POV’S THALIA

O que se fazer quando se tem a certeza de que não se pode confiar em ninguém? Bom, o fato é que todos mentem para mim, até meu próprio pai. Estamos no carro a caminho de um fast-food, o silêncio é absoluto pois não quero comunicar-me com um traidor. Talvez eu esteja vendo o mundo como ele realmente é, onde a sinceridade está se extinguindo. Comecei a escrever na janela e a tempestade que parecia não parar tão cedo dava um clima estranho, até pousarmos no estacionamento e eu acabar correndo para dentro do Mc Donald’s sem esperar o outro. Pedimos um combo para mim e um smoothie para meu pai e sentamo-nos o mais longe possível das outras pessoas. Mordisquei a batata e esperei o maior começar a explicar.

— Não sou da seita como está a pensar. É temporário, eles me escolheram pois sou o representante de Greycity e estou ajudando-os a organizar a convenção. Você acha que se tivesse escolha estaria aqui? A seita preocupa-se com tão pouco e esquece as coisas verdadeiramente importantes! Thalia, estou recolhendo informações também. Não posso deixá-los fazerem injustiças contra inocentes, não é do meu feitio. Porém, você tem de tomar cuidado, não pode jogar tudo pro alto e ir procurar os magos negros do nada, isso exige preparo. Todos estão atrás de você porque é a única que pode desequilibrar a balança, você é uma luminosa, a única em século que controla os quatro elementos, sabe quanto poder existe nisto? Eles identificaram-na mas ainda não sabem que são você. Isaac foi esperto em arranjar outro culpado, pois atrasou-os, mas não vai levar muito tempo para perceberem que ainda está viva.

— Se sou tão poderosa, posso derrotá-los! Não fale de Isaac perto de mim. Pai, o senhor tem medo, admita. Mas eu não, eu não estou com medo! – acabei gritando com nervosismo, mas voltei a bebericar o refrigerante e fingir que nada aconteceu.

—Não quer que eu fale dele por quê? Ele partiu seu coração? Oh Thalia, você ainda pensa nele? Você tem que ter medo. Ninguém escolhe ser um luminoso, não é algo que possa escolher, é uma maldição... No começo, todos os luminosos eram idolatrados, mas depois eles juntaram-se ao lado do mal e a seita teve de contê-los, todos os luminosos eram queimados como em Salém. Nossos ancestrais tem algo haver com essa maldição, embora os livros de magia não sejam muito claros. Eu acredito que possa derrotá-los mas não assim, não sozinha. Sim, fiz mal em não lhe contar a verdade desde o começo, mas há como redimir-me. Eu vou lhe ajudar, todos vamos mesmo tendo tão pouco tempo... Sua mãe foi morta por não entregar-lhe para o clã dos magos ainda quando bebê, eles sempre souberam de você, Thalia. Mas só lhe procuraram agora pela seita.

— Impossível partir, meu coração já estava despedaçado desde a morte de Liz... Não penso nele, ok, penso o tempo todo. Se os livros não contam tudo, alguém tem de contar! O senhor deve conhecer alguém... Diga-me!

— Estou anotando o endereço de uma senhora que pode ajudar-lhe, mas não vou deixar que vá sozinha. Isaac irá contigo. – murmurou bebendo o smoothie e deixando alguns dólares na mesa, deixando-me sozinha sem poder contestar.

Corri para a casa verificando meu relógio. Tyler estava prestes a chegar em casa para treinar-me. Demorou um pouco até chegar e dar de cara com o fortão escalando minha árvore, fiz uma carranca até o moreno descer.

— Isso é invasão de domicilio! É melhor parar com isso. Vamos logo treinar, tenho coisas a tratar. – murmurei sem perceber Miriã miúda atrás do outro, ela estava quieta e sem expressão, o que deixou-me intrigada.

