Call Me With The Past escrita por QueenD, Mary Crovenew


Capítulo 3
Capítulo 2 - Le fantôme de l'auberge


Notas iniciais do capítulo

Voltamos!!! Esse capítulo é o meu favorito até agora.
BOA LEITURA!



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Era uma manhã de sábado quando eu eu senti pela primeira vez a dor da perda. Como de costume, eu acordava cedo já animada para comer o café da manhã que mamãe sempre preparava aos sábados. A comida dela sempre era gostosa, mas todo sábado todas as refeições do dia eram alguma coisa nova ou comidas que eu e papai amássemos. Joguei as cobertas para o lado correndo para o banheiro e escovando os dentes da melhor maneira que uma garota de oito anos conseguia.

– Mamãe, mamãe! - Disparei para a cozinha, entrando pela porta aberta. Ela não estava cozinhando, conversava com papai em um tom baixo, ambos sentados na mesa e somente perceberam minha presença por conta do meu alarde. Seus olhos estavam tristes quando me encarou. - A senhora não vai fazer comida hoje?

– Ah! Call! - Papai me chamou para sentar em seu colo.

– Tem alguma coisa estranha acontecendo - franzi a testa. Olhei ao redor vendo a tigela de Bernie ainda cheia de ração. - Onde está Bernie?

Pela reação deles eu percebi que tinha mesmo alguma coisa errada. Ambos mexeram desconfortáveis na cadeira.

– Call, querida... - Papai começou mexendo carinhosamente no meu cabelo. Vi mamãe virar-se para o lado e passar a mão pela bochecha, limpando uma lágrima que não queria que eu visse.

– Mamãe está chorando!

Ela girou o corpo com uma expressão surpresa, mas logo sorriu querendo demonstrar que estava bem.

– Não quero que fique muito triste, tudo bem meu anjo? - Mamãe segurou minhas mãos - Bernie morreu. Nós o encontramos no quintal.

Quando eu escutei parecia que o tempo tinha parado. Mamãe e papai continuavam falando coisas que eu não escutava. Não escutava pois achava que era mentira e precisava ver com meus próprios olhos. Escorreguei do colo do meu pai e saí correndo pela porta dos fundos com a visão já embaçada, mas ainda sem querer acreditar. Meu corpo todo parou quando vi Bernie na grama. Parecia estar dormindo, não fosse pelos olhos abertos e sem vida que pareciam me encarar diretamente. Não lembro de muita coisa depois disso, mas mamãe disse que corri até Bernie e fiquei passando a mão em seu pelo macio e chorando sem parar. Fiquei consciente das coisas ao meu redor somente quando papai chegou falando que Joe tinha ido me ver. Eles achavam que ele era a única coisa que me consolaria, e era verdade. Lembro-me dele ficando ao meu lado e dizendo suavemente para que só eu pudesse ouvir:

– Eu nunca vou te abandonar, Call. Você sempre pode contar comigo.

E eu acreditei naquela promessa de um garoto de dez anos.

***

Sentei na cama sentido-a gemer precariamente abaixo de mim.

– Eu sair e já voltar - O francês bonito disse saindo pela porta e fechando-a atrás de si. Nos entreolhamos sabendo exatamente o que ambas pensávamos.

– Ele é tão lindo! - Kath abanou-se com a mão.

– Será que o outro garoto que vai dormir aqui também é assim? Meu Deus, precisamos dormir mais vezes em muquifos como esse - Mittie disse enquanto vasculhava o cômodo.

Haviam-se passado cerca de meia hora e nada do colega do francês que falava inglês chegar. Kath já estava dormindo feito um anjo, enrolada em uma coberta puída (Bem, pelo menos o lugar tinha cobertas) e Mittie jogava no seu celular. Eu tentara mandar uma mensagem para os meus pais, porém o lugar não possuía sinal, então se nós três morrêssemos iríamos ser enterradas como indigentes já que ninguém conhecido sabia onde estávamos. Eu queria dormir. Muito. Mas toda hora uma ponta de esperança que se eu me esticasse mais para um lado e estendesse o braço em tal direção o sinal pegaria, Mittie ria da minha cara. Confesso que também queria ver o outro garoto que iria dormir conosco, então lutava contra meu sono.

