarlet concordou que Igraine viesse para cá?! Isso não faz nenhum sentido! Não consigo imaginar aquelas duas entrando em um acordo.
— Eu vi isso com esses meus próprios olhos que a terra há de comer um dia.
— Onde ela está?
— Madame Scarlet disse que iria para a Devil’s cuidar de tudo porque ela sempre diz que o senhor apronta e deixa todos os problemas para ela resolver.
—  Estou perguntando de Igraine!
— Ah, sim. Ela está na sala de visitas. Gostaria de lembrar que já está escurecendo e a previsão é de chuva e...

  Cruello passou as mãos no cabelo, irritado. Pelo visto, era seu destino mesmo não ter sossego. As palavras de Cruella Devil em seu sonho ecoaram na sua mente e ele percebeu que precisava voltar a tomar as rédeas acerca de sua própria situação.

~*~

“Enorme” era um adjetivo básico para se referir á sala de visitas da mansão Devil. O local era imenso e com uma aparência tão sufocante, que Igraine sentou-se encolhida no sofá e mal bebericou o chá e mordiscou alguns biscoitos Toda a sala era composta por tapeçaria e cortinas cor de vinho e as paredes, pintadas em um tom de marrom escuro aliado aos móveis estilo Henrique V, criavam uma aparência vampiresca no local. Igraine não entendia muito de arte mas sabia que não apenas os móveis, mas as estátuas e demais obras de artes ali muito provavelmente eram peças legítimas. Porém, o que a deixava incrivelmente desconfortável, irritada e magoada era a cabeça de um elefante empalhada na cabeça. Aquilo era grotesco, revoltante e de tremendo mau-gosto.

“ Mas também..o que você esperava encontrar na mansão Devil? Teve sorte de não encontrar tapetes de ursos, animais inteiros empalhados ou pior:  coleção de casacos de pele e acessórios de couro pertencentes a Cruella Devil.”

   Não aguentando mais ficar naquele lugar, Igraine se levantou do sofá e  seguiu em direção á um dos corredores. Talvez pudesse voltar ao hall ou pelo menos achar um lugar cujas janelas não estivessem cobertas por grossas cortinas de veludo. Assim que começou a atravessar um dos longos corredores, Igraine percebeu que  ambas paredes do mesmo eram cobertas por diversos quadros. Alguns continham pinturas e eram grandes; outros eram menores e continham fotos.

   Diminuiu o passo e começou a se atentar nas pessoas retratadas ali. Todas elas (ou mesmo a maior parte delas) possuía o inconfundível cabelo monocromático da tradicional família Devil. Curiosa, Igraine recuou alguns passos e do início do corredor começou a observar e se atentar aquele lugar que começou a se revelar uma espécie de linha do tempo e árvore genealógica da família Devil. A primeira imagem emoldurada era uma espécie de vitral de aparência antiquada, com marcas gastas pelo tempo e retratava um homem de longa barba, roupas longas e olhos arregalados. Embaixo do vitral emoldurado estava escrito “Aegon Devil” seguido por uma descrição em latim que ela não entendia.

   Intrigada, ela continuou a observar aquelas pinturas que pareciam evoluir em estilos á medida que ela avançava pelo corredor. Tomou consciência que estava vislumbrando a evolução da família Devil e percebeu que seus membros mais influentes eram retratados em telas maiores: os não tão influentes eram colocados em telas menores. Mas aparentemente todos deveriam estar ali.

   E a linhagem Devil era enorme. As telas preenchiam as paredes de ambos lados do corredor e praticamente todos mantinham a linhagem estética da família: com seus cabelos metade branco e metade preto, tanto homens quanto mulheres. Algumas pessoas ali eram assustadoras, outras belas, alguns exóticos e também havia os bizarros. Soltou um suspiro de espanto ao se ver diante de um gigantesco quadro belamente pintado que retratava Cruella Devil.
  Na imagem, Cruella era retratada em pé, a usar diversas joias, um elegante vestido que modelava seu corpo esguio, os cabelos bicolores, a cigarreira em uma das mãos enluvadas e um gigante e felpudo casaco branco. O olhar dela era de orgulho, soberba e arrogância exatamente como Igraine sempre ouvira e vira em fotos de revistas e sites.

   Enquanto olhava para a imagem de Cruella, lembrou-se de Cruello e comparou o quadro dela com uma das muitas fotos do empresário que tinha em seu celular. Realmente o que Cruella não tinha em beleza, Cruello tinha. Mas em outros pontos eles eram bem parecidos. A postura de orgulho e soberba, a forma de segurar a cigarreira nos dedos, o jeito de olhar...será que os pais dele eram assim também?

