Continuação de "Julie E Os Fantasmas" escrita por Anabel


Capítulo 4
Pesadelo




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– A Julie tem um diário. - disse Daniel, pronunciando cada palavra suavemente, como se estivesse falando consigo mesmo.

Os três haviam permanecido em silêncio desde que levantaram do meio-fio, onde gostavam de sentar,encarando o asfalto. Aquela noite estava mais escura do que qualquer outra. O extremo silêncio da rua poderia amedrontar qualquer pessoa. Ou melhor,qualquer pessoa viva.
– Sério? - perguntou Félix. - Será que ela já escreveu alguma coisa sobre nós?


– Se você fosse uma adolescente, e fizesse amizade com três fantasmas, que tinham uma banda de rock nos anos 80... Escreveria sobre o que? Sobre a importância do vestibular? - disse Daniel, com o tom de voz mais irônico que conseguiu.


Félix suspirou e virou a cabeça para o chão, fingindo ignorar a ironia.


– Eu daria tudo pra saber o que ela escreve sobre mim! - exclamou Martim, animadamente.


– Mas não vai, seria errado. E... Martim, você não está pensando em ler o diário da Julie, né? Qual é, não precisa ser nenhum especialista em garotas pra saber que não se deve fazer isso. E amigos não invadem a privacidade de amigos - Repreendeu Daniel.


– As vezes invadem. - afirmou Félix, pensativamente. Daniel revirou os olhos.


– Ela ficou bem chateada por a gente não ter ido ensaiar. Sabe, acho que ela até tem razão por isso. No lugar dela, não sei se eu entenderia... Deveríamos ter explicado - disse Martim, com um pouco de tristeza na voz.

– Deveríamos ter explicado? Pra que? Pra ver a Julie triste? - retorquiu Daniel, interrogativamente.


– Ela está triste do mesmo jeito. - Respondeu Félix, secamente.


Os três ficaram em silêncio por alguns segundos.


– Eu odeio isso! Odeio com todas as minhas forças! - disse Daniel, em alta voz.


– Odeia o que? - perguntou Martim.


– Isso tudo! Odeio ter que esconder coisas da Julie! Odeio que minhas únicas opções sejam fazê-la ficar triste! Odeio ter que vê-la chorar! E odeio não poder fazer com que ela entenda... tudo! - Explodiu Daniel.


– A culpa não é sua, Daniel. Não é nossa, não é de ninguém. - Disse Martim, passando as mãos pelo cabelo, e encarando Daniel.


– Não queria que estivéssemos mortos. - falou Félix, em um suspiro.


– Nenhum de nós queria. E além de tudo, eu não queria ter visto o que eu vi. Detesto sentir essa vontade louca de socar o namorado da minha melhor amiga. - Disse Martim, com um olhar triste.


– Ele merece mais do que só socos. Não sei como ele consegue ser tão falso com ela! Como pode chamá-la pra jantar depois daquilo... como se nada tivesse acontecido? - Indagou Daniel.


– Não dá pra entender mesmo. - Disse Martim, olhando para o chão.


Enquanto viravam a esquina, os três mergulhavam em um oceano de pensamentos. Estavam tão perplexos, e completamente indignados.


– Não adianta. Como eu já falei pra vocês... eu não conseguiria contar isso pra Julie. Eu sei que não suportaria ver a tristeza nos olhos dela. - falou Daniel.

– Nem eu. Mas... E a Bia? Eu ainda não posso acreditar! Achei que ela fosse diferente, achei que realmente fosse amiga da Julie. O que será que deu nela ? - perguntou Martim.

– Eu não sei... Chega desse assunto, eu não aguento mais! Não dá! - soltou Daniel, exclamativamente.

Os três ficaram em silêncio novamente. Continuaram a caminhar, chegando a um terreno baldio. Pararam na entrada por um instante, observando o lugar. Depois de um tempo,entraram. Lá dentro, o mato havia crescido tanto, que alcançava os joelhos de uma pessoa adulta. Em volta, só havia uma cerca grotesca de arame, que o tempo encarregou-se de enferrujar. Félix, Daniel e Martim sentaram-se no espaço vazio do terreno. O Sol iria aparecer a qualquer momento. A quietude da madrugada contrastava com o barulho ensurdecedor dentro da cabeça de Daniel. Todas as coisas giravam em flashbacks como um filme antigo em sua mente. Todas as cenas, todos os momentos bons e ruins. Todas as vezes que Julie sorriu. Tudo. E por último, o pesadelo. O pesadelo que foi ver aquilo. "Desde o ínicio", pensava Daniel, "eu sabia que o Nicolas não era bom pra ela... Eu sabia que ela merecia mais do que isso" Daniel apertou os olhos com força, mas a imagem em sua cabeça não desaparecia. Por mais que ele tentasse, aquilo sempre se repetia e ficava se repetindo. E quanto mais ele tentava esquecer, mais nítida ficava a imagem. A imagem de Nicolas e Bia se beijando.


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