Mittie tinha encontrado cobertores de um material irreconhecível na parte de cima do guarda roupa e eu peguei um de bom grado. A madrugada em Paris nessa época era de gelar os ossos para uma turista não acostumada com o frio da cidade. Ela achou também pastilhas de comprimidos que suspeitamos não serem simples comprimidos e sim drogas.

Abri os olhos sentindo um gosto amargo na boca. Ergui o corpo com os olhos ardendo por ter dormido com rímel. Foi quando eu me dei conta. Tinha adormecido e não havia visto Alex e o outro possível assassino/estuprador/ladrão e agora nenhum dos dois estavam no quarto considerando que somente as camas onde Mittie e Kath dormiam estavam ocupadas. Peguei meu celular olhando meu reflexo e vendo a filha do capeta nele. Meu cabelo parecia ter sido mastigado e cuspido de volta, meus olhos estavam com olheiras e minha bochecha direita marcada.

– Droga, droga, droga - Continuei murmurando penteando meu cabelo ruivo e cacheado (O que só piorava seu estado de embaraçamento) com os dedos. A porta abriu e eu ergui os olhos assustada já pensando no pior, porque obviamente a porta não possuía nenhuma tranca ou chave. Paralisei vendo uma coisa muito pior do que eu imaginara.

– Fantasma! - Gritei dando um pulo para fora da cama.

– Gasparzinho! - Fantasma disse com os olhos arregalados e um sorriso divertido.

– Que droga de gritaria é essa? - Mittie tirou a coberta da cabeça, com uma cara mal humorada.

– Acho que estamos brincando daquele jogo onde a pessoa diz uma palavra e você responde com a primeira coisa que vier na sua cabeça - O fantasma respondeu.

Ouvi uma risada atrás dele e só então percebi Alex. Ele passou pelo batente da porta ainda sorrindo.

– Esqueci que Callie não ver ele antes. Esse é Joe. Ele quem ensinar inglês para mim.

Tenho certeza de que abri e fechei a boca várias vezes, agindo idiotamente. Meus olhos estavam fixos naquele fantasma que parecia ter vindo direto do passado para me assombrar. Ele era alto e um pouco mais magro do que deveria. Seus olhos eram verdes e o cabelo cortado rente à cabeça, não dando espaço para os possíveis cachos crescerem. Fantasma chamava-se Joe, falava inglês perfeitamente, morava na França e tinha a aparência de um garoto de vinte anos, a idade exata que o meu Joe deveria ter. Seu nome saiu dos meus lábios em um tom esganiçado. Dei um passo mínimo em sua direção, quase esquecendo de tudo e todos. Aquele era o meu Joe, só podia ser. Minha respiração estava presa na garganta quando me lembrei que se ele não tinha demonstrado nenhuma reação de reconhecimento deveria ser por não se lembrar de mim.

– Call, você ta bem? - Kath, que eu nem percebera ter acordado, perguntou.

– Eu... Estou ótima - Abaixei o olhar com a testa franzida. Sentei na cama sentindo que se continuasse de pé iria despencar no chão. Tentei me acalmar, afinal as chances daquele ser o mesmo Joe da minha infância eram tão mínimas. Deviam haver vários Joes em Paris que também eram americanos. E que tinham as mesmas características físicas. Mas ali estava na minha frente um retrato de como Joe possivelmente seria no futuro.

Respirei fundo tentando me controlar. Eu precisava conversar com ele à sós, mas obviamente era impossível. Seria muito estranho se eu interrompesse a conversa deles e do nada falasse que queria conversar sozinha com ele.

– Call, você está ouvindo? - Senti Kath segurar meu braço e vi que todos no cômodo olhavam para mim.

– O quê?

– Vamos embora, estamos sem dinheiro e a bateria do meu celular acabou. Eles explicaram como chegar na rua do nosso hotel e chamaram um táxi para nós.

Pisquei atônita olhando de Alex para Joe e continuei o encarando.

– Não liga, ela é mais sonsa que o normal quando acorda - Mittie disse em toda sua admirável gentileza caminhando até mim e segurando meu outro braço.