Entramos no porão e começamos o treino. Não irei dizer muitos detalhes porque eu realmente levei muitos tapas da morena. Elizabeth já não estava mais lá, já que Tyler comprometeu-se a treinar-me sem chantagem alguma. Ele dizia-me que não podia fazer esferas celestiais para sempre, então tentei fazer coisas maiores. Toby mostrou-me como fazer um redemoinho de água e eu acabei fazendo-o, não muito grande para não detonar a casa; consegui fazer também um escudo tão grande quanto uma parede com a água, assim nenhuma bola de fogo atingiria-me. Fiz também nascer algumas rosas brancas e dei-as para Miriã, como um sinal de paz. Decidimos não treinar com as espadas e focar nos poderes. Mesmo que Tyler dissesse que esferas celestiais eram para crianças, fiz uma quase tão grande quanto o cômodo. Ao terminar, estava tão sem energia que decidi deixar a história da velha para lá e dormi, sem preocupar-me com a escola amanhã. Eu não iria e eles entenderiam, afinal sou a garota que perdeu a melhor amiga. E mesmo que não quisesse... Dormi pensando em Isaac e o quanto sentia falta de seu sorriso. Soquei o travesseiro e ordenei a mim mesma parar com tais pensamentos. E parei quando tudo ficou escuro.

Acordei com meu pai chacoalhando-me e resmunguei. Levantei penando e troquei-me, colocando uma calça negra com uma blusa normal por baixo do cardigã azul que combinava com minhas sapatilhas da mesma cor, fiz um coque e acabei comendo cereais, então a buzina ecoou, embrulhando-me o estômago. Saí para fora sentindo a brisa gélida e por trás da nublina vi o castanho com olhar perdido, suspirei e aproximei-me, vi-o sorrir e acabei sorrindo para esconder a dor, ele entregou-me o capacete, até subir em sua moto e entregar-lhe o endereço. Demorou muito, mas muito mesmo para chegarmos a casa desta mulher.

— Parece que chegamos... Mas o número do papel não é de nenhuma dessas casas. É do centro psiquiátrico. Olha Isaac, antes de entrarmos quero desculpar-me pela cena do bar, eu estava nervosa. Vamos indo? – murmurei olhando para meus pés e andando.

— Achei que seria melhor esquecer tal cena e é o que estou tentando fazer... Mas tudo bem, só saiba que eu nunca quis magoar-te. – disse mordendo o lábio, chegamos no centro e o castanho bateu na porta, onde uma enfermeira sorridente atendeu-nos.

— Ninguém nunca quer, Isaac. – suspirei. — Olá, nós queríamos visitar a senhora Michelle. Soube que ela não recebe muitas visitas, gostaríamos de conversar com ela. –disse olhando para a “sorriso” que assentiu e pegou nossos nomes e telefone para registrar e depois dirigiu-nos até o quarto branco em que Mic ficava. Então entramos, deparando-nos com uma senhora encolhida no canto e então ela olhou para mim.

— Thalia? Oh minha neta, há quanto tempo não lhe vejo! Olhe como está moça e esse daí? É namoro ou amizade? – murmurou a senhora sorrindo.

— Vó? Você é minha vó? Mas eu nunca... eu achava que a senhora estava morta, papai sempre disse que tanto a senhora quanto a mãe morreram e agora ele me trás até aqui... Ah perdões, este é Isaac e hoje... hoje em dia não somos nada. – garanti-lhe agachando ao seu lado e vi o castanho dar um aceno.

— Seu pai é meio louco... Acha que pode esconder sua própria mãe! Eu não sou louca, Edmund matou minha mãe! Tudo por culpa daquela piranha da sua mãe... Bobo, acha que Jenny rogou a maldição tudo porque contei a história errada... A maldição acompanha-nos há muito mais tempo, há séculos aliás. Ele levou minha mãe e minha filha, minha bebê. Droga, eu ainda defendi aquela ruiva asquerosa! E por isto, hoje tenho essas queimaduras em meu rosto... Porque lutei com o clã dos magos negros para defender aquela que desonrou nossa família, aquela que quase teve de entregar sua própria filha porque utilizou magia negra... Não foi morta pelos negros, foi pela seita. Eu levei a melhor, Judd era seu nome, a primeira líder mulher do clã, a primeira pessoa que matei. Mas graças aos grandes sábios a justiça foi feita e sua mãe morreu. –disse rindo.