  Ao pensar nisso, Igraine prontamente começou a procurar alguma foto que pudesse indicar os pais de Cruello. Ao redor do grande quadro de Cruella Devil havia fotos de outras pessoas, homens e mulheres. Ao que parecia na geração anterior, logicamente Cruella havia sido o membro de maior destaque e, dado ao tamanho do quadro, era também um dos membros mais importantes da linhagem. Notou então um retrato mediano, uma foto de um casal que tinha uma mulher de cabelos pretos e um homem de cabelos, barba e bigode metade preto e metade branco. E diferente da maioria dos retratados, o olhar deles era sutilmente melancólico.

— O que você está fazendo aqui?!

    Ela deu um pulo de susto, virando-se para trás e se deparando com Cruello Devil. Como ele conseguia se manter bonito o tempo todo? Mas apesar disso, notou que embora ele usasse trajes sociais, a gravata estava torta, a camisa um pouco amassada e os cabelos pareciam despenteados.

— Ei, ficou muda? Eu fiz uma pergunta.

   Igraine se surpreendeu ao ver o rapaz diante de si, ele estava pálido e assim como nas pinturas atrás do jovem, seus olhos eram de um intenso azul. Sem pensar duas vezes, ela se jogou nos braços dele.

—Cruello! - Igraine diminuiu a distância para beijá-lo.

  Ele não recuou, aceitando e retribuindo o beijo.

— Como você está?! Fiquei tão preocupada com você! Foi horrível, um crime! Uma maldade! Depois de tudo o que aconteceu, eu imagino o quanto esteja abalado!  
— ...abalado com o quê?
—Ora, com aquela biscate da Charlene! Você estava tão perdido... E eu... Oh, Cruello, eu sinto tanto! - ela o abraçou com força, algumas lágrimas teimando nos olhos
— Ei, pare com isso! - ele a afastou sutilmente. - Eu não estou perdido nem estou precisando de consolo. Estou bem!
— Mesmo?- ela pareceu realmente preocupada. - Você conversou com alguém? Cruello, eu estou aqui no que você precisar... você não pode entrar em estado de negação, a melhor forma de superar isso é  enfrentando. Você tem o apoio de muitas pessoas e crime deve ser combatido! Não posso imaginar o quanto esteja abalado mas...

Ele não respondeu de imediato. Endireitou-se.


— Hah! Até parece que eu ficaria abalado por uma coisa mínima daquelas!  - ele colocou ambas mãos na cintura. – Aquilo não foi nada!  Eu sou um Devil! Isso não me atinge! Eu estive um pouco transtornado por conta dos efeitos do remédio, mas agora já estou recuperado e muito bem comigo mesmo! Não tenho culpa se minha beleza e sensualidade cause tamanho furor nas pessoas! Eu mesmo admito que sou irresistível e não seria capaz de resistir á mim mesmo!

 Igraine o encarou. Duvidava muito que Cruello estivesse realmente bem como dizia. Mas, vindo dele, isso não seria surpreendente.


— Cruello... Eu estou aqui por você...
— ...está...é? - ele envolveu a cintura dela. - Isso é muito bom e interessante...
— Eu... Bem... Sim!

   Cruello a trouxe para um beijo intenso o qual Igraine retribuiu na mesma intensidade.  Em meio aos beijos, Cruello abriu os olhos e se deparou com os olhos de Cruella Devil.

— HAH! - gritou, afastando Igraine de si.
—O- o que foi??!

   Ele olhou ao redor e encarou o quadro da falecida tia.

" Foi apenas um sonho, aquilo não foi real. Tenho de parar de pensar nisso!"


— Nada...o que você está fazendo aqui? Era para esperar na sala de visitas!
— Eu não queria ficar naquele lugar! Tem a cabeça de um pobre elefante empalhada! Cruello, isso é muita crueldade!  Aposto que em outros cômodas da casa há animais inteiros empalhados, tapetes e aqueles horrendos e cruéis casacos e acessórios feito com peles de animais inocentes abatidos cruelmente!
—  ... aqui é a mansão da família Devil! Você esperava o quê? – ele rosnou, colocando ambas mãos na cintura e em seguida gesticulando em seus vários trejeitos. – Um local fofinho repleto de animais saltitantes e barulhentos?! Um canil  do lado de fora e vacas pastando no jardim?!
— Ai credo, seu grosso! Nem passando por uma violência você consegue ser sensível?
— O que o fato de uma ex peguete abusar de mim tem á ver com animais empalhados e casacos de pele na mansão da minha família? E aliás...você veio até aqui para me consolar ou para brigar comigo e tentar me empurrar seu idealismo animal goela abaixo?!
 - ...aparentemente você realmente está muito bem. Nem sei por que perdi o meu tempo vindo aqui e me preocupando com você!  Eu vou embora...
— Nossa, quanto drama...venha cá!