Enquanto as duas me puxavam pela porta me ocorreu que aquela poderia ser a última vez em que veria aquele Joe. Olhei para trás e nenhum dos dois estava à vista. Tentei parar para voltar e falar qualquer coisa que deixasse uma brecha para pedir o número de telefone de qualquer um dos dois. Se não conseguisse o de Joe, Alex era um caminho indireto até ele.

– Ande logo, Callie! - Bufou Mittie - Eu quero comer e tirar o cheiro desse lugar nojento de mim.

Puxou-me com mais força sem dar chance para eu dizer qualquer coisa. Descemos às escadas passando por pessoas caídas (Talvez desmaiadas, talvez dormindo) ao longo desta e fomos para a calçada querendo nos afastar daquele lugar o mais rápido possível. Enquanto esperávamos cansei de ficar em cima daquele salto de quase dez centímetros e sentei na escada pavimentada do hotel, Mittie sentou-se junto comigo e Kath deu um sorriso sem mostrar os dentes, continuando em pé.

Um garoto passou e jogou algumas notas de euro aos nossos pés dando um sorriso - e mostrando suas lindas covinhas - e continuou a andar, começando a subir as escadas em direção à entrada do hotel.

– C'est quoi ce bordel? (Que porra é essa?) - Mittie perguntou alto o suficiente para o garoto escutar e virar-se.

– Excusez-moi? (Desculpe?) - Virou-se e todo seu corpo sacudiu em um típico trejeito europeu.

Mittie ergueu as notas do chão e sacudiu na sua frente com uma cara de "Você é idiota?".

– Oh! - Sorriu mostrando as covinhas outra vez - Ce n'est pas assez pour le café des trois? (Isso não é suficiente para o café das três?)

– O que ele disse? - Inclinei a cabeça para Mittie, entendendo somente a parte que mencionava nós três.

– Tenho a leve impressão de que esse babaca está achando que nós somos mendigas! - Mittie se levantou num pulo e eu também me levantei meio hesitante.

– Vocês são americanas? - perguntou parecendo não notar, ou importar, com a raiva de Mittie. Parece que ultimamente temos achado muitos franceses fluentes - ou quase, no caso de Alex, - em inglês.

– Sim, e nós não, hum, precisamos do seu dinheiro - Kath disse tentando ser o mais educada possível.

– Nós só estamos esperando um táxi - falei subitamente constrangida quando seus olhos pararam em mim. Era como se absorvesse tudo, captando os mínimos detalhes.

– Pegue seu dinheiro estúpido e enfie no... - Mittie empurrou o garoto pelo peito, com as notas na mão.

– Tony!

Ele virou-se com Mittie ainda pressionando as notas contra seu peito.

– Alex! Joe!

– Que ótimo - Mittie sorriu ironicamente - Agora virou festa.

O garoto - Tony - olhou divertido para Mittie e finalmente pegou as notas da sua mão.

– Vocês se conhecem? - perguntei.

– O táxi de vocês ainda não chegou? - Alex indagou solidário como se já tivesse passado exatamente pela mesma situação de acabar se perdendo, tendo que dormir num moquifo e estar morta de fome e fedendo.

– Vocês se conhecem? - Dessa vez foi Tony quem perguntou.

– Elas dormiram no mesmo quarto que nós - Joe falou. Notei que tinha trocado de roupa e parecia mais bonito ainda. Acho que o encarei por mais tempo do que havia pensado, pois quando desviei o olhar Tony olhava para nós dois com mais interesse do que acho que devia.

– ALELUIA! - Mittie berrou atraindo atenção das pessoas por perto - NOSSO TÁXI CHEGOU! ATÉ NUNCA MAIS, HOTEL DE MERDA.

Suspirei de alívio, ficando mais feliz do que nunca por ver um táxi. Antes de entrar no táxi dei um última olhada para Joe que sorriu para mim. Baixei o olhar, corando e perdendo a coragem de pedir seu número - ia ficar tão na cara que eu estava afim dele. Observei os três franceses lindos parados na escadaria de entrada do hotel até eles serem apenas pontinhos e o táxi nos levar cada vez mais para longe daquele bairro que agora não parecia mais tão assustador.


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