Horas depois acordou com o celular tocando. O sol ainda brilhava no céu. Ainda? Ou será que ela tinha dormido até o outro dia? O celular continuava a tocar. O toque nunca soou tão irritante como agora, e com um tom resmungão foi que atendeu.

– Alô?

– Annie? Podemos treinar hoje?

Sorriu ao reconhecer a voz de Eren.

– Claro. Hoje levarei alguém que você vai gostar de conhecer.

– EH? – Ele exclamou, excitado. – Daqui a meia hora, então?

– Não. Será difícil convencê-lo, por isso precisarei de tempo. Terá o dia livre hoje?

– Posso desmarcar todos os meus compromissos.

– Ótimo. Mandarei uma mensagem quando tiver acertado tudo com ele.

– Estarei esperando!

– Eren, espera! – Annie pediu, vendo que o garoto iria desligar. – Aquela maluca vai vir junto, não é?

– Quem?

– Mikasa.

– Eh? O que você quer dizer com isso? – Perguntou levemente irritado.

– Pergunte a ela. Até depois. Ah, e não ouse ligar novamente.

Desligou o telefone, pronta para fazer outra ligação. Mas, antes disso, sussurrou consigo mesma:

– É, Mikasa... hoje mostrarei alguém que não terá a mínima piedade com seu amado.

XxX

Eren gemeu de dor e Annie sorriu de canto, notando que agora Mikasa odiava aquela pessoa ainda mais do que a odiava. A morena tentou se aproximar, mas Eren rugiu um aviso de que, se ela se intrometesse, ele nunca a perdoaria.

– Você é muito fraco, pirralho.

Aquela pessoa tinha apenas 1,60m de altura, mas era mais poderosa do que qualquer gigante que habitasse a Terra.

– Annie, você não está o treinando direito.

– Ah, Levi, peguei leve com o garoto. Afinal, ele está num nível muito baixo.

Eren encarou os dois profissionais com horror, demonstrando total surpresa ao receber a noticia. Então quer dizer que ela pegava leve com ele? Que aquilo era pegar leve? Que seu nível era muito baixo?!

Annie olhou Mikasa pelo canto. Estava ameaçadora, fato. Bem... era fato também que ela não estava gostando nada de ter seu amado Eren humilhado por dois “tampinhas”.

Com esforço, Eren levantou e limpou o sangue do canto da boca.

– Mais uma vez – ergueu os punhos para Levi.

– Eren, chega – Mikasa falou num tom inflexível.

– Calada – Yeager sequer olhou para ela. – Vamos, outra vez!

– Levi, trate dos ferimentos do Eren, por favor – Annie disse. – Podemos ter uma conversinha, Mikasa?

Mikasa observou Eren e Levi saírem da sala, então voltou os olhos para Annie.

– Vai pagar por isso. Você e aquele anão.

– Sobre isso que queria falar. Que tal lutarmos?

Mikasa não pensou duas vezes. Tirou a jaqueta e o cachecol vermelho que usava e ficou em posição de ataque.

– Quanto antes melhor.

Num piscar de olhos ela estava em cima de si, o punho preparado para um soco poderoso. Mas, por reflexo, Annie ergueu um dos braços e bloqueou. Mikasa não pareceu muito feliz por alguém bloquear seu ataque tão facilmente, porém não desistiu. Atacou, atacou e atacou. Todos os ataques devidamente bloqueados pela loira.

Annie tinha que admitir: estava sendo uma luta difícil. Mikasa não era apenas história; as habilidades dela eram reais. Entretanto, o que Mikasa sabia fazer e o que Annie era capaz de fazer eram coisas de níveis diferentes, e no que uma era ótima, a outra era profissional. Na primeira abertura, Annie deu um chute certeiro que fez com que todo o ar, pra Mikasa, sumisse, e ela fosse obrigada a cair no chão, tamanha era sua dor.

– Bom – Annie disse. – Realmente muito bom.

– Do que você está falando? – A Ackerman rosnou.

– Faz tempo que não encontro alguém tão boa... Bem, ainda não está no meu nível nem no do meu amigo. – Não sorriu, porém seus olhos adquiriram um brilho diferente. – Parece que não vai conseguir dar uma lição nos “anões”.

Eren entrou sorrindo largamente e um pouco corado. Levi, logo atrás do garoto, parecia levemente aborrecido.

– Annie, por que não disse que traria o Rivaille?! – Eren perguntou com a animação a mil.

– Já disse que é pra me chamar de Levi.

– Queria te surpreender. – A loira deu de ombros.

– Annie, você é mesmo incrível! – Yeager abraçou a garota. Annie esganou uma risada vitoriosa. O que será que Mikasa estava pensando agora? Hm... – Rivaille é o meu ídolo! Minha fonte de inspiração!

– Bem, então isso não é algo positivo, visto que você luta terrivelmente mal. E, se você me chamar de Rivaille outra vez, eu te mato.

– Ah! – Eren gargalhou ao ver Mikasa no chão, suada e com a mão no estomago. – Então ela te derrotou? Eu falei que ela era boa! – Mikasa fez um barulho impaciente e se levantou. – Annie, você acabou de bater num ídolo nacional, e daqui a pouco, internacional! Você terá problemas!

