Durante o almoço meus irmãos estavam sérios. Não havia brincadeiras na mesa de Apolo naquela tarde. Aliás, devo acrescentar, em mesa alguma.

Parecia que todos estavam prendendo a respiração para ver qual seria a briga da vez.

Quíron tomou a frente e ergueu o cálice para fazer o brinde de costume aos deuses. Em seguida cada semideus levantou em silêncio para jogar a oferenda no braseiro central.

– Apolo. – Murmurei ao empurrar mais da metade da minha comida nas chamas. Ajude a trazer a paz ao acampamento. Pedi silenciosamente e voltei ao meu lugar.

Depois que todos terminaram de comer Quíron tomou a frente novamente, mas dessa vez trazia um papel nas mãos.

– Heróis. – Começou, seus olhos varrendo cada rosto preocupadamente. – A temporada de verão está começando e como todos sabem há alguns de nós que devem ir para o Brooklyn para passar o primeiro mês de treinamento lá com os egípcios.

Houve um burburinho de concordância.

– Então eu quero pedir que os semideuses que irei chamar agora se levantem e venham até mim para que eu possa passar as últimas instruções e os irmãos Kane possam levá-los em segurança. – Quíron continuou e começou a ler a lista. – Mikaela Krane.

Uma garota se levantou da mesa de Zeus. Tinha cabelos pretos e lisos, parecia um ou dois anos mais velha que eu e olhos de um azul elétrico que era possível identificar mesmo de onde eu estava.

– Adam Pierce. – Quíron continuou quando a menina parou de pé próxima a ele. Um garoto alto e corpulento de no máximo 14 anos saiu da mesa de Ares, um traço bem marcante nele era a enorme quantidade de cicatrizes que tinha no rosto dando a ele uma aparência medonha, mesmo assim parou ao lado da filha de Zeus que permaneceu impassível. – Rosalie Smith.

Uma menina de 11 anos e cabelos ruivos saiu da mesa dos filhos de Deméter e parou ao lado do filho de Ares parecendo estranhamente tranquila.

– Natália Vasconcelos. – Quíron chamou e eu precisei de um instante para perceber que era eu.

– Nat, vai. – Will murmurou para mim no mesmo momento que eu forçava minhas pernas a levantarem e me guiarem até a frente do pavilhão, onde eu me postei ao lado da garota, sentindo meus dedos tremerem ao perceber que muitos dos semideuses olhavam para mim.

– Kevin Wayne. – Quíron continuou e meus olhos se voltaram para a mesa dos filhos de Hades. Todos eram incomumente pálidos, com cabelos escuros e olhos negros. O semideus se levantou assim que seu nome foi chamado, quando parou ao meu lado fez um leve gesto com a cabeça e um leve sorriso para mim e eu sorri de volta. – Anne Black.

Dessa vez uma adolescente da mesa de Poseidon levantou, tinha cabelos pretos com mechas em uma cor que não consegui definir, olhos verdes mar com a blusa do acampamento e uma jaqueta de couro por cima e jeans rasgados. Fez um aceno para Kevin que retribuiu o gesto.

– Fernanda Kramer. – Quíron chamou e a líder do chalé de Afrodite andou com passos decididos e graciosos até a linha onde nós semideuses Uniões Raras estávamos. Ela lançou um sorriso vacilante para mim e se postou ao lado da garota filha de Poseidon. – Edward Hudson.

Meus olhos buscaram o garoto que havia me interceptado nos estábulos uma vez. Ele levantou da mesa de Hermes depois de dar uma piscadela para os irmãos e vir andando rapidamente até parar ao lado de Fernanda.

– Victoria Ramírez. Cody Prince. Saeme Utamazato. Rebeca de Souza. – Quíron chamou rapidamente e vários semideuses levantaram ao mesmo tempo.

Uma menina de aparência frágil levantou da mesa de Ares com um cachorro enorme a guiando, talvez fosse cega.

Olhei ao redor quando todos estavam presentes, éramos aproximadamente doze, talvez treze.

– Venham comigo. – Quíron falou e começou a nos guiar para a Casa Grande.

Percebi depois de algum tempo que ele não estava nos guiando para a Casa Grande, mas sim para a área comum dos chalés.

– Cada um vá ao seu chalé e pegue uma mochila com as coisas que irão precisar. – Quíron falou. – Dou-lhes dez minutos.

Olhei ao redor, não nos comportávamos como um grupo, na verdade estávamos dispersos e com aparência entediada ou preocupada.

Comecei a me afastar para o chalé antes que qualquer um tivesse a iniciativa. Assim que entrei passei pela gaiola de ratos onde Stu estava dormindo e subi para o segundo andar.

