Lembranças...

Escuto um rádio bem distante. Está tocando aquela música. Quantas vezes eu fui dormir com ela tocando nos meus fones de ouvido enquanto meu pensamento viajava para o momento em que algo entre mim e você tinha acontecido. E agora ela está tocando de novo, mas agora eu me lembro de tudo que poderíamos ser e não somos e talvez nunca possamos ser e isso me arranca lágrimas do fundo da minha alma já esquecida. Quis por tanto tempo esquecer você, esquecer meu amor, esquecer minha alma que é gêmea a tua.

Mas a música insiste “You’re all I want... you’re all I need...” queria que ela simplesmente se calasse e calasse consigo meu amor por você.

Apenas crianças.

Éramos apenas crianças quando nos cruzamos numa sala de aula lotada com outros como nós. E naquele momento eu jamais imaginaria o quanto eu poderia vir a te amar um dia e a quantidade de dor que esse amor iria me causar.

–Oi, qual seu nome?

–Richard... E o seu?

– Katherine, mas todos me chamam de Kate.

– Ok Kate, pode me chamar de Rick, é assim que todos me chamam também.

– Você vai fazer o trabalho de história com o nosso grupo ok?

– Tá legal.

E assim nos perdemos pela sala. Perdemo-nos pela biblioteca, pelos playgrounds, pela sala da minha casa, pelo meu quarto, pelas mensagens trocadas e mesmo com toda implicância de criança eu pude ver que era para você que minha alma se destinava.

Só restaria me declarar. Arrebatador. Arranquei um pedaço pequeno do caderno. Escrevi com letras desenhadas “Eu gosto de você. Kate.”. Não demoraria muito para que o destino me batesse bem no meio da face e me derrubasse tão bruscamente no chão.

Recreio:

–Ei, Kate.

–Ei!

–Olha, eu vi seu bilhete no meu estojo. Eu gosto também de você, mas como minha amiga. E gosto muito.

–Oh, eu também. – sorri de forma amarela, minhas pernas dançavam sem controle, puxava o tempo todo meus fios de cabelo para detrás da orelha. – Somos grandes amigos, queria que soubesse.

– Eu sei. Mas tenho algo para lhe dizer.

– O que é? – Uma ponta de esperança se despertou em mim.

– Eu vou embora da escola e de Nova Iorque. Vou morar no Texas. Meu pai vai iniciar um novo negócio por lá. Só ficarei na escola até semana que vem.

– Jura? – Eu estava chocada, e minha pergunta só afirmava a minha queda brusca das nuvens da ilusão para o chão da realidade.

–Sim, sinto muito.

Os olhos dele eram tão azuis que eu poderia com auxilio do Sol ver meu rosto de susto refletido no seu olhar.

O que eu poderia fazer agora. Eu tinha apenas 13 anos, mas em meu peito o meu coração parecia querer ter um ataque cardíaco. Ele mexia comigo. Suas brincadeiras estúpidas me irritavam profundamente, mas a forma como ele me olhava, olhar tímido, intenso, despido de julgamento, apenas curiosidade, apenas carinho, me atou numa vontade nunca sentida por mim antes. A vontade de beijar seus lábios e de abraça-lo a hora que eu quisesse. Ele me tinha antes mesmo de me tocar.

Mas agora ele ia embora. A capacidade de descobrir e viver o amor de forma inteira escapava das minhas mãos sem que nada eu pudesse fazer. E ele se foi. E os corredores da escola jamais seriam o mesmo sem as implicâncias de Rick comigo.

As lembranças se moviam de forma ordenada, como se cada fato passasse por mim como uma linha do tempo. A nossa linha do tempo.