Ashley

Eu estava estudando no quarto que divido com Emma, teria prova no dia seguinte. Ao contrário de mim, o resto do país assistia ao Jornal Oficial. Faltava uma semana para o sorteio da Seleção, e ninguém queria perder nada- exceto por mim, é claro.

Sentada em minha escrivaninha, o brilho de uma esmeralda despontava no canto de meu olha, me distraindo. Não que a esmeralda fosse minha, fazia parte do meu trabalho. Ah, claro: sou uma 4, uma joalheira. Eu tinha que acabar aquele anel até amanhã, e ainda faltava bastante. Deixei o livro de lado e peguei o anel. Papai o forjara e eu fiquei incubida do resto.

Estava concentrada em polir a pedra quando afastaram meu cabelo. Um queixo se apoiou em meu ombro e eu senti a respiração quente de Emma. Olhei para o ladp e vi aqueles olhinhos verdes concentrados em minha mãos, que ainda poliam a pedra preciosa. Sardas salpicavam seu nariz e bochechas, e a pele branca como leite contrastava com os negros cabelos pretos. Olhos grandes, boca desenhada. Essa era Emma. Essa era eu- todos diziam que nos parecíamos muito.

Minhas mãos pararam por um segundo e os olhos de minha irmã se desviaram para a carta da Seleção. “Aí vem”, pensei.

–Ashley?- ela me chama

–Oi, Emma?-me volto para o anel, e Emma já está longe de meu ombro

–É veludo.- ela passava a mão sobre a carta

–Sim, veludo. Por quê?

–Vai se inscrever?

–E deixar vocês? E Nancy e Tommy? Acho que não.

–Mas Ashley, e se acontecer outro Inverno- ela perguntou. Droga. Tocou no meu ponto fraco. Desde O Inverno, há três anos( quando eu tinha 14 anos) , eu sou a irmã mais velha entre quatro, pois este levara Aspen, meu único irmão mais velho. Foi o único inverno que passamos fome, mas foi fome até demais- A gente tem que sair dessa. Só tente. Por mim.

Eu havia deixado a joia cair com a lembrança súbita. Qual é, eu vinha me esforçando para não lembrar e Emma trazia o assunto à tona do nada?

–Emma. Não vai haver outro inverno. E essa decisão é minha. E eu digo não.

–Pense nisso. Por mim.

–Eu disse não. Me deixe terminar isso. Saia.

–Mas, Ash...

–Não.- eu a interrompi e ela saiu.

Não sei exatamente por quê, horas mais tarde eu estaria preenchendo aquela porcaria de formulário.

Juliet

Fazia frio naquela noite, mas eu não me juntara à minha família sob as cobertas. Na verdade, eu estava no ateliê, terminando uma encomenda. Era uma ponte com uma mulher e um homem nela. O lago abaixo tinha folhas de tons clássicos do outono, como laranja. O homem se ajoelhava em frente à mulher, claramente pedindo sua mão. Eu estava em minha fase impressionista, e aquele quadro poderia fazer minha carreira como pintora decolar.

Ao meu lado, Matthew, meu namorado, um três, lia alguma petição. Ele estava se esforçando para resolver aquilo havia semanas, e eu realmente queria que ele acabasse, mas não daquele jeito. Ao seu lado, repousava a carta para A Seleção. Ele bufou:

–Nunca vou conseguir resolver isso!

–Calma, Math. Respire fundo. Você vai dar conta. Sempre dá.- disse, impassível. Estava fazendo o braço da mulher.

–E essa carta da Seleção? Por quê continua aqui?- ele mudou de assunto

–Savy ainda pode se candidatar, se quiser.- respondi, passando para a mão. Eu é que não me inscreveria- Não que ela queira, é claro.

–Se ela não quer por que está aqui?- insistiu

– Porquê está, Matthew.- passei para o braço do homem mantendo o tom de voz e o interesse. Se eu não me interessava mais, era porque estávamos chegando ao fundo do poço mesmo- Agora vá ler e me deixe desenhar. Petições não se resolvem sozinhas e telas não se desenham sem um lápis.

Math ajeitou seus óculos, suspirou, e voltou a ler. Ficamos assim por mais um tempo, até ele gritar:

–Isso!

Me assustei, cometendo um erro na roupa do homem. Fiquei com raiva, mas me contive. Ele se sentou aos meus pés, para me ver pintar. Acabou adormecendo. No final de tudo, eu só precisava de uma foto minha e outra dele, e fui procurar em sua carteira.

Abrindo o objeto, vi a foto de uma garota- Ellen Woods, uma quatro de minha idade. Tremendo, virei a foto. No verso, se lia: Para Matthew Noon, o melhor namorado do mundo, 21/07. Acontece que 21/07 fora ontem. Acordei Matthew aos gritos:

–Matthew Noon, o que é isso?

Ele demorou um tempo para responder:

–Oh, Juliet...

–Nada de Oh’s, tá bem?- meus olhos, normalmente negros como carvão, estavam vermelhos como meu cabelo- Pode ir ficar com sua namorada agora! Saia de minha casa para não voltar mais! Posso ser uma cinco, mas não sou tão baixa como você!- vi que essa última frase o atingiu- E é bom que saiba, está tudo acabado!- com essas palavras, arranquei o colar(um presente dele) de meu pescoço e o joguei no chão. Ele pegou o objeto e saiu, os ombros encurvados.

Assim que a porta se fechou, me ajoelhei no chão, mas não permiti que as lágrimas escorressem. No momento que arranquei aquela regalia de colar de prata-aqueles que só dois e três tinham condições de comprar- percebi que não amava Matthew, não realmente. Me abalei por causa da traição. Acreditem, essa é uma experiência ruim. Me recompus antes que Savy, minha irmã de 16 anos, um a menos que eu, entrasse no ateliê.

–Tudo bem?- ela se ajoelhou ao meu lado. Neguei–Posso te ajudar de algum jeito?

–Pegue a carta. As garotas de Waverly tem mais uma concorrente para A Seleção.