Nada mais fazia sentido pra mim. Não agora que Mary estava morta e ela havia ido embora.

Correr dos manequins, fugir de labirintos, se esconder das bonecas... Não era mais a mesma coisa a partir do momento em que fiquei sozinho. Então era assim que Mary se sentia? Sozinha. Agora eu entendo, mas é tarde demais.

Ib voltou para os seus pais e aqui estou eu: preso no maldito mundo de Guertena. Minha rosa está intacta mas a cada dia que passa, sinto como se um pedaço do meu coração fosse arrancado. Ainda posso ouvir a voz dela ecoando na minha mente:

"Promete que nunca vai me deixar sozinha?"

"Claro, somos amigos Ib."

"Promete de dedinho?"

Agora,essas lembranças que deviam ser felizes e boas são tão dolorosas quanto quando uma pétala da minha rosa azul é arrancada.

Levantei o rosto para olhar o lado de fora da galeria, o mundo que eu jamais voltaria a ver. No meio de uma multidão de visitantes, consegui enxergar uma garota de cabelos castanhos compridos e brilhantes olhos cor de rubi. Era ela. Ib.

Sabia que não adiantaria gritar por ela, não seria ouvido. Apenas encostei minha mão na tela e deixei as lágrimas caírem. A única amiga que eu tive estava a uma tela mas ao mesmo tempo a um mundo de distância de mim e aquilo doía como o inferno, como se meu coração estivesse em chamas.

Não existiam mais rosas vermelhas, amarelos e azuis. Não existia mais Ib, Mary e Garry. Era apenas eu, as pinturas, as bonecas e os manequins.

– Garry - ouvi uma vozinha me chamando e eu conhecia aquela voz.

Ergui os olhos e encontrei Ib olhando para o meu quadro com a mão apoiada nele e, se não fosse por aquela maldita tela, nossas mãos estariam se tocando.

– Ib - sussurrei e fechei os olhos, meu mundo desabando aos poucos.

Senti algo caindo em cima de mim e me derrubando. Abri os olhos e lá estava ela, com os braços em volta de mim.

– I-Ib... É você mesmo? - perguntei espantado, quase sem acreditar que aquilo era verdade.

–Sim, sou eu Garry - Ib me soltou e percebi que ela também estava chorando. – Pensei que nunca mais fosse te ver.

Abracei-a novamente, ainda não tinha certeza se aquilo estava mesmo acontecendo.

– Eu também - falei. – Mas agora você precisa voltar, antes que fique presa aqui assim como eu.

Isso foi o que eu disse mas não me importava se ela iria ficar presa ali, pelo menos estaríamos juntos e era só o que eu queria: ficar junto de Ib.

– Não, eu não quero ir! Quero ficar com você,Garry.

Sorri automaticamente.

– Então promete que nunca vai me deixar sozinho de novo? - perguntei, dessa vez eu quem estava pedindo.

– Claro, somos amigos Garry - ela sorriu.

– Promete de dedinho?

Ib assentiu e eu entrelacei meu dedo mindinho com o dela.

–Acho que vai precisar disso - falei e entreguei uma rosa vermelha à ela.

– Não é a mesma coisa sem Mary - ela disse com ar tristonho.

Me senti mal por Mary, no final de tudo, ela só queria amigos, só não queria mais ficar sozinha. E mesmo depois, ela terminou mais sozinha do que Ib, mais sozinha do que eu.

– Não sintam pena de mim.

Olhei para a frente e vi uma menina loura de olhos azuis e com uma rosa amarelo nas mãos. Mary.

– Mary - eu e Ib dissemos juntos e corremos para abraçá-la.

–Pensei que estivesse... Você sabe - falei meio sem jeito.

–As bonecas me salvaram - ela sorriu. - Me desculpe por tudo o que fiz à vocês, eu só queria ter Ib como amiga e quando Garry apareceu pensei que fosse perdê-la.

– Está tudo bem - Ib disse e continuamos sentados no chão, nos abraçando por mais um tempo.

Meu coração estava sendo curado, meu mundo estava sendo reconstruído e eu não estava mais sozinho.

Estava pronto para viver tudo novamente.

Não, não iríamos viver tudo de novo. Eu não cometeria os mesmos erros. Ib não iria embora, Mary não iria morrer e eu não ficaria sozinho. Agora, existiriam para sempre rosas vermelhas, amarelas e azuis. Existiria para sempre, Ib, Mary e Garry.