Sobre Futuros Corações Estilhaçados escrita por Miojo Maldito


Capítulo 1
Capítulo Único


Notas iniciais do capítulo

Escute Stairway to Heaven e seja feliz...



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A moça estava sentada, com os braços apoiados no balcão daquele bar. Sua única companhia era um copo de vinho barato e um Derby que já se encaminhava para o fim.

Eu estava sentado na outra ponta do balcão e, como um bom psicólogo, tal melancolia alheia me atraiu. Ainda mais quando ela disparou um olhar para mim. Seus olhos, tristes, marejados,esbanjavam algo que me era mais do que uma simples atração profissional.Atração pessoal? Amorosa? Talvez. Ela virou o rosto novamente e se dedicou a tomar o resto do vinho no fundo do copo americano.

Não acreditava em amor à primeira vista, mas eu acreditava em obras do destino, coincidências. Ela era bem apessoada e, assim como eu, parecia ter uma boa situação financeira. Talvez estivéssemos naquele boteco de beira de esquina apenas para nos esquecermos dos nossos problemas, afogar nossas mágoas num copo de qualquer bebida cujo preço não passasse dos cinco reais. Eu só sabia pensar, mas não conseguia agir.

Isso. Agir. Uma aproximação seria uma boa escolha para começarmos uma relação amistosa. Tão logo minhas concepções sobre amor a primeira vista iam se esvaindo, iam embora para o ralo.Caminhei alguns instantes, e quando menos vi já estava com a mão esticada para ela e com um sorriso no rosto:

— Olá, meu nome é Marcos. Aceita companhia?

Tocava um clássico da banda Led Zeppelin. Prestei atenção neste detalhe porque ela não correspondia à minha tentativa de cumprimento e eu tentava olhar para os lados para disfarçar e sair dali de uma forma que não demonstrasse que eu havia acabado de levar um fora.Ela apenas olhava para mim, e pude notar que sua maquiagem estava borrada, fruto das lágrimas que com certeza escorreram por ali. Abaixei a mão e fui direto ao toalete. Minha esperança era de que quando eu saísse de lá, aquela moça não estivesse mais no bar.

No toalete fedido, abri a torneira e fiquei alguns minutos observando a água cair. Pensei comigo mesmo se eu estava realmente apaixonado, e minha cabeça só conseguia fazer planos. Pensamentos de um futuro que nem ao menos eu teria certeza se aconteceria. As chances eram mínimas.

Pensei em coisas esdrúxulas, clichês de qualquer homem recém apaixonado, contudo,todos aqueles devaneios tomavam conta do meu ser. Como por exemplo, pensei em como seria o nosso primeiro beijo, no que eu teria de fazer para firmar nossa relação. E se casaríamos na igreja ou apenas no civil. Se ela preferiria morar numa casa grande, com um jardim enorme, ou num apartamento, em um prédio bem alto,onde poderíamos ver a Lua mais de perto nas nossas noites. Sim, noites tão esperadas depois de um dia cheio de trabalho, mas o momento onde ela e eu poderíamos ficar mais perto dos nossos filhos. Isso, gêmeos. Um casal.

E discutiríamos pelo controle da TV,ou sobre quem sairia da cama quando as crianças chorarem. Ela talvez fosse palmeirense, e isso poderia provocar mais algumas pequenas discussões, pois sou corintiano roxo. Ela reclamaria da toalha molhada em cima da cama, e eu de suas calcinhas penduradas no box do banheiro. Eu reclamaria também da sua mãe, que com certeza iria querer passar o fim de semana conosco. Logo a vida de casado pesaria nas nossas costas e ela pediria o divórcio.

Depois de tantos pensamentos, fechei a torneira e voltei para o balcão. Olhei para o lugar onde a moça estava e não a vi mais lá. Ótimo assim. Pedi uma dose de uma bebida alcoólica qualquer e,minutos depois, senti um pequeno toque nas minhas costas. Era ela. Os olhos já não estavam marejados, mas continuavam fundos e borrados. Também havia um sorriso em seu rosto, e assim como a minha mão estava há alguns minutos, a dela também estava esticada.

— Laura, prazer. — disse ela.

Os meus pensamentos do toalete voltaram a me atordoar. Flashbacks de devaneios em sépia. Namoro, filhos, vida de casado. Meu coração palpitou.

— De novo não!

Saí correndo do bar, sem nem ao menos pagar a minha conta.


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