Sentei rapidamente na cama onde havia passado dois dias apagada. Um arrepio subiu minha espinha quando lembrei o que havia sonhado. Fazia tanto tempo que não pensava no que aquilo poderia significar.

Levantei num salto e peguei a mochila. Tudo o que eu precisava estava ali dentro.

– Vou sentir saudade. – Murmurei lançando um breve olhar para trás e saindo do chalé.

Quando voltei para perto de Quíron apenas alguns semideuses já haviam voltado, mas mantinham distância segura uns dos outros. Estava tentada a ficar ao lado da Fernanda, mas achei que não seria uma boa ideia, ainda mais com a trégua recém acertada com meus irmãos.

Foi quando senti uma mão em meu ombro. Olhei para trás e sorri ao ver que era Kevin.

– Oi. – Ele falou e se colocou ao meu lado para esperar o restante de campistas que iria conosco.

– Oi. – Foi a minha resposta brilhante.

– Soube que você tinha ido para Londres. – Kevin falou naquela voz grave e suave ao mesmo tempo, percebi que uma garota olhava estranhamente para mim, parecia raiva.

– Sim, fui terminar meu ano letivo e me despedir dos meus amigos. – Respondi e baixei os olhos para a grama aos meus pés.

– Mortais realmente não devem manter contato com pessoas iguais a nós. – Ele murmurou. – É perigoso demais.

Concordei com a cabeça quando a última semideusa chegou até nós e Quíron começou a nos guiar para a colina onde ficava o pinheiro de Thalia. O limite do acampamento.

Todos estavam em silêncio mortal durante a subida na colina, quando chegamos ao topo percebi que quatro pessoas esperavam por nós.

– Não quero receber queixas de brigas e confusões da parte de nenhum de vocês. – Quíron falou seriamente. – Isso é principalmente válido para vocês dois, Fernanda e Kevin.

A irmã de Linda olhou para o filho de Hades e eu quase pude ver a eletricidade entre eles. Em seguida ambos deram de ombros.

– Muito bem. – O centauro falou e liberou nossa passagem.

Prestei atenção nas pessoas que nos esperavam pacientemente e reconheci Carter, Sadie e Zia, mas não sabia dizer quem era o cara que os acompanhava. Era alto, com pele de um tom de café, assim como os outros três usava roupas de linho, mas ao contrário deles não trazia uma bolsa de carteiro ao lado do corpo.

– Aqui estão. – Quíron falou acenando para nós.

– Ainda faltam Logan e Mark. – Carter falou olhando para nós e eu tive que me conter para não fazer careta ao som do nome do meu irmão.

– Os dois fazem parte daquela situação especial a qual já conversamos. – Respondeu misteriosamente o centauro, mas Carter assentiu como se compreendesse.

– Muito bem, podemos ir? – Perguntou.

– Sim. – Todos respondemos juntos.

– Está certo. Boa sorte semideuses. – Quíron falou e começamos a descer a colina para sairmos do acampamento.

Quando terminamos a descida olhei para cima. Quíron havia erguido o arco, como uma forma de saudação, em seguida desceu de volta para o acampamento.

Olhei para Carter, Sadie e Zia. Com algum temor olhei para o cara que os acompanhava.

– Para aqueles que não me conhecem. – Ele falou depois de interceptar meu olhar curioso. – Me chamo Walt, e também sou Anúbis.

Seu tom de voz mudou brevemente e eu senti um arrepio.

– Sadie, será que você pode abrir um portal? – Zia falou como se não fosse nada demais, mas eu fiz careta ao lembrar de poucas horas antes e apertei a alça da mochila com força.

Alguns ao meu redor também não pareciam muito contentes com a ideia de atravessar uma ampulheta de areia.

– Hum-hum. – Chamou o cara moreno. – Você esquece que eu posso fazer isso?

Ele estendeu a mão no ar e um portal negro apareceu. Sadie, Carter e Zia reviraram os olhos como se achassem graça.

– Ainda não se cansou disso não é? – Carter falou com um sorriso e balançando a cabeça.

– Ele nunca vai cansar. – Sadie falou com um sorriso ao olhar carinhosamente para o cara moreno.

– Muito bem, nossos iniciados primeiro. – Zia falou tentando parecer séria, mas um sorriso brincando nos cantos dos seus lábios. Seus olhos dourados estavam brilhando em diversão enquanto ela acenava para que atravessássemos o portal.

Kevin foi o primeiro, Edward o seguiu, e assim foi, logo todos haviam passado menos eu. Lancei um olhar rápido para trás, desejando ficar no acampamento, mas aceitando meu destino, em seguida me dirigi para o portal com a certeza de que um mês de novas descobertas me esperava.