— Minha mãe? O que ela fez? Por quê a seita a matou? Como você derrotou o clã? Papai disse que era impossível... – murmurei abismando-me.

— Ela usou magia negra para que... Para tornar-se uma luminosa, óbvio, mas ela não conseguiu porque não dá para tornar-se um luminoso, tem de nascer sendo. Ainda acredito que a magia dela caiu sobre você que estava na barriga daquela monstra. Ela era o ponto fraco de seu pai, tudo que ele fazia era pensando nela. Conheceu-a na convenção, sabia? Encantou-se com o modo como ela lutava, como matou o próprio irmão que foi sorteado para lutar com ela. Horrível, não? Tentei denunciar aquela ruiva mas acharam que eu estava louca e me trancaram aqui, quem sabe eu não estou louca agora mesmo? Não derrotei o clã, eramos só duas, sua mãe e eu derrotamos Judd e depois fugimos do resto... – murmurou fitando-me.

— Não sou obrigada a ouvir isto. Minha mãe não faria isso, ela não seria podre deste jeito. Eu estou indo. – resmunguei saindo do quarto enquanto ouvia as risadas roucas da outra, vi-me no corredor com Isaac atrás de mim, procurei os banheiros mas vi algo intrigante perto do bebedouro, um rapaz com manto verde. — Você viu aquilo? É um mago negro. Perceba que suas vestes são verdes, as da seita são vermelhas com exceção do manto do líder que é negro... – murmurei para o acastanhado, sem que ele respondesse corri atrás do mago que também moveu-se rapidamente.

Lá estou eu correndo no refeitório enquanto vejo um monte de adultos falando sozinhos atrás de um mago veloz. Não vejo-o mas sei que Isaac está atrás de mim e vejo também que o mago derrubou o carrinho de medicamentos propositalmente mas isto não me impede, pulo sobre eles e me vejo na saída de emergência, vejo um monte de carros mas não vejo quem quero, até vê-lo do outro lado da rua e manter-me atrás deste, quase sendo atropelada. Ouço um grito de desespero de Isaac por meu nome e olho para trás mesmo que rapidamente, estava tudo bem. Ele entra pelo meio das árvores e se mistura com as folhagens verdes, sinto-me boba mas decidida a saber porque ele me espionava e adentro a mata, até que perco o ligeirinho de vez. Ouço passos prováveis de Isaac e minha respiração está descompassada, tanta adrenalina fez meu coração pular, descanso em uma árvore mas mantenho meus olhos abertos. Sinto mãos me prendendo na árvore e grito, e lá estava ele, Logan.

— Hihihihi, está assustada? Calma, Thalia, só estou querendo conversar... Não é ágil? Aquela é Megumi, você deve conhece-la da festa. Ela está te espionando já que Isaac não consegue fazer certo. Mas calma! É diferente... Isaac lhe espiona a mando da seita. Megumi a mando do clã. Talvez você não saiba mas... Estou do lado errado, hihihi. Não vire as costas para mim por isso! Por quê está tremendo? Não tenha medo de mim. Só vim avisar-lhe que o mestre não irá lutar com você no fim do mês, sabe, temos coisas importantes a planejar. Mas talvez, depois vocês duelem. Tempo está sobrando! Não se preocupe com o adiantamento da convenção, ela não ocorrerá se depender de nós, magos negros. Papai se transformou em um monstro, está na hora dele sair do trono. Você pode juntar-se a nós e garantiremos um lugar seu no conselho da seita, menos o trono pois ele será meu, hihihi. Seu namoradinho está chegando, se eu fosse você avisava-o para não ir na convenção. Todos que estiverem com aqueles mantos vermelhos serão mortos. Até mais, doce Thalia. – disse me desprendendo da árvore, suspirei tentando acalmar-me.