Por algum motivo, isso parecia divertir o garoto imensamente. E isso divertia Annie infinitas vezes mais.

– Ah, sim! – Eren bateu uma mão na outra, como se acabasse de se lembrar de algo. – Espero que não fique chateada, mas... Bem...

– A partir de hoje Eren irá treinar comigo – Levi disse sem rodeios. Por algum motivo, Eren corou, e seu sorriso ficou tímido.

– Sem problemas – a loira falou, imaginando que a sorte estava ao seu lado, pois a expressão que Mikasa fez ao ouvir aquilo foi... impagável.

– Eren, vamos. – Mikasa ordenou, deixando todos momentaneamente mudos.

– Agora vou treinar na casa do... Levi. – O moreno mais baixo pareceu satisfeito por Eren ter, finalmente, o chamado de modo que queria. – Pode ir, depois eu vou.

– Ere-

– Volte. Logo. – Eren sibilou. Mikasa mordeu o lábio, indignada, e saiu com uma fúria negra.

– Sei onde é a saída – foi só o que disse antes de chegar à porta.

Annie perguntou-se se Mikasa colocaria toda a culpa nela. Concluiu que sim. E sorriu ao notar que isso era bom.

XxX

Omake

– Levi, trate dos ferimentos do Eren, por favor – Annie pediu. Ah, então agora é a chance dela ficar sozinha com a Mikasa...

Levi olhou para o garoto; sangue escorrendo e mal conseguindo respirar. Tão... fraco. Não era de se admirar que aquela garota tivesse que protegê-lo. Contudo... – Contudo! – Ele mantinha punhos levantados e o olhar desafiador. O moleque não era idiota, é claro que ele sabia que iria perder. Mas, curiosamente, Eren parecia querer lutar até o ultimo momento. Não que Levi quisesse feri-lo gravemente (só Deus sabe quantos processos Mikasa colocaria em cima dele e de Annie. E de processos ele já estava cheio, não precisava de mais um daquela menina chata e arrogante), só que... Aquela expressão determinada... Aqueles olhos expressivos... A boca rosada e manchada de sangue... Ver Eren daquele jeito fazia com que Levi quisesse bater mais e mais naquele rostinho bonito.

– Vamos, garoto - sussurrou sem quase mover os lábios, tão baixo que só Eren ouviu, mas ainda assim precisou de alguns segundos para entender e marchar para a “enfermaria”. Afinal, Annie frequentemente tinha feridos em casa, e uma enfermaria era mais do que necessária.

– Ali – Levi apontou para uma cadeira branca, abrindo os armários e procurando algo para limpar e fazer curativos.

– Você é o Rivaille, não é? – Eren perguntou o encarando.

– Não precisa me chamar assim. Meu nome é Levi.

– Mas você é o Rivaille, não é? Aquele explorador famoso... – Insistiu.

– Não me chame desse jeito, moleque. Já disse que é Levi – o mais velho sibilou, limpando o rosto de Eren, não tendo gentileza alguma no ato. Eren gemeu de dor.

– Por quê? – O mais novo mordeu o lábio, tanto de curiosidade quanto de dor.

– Rivaille é meu nome profissional. A partir de hoje teremos um relacionamento um pouco mais... íntimo, se bem que não quero ter intimidade alguma com você. Mas eu definitivamente não me sentiria bem em bater em alguém que me trata tão formalmente.

Sem que Eren percebesse, seu rosto já estava corado.

– O que... O que quer dizer com isso? – Perguntou pausadamente.

– Que quem irá treiná-lo a partir desse momento sou eu. Annie está pegando leve demais e creio que você quer sair de baixo da saia daquela garota.

– S-sim. – Eren respondeu depois de um momento de hesitação.

– Vamos treinar agora.

– Agora?

– Sim. Vamos para a minha casa – Levi disse com um aceno, indicando que todos os cuidados já estavam ok. Eren se levantou e achou estranha a sensação de ser mais alto que o seu idolatrado Rivaille.

– Obrigado por fazer isso por mim! – O garoto disse com uma reverencia.

Levi encarou o garoto e respirou fundo antes de responder.

– Não estou fazendo isso por você. É pela Annie.

– Pela Ann-

– Não pergunte – avisou.

Eren pareceu não saber o que fazer. Dez segundos se passaram com eles se encarando, e lentamente o maior e mais radiante sorriso que Levi já viu brotou nos lábios de Eren.

– Muito obrigado, mesmo assim!

Levi ficou estupefato, mas tudo que fez foi parecer aborrecido. Gesticulou para que Eren fosse na frente, e assim ele o fez, com o sorriso intacto.

– Tsc – reclamou olhando as costas do garoto. O sorriso dele era tão grande que dava pra ver até de costas... Ok, exagero. Mas Levi não pôde conter a sensação estranha que se apoderou de si ao pensar que passaria boa parte de seu tempo treinando aquele pirralho de merda. E isso só fez com que ficasse ainda mais aborrecido.