  Ele a puxou pela mão, trazendo-a para perto dele.

— Não me diga que não está com vontade de me consolar? Eu acho que sei como pode fazer isso.

  Sem resposta. Mas ao perceber o que provavelmente ele estava pensando, Igraine corou e baixou o olhar. Como ele poderia sugerir tal coisa  poucas horas depois de ser praticamente abusado por uma vadia insana?!

— Cruello...você....você...deveria estar abalado e...
— A vida é muito curta para se perder oportunidades. – Cruello percorreu sensualmente o corpo da garota com suas mãos. – Estamos juntos oficialmente, já tivemos alguns momentos de intimidade, ao que parece Scarlet é tolerante com você, você está na mansão Devil e passará a noite aqui pois já começou a chover...
— Não está chovendo!

  O som de um relâmpago ecoou. Segundos depois, o barulho da chuva do lado de fora se fez presente.

— Pelo que sei, choverá a noite toda. Alfred já disse que não irá dirigir porque seria muito perigoso, eu não vou arredar os pés daqui e nesse lugar e com esse tempo nenhum táxi ou Uber virá te buscar. Só lhe resta ficar na mansão Devil junto com o herdeiro de uma das famílias mais tradicionais e conhecidas de Londres. - ele sorriu, provocador. – E devo dizer que muitos gostariam de estar no seu lugar.

— ...você sabe se vender muito bem, não é mesmo?
— Eu só falo verdades.
— Cruello, eu...eu...
— Ora, Igraine. Quando poderemos ter aquilo que eu quero, que muitos querem e que eu sei que você também quer? É tão difícil assim para você se deitar comigo?

   Igraine corou. Era fato que estava ansiosa por ter um contato mais íntimo com Cruello e as vezes em que haviam tido algo mais intenso, sempre eram interrompidos. E posteriormente, quando ficava sozinha, Igraine sempre se relembrava desses momentos, desejando secretamente uma nova oportunidade na qual pudessem avançar. Mas quando isso acontecia, ela era cometida por um nervosismo e ansiedade que não conseguia entender e justificar. Ainda se culpava duramente por ter negado naquele dia fatídico no motel.

   Era uma pessoa adulta, gostava dele, estavam juntos oficialmente e ele não iria descartá-la agora que praticamente todo o mundo da moda tinha conhecimento do relacionamento dos dois. Então por quê?

   Por quê queria que fosse com Devs.
   Igraine abraçou Cruello com força, escondendo o rosto no peito dele. Cruello não se moveu, percebendo que talvez fosse o momento de tomar uma certa atitude para que toda a situação avançasse.

“Eu sou mesmo uma idiota. Nunca vou tornar a encontrar o Devs...e mesmo que o encontrasse, até parece que ele iria querer algo comigo com base em uma promessa estúpida do passado!”

— Não se preocupe. – a voz de Cruello sussurrou próximo ao seu ouvido. – Eu vou te agradar muito, sabe que sei e farei isso.  Não confia em mim?
— ...confio...
— Isso não soou muito confiante. Mas eu sei como lhe dar uma certeza.
  Ergueu o rosto de Igraine com seus dedos, induzindo-a a encará-lo.
— Cumprimos a promessa.
— ..promessa...?!
— É...lembra? Daqui á dez anos...iriamos nos unir, raposinha.

   Silêncio sepulcral. Os olhos de Igraine se arregalaram e seu corpo todo retesou enquanto via um sorriso muito familiar se formar nos lábios de Cruello. Não, não podia ser verdade.
— ...Devs?!

 

~*~


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

E mais um capítulo finalizado!
E agora hein povo? A ficha da Igraine finalmente caiu e como ela irá reagir á isso? Meu Deus, nem eu faço ideia!
E o que acharam da presença da Cruella? Será que ela deveria aparecer mais vezes? Fica a pergunta aí para vocês votarem!
Será que dessa vez vai realmente rolar o que todos estamos esperando? Será? Bom, tudo parece conspirar á favor disso caso contrário teremos que criar a tag #liberaigraine XD.
Esse capítulo acabou fluindo para escrever, mais fácil do que pensei á princípio. Tive algumas dificuldades e ainda havia me imposto um “dead line” para poder finalizá-lo e postá-lo. Procurei fazer o melhor que pude, mas se tiverem alguma crítica ou sugestão por favor é só dizer!