— Thalia! Você deve estar doida mesmo não é? Prometi a seu pai que lhe traria inteira! Céus creio que essa mata não é um bom lugar para... Para nada! Porque não tem nada aqui! Espera... ela pode ser boa para alguma coisa, se é que você me entende. É brincadeira, vamos sair daqui antes que saia um canibal daí. – murmurou deixando-me ir na frente, segui caminho pelas árvores olhando atentamente para a posição do sol, até perceber que estavamos no mesmo lugar. Eu não poderia estar perdida, não mesmo...

— Céus Thalia, para onde estamos indo? Estou quase a achar que quer ficar nessa mata para sempre. Não leve a mal, eu até ficaria mas estamos andando a horas e já é noite e também não quero ser morto por canibais! – murmurou fazendo bico.

— Pare de me apressar! Não vê que estou seguindo o sol... Quer dizer, seguia porque ele já se pôs. Que canibal o quê rapaz, está vendo muito filme de terror! Isaac, vamos dormir aqui não há saída, meu celular mal tem área! Estou com turbilhões de pensamentos e quero dormir, encontrei Logan na mata e ele disse que a convenção não irá acontecer se depender dos magos negros... Ele está traindo o próprio pai! – murmurei esgueirando-me numa árvore.

— Você que pensa, existem canibais por todo lado! Eu não vou dormir, ficarei de vigília. Logan sempre foi suspeito, mas não podemos contar isso para Joseph porque ele sabe quem você é e pode contar para o pai... Durma, precisa de alguma coisa, tipo cafuné e tal? – murmurou rindo e esgueirando-se ao meu lado.

“Preciso do seu carinho, da sua atenção, que cuide de mim, preciso de você, apenas você, mas não posso” foi o que pensei. Mas apenas murmurei um nada e pousei minha cabeça em seu peito, ouvindo seu coração acelerar e mesmo que não pedisse, senti suas mãos acariciando meus cabelos negros e então sorri antes de cair no sono.

Acordei antes mesmo do sol nascer. Isaac mantinha-se acordado e observava o medalhão que eu havia lhe dado no parque, ao ver-me acordar guardou-o no bolso da camisa polo e murmurou “bom dia”, disse o mesmo e levantei-me olhando o castanho fazer o mesmo. Esperamos até o sol nascer a leste e posicionei-me para saber de onde vimos. Com certeza no lado oposto, deduzi. Seguimos até vermos a civilização e animei-me. Encontramos a moto de Isaac ainda estacionada e seguimos, de volta ao lar doce lar. Ao chegar em casa, vi papai preocupado. Ele fez uma carranca ao me ver daquele estado, com cabelo sujo de folhas e tudo mais. Avisou-me que havia visitas, o que estranhei, mas mesmo assim entrei no local e vi no canto direito Tyler seguindo os olhos para o fundo da sala... A figura de cabelos totalmente brancos e grandes olhos azuis e mongólicos com rugas e sardas, barba grande também, com manto negro detalhado em folhagens prata. Joseph, que cumprimentou-me com um aceno. Aproximei-me de Toby e sussurrei:

— O filho dele... O filho dele está no clã dos magos negros. –observei-o umedecer os lábios.

— Se preocupe com o agora. Ele já escolheu o lugar da convenção, está tudo praticamente pronto... Perdemos muito tempo. Faltam poucos dias para acontecer e precisamos treinar. Noite e dia se possível. Mas Miriã... Ela está doente. Somos apenas eu, você e Isaac, ele está no nosso time agora. – murmurou apreensivo e Isaac, que mantinha-se perto de mim, assentiu com a cabeça.

— Edmund é mesmo pimpão com a filha... Ele apostou kunys em você, jovem Thalia. Não decepcione-o... Eu também apostaria em você, mas tenho de ser imparcial com a jovem Aimee Satsuki. Desejo boa sorte a você, afinal irá precisar. Aimee é tão forte que tem chances de acabar com você... Não se canse.

FIM POV'S THALIA